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A ÁGUIA E A CORUJA

Quarta-feira, 25.09.13

Uma coruja encontrou uma águia e disse-lhe:

-Ó águia, se vires uns passarinhos muito lindos, num ninho, com uns biquinhos muito bem feitos, olha lá não os comas que são os meus filhos.

A águia prometeu que os não comia; foi voando e encontrou numa árvore um ninho de coruja, e comeu as corujinhas. Quando a coruja chegou e viu que lhe tinham comido os filhos, foi ter com águia, muito aflita.

- Ó águia, tu foste falsa, prometeste que não me comias os meus filhinhos e mataste-os todos.

Respondeu a águia:

- Eu encontrei umas corujas pequenas, num ninho, todas depenadas, sem bico e com os olhos tapados, e comi-as todas; e como tu me disseste que os teus filhos eram muito lindos e tinham o biquinho bem feito, entendi que esses não eram os teus.

- Pois eram esses mesmos – disse a coruja.

- Pois então queixa-te de ti – tornou-lhe a águia – que me enganaste com a tua cegueira.

 

Conto popular, extraído do antigo livro de leitura da 4ª classe.

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publicado por picodavigia2 às 20:20

DUAS LUAS

Quarta-feira, 25.09.13

(TEXTO DE ANTÓNIO TORRADO)

 

O senhor Túlio foi ao Brasil de avião. Ele que nunca tinha saído lá da sua aldeia, aventurar-se a uma viagem tamanha era de espantar. Mas o senhor Túlio tinha uma filha no Rio de Janeiro, filha essa que lhe dera uma neta, neta essa que ia a baptizar, baptizado esse a que o senhor Túlio nem por nada podia faltar.

Na grande cidade do Rio de Janeiro, tudo o espantou: o tamanho dos prédios, a largueza das avenidas, a extensão das praias, a bicheza de gente.

– É tudo maior do que na minha terra – dizia ele, constantemente. – Até a Lua daqui é mais grada do que a nossa.

1A filha indignava-se:

– Ó pai, não ande sempre de boca aberta que parece mal e, por favor, não diga que esta Lua é maior do que a lá da aldeia, porque a Lua é só uma.

O senhor Túlio engolia e calava-se, mas, à cautela, pôs-se a medir aos palmos, de longe, a Lua Cheia sobre o Pão de Açúcar. "Um palmo bem medido", memorizou ele.

Quando, com muita pena, teve de voltar para Portugal e regressou à aldeia, não se esqueceu do que matutara. Numa noite de Lua bem redonda, estendeu a palma da mão para o céu e mediu:

– Um palmo e nem mais um niquito.

Ficou-se a pensar e concluiu:

– Ai que tu engordaste, magana, enquanto eu andei lá por fora!

 

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publicado por picodavigia2 às 15:42

A MONTANHA COBRIU-SE DE NUVENS

Quarta-feira, 25.09.13

Álvaro impulsionado pelo assombro de uma estranha crença, levantou-se de rompante e assomou à janela, há muito aberta e por onde, filtrados por uma leve cortina de tule esbranquiçado, entravam refulgentes, os primeiros raios matinais. O espectáculo que se apresentava era deslumbrante, maravilhoso e soberbo: totalmente descoberta, a montanha ostentava-se na sua beleza pura, original e genuína. O Pico retratado ali, na grandiosidade da sua montanha, era assim, belo, imponente, altivo e dominador. Álvaro conhecia por demais todas as outras ilhas. O que nelas, banhado por uma verde maresia, era beleza, simplicidade e doçura, no Pico, embrenhado na imponência e altivez daquela montanha, era um silêncio escuro mas deslumbrante e agreste, uma braveza destemida e contumaz, uma imponência rude e descomunal, uma escaleira de lava basáltica a tentar unir a terra ao céu.

Álvaro retirou-se por uns momentos como que a espicaçar uma sonolência de que ainda se não havia libertado por completo. Mas não se conteve e voltou à janela, atraído pela sublimidade do espectáculo que acabara de presenciar. A montanha continuava, ali, à sua frente, escancarada e nua, agora já aureolada com o dourado da claridade nascente, cada vez mais deslumbrante, mais emotiva e mais atraente. Com o Sol lá ao fundo, a impor-lhe um cerco de transparência, a aureolar-lhe o negro basáltico da lava, parecia que lhe escorriam, pelas encostas laminadas, refluxos de uma luz acariciadora e aconchegante.

