PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
DIA DA LIBERDADE
(TEXTO DE CARLOS SOUSA)
Neste saboroso feriado, que hoje nos chegou, para fazer lembrar a data importante que foi o 25 de Abril de 1974, queria aqui recordar alguns dos grandes alicerces, pelo menos para mim e colegas desse tempo, em que se tornaram as cantigas de intervenção, poetas, compositores e cantores. Nos finais dos anos sessenta e inícios dos de setenta, mexeram connosco, abanaram consciências e influenciaram a maneira de pensar e de agir de muitos de nós.
Nomes como os de Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira, José Mário Branco, José Gomes Ferreira, Luís Cília, Manuel Alegre, Francisco Fanhais, Manuel Freire, Ary dos Santos, Manolo Diaz, Paco Ibañes, Patxi Andion, Fausto, Sofia de Mello Breyner, António Gedeão, António Aleixo, Geraldo Vandré, … para citar apenas alguns dos mais importantes, pois eram muitos, puseram-nos entre mãos tantos e tão bons e enigmáticos poemas/canções – que se transformaram em verdadeiros temas para conversa, para meditação, despertando consciências ainda adormecidas.
Era ver-nos, naquele tempo, de coração aberto à novidade e à mudança, por esses campos fora, quer isoladamente, quer em grupo, trauteando muitos dos proibidos e censurados estribilhos que nos enchiam de porquês e nos abriam horizontes de liberdade.
Quem não se lembra de poemas e canções como a Pedra Filosofal – o sonho comanda a vida… sempre que um homem sonha o mundo pula e avança; Trova do Vento que Passa – há sempre alguém que diz não; Canção para desfazer equívocos – irmão doutra cor, não estranhes que te chame irmão; Ó pastor que choras – deita as mágoas fora; Porque – porque os outros se mascaram mas tu não; Borboleta Preta – há muitas asas ardendo neste descampado; Corpo Renascido – canção, casa do mundo, viagem do homem para o homem; Descalça vai para a fonte – se os filhos se alimentassem com a sua formosura … Leonor pensa de mais, vai formosa e não segura; Traz outro Amigo Também – não percas tempo que o vento é meu amigo também; Canto Moço – somos filhos da madrugada; Este parte, Aquele Parte - e todos, todos se vão; Eles - Ei-los que partem novos e velhos; Menina dos Olhos Tristes - vem numa caixa de pinho, desta vez o soldadinho; Sei duma Menina – enfrentar a vida é o seu pavor; Para não dizer que não falei de flores – caminhando e cantando e seguindo a canção/somos todos iguais braços dados ou não; Natal para os Meninos da Guerra – era de morte o tempo nesse dia velho de ser Natal; Recuso-me – ao silêncio e à mordaça… a ter medo e a estiolar na concha dos poetas sem mensagem; Canção do Vento - há tempo p’ra tudo na terra; O que menos importa é o fato surrado; Os Vampiros – eles comem tudo e não deixam nada; Calçada de Carriche - Luísa sobe, sobe a calçada; O que faz falta é avisar a malta; Natal dos Simples - vamos cantar as Janeiras; Cantata da Paz – vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar; Cantilena - cortaram o bico ao rouxinol; Livre - não há machado que corte a raiz ao pensamento; Menino do Bairro Negro – onde não há pão, não há sossego; Exílio - Venho dizer-vos que não tenho medo – a verdade é mais forte que as algemas; Canta, Amigo, Canta - erguer a voz e cantar; É preciso avisar toda a gente – dar notícia, informar, prevenir; Dedicatória - se poeta sou, sei a quem o devo/ao povo a quem dou os versos que escrevo; Regresso – dia de festa na pátria amada; Sou Barco – e os barcos abandonados voltarão a Portugal; Canta, Camarada, Canta – canta que ninguém te afronta; Grândola, Vila Morena – o Povo é quem mais ordena; Somos Livres – uma gaivota, voava, voava…
…e outros, muitos, muitos singles e LPs, alguns estampados à pressa, mas novidade clandestina que mão amiga nos trazia de Lisboa.
Tempo de esperança, que se foi tornando realidade, com avanços e recuos, abusos e mal-entendidos, verdades e inverdades, paz, sossego, desassossegos e guerras, sempre e tudo em nome da liberdade, esse caminho nunca completo que teimosa e convictamente vamos trilhando.
Carlos Sousa, Facebook