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O JOGO DO PIÃO

Quarta-feira, 13.11.13

Embora conhecido e praticado em todas as regiões e localidades do país, o jogo do pião era um dos mais populares e típicos a que se dedicava a ganapada da Fajã, nos anos cinquenta. Curiosamente, na Fajã, não se jogava ao pião durante todo o ano, mas sim e apenas numa época concreta e específica que coincidia mais ou menos com a Primavera ou, mais concretamente, com as semanas que decorriam ente o domingo de Páscoa e o do Espírito Santo. Era a denominada «época do pião». Nessa altura não havia criança, rapaz e, muitas vezes, até homens que não arranjassem o seu pião, com a respectiva fieira, para uma valente e porfiadíssima jogatina. Depois era treinar, treinar e preparar-se para lutas disputadíssimas e grandes desforras. Mas o jogo do pião tinha as suas regras, as quais eram escrupulosamente respeitadas por todos os jogadores, não apenas no que dizia respeito ao desenrolar dos jogos, mas também relativamente ao formato, feitio, volume e qualidade do pião, à agudeza do bico e até ao tamanho da fieira. Os piões, geralmente, eram feitos por carpinteiros ou outros curiosos da Fajã, mas também se podiam comprar nas lojas, vindos do Faial ou de S. Miguel, preparadinhos com fieira, embora neste caso, geralmente, fosse necessário substituir-lhes o bico, porque o original não era dotado de grande qualidade penetrativa, nem muito adequado para as nicas. Os piões, normalmente, eram feitos de madeira de buxo, rija como ferro. Tinham um diâmetro, aproximadamente, entre cinco e dez centímetros, tinham uma cabeça no lado superior, à volta da qual se iniciava o enrolar da fieira e, no outro extremo, um potente bico em ferro.

Chegada a época do pião todos se preparavam, não apenas mandando fazer um pião, procurando, entre os arrumos, o da época anterior, ou comprando um novo. Era necessário também arranjar uma boa fieira, pois a sua qualidade influenciava, em parte, a eficácia da actividade giratória e impulsiva do pião. Fieiras boas eram as obtidas de antigos fios de pesca, sobretudo os que vinham da América. Depois era treino, muito treino, para aperfeiçoar a pontaria e para por o pião a rodar e a «dormir», não apenas no chão, em superfície lisa, mas até pegando-lhe do chão para a palma da mão, sempre a «dormir” ou até atirá-lo ao ar e apanhá-lo e pô-lo a girar na palma da mão sem ter que, antes cair ou sequer tocar no chão. Os mais habilidosos até o punham a girar ou a «dormir” em cima de um ombro, passando-o depois para outro, sem o pião nunca parar ou ir ao chão. Havia jogos ou concursos que tinham como objectivo que cada qual demonstrasse maior qualidade, destreza e habilidade no jogar do seu pião.

Mas o principal jogo era o das «nicas» ou «ferroadas». Um grupo ilimitado de jogadores predispunha-se a jogar. Era escolhido o pião que havia de ser a primeira vítima. A escolha geralmente era feita através de um atirar colectivo de todos os piões e o pião que “caísse” mais cedo, isto é, que parasse de girar em primeiro lugar, seria aquele que iniciaria o jogo, colocando-se, parado no chão, à espera que os outros, mediante a agilidade e destreza dos seus donos, o nicassem. O pião era colocado, solto e sem fieira no chão, enquanto os restantes jogadores, lhe tentavam dar uma nicada ou ferroada com o bico do seu. E era cada uma! O primeiro pião a falhar a nicada substituía imediatamente o que estava no chão, passando a ser a vítima, enquanto o outro se preparava para nicar. As nicadas, por vezes eram tão fortes que chegavam a inutilizar o pião vítima, rachando de uma ponta à outra. Mas isso fazia parte das regras do jogo que todos eram obrigados a aceitar, embora cada qual ficasse bastante triste e desolado ao ver o seu pião desfeito, rachado ou, simplesmente nicado.

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