PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O FOGÃO DA LUZ
Era uma vez um pai que tinha muitos filhos. Era de avançada idade e sentia-se cansado e desiludido, mas era conhecedor profundo da vida e, sobretudo, da forma como resolver, tanto os grandes e esporádicos problemas como as pequenas dificuldades do dia-a-dia. Andava preocupado o bondoso e inteligente ancião, pois, observando as atitudes e comportamentos dos seus filhos, cuidava que não punham muito tino na forma de resolver os problemas, que tomavam decisões impensadas e irreflectidas de que depois se arrependiam e não reflectiam a fim de escolher a melhor, a mais fácil e a mais eficaz forma de resolver esta ou aquela dificuldade. Apenas um dos filhos, o mais novo, era, na opinião do veterano pai, sensato nas suas tomadas de decisões, prudente nas suas atitudes e deliberações, precavido nas acções mais inesperadas, ponderado e cauteloso em tudo o que fazia.
Preocupado em cada dia, em cada hora e em cada momento, o bom pai bem avisava os filhos sobre a necessidade de reflectirem antes de tomarem qualquer decisão a fim de que as suas atitudes não fossem perniciosas e nefastas e delas não se viessem a arrepender mais tarde. Caíam em saco roto, os seus conselhos.
Certa noite, ao deitar-se, colocou um candeeiro a petróleo em cima de uma mesa-de-cabeceira que ali havia, ao lado da velha enxerga de palha e pragana. Acendeu-o com o pavio de tal maneira alto que aqueceu excessivamente o vidro. Depois, quando percebeu que o fogão da luz já pelaria quem o tocasse, chamou o filho mais velho e ordenou-lhe:
- Agarra o fogão desta luz com ambas as mãos.
O rapaz de imediato respondeu:
- Não posso, meu pai. Não vê que está muito quente? – E sentou-se ao lado, por ordem do progenitor, o qual, de imediato, chamou outro filho a quem deu a mesma ordem. A resposta imediata do rapaz foi também a mesma: “Não posso, meu pai, está muito quente!” e sentou-se ao lado do irmão mais velho. O mesmo aconteceu com os restantes irmãos.
Chegou, finalmente, a vez do mais novo. Entrou no quarto e o pai deu-lhe a mesma ordem:
- Agarra o fogão desta luz com ambas as mãos.
O rapaz calou-se durante uns segundos e fechou os olhos, sinal de que estava a pensar. Pouco depois, sorriu, deu um sopro e apagou a luz. Esperou algum tempo, o necessário para que o fogão arrefecesse. Foi então que facilmente agarrou o vidro com ambas as mãos e tirou-o do candeeiro, entregando-o ao pai.
Não foi necessário dizer qualquer palavra. Os outros filhos compreenderam a lição e, a partir de então, tornaram-se mais ponderados nas suas atitudes, mais reflectidos nas suas decisões e mais sensatos nos seus procedimentos.