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FAJÃ GRANDE

Quinta-feira, 06.06.13

A freguesia da Fajã Grande ocupava, juntamente com a Fajãzinha, uma ampla fajã delineada a Oeste pelo mar e a Norte, a Leste e a Sul por uma altíssima rocha que a separava do resto da ilha, isolando-a das restantes freguesias e das duas vilas – Santa Cruz e Lajes. O isolamento era tal que até as deslocações à freguesia mais próxima, a Fajãzinha, sobretudo no Inverno, tornavam-se bastante difíceis e por vezes impossíveis. Era necessário atravessar a Ribeira Grande, muito larga, apenas com uma ponte pedonal e por vezes levada pela correnteza e com um caudal fortíssimo. As margens ligavam-se por uma fila de enormes calhaus, mais ou menos alinhados, alguns ali colocados pela natureza outros pelos homens e relativamente próximos uns dos outros. Chamavam-se “passadeiras”. Quem se aventurasse a atravessar a ribeira, teria que o fazer saltando de calhau em calhau, o que, por vezes e para os menos afoitos, provocava escorregadelas que, para além de assustadoras, encharcavam uma boa parte da roupa. Os animais atravessavam-na a pé ou a nado. A ribeira, no entanto, não dificultava apenas as deslocações à Fajãzinha. Era por ali também que se ia às vilas ou às outras freguesias. Apenas para Ponta Delgada se virava a Norte, subindo a rocha da Ponta, percorrendo um sem número de atalhos e veredas, saltando tapumes,  pulando grotões e atravessando relvas para encurtar caminho. 

Todas estas deslocações para além de muito difíceis eram também demoradíssimas. As ligações por mar não existiam.

Assim, o isolamento em que vivia a freguesia era total, absoluto e permanente.

No meio deste isolamento a beleza pura, original e sublime. Do cimo do Pico da Vigia podia desfrutar-se de uma vista aprazível, deslumbrante e encantadora sobre a Fajã. Talvez mesmo uma das mais belas vistas de toda a ilha das Flores.

Logo à direita de quem subia, divisava-se, ao longe o Oceano, ora manso e azulado, ora revolto e esbranquiçado de espuma, ornamentado pelo Monchique e pela Baixa Rasa, como que envolvendo e abraçando sem disfarce e sem vergonha, em semicírculo, a extensa fajã, delimitada a Norte pelo alto do Portal e a Sul pela Rocha dos Bredos. Depois, mais perto, a mancha negra, basáltica e rendilhada do baixio, com os seus caneiros e enseadas, onde se destacavam o Redondo, a Retorta, o Caneiro das Furnas, a Baia de Água e o Poceirão com o Calhau da Barra a fiscalizar passagem para o Atlântico. Mais além, espraiava-se a enorme Baía, debruada pelo Rolo, um amontoado inaudito de pedras polidas e arredondadas, estendendo-se ao longo da Ribeira das Casas e das Covas, desde o Pesqueiro de Terra ao Ilhéu do Cão, metamorfoseando-se de novo em baixio, lá ao fundo, junto à rocha da Ponta. Já mais perto, a igreja rodeada pelas casas ordenadas em arruamentos simétricos, umas brancas, outras cinzentas, com os seus telhados avermelhados, aglomerando-se e misturando-se com cerrados, belgas e courelas onde florescia milho, batatas e couves. Mais perto ainda, já como que a prolongar-se pela encosta acima, pequenas pastagens e algumas terras de mato galvanizadas de um verde onde se misturavam incensos, faias, canas, fetos e cana-roca. Finalmente, mas muito distante, a Norte, já para além da ribeira do Cão, a Ponta, onde as casas se postavam em fila, muito bem arruadas na direcção da ermida da Senhora do Carmo, encravada nos contrafortes da rocha. Contrastando com o Oceano e do lado oposto, um semicírculo pétreo e altivo, formado pelas rochas da Ponta, das Covas, das Águas, dos Paus Brancos, dos Lavadouros e do Curralinho, povoadas de ribeiras e de cascatas onde a água se desprendia em fluxos ritmados e refulgentes sob o verde dos socalcos e andurriais e o negro das fragas, ravinas e penhascos.

Do outro lado e a Sul, a segunda parte do semícirculo. Muito ao longe as Rochas da Figueira e dos Bredos a protegerem a Fajãzinha, onde as casas, tão distantes e tão pequeninas, se assemelhavam a minúsculos salpicos esbranquiçados, como que confundidos com a enorme mancha verde das terras de mato, dos campos e das pastagens. Depois a Cuada com a velhinha Casa do Espírito Santo e pouco mais de meia dúzia de casas perdidas entre hortas e pomares, consubstanciando-se, mais adiante, na Eira-da-Quada, com o Oceano extenso, resplendoroso e sempre predisposto a receber o volumoso caudal da Ribeira Grande. Finalmente a rocha da Alagoinha povoado de um número quase infinito de grotas e cascatas, muitas delas dia e noite a escorrer, fazendo transbordar o Poço da Pata, semiencoberto pelo arvoredo do Vale Fundo, do Pocestinho e da Cabaceira.

No cimo daquele pico existia uma pequena casota branca, destinada a vigia de baleia, com uma enorme fresta no mural voltado para o Oceano, que permanecia sempre aberta sobre o mar para que o vigia ali sentado horas a fio, avistasse as baleias e, de imediato, lançando um foguete lá do alto, avisasse os baleeiros, entretidos cá em baixo nas suas courelas, em pequenas fainas agrícolas, de tão gratificante descoberta. Daí a razão do seu epíteto – Pico da Vigia.

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publicado por picodavigia2 às 21:57

HAMBURGUER

Quinta-feira, 06.06.13

O hambúrguer é uma espécie de sanduíche de carne de bovino, moída e cozida ou grelhada, servida entre duas metades de pão. Geralmente é acompanhado por condimentos e outros ingredientes também eles colocados dentro do pão, como cebola, alface, tomate, ketchup, queijo fatiado, bacon, etc. O hambúrguer, uma sanduíche muito popular em quase todo o mundo, existe aqui bem perto, mais concretamente no Ferrara Plazza, na freguesia de Carvalhosa, em Paços de Ferreira.

Não se sabe ao certo a verdadeira história da origem do tão famoso hambúrguer cuidando-se que se originou a partir de uma simples sanduiche de pão e, carne e com o passar dos anos, foi ganhando aperfeiçoamento e adoptando novos ingredientes.

