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DELIRANTE

Terça-feira, 01.10.13

MENU 10 – “DELIRANTE”

 

ENTRADA

Bolo de massa adocicada, recheado com chouriço e fiambre,

acamado sobre folha de alface.

 

 

PRATO

 

Risoto de salmão e legumes,

temperado com cremes de salmão e de queijo fresco.

 

 

SOBREMESA

 

Puré de maçã polvilhado com açúcar e canela

Gelatina de Pêssego.

 

******

 

Preparação da Entrada: Adquirir o bolo e colocá-lo, em prato, sobre uma folha de alface, devidamente temperada.

Preparação do Prato – Cozer o salmão em água temperada com azeite e ervas aromáticas. Cozer o arroz com a parte necessária, desta água. Refogar uma cebola, em pedacinhos, em azeite e juntar alho, finamente picado, e os legumes devidamente picados muito miudinhos (cenoura, feijão verde, repolho, pimentos, etc,). Misturar o arroz e de seguida o salmão desfeito. Misturar juntando os cremes.

Preparação das Sobremesas – Confecção tradicional.

 

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publicado por picodavigia2 às 23:55

O CANIVETE

Terça-feira, 01.10.13

A Eduarda era uma das moças mais bonitas da freguesia. Alta, forte, morena e trigueira, aliava aos dotes físicos uma bondade de modos que consubstanciava com uma doçura de costumes. Namorava o Luís e ansiava a maior idade, para que o pai autorizasse o namoro. Mas, apesar da oposição paternal, planeavam alguns encontros rápidos e fortuitos, ora entre as faias e os incensos do Espigão, quando ia aos inhames ao Lameiro, ora junto às altas paredes da relva da Lagoinha, quando para lá ia levar as vacas. Fora aí, numa aba mais escondida, que um dia, ela lhe pedira casamento.

- Casar como? - perguntava o Luís. - Não temos onde morar. Em minha casa, nem pensar! Com meus irmãos ainda solteiros e com o feitio de minha mãe!...

A Eduarda bem explicava que a sua casa era muito grande, que os pais não se importariam e que ele até faria um “jeitão” lá em casa.

- Meu pai já está velho e tu podias ajudá-lo. Talvez nos dê umas territas. Com uma vaquinha viveríamos à vontade.

Mas o Luís tudo contrariava:

- Com um feitio como o dele! Nem morto!...

Um dia, no Espigão, depois de mais um encontro amoroso, o Luís anunciou sem hesitação:

- Vou prá América!

- O quê!? - Perguntou perturbada a Eduarda, enquanto distraidamente tentava endireitar, com ambas as mãos, o amarrotado da saia.

- Está decidido… Vou para a América! Depois casamos por procuração e vais ter comigo. Isto aqui não é vida. Mato-me a trabalhar e não tenho nada. Acredita em mim: nesta terra não temos futuro!

Um silêncio sepulcral abateu-se sobre os dois e duas lágrimas rolaram dos olhos da Eduarda.

Passados alguns meses o Luís partia. A Eduarda ficava só, solitária e triste, recordando, em tardes chuvosas e cinzentas, os frugais encontros do Espigão e da Lagoinha.

Encontrei-a tantas vezes, descendo a ladeira de Espigão, carregando cestos de inhames ou molhos de incensos, olhos no chão, silenciosa e pensativa.

A nossa diferença de idades era muita. Eu uma criança, ela uma mulher feita. Nada tínhamos em comum que nos aproximasse.

Na América tudo corria bem ao Luís. O casamento apressou-se. Casariam por procuração, pesassem embora todas as contrariedades que tal forma de casamento acarretaria. Como o pai não queria aquele casamento, tinha que ser a Eduarda a ir às Lajes tratar da documentação necessária. Quem a acompanharia? Não tinha ninguém!...

E não é que veio solicitar a minha companhia, junto de minha irmã!

- Se fores comigo, quando chegar à América mando-te um canivete! – Prometeu, com convicção.