Ali ficou mais uns momentos a cuidar que, dentro de momentos havia de agarrar-se aquela montanha, embrenhar-se nela como se fosse um rolo de neve, de a galgar até ao cume. É verdade que a subida do Pico armazenava relatos contraditórios, mas todos eram unânimes: a escalada consubstanciava-se sempre numa inesquecível noite, bem lá no alto, entre pedregulhos e fumarolas, com a Lua a impor-se teimosamente nos céus e a iluminar uma estranha e metafórica paisagem, espelhada num mar prateado quase infinito a prolongar-se até ao horizonte. Lá no alto, quase a beijar o céu, o silêncio sufocava os murmúrios e o sibilar acutilante do vento agreste salpicava desejos imperceptíveis. Depois era o florescer da madrugada, a apagar o rumo das estrelas e agigantar ainda mais a infinidade do oceano, agora ensopado com as manchas luxuriantes das ilhas que, lá em baixo se erguiam ao redor, como se fossem pérolas de um colar: o Faial aqui tão perto, mais além a Terceira, São Jorge do outro lado e, lá ao fundo, a Graciosa.

Álvaro, finalmente, despertou por completo, mas, quando de novo regressou à janela, a montanha, estranha e inexplicavelmente, era um enorme chumaço de neveiro acinzentado A montanha havia-se coberto de um denso manto que obstruía sonhos e obliterava desejos.

Ainda não seria naquela manhã que havia de escalar aquele alcantil imponente, altivo e sublime que ali estava a sua frente, agora, emerso no mais denso e incompreensível véu de nebulosidade.

De mansinho, fechou a janela e voltou a deitar-se. Talvez amanhã estivesse melhor. No folheto turístico colocado em cima da mesa-de-cabeceira, pode ler: Pico, a segunda maior ilha dos Açores, com uma superfície de cerca 447 quilómetros quadrados, possui uma altíssima montanha, ao redor da qual proliferam campos carregados de vinha…

Pouco depois, voltou a adormecer, enquanto a montanha, lá ao longe, anulando desejos, se cobria com um véu de nuvens, cada vez mais denso e escuro.

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publicado por picodavigia2 às 15:21

A CACINA

Quarta-feira, 25.09.13

A “cacina” era, antigamente, um dos jogos de cartas mais populares na Fajã Grande. Devido à sua nomenclatura deduz-se facilmente que teria sido um jogo trazido da América por tantos fajãgrandenses que, clandestinamente, demandaram a terra do Tio Sam, muitos deles fugindo da ilha nas baleeiras que ali paravam, sobretudo nas baías e enseadas da costa oeste, junto à foz das ribeiras, a abastecerem-se de víveres ou, também, por tantos outros que emigraram na legalidade para aquele continente, sobretudo, para as bandas da Califórnia. Uns e outros geralmente regressavam e, juntamente com algumas águias, muitos “candys” e um ou dois baús com roupas vistosas, traziam muitos usos, costumes e vocábulos americanos.

O jogo da “cacina” tornou-se bastante popular por ser muito simples, de regras fáceis e por poder ser jogado apenas por dois ou também por quatro mas, neste caso, formando dois pares.

Jogava-se com todas as cartas do baralho. Cada jogador recebia, do dador, quatro cartas, sendo viradas outras tantas sobre a mesa de jogo, com a face voltada para cima. O jogador que não dava as cartas ou que se lhe seguia era o primeiro a jogar, podendo juntar qualquer carta igual à que tivesse na mão ou, com excepção das figuras, somar as da mesa e juntá-las com uma de mão com o total da soma, por exemplo, se estivesse um cinco e um dois na mesa o jogador podia juntar as duas cartas com um sete. Podia ainda empalhar, ou seja, se estivesse um cinco na mesa e o jogador tivesse na mão um três e um oito, podia jogar o três, empalhando-o sobre o cinco, para na jogada seguinte o juntar com o oito. Esta jogada, porém, era arriscada, dado que se o jogador adversário estivesse atento e se tivesse um oito na mão podia antecipar-se e juntar as cartas ou se tivesse um ás e um nove, podia jogar o ás sobre o oito, somando ao oito do cinco e três mais um e anunciar nove, recolhendo na jogada seguinte, todas as cartas com o nove que possuía. As últimas cartas eram recolhidas da mesa pelo último jogador a juntar um par.

Cada jogo valia onze pontos assim distribuídos: 3 pontos por maior número de cartas (mais de vinte e seis), 1 ponto por ter mais espadas (sete ou mais), 1 ponto por cada ás, 1 ponto pelo “lou” (dois de espadas) e 2 pontos pela “big cacina” (dez de oiros).Cada jogador que conseguisse deixar a mesa vazia fazia um “sweep” e, por isso ganhava um ponto extra.

Ganhava o jogo o jogador ou par que primeiro obtivesse trinta pontos, os quais, após cada partida, iam sendo marcados numa tabuinha com dois carreiros paralelos de trinta furos, através de dois pequenos pauzinhos. O jogador que numa jogada não pontuasse “ia à figueira”.

Minha avó era uma jogadora “viciada” no jogo da “cacina”. Jogava com grande habilidade, enorme competência e, sobretudo, com tal concentração que sabia todas as cartas que saíam bem como as que ainda estavam por sair, o que lhe permitia uma enorme vantagem sobre os adversários.

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publicado por picodavigia2 às 13:35





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