Hoje existem outros hambúrgueres para além dos de carne bovina: frango, peru, peixe, soja e até hambúrgueres de vegetais. É que, actualmente este tipo de alimentação, no que à carne de bovino diz respeito, levanta alguns problemas à saúde humana, por isso começaram a surgir hambúrgueres alternativos àquela carne. O peito de peru e a soja parecem ser as melhores opções. O peito de peru porque tem uma quantidade mais reduzida quer de calorias quer de gorduras, enquanto o de soja, por sua vez, parece ter influências na redução e no controle do colesterol. O hambúrguer de frango também tem uma quantidade reduzida de gorduras, mas, em contrapartida, é excessivamente rico em proteínas.

É importante ressaltar que todos os tipos de hambúrgueres têm sódio na sua composição. Este mineral em excesso eleva a pressão arterial e pode trazer outros malefícios para a saúde, por isso a moderação é fundamental.

As pessoas que possuem doenças como hipertensão, colesterol e triglicerídeos elevados e gastrite, entre outras doenças, devem ficar atentas ao consumo de produtos industrializados e isso inclui o hambúrguer comprado no supermercado.

 “At the heart of every hamburger is the patty. Most typically people think of a hamburger patty as beef. This is a great place to start. When using ground beef to make hamburger patties, be sure to select the right meat. Lean ground beef like ground sirloin or the 7% fat meat will tend to make dry burgers. Remember, when you grill a burger a lot of the fat will drain off so starting out too lean can make a dry burger. But also remember that the more fat the more the burger will shrink while cooking.”

Pois esta delícia pantagruélica, este sublime e gratificante alimento também foi abruptamente arrancado do meu cardápio, uns por excesso de proteínas e gorduras, outros por conterem demasiadas proteínas. Assim, dele não posso mais fruir, nem sequer das suas excelentes e saborosas alternativas à carne bovina, como é o caso do hambúrguer de frango, de soja, de peito de peru ou até de peixe. Por isso, hoje quando vou ao Ferrara, ali para os lados de Carvalhosa, sinto uma grande nostalgia e nada mais posso fazer do que envolver-me na eterna lembrança daquele delicioso hambúrguer com que me deliciava outrora. Agora, uma simples sanduiche de queijo fresco, alface e cenoura, sem maionese ou ketchup e é tudo.

Adeus, creio que para sempre, meu “ adorado” hambúrguer.

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publicado por picodavigia2 às 21:46

SARDINHA

Quinta-feira, 06.06.13

A sardinha é um peixe da família “Clupeidae”, espécie “Anmagnq” aparentada com os arenques. Geralmente, é de pequena dimensão, caracterizando-se por possuir apenas uma barbatana dorsal, mas sem espinhas. Por sua vez, a barbatana anal tem o caudal bifurcado e as escamas ventrais são em forma de escudo, características que fazem das sardinhas peixes de uma beleza rara e de um simplicidade contagiante e muito apetecíveis ao paladar.

Acredita-se que o nome "sardinha" tenha a sua origem na ilha Sardenha, onde consta que, outrora, a sardinha tenha abundado.

A sardinha, de barbatana dorsal sem espinha e de barbatana anal bifurcada, alimenta-se de plâncton e vive, frequentemente, em grandes cardumes, servindo de alimento a muitos outros peixes, Sabe-se, também, que é rica em o ômega-3, que se julga ser um "protector" do coração humano.

As sardinhas assadas são um dos pratos mais típicos e tradicionais da cozinha portuguesa. A sardinha, em Portugal, é pescada legalmente por quase meia centena e meia de embarcações, em todo o país, e é a única espécie de peixe, em toda a Península Ibérica, a obter a certificação de qualidade, como resposta às preocupações sobre a sustentabilidade dos recursos. A certificação é uma mais-valia para toda não só para os pescadores mas também, e em particular para a indústria conserveira, mas é, também, benéfica para o consumidor, dado que lhe traz mais informação, quer do produto fresco quer do congelado, por forma a ser valorizado o preço de venda, aumentando, assim, a rentabilidade do pescado.

Para a saúde humana, os benefícios da sardinha, um dos peixes mais baratos do mercado, são inúmeros e têm comprovação científica. Especialistas acreditam que o seu consumo é capaz de reduzir o risco de enfarto, de baixar o nível de triglicerídeos no sangue e também auxiliar na prevenção de diabetes, osteoporose e enxaquecas.

Há quem afirme que duas sardinhas, duas a três vezes por semana, são suficientes para se obter os benefícios resultantes das suas potencialidades. A fim de se poder retirar o máximo de vantagem do consumo da sardinha, é preferível comê-la fresca e com pele. Quem tem o colesterol alto deve optar pelas versões: fresca, grelhada ou assada e a enlatada em molho de tomate. Para quem pretende aproveitar o cálcio da sardinha, é preferível optar pela enlatada. É que nesse caso a espinha é bem macia e mais fácil de ser consumida. A espinha da sardinha é uma fonte riquíssima de cálcio.

Incontestavelmente que uma sardinha assada, colocada sobre uma fatia de broa a pingar gordura, para além de muito saborosa é um petisco de excelente qualidade, mas totalmente vedado aos doentes, como eu, portadores de insuficiência renal.

 

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publicado por picodavigia2 às 19:53

O FIO

Quinta-feira, 06.06.13

Todos os anos, nos meses de Março e Setembro, os Cabeças, através de um edital afixado na porta da igreja da Fajã, com duas ou três semanas de antecedência, anunciavam o dia de Fio.

De imediato, todos os que tinham ovelhas bravas no baldio preparavam com acentuado denodo e excessivo desvelo o dia em que mais de metade da freguesia partiria para o Mato a fim de conjuntamente proceder à recolha e tosquia dos ovinos.

Aos homens competia juntar o gado, tarefa nada facilitada por parte dos animais que frequentemente se aventuravam em fugas estonteantes por entre fragas e grotões, a que nem os cães punham cobro. Às mulheres, por sua vez, competia a preparação e o transporte da comezaina, e não era pouca. É que o ajuntamento dos ovídeos iniciava-se pela madrugada, a tosquia terminava ao lusco-fusco e o regresso a casa prolongava-se pela noite dentro.