É verdade que não era necessário a promessa duma prenda. Acompanhar a Eduarda até às Lajes, durante um dia, atravessando a ilha de lés-a-lés era, por si só, uma nobre recompensa. Mas com um canivete à mistura... e dos de três ferros. Decididamente era o por de lado o recurso proibido à faca da cozinha, quer para aplainar os toscos bocados de madeira que teimavam em transformar-se em vaquinhas, quer para cortar e abrir as películas das canas com que faria clarinetes, requintas, trombones ou saxofones ou botes para a baleia. Ah! Com um canivete de três ferros todas estas tarefas seriam mais fáceis…

Nessa noite quase não dormi. Era a primeira vez que ia às Lajes. Dominava-me um enorme e transcendente sentimento de masculinidade, subjacente à ilimitada confiança que a Eduarda depositara em mim.

 Sentia-me, pela primeira vez, verdadeiramente um homenzinho.

A Eduarda, na véspera, avisara:

- Temos que sair de madrugada. Quero ver se chego às Lajes antes das dez. Tens que acordar muito cedo.

Levantei-me, vesti-me e partimos. As sombras enigmáticas da noite, ainda se não tinham dissipado e erguiam-se altivas e assustadoras a nosso lado. A Eduarda deu-me a mão, não tanto para que a protegesse, mas para que os meus passos de criança não se atrasassem em relação ao seu andar lesto e apressado. Ao passar pelo Vale Fundo, como a noite ainda persistisse e o medo me dominasse, agarrei-me mais a ela. Adivinhando o meu estranho sentimento, de imediato, maternal e instintivamente, pôs-me o braço por cima do ombro e aconchegou-me a si, permitindo-me, então, sentir o calor do seu corpo, o arfar ofegante do seu peito, a ternura envolvente da sua aproximação. E quando, para lá da Fajãzinha, ao iniciar a subida da rocha da Figueira, quer porque já clareasse, quer porque a íngreme estreiteza do caminho me obrigasse a ir à frente, ela se afastou de mim, senti uma infinita pena da noite ter acabado.

Em contrapartida, porém, ela falou-me de muitas coisas. Falou-me dos seus sonhos, falou-me da América e falou-me, sobretudo, do seu amor pelo Luís, por quem, confesso, comecei a sentir um odiozinho.

Ao subirmos a rocha da Figueira cruzámo-nos com os pastores da Fajãzinha, que regressavam do mato, carregando pesadas latas de leite, suspensas em paus, amparando-se e defendendo-se das agruras do caminho, com enormes bordões de araçá. Ao verem, ali, naquele ermo, a Eduarda, jovem, bela, elegante e indefesa, acompanhada apenas por um garoto de palmo e meio, olhavam-na com olhar lascivo e concupiscente. Um deles ainda sussurrou:

- São da Fajã. É a filha do Travanca! Para onde diabo vai a estas horas com aquele badameco?!

Indiferentes e lestos caminhávamos, subindo a íngreme rocha, enquanto a manhã clareava por completo e o sol espreitava sob a rocha da Lagoinha. Agora, já no alto, olhava para trás, contemplando a paisagem dispersa e difusa entre o azul do mar e o verde dos campos. Por entre o Pico da Vigia e o Outeiro Grande, vislumbravam-se algumas casas da Fajã. Mais ao perto, a Fajãzinha definia-se clara e totalmente. Dezenas de casinhas brancas, com telhado avermelhado, aconchegavam-se à volta da Matriz e do Rossio. O ramal, por onde seguiam agora os pastores, vergados ao peso das latas de leite, serpenteava por entre campos de milho, de favas, de trevo e de erva-da-casta. Atravessámos, finalmente, a estrada e entrámos nos matos do Mosteiro, no caminho que durante dezenas e dezenas de anos ligara a Fajã às Lajes e que em breve, com a construção da nova estrada, teria, decerto, os seus dias contados.

