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O JOAQUINISMO E O CULTO AO DIVINO ESPIRITO SANTO NOS AÇORES

Domingo, 15.05.16

Numa das minhas aulas de História da Filosofia, no Seminário de Angra, o meu douto professor referiu-se ao abade Joaquim de Fiore, nascido em 1132 e falecido em 1209, definindo-o como um notável filósofo místico, defensor do milenarismo e do advento da idade do Espírito Santo. O seu pensamento deu origem entre outros movimentos filosóficos, ao chamado joaquinismo, pelo que ganhou fama de filósofo e sábio.

De seguida resumiu sucintamente o seu pensamento filosófico. Segundo ele, o tema das mais importantes obras de Joquim de Fiore é o da interpretação da visão profética das Sagradas Escrituras no contexto da História e a previsão do futuro da Igreja enquanto comunidade mística. Segundo ele existiriam três Estádios, ou Idades da História, no desenvolvimento do Mundo e da Igreja de Deus, correspondentes às três Pessoas da Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito santo

A Primeira Idade correspondeu ao governo de Deus Pai e é representada pelo poder absoluto, inspirador do temor sagrado que perpassa o Velho Testamento. Correspondeu ao tempo anterior à revelação de Jesus Cristo.

A Segunda Idade inicia-se com a revelação do Novo Testamento e com fundação da Igreja de Cristo, em que, através de Deus Filho, a sabedoria divina que tinha permanecido escondida da humanidade se revela em Epifania. Correspondeu à contemporaneidade do autor

Finalmente a Terceira Idade, que há-de vir, corresponde ao domínio da Terceira Pessoa ou seja do Espírito Santo Paráclito. Será o advento do Império do Divino Espírito Santo, um tempo novo, onde serão alcançados o amor universal e a igualdade entre todos os membros do Corpo Místico de Deus, isto é entre os cristãos. No Império do Divino Espírito Santo, as leis evangélicas serão finalmente concretizadas, não só na sua letra mas no seu espírito, isto é, na mensagem que nelas está escondida e que, segundo Joaquim de Fiore será finalmente compreendida e aceite pela humanidade. Nesta Terceira Idade, a idade da graça redentora, não haverá necessidade de leis ou instituições disciplinadoras da fé, já que esta será universal e baseada directamente na inspiração divina, pelo que poderão ser dispensadas as estruturas institucionais do poder temporal da Igreja e a sabedoria divina a todos iluminará igualmente, ou seja todos beneficiarão de uma inteligência espiritual capaz de permitir a plena compreensão dos divinos mistérios. Assim todos podem ser doutos e imperadores.

Joaquim de Fiore acreditava que a Segunda Idade estava no seu fim e que o advento do Império do Espírito Santo estava próximo. O fim da Segunda Idade, a ser marcado por um cataclismo, era já prenunciado pela desordem então patente no mundo. Após essa transição dolorosa, a unidade cristã seria alcançada com a união entre as igrejas cristãs do ocidente e oriente e o fim dos cismas e os judeus veriam a verdade do Novo Testamento. O Império do Divino Espírito Santo seria pois a apoteose da História, durando até ao fim dos tempos, apenas terminado com a glória da segunda vinda do Redentor.

Perante isto, pode concluir-se que apesar do povoamento dos Açores só se ter iniciado a partir de 1432, quase 200 anos após o apogeu do joaquimismo, e do núcleo central da sua doutrina já ter sido condenado em 1256 pelo papa Alexandre IV, houve no arquipélago açoriano um claro reacender daquelas doutrinas, inspirando manifestações religiosas e ações rituais e simbólicas que perduram até aos nossos dias.

Por influência destas doutrinas trazidas pelos frades, nomeadamente pelos franciscanos, o culto do Divino Espírito Santo, então em apagamento na Europa devido à crescente pressão da ortodoxia religiosa, foi trazido para as ilhas. Aqui, as comunidades isoladas e sujeitas às pressões, medos, catástrofes e incertezas recorriam à proteção divina, adotando crenças e ritos ao Divino Espírito Santo que assim ganharam raízes e recuperaram vigor, adquirindo um claro cunho joaquinista que ainda hoje está bem patente nas festas que por estes dias se fazem em todas as ilhas.

Os Açores, e as comunidades de origem açoriana, constituem assim os últimos redutos onde as doutrinas de Joaquim de Fiore sobrevivem, e, a julgar pelo empenho que o povo, incluindo os mais jovens, continua a dedicar a estas celebrações e pelo recrudescer das Irmandades do Divino Espírito Santo, mantêm e manterão para sempre todo o seu vigor.

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publicado por picodavigia2 às 00:02





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