No dia marcado todos se levantavam alta madrugada. Os homens e os rapazes caminhavam para o mato, ainda noite escura. Na véspera, reunidos com os Cabeças, haviam combinado e formado vários grupos. Um, o dos mais novos e expeditos, ia pela Fajãzinha, subindo a Rocha da Figueira até às lagoas. Aí dividir-se-ia, entrando uns pela Burrinha e outros pela Água Branca. Os restantes grupos seguiam pela Rocha: um com destino ao Queiroal, outro ao Morro Alto e Pedras Brancas, enquanto o último, que incluía os mais velhos, ficaria na zona do “curral”, sobranceira ao Rochão Grande, a fim de controlar e afunilar a chegada dos ovinos e evitar o mais possível a sua fuga. Acompanhados pelos cães, protegidos do frio do Mato por grossos casacos, amparados a enormes bordões de araçá e saco a tiracolo partiam em bandos, arfando em loucas correrias e longas caminhadas, proferindo, em colaboração com os cães, uivos alucinantes e pungentes. Só assim era possível ajuntar as ovelhas bravas em toda zona do baldio, desde o Queiroal à Água Branca e conduzi-las até ao “curral”.

Em casa as mulheres enchiam cabazes e cestos de vimes brancos, usados habitualmente para ir lavar a roupa à ribeira, com pratos e tigelas a que sobrepunha postas de peixe frito, torresmos e toros de linguiça, talhadas de inhames, quartos de bolo do tijolo, fatias de pão de milho, pedaços de queijo, um bule cheio de café com leite, algumas maçãs e as tesouras de tosquiar.

Mal o Sol começava a raiar, iniciavam a longa e difícil caminhada em direcção ao “curral”, a fim de que chegassem a tempo para que os homens tivessem a primeira refeição logo a seguir à recolha das ovelhas.

Era no Alagoeiro que as mulheres, esperando umas pelas outras, juntamente com as crianças, se juntavam para iniciar a íngreme subida da Rocha. Carregando pesados cestos e cabazes, ajeitados à cabeça protegida com uma rodilha de pano, acompanhadas pelas crianças que levavam as cestas e os cabazes mais leves, formavam uma enorme e compacto pelotão, em direcção à Ribeira. Aí voltavam à esquerda para o lado da Figueira, junto ao chamado largo do Arame. Em breve entravam na primeira das trinta e duas voltas da Rocha que, desenhadas em ziguezague, somavam degraus após degraus, num escalar contínuo, íngreme e quase infinito. O pelotão, logo ao iniciar a subida, começava a desfazer-se, transformando-se numa fila compacta que se estendia entre o verde dos socalcos e das ravinas, o negro dos andurriais e dos penedos, como que delineando um filamento serpenteado e colorido que avançava lentamente.

Para trás ficavam as casas, os campos amarelados de milho e o oceano azul e infinito. Ao perto as relvas de um verde muito verde, entrelaçadas entre florestas escuras de faias, incensos e criptomérias, por onde deslizava a Ribeira das Casas.

Ao chegar à Furna do Peito, as mulheres que seguiam à frente paravam. Era um dos lugares da Rocha institucionalizado para o descanso. A furna era uma enorme concavidade encravada num sítio mais saliente e pedregoso da Rocha e cuja forma se assemelhava a um gigantesco peito humano, razão óbvia do seu epíteto. Era lá que os homens descansavam ou se abrigavam e protegiam das intempéries, quando desciam com as latas de leite penduradas em paus de araçá ou quando subiam com o gado. A maior parte das mulheres entrava, poisava os cestos e cabazes no chão e sentava-se a descansar, enquanto muitas outras permaneciam nos degraus circundantes.

Pouco depois a subida recomeçava A coluna ora caminhava em descampados rectilíneos, ora escalava degraus e degraus feitos de pedras rústicas, protegidos por pequenos bardos de queiró e vinhático. A Fajã, agora, surgia como numa vista aérea, onde se divisava o vermelho escuro dos telhados, misturado com o verde amarelado das courelas. Ao longe a mancha negra do baixio, recortada por caneiros e enseadas, onde as vagas crespadas se desfaziam em constante e esbranquiçado rodopio. O oceano, mais azulado, surgia calmo e como que inclinado, a despejar-se sobre a freguesia. No meio e ladeado pela Baixa-Rasa, o ilhéu do Monchique, maior, mais negro e muito próximo.

As voltas da Rocha, no entanto, sucediam-se umas às outras como que teimando em não ter fim. A própria coluna já se dividia e subdividia em pequenos grupos. Algumas mulheres maldiziam a sua sorte e arrependiam-se de ter saído de casa, enquanto outras não o declaravam por vergonha. Na volta do Descansadouro, onde havia uma outra furna mais pequena do que a do Peito, as mulheres voltavam a poisar os cestos sobre uns muros ali existentes, efectuando um segundo e merecido descanso. Era o meio da subida.

Pouco depois reiniciavam a marcha, cada vez mais amarga e mais cansativa.

Finalmente, chegavam à retemperadora Fonte Vermelha! Para além de saciar a sede, na que se dizia ser a melhor água da ilha das Flores, era a certeza de faltarem poucas voltas para o cimo da Rocha.

As mulheres de rosto avermelhado como maçãs apodrecidas, a limpar suor e a proferir imprecações, retiravam os cestos da cabeça, guardavam as rodilhas de pano multicolor debaixo do braço e formavam fila diante da fonte de água miraculosa. Miraculosa porque balsamizava o cansaço, suavizava o esgotamento físico resultante de tão longa e íngreme subida e retemperava as forças e o ânimo para continuar. A água jorrava, incessantemente, de uma pequena e tosca bica, encravada num tufo da Rocha, onde cada um colocava uma folha de incenso ou de sanguinho, para ter acesso mais higiénico e eficiente ao consumo do cristalino e diáfano fiozinho.

Consoladas com o hausto milagroso, muitas mulheres exclamavam:

- Isto é que é um consolo! Foi posta aqui por Deus, para nos retemperar as forças! Pena é estar tão longe das casas! Uma fonte assim na Praça é que era… Nem o Rossio, na Fajãzinha…

Todas bebiam, muitas voltavam a beber e a fonte nunca secava. Corria sempre, dia e noite, jorrando um frágil mas contínuo veio, lá bem do interior da terra. Mesmo que ninguém a procurasse para beber, a água continuava a brotar e caía solitária mas sussurrante, formando, no chão, uma poça que, depois de cheia escoava pelos degraus e encostas da Rocha, transformando-se num pequeno regato.

O pelotão aglomerava-se de novo. A paragem junto à fonte proporcionara às mais retardatárias ocasião para se juntarem à coluna e reiniciar a marchaem conjunto. Finalmentea minúscula furna dos “Dez Reis”, a indicar que faltavam apenas dez voltas para a cancela do cimo da Rocha. Era o fim da subida.