A Eduarda, adivinhando a fome que me saltava do corpo e que lentamente me conduzia a uma fraqueza quase impeditiva de tão longa caminhada, decidiu que devíamos parar. Sentámo-nos na relva fresca e perfumada a cidreira, poejo e erva-néveda. Abriu um pequeno saco e dele tirou meio pão de trigo, partido às fatias e um grosso pedaço de queijo, também devidamente esfaqueado. Sentada à minha frente, pernas cruzadas, repartia comigo o pão, o queijo, o carinho a ternura, a sua própria bondade e beleza.

Para além de me enlevar na contemplação da que me elegera para seu acompanhante, ali sentada à minha frente, no meio daquele ermo, onde de longe em longe, apenas se ouvia o gemidos de vitelos misturados com o berrar das mães, saboreava deliciado o pão de trigo, nada habitual nos meus cardápios domésticos. Ao longe, cada vez mais longe, o oceano, azulado e infinito, a separar a ilha do firmamento. De vez em quando, pássaros multicolores sobrevoavam-nos, na tentativa impossível de partilharem a nossa merenda.

Não demorámos! A Eduarda guardou o que sobrara do exíguo repasto e levantou-se. Reiniciámos a nossa marcha. Não demorou muito, alcançámos o alto donde se vislumbravam as bordas da Caldeira Rasa, no meio de recortes enfeitados e debruados de hortênsias azuladas. As suas águas, límpidas e transparentes, espelhavam a luminosidade, a calma, o silêncio e a transcendência que a envolviam. Além, a Funda encaixilhada entre rochas verdes e negras recortadas com cascatas esbranquiçadas, que deslizando lentamente, se perdiam na superfície verde azulada da sua água. Finalmente a Boca da Baleia, termo do percurso mais acidentado, daquele naco de trajecto, entre os Terreiros e as Lajes. Descendo a ladeira da Boca da Baleia, entrámos decididamente na grande recta, onde a nova estrada começava a tomar forma.

Percorremos, na vila, os lugares necessários a que a Eduarda adquirisse papéis, tirasse certidões, apresentasse requerimentos e procurações, onde, enfim, formalizasse o seu casamento. Fomos jantar à Firma, depois de trocar alguns dólares que o Luís lhe enviara para as despesas nupciais.

Tudo tratado e ultimado, regressámos, fazendo o trajecto inverso. Chegámos a casa, ao lusco-fusco. A Eduarda, ao deixar-me na Assomada, despediu-se de mim, renovando a sua promessa:

- Deixa estar, que eu não me esqueço do canivete.

Passado algum tempo a Eduarda casou por procuração e, pouco depois, partiu para a América e eu, dela, não soube mais nada.

 

......

 

Passaram-se anos. Cresci. Abandonei a ilha e esqueci a Eduarda, a viagem às Lajes e a promessa do canivete.

Quando, pela primeira vez, voltei à ilha, o Aires, regressado da América, cruzando-se comigo, na Cancelinha, perguntou-me:

- Tu é que és o Alvarinho, neto do Jacinto Belchior?

Como lhe respondesse afirmativamente, ordenou-me, para espanto meu, que passasse em sua casa, porque tinha uma encomenda da América para mim.

E eu, a orgulhar-me da generosidade de meus parentes americanos!...

Lá fui. O Aires deu-me um embrulhito, muito bem feito, onde se podia ler: “Da Eduarda, para o Álvaro.”

Abri-o, sobressaltado. Era um canivete!

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publicado por picodavigia2 às 19:09

