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CADE A ÁGUA

Sexta-feira, 04.10.13

Cade a água?

O boi bebeu-a.

Cade o boi?

Foi debulhar o trigo.

Cade o trigo?

A galinha comeu-o.

Cade a galinha?

Foi pôr o ovo.

Cade o ovo?

O padre comeu-o.

Cade o padre?

Foi celebrar missa.

Cade a missa?

Está no altar.

Cade o altar?

Está no seu lugar.

Cade a campainha?

Está na buraquinha.

Cade o campanhão?

Está no buracão.

 

(Aravia popular fajãgrandense)

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publicado por picodavigia2 às 20:20

SARGAÇO

Sexta-feira, 04.10.13

Noite escura. A manhã tardava em alvejar. Clara sentiu um bater martelado na janela do seu quarto. A mãe já se levantara e, alumiada pelo brasido do lar, cirandava na cozinha, no meio duma penumbra confusa e impertinente. De fora um vozeirão grave e solene:

- Ó vocês, levem garfos, cestos e um pingo de café para o Rolo. Tá a sair uma grandeza de sargaço.

Não foi preciso esclarecer ou perguntar o que quer que fosse. Clara levantou-se de um salto e entrou assarapantada pela cozinha a alertar a mãe. Bem conhecera a voz do Ricardo. O pai, saíra de casa, com destino às Covas para ceifar um molho de erva, Decerto que se havia enfiado no Rolo, na retirada daquele maldito sargaço.

- E aquele homem que já não pode com nada e a meter-se sempre em grandes trabalheiras. Eu me benzo do Coiso Mau! Tanto que o aviso e lhe peço, Não há maneira de se aquietar. E eu sem o poder ajudar!

- Deixe lá mãe. Faça o café que eu vou levar-lhe os garfos e os cestos. Hei-de ajudá-lo como puder.

Pouco depois, com a escuridão ainda a aguçar-lhe o medo, Clara abriu a porta da cozinha que dava para os pátios traseiros. Cestos à cabeça, enfiados uns dentro dos outros, dois garfos alçados sobre o ombro direito e uma lata de café com leite, onde a mãe havia migado umas fatias de pão, com uma colherada de açúcar.

A Rua Direita ainda estava deserta mas na Tronqueira, para lá da casa do Belchior, já se viam muitos vultos apressados e cambaleantes que, como ela, se encaminhavam para o Rolo, na demanda do sargaço.

Todos os anos era aquela efervescência, desprezível para alguns, indiferente para outros mas gratificante para muitos. No Outono, com os ventos de oeste, com o mar a abarrotar de maresia e com as ondas a encapelarem-se alteradas, de vez em quando, o Rolo cobria-se de um extenso tapete aveludado, fofo, castanho e amarelado que ia do Pesqueiro de Tera até à Ribeira das Casas. Era o sargaço que, arrancado das profundezas do oceano, trazido por correntes e marés, ali vinha encafuar-se, sendo depois atiçado para terra pelo reboliço das ondas e pela correnteza da maré. O Reboredo era sempre dos primeiros a chegar. Assenhoreava-se de uma bom pedaço do Rolo, demarcava com canas e paus o seu território e, a partir de então, todo o sargaço que o mar ali trouxesse era seu. Depois era só atirá-lo à mão, à garfada, aos cestos, bem mais para cima a fim de que a maré, ao encher, assim como o trouxera, agora o não levasse.

Quando Clara chegou ao Rolo já os primeiros raios da aurora, embora tímidos, espreitavam sobre a Rocha dos Paus Brancos. Um reboliço enorme espalhava-se sobre todos aqueles calhaus, agora atapetados de algas mortas. Homens descalços e de calças arregaçadas até aos joelhos lutavam contra a braveza das vagas, na mira de arrecadar o maior quinhão. As ondas num vai e vem tremendo, assustavam os homens, afugentando-os quando subiam mas incentivando-os quando desciam. Muitos já haviam amontoado uma boa safra, mas todos se aventuravam na conquista de mais. O pai alapara-se mesmo ali, logo no início do Rolo, junto ao ilhéu do Constantino. Fora dos primeiros a chegar.