Chegar ao cimo da Rocha era um alívio. O cansaço porém convidava a novo descanso, logo a seguir à cancela do Couceiro, onde ao longo dos tempos os homens que por ali passavam diariamente haviam criado uma espécie de logradouro. Junto a uma alta parede, que os abrigava dos ventos frios do Norte, haviam construído uma bancada de pedra tosca onde se sentavam a descansar, a conversar e a esperar uns pelos outros para depois iniciarem em conjunto a longa caminhada que os esperava até às longínquas relvas do Queiroal, da Burrinha ou da Água Branca. Ali o ar era puro, fresco e exalava um cheiro a poejo e a erva-néveda. Além disso, as que iam mais aliviados do peso dos cestos e cabazes podiam apreciar uma vista deslumbrante. A poente vislumbrava-se a ampla fajã, delimitada pela Rocha e pelo oceano. Ao longe, a enorme planície da Fajãzinha, com um alcantil sobranceiro, donde irrompiam cascatas de um esbranquiçado flavescente que, ora se perdiam entre o arvoredo, ora se salientavam nos socalcos das ravinas. Lá longe o casario disperso, a perder-se entre os cerrados de milho e os prados verdejantes. Depois a floresta de um verde escurecido onde se escondiam as poucas casitas da Cuada. Finalmente, mais ao perto, a Fajã, com as casinhas aninhadas junto à igreja e protegidas pelo Pico da Vigia e pelo Outeiro. Cercando o enorme semicírculo, o oceano, azul, infinito e cada vez mais inclinado, onde calmo e ronceiro navegava um enorme e esbranquiçado paquete que se encaminhava-se na direcção do Monchique e da Rocha da Ponta.

Pouco depois a coluna começava a deslizar sobre alfombra fresca e perfumada das relvas, tornando a caminhada mais suave e menos perigosa do que a da Rocha. As casas da Fajã e o Oceano haviam-se perdido de vista. Agora só o verde silencioso e fresco do Mato. Ao fundo o Queiroal povoado de relvas, separadas por tapumes de hortênsias multicolores. Mais aquém, a Ribeira das Casas, na sua infância, com o seu enorme, temível e fundíssimo Caldeirão e, mais ao perto ainda, o Calhau do Touro, que nos dias de vento forte emitia aulidos semelhantes aos dos bovinos, razão porque granjeara aquele nome estranho e esquisito.

Com o  Sol já quase a pique o pelotão atingia o tão almejado portal que dava da relva do Bacelar para a do Fragoso, onde se situava “o curral” das ovelhas. Separava-as uma enorme cancela, feita de paus de cedro, pregados uns nos outros, em rendilhado pouco simétrico, que rodava sobre ganchos de madeira encravados numa grossa parede e fechava-se do lado oposto com uma enorme e desconexa cravelha. Logo a seguir o “curral”, um fosso rectangular, cavado num canto da relva. Num dos extremos tinha um portal de pedra, que alguém já destapara. Precedia-o um enorme átrio, também cavado na relva e que se ia afunilando até desembocar no Curral.

Ao chegar junto do “curral” das ovelhas, as mulheres poisavam os cestos e os cabazes sobre a relva demarcando o território necessário à colocação de utensílios e gado. As mais lestas corriam para apanhar as áreas melhores e mais próximas do “curral”, enquanto as outras escolhiam os sítios mais abrigados. A relva perdia o verde e transformava-se num tapete multicolor, salpicado de pessoas, de toalhas, de cestos e de cabazes.

Os grupos de homens que haviam caminhado de manhã, regressavam agora juntos, com o gado, enquanto outros formavam uma espécie de cordão com o fim de impedir a fuga dos ovinos. Uma enorme algazarra, misturada com o latir dos cães, começava a ouvir-se. Os grupos haviam-se juntado, no cimo da ladeira da Burrinha e conduziam um enorme rebanho do Rochão do Junco ao Rochão Tamujo, onde ficava o “curral”. De repente, este enchia-se e transformava-se num espesso e denso manto negro e branco. Um dos cabeças fechava o portal e dava ordens para que todos saíssem.

Os homens esfomeados, a arfar cansaço e com as roupas encharcadas de suor e humidade procuravam familiares e comida. Todas as famílias se sentavam ao redor dos cestos petiscando as diversas vitualhas que até ali tinham sido transportadas.

Depois de retemperadas as forças com a primeira refeição, homens, mulheres e crianças chegavam-se para a orla do “curral”.  Uma vez dada a autorização, cada qual entrava no “curral” e procurava os animais que tinham assinalado nas orelhas o sinal denunciador de lhes pertencer: “Na direita, forcada e troncha com três mossas. Na esquerda, troncha fendida com mossa”.

É que cada família da freguesia, possuidora de ovelhas bravas no baldio, tinha, por tradição hereditária, um sinal constituído por um conjunto de marcas diversificadas nas orelhas dos animais, que os identificavam como sua pertença. Assim os homens e os rapazes desciam ao curral e procuravam o seu sinal nas orelhas de quantos ovinos lhes passavam pelas mãos, até encontrar os que lhes pertenciam. Depois, amarravam-lhes pés e mãos e entregavam-nos a um familiar que os ia, sucessivamente, aconchegando, no sítio que inicialmente demarcara, enquanto o curral se ia esvaziando lentamente. Por fim ficavam apenas os cordeirinhos e uma pequena quantidade de carneiros e ovelhas, que haviam escapado às recolhas anteriores.

Em seguida, os homens, regressando aos seus locais, munidos de tesouras bem amoladas, iniciavam a tosquia, enquanto as mulheres enchiam a lã em cestos e sacos.

Uma vez tosquiada, cada ovelha era testada: se não desse leite, libertava-se na direcção do baldio, caso contrário era sinal de que tinha cria a qual, muito provavelmente, estaria no “curral”. Era necessário procurá-la e só a mãe a poderia identificar. Por isso os donos amarravam aos pescoços das presumíveis progenitoras lenços ou panos de cores diversas, atiravam-nas de novo para “o curral”e colocavam os mais pequenos à espreita. O vigia nunca podia perder de vista a sua ovelha a fim de identificar a cria logo que mamasse na mãe. O dono saltava para o curral e apanhava ovelha e cria, desenhando, nas orelhas desta, as marcas que a identificariam como sua pertença. No próximo Fio, já feita carneiro ou ovelha, seria facilmente identificado pelo proprietário.

Por vezes era necessário a intervenção dos cabeças para julgar os batoteiros que se apoderavam de crias que não lhes mamavam nas ovelhas, negando-lhes, assim, o direito às que de facto não lhes pertenciam.