COUVES COM CONDUTO

Terça-feira, 01.10.13

Um dos pratos mais típicos e tradicionais da gastronomia Fajã Grande era as couves com conduto. A sua confecção era simples mas o prato era muito apreciado e saboroso, sendo cozinhado com mais frequência nos meses de Inverno, logo a seguir à matança do porco. Os seus ingredientes também eram poucos e simples: batata, couve e carne de porco, para além da cebola, alho, banha de porco e outros temperos. A batata por vezes era substituída pelo inhame, que neste caso era cozinhado à parte. As couves, por sua vez, abundavam nos campos das Furnas, do Areal e do Porto, ou nas courelas junto às casas, pelo que era fácil de se obterem, sendo por isso mesmo, utilizadas em grande quantidade, não só neste prato masem outros. Acarne de porco utilizada era a que após a matança havia sido cortada, salgada e guardada nas salgadeiras, ou seja, os ossos da cabeça, da coluna e das patas e algumas postas de toucinho que continham alguma carne, sobretudo as das orelhas e os pés. Quanto à confecção a tarefa era fácil. Utilizava-se um caldeirão de ferro com água a ferver, colocado em cima duma grelha onde se fazia o lume e colocava-se dentro os ingredientes, com alguns temperos, sendo que a carne de porco era sempre lavada previamente para lhe extrair a maior parte do sal e só depois era colocada no caldeirão, sempre em primeiro lugar, uma vez que a sua cozedura demorava mais do que as couves e as batatas.

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publicado por picodavigia2 às 14:38

OS GATINHOS DE LAIAS

Terça-feira, 01.10.13

Seriam muito poucas as casas da Fajã que, outrora, não tinham como enfeite, geralmente em cima de uma cadeira de vimes ou sobre a mesa da sala, um gatinho de laias, feito com agulhas e com laias ou seja com fios de lã e que geralmente tinha cores muito variadas.

Eram feitos com agulhas semelhantes àquelas com que se faziam as “soeras”, as meias e afins, mas com “pontos” diferentes. Eram extremamente bem elaborados e ainda melhor acabados, da cabeça aos pés, passando pelo corpo e pelas mãos e até tinham olhitos feitos, geralmente, com dois botões pretos, castanhos ou azuis, mas daqueles que vinham em roupas da América e não tinham buracos, mas sim uma espécie de anilha por trás, que os prendesse. Eram feitos de maneira que ao colocá-los sobre a cadeira ou sobre a mesa ficavam muito bem sentadinhos sobre as patas inferiores e tinham sobre estas e presa à barriga uma grande bola feita também com fios de lã. Eram verdes, vermelhos, pretos, brancos, azuis ou de várias cores, conforme as lãs de que dispunha quem os fazia.

Decididamente parecem ter-se perdido no tempo… os gatinhos de “laias”.

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publicado por picodavigia2 às 14:29

TIRAR O ESTERCO E DESPEJAR A POÇA

Terça-feira, 01.10.13

Duas das tarefas mais degradantes, asquerosas, conspurcas, imundas e enlameadas que a actividade agro-pecuária, praticada outrora na Fajã Grande e, naturalmente em muitas outras localidades rurais açorianas, abrangia ou melhor exigia, era as de tirar o esterco dos palheiros onde era guardado o gado bovino e despejar a urina das poças dos mesmos.

Quer as vacas de leite quer o gado alfeiro, era religiosamente guardado nos palheiros, situando-se, muitos destes, nas lojas, ou seja, nos pisos inferiores das habitações, exacta e precisamente, por baixo do próprio sítio onde adultos, velhos, doentes e crianças passavam a maior parte do seu dia, onde conviviam, onde faziam as suas refeições e onde dormiam.

Com um papel predominante na sustentação económica das famílias, as vacas, na Fajã Grande, eram criadas com cuidados exagerados, reivindicavam um tratamento primoroso, uma atenção contínua, um cuidado persistente e uma dedicação abnegada, uma vez que, por um lado, constituíam uma base importante da alimentação e por outro constituíam a única fonte de receita existente em cada família: a venda do leite e a do próprio animal. Numa palavra, eram a razão última da sobrevivência das famílias. Vaca que morresse constituía uma das maiores desgraças para qualquer agricultor fajãgrandense da altura. Por isso o gado bovino tinha que ser muito bem tratado, não apenas no que dizia respeito à sua alimentação mas também, relativamente, às condições de higiene e limpeza do local onde era guardada – o palheiro.