Clara saltitando de pedregulho em pedregulho, aproximou-se do eito, onde o pai todo molhado retirava das ondas temerosas e altivas, mancheias de sargaço encharcado. Colocando a latinha do café em lugar seguro, depondo cestos e garfos, atirou-se de rajada sobre o montículo de sargaço que o pai já havia armazenado, afastado das ondas. Ali tudo era cheiro a maresia e sabor a salinidade, ali, tudo era um tactear fofo, um saltar acolchoado, um contacto sublime e terno com o aroma delicado e doce do mar. E enquanto o pai, fazendo uma pausa na safra, se entretinha nas sopas, Clara, descalçando-se, aproveitou para retouçar, rebolar, pinchar, saltar, pular e espinotear sobre o montículo de sargaço que o pai ali já retirara do mar.

Depois, ora fugindo às ondas, ora deixando-se banhar pela frescura inebriante das águas lá foi, com galhardia e excelência, ajudando o pai. Ao meio-dia, quando a mãe ali chegou trazendo, num cesto, à cabeça, o almoço, o monte de sargaço do Reboredo era um dos maiores do Rolo.

O diabo era agora, de tarde, quando a maré subisse ao ponto de recusar a cedência sequer de mais uma febrinha que fosse, acarretá-lo para o “lago”, onde ele havia de ficar a fermentar, durante meses, até se transformar em precioso adubo. Ele, Reboredo, a encher os cestos, ela, Clara, no “lago” a despejá-los e a acalcar o sargaço… O problema era acarretá-lo, em cestos pesadíssimos, muito cheios, bem acuculados e a escorrerem água por quantas juntas tinham!...

E foi o Câncio, o filho do Machado, que, de boa vontade, se veio oferecer para ajudar. Perante a anuência do Reboredo, o rapaz que desde há muito catrapiscava o olho à Clarinha, cuidou que aquele seria um dia de esperança – esperança de, através da ajuda no sargaço, conquistar, para sempre, o coração da moça.

E não se enganou, o bisbórrias.

 

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publicado por picodavigia2 às 14:55

GRANDE DERROCADA DE ÁGUA E LAMA SOBRE A FAJÃZINHA

Sexta-feira, 04.10.13

Aqui transcrevo na íntegra, a notícia transcrita no site “Ilha das Flores”, (no dia 4 de Dezenbro de 2010) fonte “Diário dos Açores” sobre o desabamento de uma ribanceira sobre a vizinha freguesia da Fajãzinha, que desalojou as 74 pessoas que ali viviam.