Tosquiadas todas as ovelhas, e despejado o curral, homens e mulheres voltavam a sentar-se na relva amachucada por pessoas e gado para novo repasto. Depois, carregando sacos e cestos de lã e um ou outro carneiro para abate, iniciavam o regresso a casa, calcorreando atalhos e veredas, até ao cimo da rocha. Finalmente a descida do famigerado alcantil, enquanto o Sol amarelecido e avermelhado se ia escondendo no horizonte até o dia escurecer por completo.

Dento em breve chegariam as noites longas de Inverno e os serões, durante os quais se cardava e fiava a lã. Enquanto os homens batiam a sueca, algumas mulheres, puxando as cardas, transformavam a lã em fofas pastas, enquanto outras, rodopiando o fuso com destreza, transformavam as pastas em fios que, depois de dobados, ou entravam na urdideira e mais tarde no tear para se tecerem mantas e cobertores ou eram tricotados por mãos mágicas transformando-se em casacos, sueras e peúgas.

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publicado por picodavigia2 às 19:07

FRANGO

Quinta-feira, 06.06.13

Muito tenrinha, muito branquinha, muito apetitosa e de sabor muito agradável, a carne de frango, contrariamente à de peru, também me é absoluta e radicalmente interdita, por culpa da insuficiência renal de que sou vítima. E eu… com a churrasqueira aqui bem perto! Aliás a carne de frango parece começar a ser parcialmente evitada, ou pelo menos a ser ingerida com moderação. É que as chamadas carnes brancas, apesar de consideradas uma fonte de ómega 3 e ómega 6 e de ácidos graxos, o seu consumo começa a ser apontado a como algo, potencialmente, perigoso para a saúde humana, mais ainda se tratando da carne do frango de aviário.

É a crença no uso de promotores de crescimento, que ganhou força, sendo recorrentes os alertas sobre os "frangos de aviário, cheios de hormônios", como um potencial perigo para a saúde humana. Cuida-se no entanto que os produtos que detêm tais substâncias nem são empregados, directamente, na avicultura, mas antes se recorre à utilização de compostos promotores de crescimento produzidos pela indústria farmacêutica mas o seu uso também é prejudicial ao nosso organismo, estando os mesmos proibidos em muitos países da Europa, uma vez que eles também podem contribuir para a resistência das bactérias aos antibióticos, tornando os remédios desse tipo ineficazes para doenças humanas.

A carne de frango faz parte da alimentação humana, nos mais variados quadrantes, em muitos países do mundo. É servida de variadíssimas formas, com sabores variados. Entre elas, a canja que se dá às crianças, aos convalescentes ou a alguém que pretenda uma refeição ligeira e nutritiva, considerada uma espécie de medicamento ou lenitivo Mas não o é, a não ser que se recorra, nestes casos, para fazer a canja, à criação de aves caseiras. Mas mesmo neste caso, a canja, como substituta da sopa, é nutritivamente insuficiente, porquanto não contém nem vegetais nem legumes, pese embora seja reconfortante, especialmente nos dias mais frios de inverno.

A opinião do nutricionista é, incontestavelmente, necessária para compreendermos as potencialidades e os aspectos menos positivos de um determinado produto alimentar que incluímos no nosso cardápio.

Independentemente da maneira como é confeccionada a carne de frango quando a utilizamos na nossa alimentação: cozida, assada ou grelhada (sendo de evitar os fritos, como é evidente), faz parte da nossa vida e nela encontramos, realmente, uma enorme variedade de vitaminas. A carne de frango também é rica em vitamina PP, que é indispensável no sistema respiratório e na dilatação de vasos sanguíneos. A sua carência conduz à fraqueza muscular, à anorexia, a lesões na pele.

As virtualidades da carne do frango, afinal, são extremamente positivas e, indiscutivelmente, o consumo da sua carne potencia a saúde e, além disso, constitui um prato bastante económico e de fácil confecção. Apenas aos doentes portadores de insuficiência renal está interdito o prazer de dar uma trinca que seja num saboroso panadinho de peito de frango, sobretudo se regado com sumo de limão! E que dizer dum peitinho de frango grelhado ou duma coxa cozida ou até do simples sabor do molho do frango de cabidela?! Hum! Tudo isto, porém, me é interdito!

 

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publicado por picodavigia2 às 18:33

OS SANTINHOS DA MINHA AVÓ

Quinta-feira, 06.06.13

Possuía minha avó, em cima da cómoda da sala, um pequeno oratório, onde guardava, com grande estima e acentuada meticulosidade, os três santos da sua heteróclita e pouco canónica devoção: São Pedro, São João e Santa Rita.

Os santinhos passavam ali dias e noites, isolados de tudo e de todos. Apenas minha avó, quando as agruras e atrocidades da vida o exigiam, recorria à sua protecção suplicando as graças e os favores de que necessitava e, em caso de atendimento, acendendo uma luzinha que ali permanecia três, quatro, cinco ou mais dias, conforme a importância do favor alcançado.

Se não chovia durante quinze dias, lá estava ela diante de oratório, pedindo chuva a São João. No dia seguinte chovia e o precursor messiânico tinha garantida luzinha durante três dias, pese embora o mefítico cheiro a petróleo, exalado pela sala e que provocava grande contestação por parte dos tios que, dada a exígua pequenez da casa, lá dormiam.

Se o tio Onofre ia às Lajes e se demorava, lá estava ela a suplicar a Santa Rita que o trouxesse são e salvo. O tio regressava, luzinha acesa quatro dias. Se a Mimosa negava o leite, era para o São Pedro que se voltava, a fim de que o porteiro celestial alterasse o úbere da vaca. No dia seguinte, chegavam as latas cheias de leite e o santo tinha luzinha garantida uma semana. Às vezes, para assegurar de forma mais eficiente a obtenção do milagre pretendido, recorria simultaneamente a dois ou até, em casos extremos, aos três santos. Foi o que aconteceu quando o tio Justino foi para a tropa, para S. Miguel e, passados dois anos, regressou gordo e anafado que nem um chino. Os três santos tiveram a luzinha acesa durante três meses.

A fama milagrosa e a popularidade dos três santos era tanta e tal que muitas vezes, não só as vizinhas como até as amigas de mais longe vinham pedir-lhe que recorresse à sua protecção e, no caso de serem atendidas nas suas necessidades ou maleitas, eram elas que pagavam o petróleo que a luzinha consumia durante os dias que duravam as promessas. A casa da minha avó transformava-se, assim, por vezes, num autêntico pequeno santuário. Pela freguesia corria um falatório desusado. Não havia maleita, infortúnio ou desgraça cuja vítima não procurasse os “Santinhos da tia Jarónima Batelameira.”