Assim, os palheiros exigiam uma limpeza rigorosa, excessiva, quotidiana e permanente. As vacas e os restantes animais bovinos estavam amarradas à manjedoura, em posição vertical à mesma, onde lhes era colocada a comida, acarretada, geralmente, às costas, das terras para os palheiros. Sozinhas ou de duas a duas, as rezes ficavam arrumadas em pequenos espaços, separados pelos “repartiamentos” ou seja, por umas divisórias feitas com paus encravados no chão, nos quais eram pregadas tábuas ou farripas de madeira, com o fim de evitar que os animais usurpassem o espaço uns aos outros e se ferissem ou magoassem. Do lado oposto à manjedoura ficava, com uma distância devidamente adequada ao tamanho do animal, o rego do esterco. Este estendia-se de uma ponta à outra do palheiro e era nele que se iam armazenando a urina e a bosta dos animais que se misturavam uma com a outra e com a “cama” ou seja com os fetos e restos de alimentos que eram espalhados pelo chão, a fim de que, por um lado os animais não se deitassem sobre os dejectos e, por outro, para que se produzisse a maior quantidade de esterco possível, tão necessário à fertilidade dos campos. O rego comunicava através de um buraco com a poça, geralmente quadrada, situada num canto do palheiro, coberta com tábuas e bem mais funda do que o rego, onde se ia armazenando, durante dias e dias, a urina dos animais.

Este tétrico e mefítico cenário que aconchegava os bovinos, no Verão durante o dia, para os proteger do calor excessivo, e no Inverno, ao longo da noite, para os abrigar do frio e das intempéries, tinha que ser limpo, no que dizia respeito ao esterco acumulado no rego, dia sim, dia não.

Por isso à noite no Verão e de manhã no Inverno, homens ou rapazes, munidos do “garfo de tirar esterco”, puxavam, rapavam, remexiam, amontoavam, espetavam toda aquela imundície e padejavam-na às garfadas para um monte de esterco que, dia após dia, ia crescendo e fermentando fora da porta do palheiro, levantando um cheiro horroroso, promíscuo e aberrante que penetrava pelas frestas e paredes das casas e se defluía, emanava e dispersava pelos arredores. Uma vez por semana também era necessário despejar a poça, com odores e cheiros ainda mais insuportáveis. O seu conteúdo era padejado com um caneco velho qualquer que já não servisse para mais nada ou para coisa nenhuma, para dentro das “latas da urina” ou seja, uns enormes e toscos vasilhames de madeira, exclusivamente usados para este fim e que depois de cheios eram transportados aos ombros, de palanca, presos num pau, um atrás das costas e outro à frente, para alimentar e fazer crescer as caseiras, as batatas-doces e as couves que floresciam nas terras do Porto, das Furnas e do Areal. Acrescente-se que muitas vezes uma e outra destas tarefas eram feitas por homens ou rapazes que andavam descalço, com os pés a sangrar, com os artelhos gretados, com topadas ou com “dedos degolados”.

A este suplício estiveram rigorosa e permanentemente condenados, em pleno século XX, os nossos avós, os nossos pais e os nossos irmãos! Talvez por estas e por outras razões muitos deles escapuliram para a América e para o Canadá e nunca mais voltaram.

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publicado por picodavigia2 às 09:13

A BAÍA DAS ROSAS

Terça-feira, 01.10.13

Conta-se que, há muitos, muitos anos, (há tantos que já se lhes perdem as contas), havia um rapaz e uma rapariga que viviam, isolados e sozinhos, numa ilha algures perdida na imensidão do Atlântico e cuja existência ninguém conhecia. Os jovens, ao que parece, viviam num verdadeiro estado de pureza original, de inocência absoluta e nem sequer sabiam quem eram, onde tinham nascido ou quem eram os seus progenitores. Ela era jovem e bonita, mas débil, inocente, desmaliciosa, sem conhecer a malvadez e a concupiscência humana. Ele mais velho, mais forte e, embora mais experiente, mas também não conhecia nem a maldade do mundo, nem a ganância danosa dos homens. Como eram os únicos habitantes da ilha, passavam os dias andando pelos campos, passeando pelas florestas, apreciando a natureza, alimentando-se do que ela lhes dava e, conta a história, que até falavam com as plantas, conviviam com os animais, visitavam, com frequência os peixes, os búzios e as algas, dançavam no vai e vem das marés e tinham-se apaixonado por todas as criaturas da ilha, nas quais eles próprios se incluíam.