“Foram 74 pessoas e muitas horas de susto e luta, tudo ao lado, e depois de uma derrocada imensa que deixou a Fajãzinha isolada do resto da ilha das Flores. Passavam poucos minutos das 5 da madrugada (do passado dia 3) quando uma derrocada, sem precedentes, atingiu parte da freguesia da Fajãzinha, concelho de Lajes das Flores. Só por volta das 7 horas da manhã toda a população ficou alerta do que se estava a passar e foi a partir daí que começaram os esforços para tentar “contornar” este incidente. As fortes chuvadas que assolaram a ilha mais Ocidental do arquipélago durante cerca de 72 horas consecutivas não podiam prever pior cenário, salvando-se o facto de não haver vítimas humanas nesta já considerada “tragédia”. Casas inundadas, carros submersos, garagens e palheiros arrastadas literalmente por uma ribeira de lama, água, entulhos, árvores e todo o lixo que se acumulou freguesia abaixo. O cenário foi descrito pelas dezenas de pessoas que o “Diário dos Açores” contactou durante todo o dia de hoje. As imagens falam por si, mas o que a população de uma das mais pequenas freguesias açorianas passou não tem precedentes. O polidesportivo que se encontra no centro da freguesia não se vislumbra, a Junta de Freguesia está toda destruída, dizem ao nosso jornal “isto não é a Fajãzinha”. Apenas às 11h50 a chuva dava sinais de ‘fraqueza’ e apenas passada uma hora a acalmia do vento, da chuva e do nevoeiro permitia perceber o estado lastimoso que a Natureza acabara de deixar este sítio. A única via de acesso à freguesia foi, também ela, afectada pelas ribanceiras que atravessaram a estrada regional, impedindo dessa forma a passagem de veículos para a freguesia. Só por volta das 14hoo as máquinas da Secretaria Regional Ciência Tecnologia e Equipamentos, SRCTE, e da Câmara Municipal das Lajes das Flores conseguiram chegar à zona mais afectada pelas fortes derrocadas. Sem luz nem água (postes de alta tensão deitados ao chão), cenário que não será restabelecido nas próximas semanas, a EDA pondera nesta altura garantir a electricidade na freguesia vizinha, Fajã Grande, através de geradores. Até por volta das 16h00 a população esteve reunida na Igreja e antiga escola primária, locais considerados seguros pelas autoridades. Mas os cerca de 70 habitantes da Fajãzinha já foram evacuados e permanecerão pelo menos até amanhã no aldeamento turístico da Aldeia da Cuada que acolheu praticamente toda a população (referir que alguns populares vão permanecer na freguesia – na escola primária). Dois idosos foram deslocados para o Centro de Saúde, em Santa Cruz, e por agora resta tentar inverter um cenário que ninguém esperava ver quando acordou. Os trabalhadores da Câmara Municipal das Lajes das Flores e da SRCTE procuram limpar, ao máximo, toda a zona que foi deteriorada, uma vez que face ao agravamento do tempo que se prevê durante a tarde as autoridades não deixam de parte a possibilidade de novas derrocadas e desabamentos poderem acontecer. Referir que durante todo o dia estiveram no local, desde o início da manhã, bombeiros (Protecção Civil), PSP, GNR, elementos da SRCTE, Presidente da Câmara, entre outros, chefiando toda a missão junto de uma população visivelmente assustada.”

 

Este texto foi publicado no “Pico da Vigia” em 04/12/10

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publicado por picodavigia2 às 09:33

HOMENAGEM

Sexta-feira, 04.10.13

Assinalando os 10 anos da sua morte, a Biblioteca Nacional apresentou uma pequena mostra documental sobre o florentino Pedro da Silveira.

Pedro da Silveira – autor, poeta, investigador histórico e literário, tradutor, etnógrafo – falecido há dez anos, foi um dos grandes poetas açorianos do século XX e deixou uma marca cultural profundamente impressiva cujo registo esteve patente na exposição da Biblioteca Nacional (em Lisboa), antecedendo a cerimónia de homenagem promovida no dia 1 de Outubro pela Casa dos Açores em Lisboa.

Este multifacetado autor florentino ilustrou a literatura açoriana – que defendeu frontalmente como teórico, historiador e crítico, até contrariando alguns meios intelectuais do Continente – foi também um dos seus mais persistentes e criteriosos divulgadores, tendo-se dedicado ainda a importantes recolhas de literatura oral.

Pedro da Silveira foi autor de várias obras de poesia, entre as quais se contam «A ilha e o Mundo», «Sinais de Oeste», «Corografias», «Poemas ausentes» e «Fui ao mar buscar laranjas», o primeiro volume da sua obra completa. Com uma vasta colaboração dispersa por jornais e revistas nacionais e estrangeiras, Pedro da Siveira foi ainda autor de duas antologias de poetas açorianos, sendo que no prefácio de uma das quais – «Antologia de poesia açoriana – do século XVII a 1975» – ensaia uma tentativa de autonomia da literatura açoriana das restantes literaturas de expressão lusófona.

A sua poesia manteve sempre uma forte ligação ao solo açoriano, não deixando, porém, de dialogar cultural e poeticamente com «as ilhas todas do Mundo». Foi um dos promotores da elaboração da «Enciclopédia açoriana» e preparava uma «História da literatura açoriana» quando faleceu. Integrou, até 1974, o conselho de redação da «Seara Nova», tendo sido até 1992 funcionário da Biblioteca Nacional, da qual foi director dos Serviços de Investigação e de Actividades Culturais.

 

NB – Texto retirado integralmente do Forum Ilha das Flores

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publicado por picodavigia2 às 09:29





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