Eu, na minha inocência de criança, admirava-me com tal taumaturgo poder e entendia que os santinhos não eram devidamente recompensados. Na igreja, sob as ordens de Padre Silvestre, as gigantescas imagens de São José, da Senhora da Saúde, de Santa Teresinha e até do Coração de Jesus não faziam, que se soubesse, nem de longe nem de perto, milagres comparáveis aos daqueles três santos carracenos. Apesar disso, eram dolares a cair sobre os altares, eram velas, missas votivas, sermões, novenas e procissões, durante as quais eram levados em ombros, pelas ruas da freguesia. A Senhora da Saúde era a mais festejada. Tinha direito a uma grande festa, com foguetes, quermesse, bandeiras, à qual até vinha, juntamente com romeiros de toda a ilha, a filarmónica da Fajãzinha. Os da minha avó era um chorrilho quotidiano de milagres e nada mais do que a luzinha!…

Comecei, então, a arquitectar a forma mais correcta de ressarcir os três santinhos de tão grande injustiça. É que sentia no meu íntimo que, assim como entre as pessoas, também entre os santos havia desigualdades entre grandes e pequenos. Se os santos grandes, mas menos taumaturgos do que os pequenos, tinham direito a festas, missas e procissões, porque razão os pequenos não deveriam ter esse mesmo direito?

Certo dia minha avó saiu de casa juntamente com as tias, para apanhar o milho das Furnas. O cerrado era grande e a tarefa demoraria toda a manhã. Em casa fiquei eu, meus irmãos mais novos e os primos da Via d’Água. Na minha qualidade de decano da pequenada, fora-me recomendada a guarda de todos. Estavam criadas, pois, as condições ideais para repor a justiça. Iríamos fazer uma grande festa, com uma procissão que não desdenhasse em nada das que padre Silvestre fazia à Senhora da Saúde e a São José. Organizei tudo. Os paramentos e as opas foram feitos de toalhas e soeras velhas. A cruz foi construída com dois paus tirados do cepo da lenha. Fazer os andores foi a tarefa mais difícil. Obtive-os da transformação de três caixas de fósforos, devidamente furadas e nas quais meti dois pauzinhos de cada lado. Tudo muito bem preparado e cuidado como a grandiosidade da cerimónia exigia. O vidro do oratório estava pregado. Enfiei-lhe uma faca de cozinha. Os pregos presos na madeira carcomida saíram facilmente e os santinhos, que nunca tinham gozado, que se soubesse, tal privilégio, vieram, sem dificuldade, cá para fora, sendo colocados nos andores que a Graça e a Juliana haviam enfeitado com pétalas vermelhas, amarelas e brancas. Estavam prontos a caminhar.

De seguida organizámos a procissão. À frente, meu irmão mais novo com a cruz, feita de dois garranchos tirados do cepo da lenha. Depois o Luís, o Carlos e a Juliana, cada um com o seu andor, todos de soeras e casacos vermelhos a fazer de opas. A seguir eu com duas toalhas presas com alfinetes, enfiadas no pescoço, a simular uma casula amarela, igual à que padre Silvestre vestia em dias de festa. Atrás a Graça com uma vela na mão. Todos cantavam, na maior das devoções, prestando aos três santos a homenagem devida e o agradecimento por todas as graças concedidas à nossa avó.

De repente, abre-se a porta da cozinha com grande estrondo. Era a tia Hermínia que tinha vindo a casa buscar uns sacos esquecidos.

Todos nos assustámos terrivelmente. Uns fugiram para debaixo das as escadas do saguão e outros esconderam-se debaixo das camas, enquanto os pobres dos santos, porque soltos em cima dos andores, rolaram pelo chão. O São Pedro partiu a cabeça e o braço que mantinha erguido mostrando ostensivamente a chave do céu. Santa Rita partiu-se ao meio e São João, o menos acidentado, partiu a peanha e perdeu o aro.

 A tia Hermínia acorreu espavorida. Levava as mãos à cabeça e gritava como se grande desgraça tivesse acontecido:

  -Ah! Grandes patifes! Vocês sabem o que fizeram!? Estamos desgraçados! A avó o que vai dizer? Deram-lhe cabo dos santos!

 Eu nem a ouvia. Na minha qualidade de responsável mor por tal hierática hecatombe, permanecia estarrecido e a chorar, enquanto os outros, aparecendo dos seus esconderijos e apontando para mim, juravam em coro:

 -  Foi ele! Foi ele! Ele é que abriu o oratório.

Apesar de partidos, virei-me para os santos com enorme convicção. Lembrei-me dos vinte centavos que minha mãe me dava para gastar na quermesse da Senhora da Saúde e, decididamente, prometi:

 - Meus santinhos! Se mesmo partidos, fizerdes o milagre da avó não me ralhar e me livrardes duma grande tareia, vou comprar petróleo com o dinheiro da festa da Senhora da Saúde e acender-vos a luzinha.

A verdade é que minha avó, quando chegou, nem fez grande alarido. Talvez porque compreendesse a minha intenção de agradecer aos santos, talvez porque compreendesse a nossa inocência, decidiu-se por colá-los. E não querem ver que mesmo colados os santinhos continuaram a fazer milagres e o primeiro milagre foi o meu, pois livrei-me da tareia a que merecia.

E os santos tiveram luzinha acesa durante três dias.

  

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publicado por picodavigia2 às 15:10

PICO DA VIGIA

Quinta-feira, 06.06.13

Eu olhava a Fajã, ao fundo, distanciando-se aos poucos, numa perspectiva que nunca me tinha sido dada observar e que, agora, me permitia imaginar e configurar formas diversificadas e simbólicas. As casas brancas, agrupadas e enleadas, faziam-me lembrar as pérolas de um enorme colar, suspensas entre dois grandes, pétreos e turgescentes peitos: o Pico da Vigia e o Outeiro, ou, então, numa visão mais integradora, a Ponta dos Pargos surgia-me como a proa negra dum grande navio, com o seu convés povoado de casotas e torres, onde se destacavam as da Igreja e da casa do Chileno e lembrava-me dos rigores do Inverno, quando o velho Carvalho Araújo ancorava mesmo ali, totalmente impedido de o fazer em qualquer outro ponto da ilha, devido aos fortes ventos de Oeste.