Assim viveram em liberdade e inocência, em amor, pureza e simplicidade, até que um dia chegou à ilha uma estranha e inaudita embarcação. Era uma galé que, ostentando sinais de realeza, atracou numa enorme baía que existia no local onde os jovens viviam. Algum tempo depois de ali ancorar, a galé lançou ao mar um pequeno batel que se dirigiu em direcção à ilha, transportando um estranho visitante. Pelas vestes e falar, pela coroa cravejada de pedras preciosas e pelo ceptro que ostentava numa das mãos, parecia ser um rei, talvez um rei Mouro que por ali passava, na demanda de novas terras que pretendia conquistar. Ficou a estranha figura e suposto monarca muito entusiasmado com a presença ali dos dois jovens, pois considerava desertas e despovoadas aquelas paragens. Aproximando-se dos jovens, trocou com eles algumas palavras, que não entenderam. O jovem, porém, através da postura do estranho visitante, depressa se apercebeu das suas malévolas intenções, consubstanciadas numa aparente e disfarçada benignidade. Mas os seus olhares perversos e maliciosos não cessavam de cair de rajada sobre a jovem que, vendo-se assim e pela primeira vez lisonjeada e desejada, se rendia, inocente e deslumbrada, aos exagerados e lascivos desejos que a sua beleza provocava, no malicioso e concupiscente monarca.

Pouco depois, o estranho visitante, cada vez mais maléfico, libidinoso e afeito à jovem, simulando afastar-se e regressar à sua galé, escondeu-se, sem que os jovens se apercebessem ou disso dessem conta, numa esconsa gruta que por ali existia. Cuidando, na sua ingénua inocência, que estavam aliviados de tão heteróclito visitante, os jovens regressaram à sua vida simples, pacífica, inocente e feliz, na ilha. Em plena noite, porém, o suposto rei, saindo do esconderijo, aproximou-se dos jovens e, à socapa, matou o rapaz e raptou a moça "que era tão bonita, tão fresca, tão bela, tão doce e tão atraente que fazia apaixonar o coração de qualquer homem". O rei pegou na jovem que, desolada, chorava a morte do seu companheiro, e levou-a para junto do mar, na mira de a conduzir à galé real. A jovem, porém, embora infrutiferamente, tentava resistir, mas o poderoso monarca arrastou-a até aos baixios que ornavam de escuro a orla marítima, exigindo que o acompanhasse até à galé real. A jovem, porém, apesar de inocente e ingénua, apercebendo-se das malévolas intenções do facínora, recusou-se a acompanhá-lo, oferecendo uma forte e tenaz resistência. O rei aproximou-se, enraivecido, tentando puxá-la para o batel. A jovem multiplicou-se em resistência e oposição, transformando-se numa enorme e esguia pedra de baixio, semelhante a tantas outros que por ali proliferavam. E tanta, tão forte e tão tenaz resistência foi a da jovem transformada em rochedo que o monarca não a conseguiu puxar, nem mesmo com a ajuda dos seus vassalos, que, ouvindo os seus gritos e chamamentos, se haviam aproximado de terra para o ajudar. Incapaz de puxar aquele rochedo, ali encravado, cada vez mais preso e seguro, o rei, desiludido, mandou destruí-lo, atirando-o para o fundo do mar, no meio da enorme baía.

Para espanto seu e de quantos o acompanhavam, pouco tempo depois, no lugar onde a pedra havia caído, começaram a brotar e a nascer da água rosas – as mais belas rosas que o monarca alguma vez vira sobre a face da terra. Essa a razão por que aquele rei mouro, arrependido dos seus actos, vis e concupiscentes, afastando-se dali, deu àquela baía, o nome de “Baía das Rosas”

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publicado por picodavigia2 às 09:07

LUA

Terça-feira, 01.10.13

Deus

só fez o Mundo

porque,

ao redor dele,

te

queria

colocar,

- Lua!

 

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publicado por picodavigia2 às 00:03





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