 

Na Fajã Grande “… subir a Rua Direita (Rua Senador André de Freitas), a principal da Fajã Grande, até à última casa da Freguesia, antes da qual se deve entrar num carreiro à direita. Na colina, à direita, há um poste de luz: logo depois de se alinhar com ele, ha uma canadinha entre paredes, do mesmo lado, estreita mas muito bem traçada, conduz à vigia. Quem prosseguisse em frente pelo carreiro iria ter à Fajãzinha. O primeiro troço da subida ao Pico da Vigia é uma escada em pedra muito íngreme, mas após duas ou três voltas já aparece a meta, uma cabina empoleirada em cima de um rochedo, que se projecta sobre o mar. A segunda parte da vereda, porém, é muito menos empinada.

Uma vez ao pé da vigia, para gozar o estupendo panorama, realmente «sem palavras», pode-se subir à placa do tecto, do lado direito da cabina. O caminho está sempre mondado e transitável (…)

 Para além do porto e área de lazer adjacente, a freguesia da Fajã Grande (ilha das Flores, Açores) apresenta alguns locais de interesse, nomeadamente:

•    Igreja paroquial de São José, edificada em 1868, com sua génese uma primitiva capela com a mesma invocação, erigida em 1755. Este templo possui dois altares no encontro do arco que separa a restante parte do edifício;

•    Pico Vigia da baleia, uma cabina empoleirada em cima de um rochedo que se projecta sobre o mar, da qual se goza um estupendo panorama. Em tempos serviu a indústria baleeira, assinalando a presença de chachalotes na zona e coordenando a caça pelos botes baleeiros baseados no porto da freguesia;

•    Capela de Santo António, no atalho que conduz à Cuada;

•    Casa do Espírito Santo da Cuada, datada de 1841 e teatro da festa homónima no dia de Pentecostes.”

 

In “Guia turístico da Fajã Grande das Flores”

 

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publicado por picodavigia2 às 14:52

CONSERVAS EM AZEITE OU ÓLEO

Quinta-feira, 06.06.13

Os médicos e os nutricionistas alertam os portadores de insuficiência renal, a fim de evitarem, em absoluto, o consumo das agradáveis e apetitosas conservas, tradicionalmente, guardadas dentro de latas, em azeite ou óleo, assim como o uso de sal em excesso

A época do Verão é uma altura em que as pessoas em geral, e os portadores de insuficiência renal não fogem à regra, têm mais tendência para os excessos pantagruélicos, pautando, geralmente, a sua alimentação por uma espécie de desequilíbrio institucionalizado, resultante das idas à praia, passeios pelo campo ou pela beira-mar, quer abusando do consumo de mariscos e churrascos, compostos por carne ou peixe, mas repletos de sal, quer optando por refeições mais ligeiras, onde imperam a conserva e os enlatados. Além disso, nestas refeições rareiam os legumes, e nas sobremesas que se lhes seguem, imperam os gelados, em prol da fruta.

Neste contexto é imperioso alertar os doentes com insuficiência renal crónica para a necessidade de terem cuidados especiais com este tipo de alimentação, devendo mesmo bani-lo por completo, dos seus cardápios diários.

Sabe-se que um maior consumo de sal pode prejudicar a saúde do sistema cardiovascular, aumentar a tensão arterial e, consequentemente, afectar os rins e, por isso, a escolha da dieta deve ser sempre feita de uma forma individualizada. A perda da funcionalidade dos rins faz, também, com que o potássio se acumule no sangue e, quando os níveis deste ficam muito altos, o doente pode sentir debilidade muscular, tremores e fadiga, podendo, até, correr risco de vida. Daí necessidade de uma alimentação saudável e regrada, onde não entre a apetecível e saborosa conserva em azeite ou óleo, mesmo se originária dos mares açorianos ou confeccionada em quer terras amarantinas e do interior quer nas fábricas da beira-mar continental.

Contrariamente a conserva ao natural, apesar de menos gostosa, é aconselhável, porquanto o peixe, nela contido, mantém as características do produto alimentar fresco que a originou, que foi esterilizado e metido em latas ou frascos devidamente esterilizadas, conservada na sua própria água e fechado, na lata, de modo hermético e com validade inscrita de vários anos.

Aconselha-se pois, aos doentes portadores de insuficiência renal a abstenção de todo o tipo de conservas em óleo ou azeite, embora muito saborosas e apetitosas, e a sua substituição por conserva natural, hoje disponível em todos os supermercados, na região do Vale do Sousa, incluindo Paredes e, sobretudo, Amarante, onde abundam conservas disfarçadas em doces compotas de frutas variadas.

 

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publicado por picodavigia2 às 13:49

ENTRE AS FLORES E O FAIAL

Quinta-feira, 06.06.13

Já era noite escura quando o Carvalho levantou ferro da baía das Lajes com destino ao Faial, onde deveria chegar na manhã seguinte. Conformado com a minha situação de desacomodado, dirigi-me à amarra do convés e entretive-me a ver as manobras que os guindastes e roldanas da proa executavam a fim de levantarem do fundo do mar a pesada âncora que prendera o Carvalho em frente à vila, durante várias horas. Alguns marinheiros já tinham levantado a escada e fechado o portaló, trancando-o com duas grossas cavilhas de ferro. O navio, sentindo-se liberto da pesada poita, deu duas guinadas à retaguarda, apitou por três vezes, orientou-se rumo à saída da baia e zarpou em marcha lenta, em direcção ao Faial, deixando atrás de si, juntamente com o roncar estridente dos motores, uma enorme esteira de espuma esbranquiçada.

Passei a noite num vai e vem apreensivo e temerário entre a primeira e a segunda, ora subindo escadas ou penetrando em corredores ora entrando nas salas que ainda permaneciam abertas, para sair logo a seguir. De vez em quando subia ao convés da primeira a ver se descortinava uma espreguiçadeira desocupada. De seguida voltava à amarra para ver mais uma vez a ilha das Flores, agora já muito longe e de tal maneira confundida com o negrume da noite que quase não se via, apesar de estar perfeitamente assinalada pelos dois enormes e potentes faróis: a Sul o das Lajes e a Norte o do Albarnaz. Eu pensava então em meu pai, que aquela hora estaria a atravessar a ilha a pé, sozinho, sem luz, no meio de toda aquela escuridão. Possivelmente ainda estaria muito longe de casa. Olhava para o relógio e contava as horas desde que ele tinha partido das Lajes. Três horas de viagem, permitiam-me concluir que já teria chegado aos Terreiros. Mais uma hora e meia e estaria em casa. Depois imaginava minha irmã a levantar-se quando ele chegasse, alta madrugada, para lhe fazer café. Decerto iria dormir muito pouco, talvez mesmo, preocupado comigo, nem chegasse a pregar olho. Além disso, como habitualmente, pela manhã teria que se levantar muito cedo, para ir à lagoa das Covas ceifar um molho de erva e trazê-lo às costas até ao palheiro onde as vacas permaneciam fechadas até à hora em que as soltassem para os pastos.

Voltei a olhar a escuridão da noite onde já muito ao longe e muito tenuemente brilhavam os dois faróis. Dizia-se que havia um sítio a meio do canal entre as Flores e o Faial donde, em noites muito limpas e bem escuras, se viam ao mesmo tempo os faróis de ambas as ilhas. Mas aquela noite, apesar de muito escura, estava bastante enevoada.

Passaram-se mais algumas horas e começaram a vagar cadeiras no convés da primeira. Ocupei uma, mas não conseguia dormir. O navio, no silêncio escuro da noite, enquanto a maioria dos passageiros e tripulantes dormia, com as luzes quase todas apagadas, continuava o seu marear com solavancos rítmicos, cada vez maiores, acompanhados pelo som roufenho das máquinas. Os faróis das Flores há muito que haviam desaparecido por completo. Agora, possivelmente, já estaríamos mais perto do Faial. Eu aguardava expectante a aproximação da ilha, na esperança de conseguir vislumbrar, de longe, o vulcão dos Capelinhos.

É verdade que o vulcão havia rebentado quase há um ano. No entanto quem por ali passava a bordo do Carvalho afirmava que ainda se via perfeitamente uma coluna de fogo. Tinha sido no final do mês de Setembro, do ano anterior que tudo começara. Entre os dias dezasseis e vinte sete de Setembro registara-se uma crise sísmica no Faial e no Pico, como há muito se não vira e que culminara com o rebentar de um vulcão, no final do mês, na parte norte da ilha do Faial. Uma enorme coluna de fogo emergira do seio da terra, espalhando uma chuva de cinzas sobre grande parte da ilha. Os abalos sísmicos foram prosseguindo e a coluna de fogo manteve-se bem viva e ameaçadora durante longos meses. Agora, no entanto, já não tinha nem a pujança nem a força inicial. Mas no início da crise, a lava emersa da terra era tanta e tão forte que até nas Flores, imune a todo o tipo de actividades sísmicas, ter-se-ia visto, por vezes, o céu mais enevoado e mais escuro devido às cinzas e aos fumos libertados pelo vulcão.

Agora era-me dada a oportunidade única de observar aquele fenómeno telúrico, embora já na sua fase decrescente, mas do qual tinha um medo terrível. Levantei-me ocupando um lugar estratégico a bombordo, na amarra do convés. Muitos passageiros já ali estavam com os mesmos intuitos. Passado algum tempo foi possível observar, lá ao longe, uma pequena e trémula coluna de fogo que saía da terra em espiral e se ia enrolando pelo céu acima até se perder no horizonte e na escuridão que de momento para momento começava a clarificar-se.

Voltei à espreguiçadeira e pouco depois adormeci. Quando acordei já era dia claro. O navio, muito lentamente, rodava a ponta da doca do Faial.

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publicado por picodavigia2 às 10:14

BOLO-REi

Quinta-feira, 06.06.13

O Bolo-rei é um bolo típico português que se come tradicionalmente entre o Natal e o Dia de Reis e, por vezes, nessa altura do ano, nos é oferecido ou trocado como prenda por parentes, vizinhos e amigos. No entanto, actualmente, a maioria das confeitarias e casas da especialidade disponibilizam-no, praticamente, durante todo o ano.

De forma circular, com buraco redondo no centro, tipo rosquilha açoriana, o bolo-rei é feito de uma massa branca e fofa, também algo parecida com a massa sovada das ilhas, misturada com passas, frutos secos e frutas cristalizadas. Tradicionalmente, no seu interior encontram-se também, por altura do Natal, uma fava seca e um pequeno brinde, este, normalmente feito de metal. Cuida o povo, na sua ingénua e simples sabedoria, que fava concede, a quem a recebe numa fatia, o dever de pagar o próximo bolo-rei, enquanto o brinde dá sorte a quem o encontra. Consta que havia ainda quem, antigamente, colocasse no interior do bolo-rei pequenas adivinhas, cuja recompensa, para quem as decifrasse, seria meia libra de ouro, como forma de presentear a quem se oferecia o bolo.

A origem do bolo-rei remonta, ao que se sabe, ao tempo dos romanos. Estes tinham por hábito eleger o rei da festa durante os seus lautos banquetes festivos e bacanais, servindo-se de uma fava para o sorteio, pelo que o comensal escolhido era também designado, por vezes, por “rei da fava”. A Igreja Católica aproveitou o facto de aquele costume romano ser característica do mês de Dezembro e decidiu relacioná-lo com a Natividade de Jesus e com a Epifania, ou seja, com os dias 25 de Dezembro e 6 de Janeiro. Assim se criou e manteve o costume de comer aquele bolo durante estes dias. A influência da Igreja Católica na Idade Média, ainda determinou que a Epifania fosse designada por “Dia de Reis” e como que fosse simbolizada por uma fava introduzida dentro de um bolo.

Em Portugal, com a proclamação da República, em 5 de Outubro de 1910, a existência do bolo-rei foi posta em risco por causa do nome conter a palavra "rei". De acordo com a lógica republicana vigente, deixando o rei de existir na hierarquia nacional, também o bolo tinha que desaparecer ou, no mínimo, ter outro nome. Os confeiteiros nacionais, partindo, mais uma vez, do princípio de que negócio é negócio e política é política, continuaram a fabricar o bolo sob a simples designação de "bolo de Natal".

Os doentes com Insuficiência Renal Crónica ou em tratamento de substituição devem ter especial atenção quando consomem este bolo ou até abster-se, totalmente, da sua degustação, dado que ele possui uma boa quantidade de frutos secos que são muito ricos em fósforo e também passas que se caracterizam por concentrarem grandes quantidades de potássio, para além das frutas cristalizadas muito ricas em açúcar. Por isso há que abdicar radicalmente e absolutamente mesmo que seja de uma pequenina das saborosíssimas fatias de bolo-rei, incluindo o bolo escangalhado. É que na realidade, para os doentes portadores de insuficiência renal, entres os quais eu me incluo, as únicas partes do bolo-rei de que podem usufruir são a fava e o brinde! Mas, desgraçadamente, até já estas, começam a rarear, nos bolos-reis actuais.

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publicado por picodavigia2 às 09:50





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