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MANUEL HENRIQUE DIAS

Quarta-feira, 30.10.13

O poeta e prosador Manuel Henrique Dias nasceu no Cais do Pico, em 1867 e faleceu na mesma vila em 1902. Trabalhou num cartório, serviu a política e acreditou nela, por algum tempo. Com Domingos Machado Soares, fundou, em 1885, o jornal Pico, onde está publicada alguma da sua poesia. Foi redactor principal e proprietário de O Independente, criado em S. Roque, em 1886.

Em 1889, publicou o seu primeiro e único livro de versos – Harpejos, - impresso em Lisboa. Revelou-se um poeta sentimental e ardente. No prólogo, desse seu livro escreveu: «Principiei a fazer versos aos quinze anos, sem instrução literária, sem conhecimento das regras de arte, sem leitura quase, sem nada, enfim, que pudesse auxiliar-me.» A sua obra principal veio depois, quando o seu espírito se amadureceu na luta, se amoldou à realidade e que ele espalhou pelo jornalismo faialense e picoense, com reflexos na imprensa de outras terras.

Manuel Henrique Dias suicidou-se no mar, no sítio da Furna, próximo do Cais do Pico. «As últimas palavras do suicida» foram publicadas em O Telégrapho, jornal que também publicou, postumamente, o seu inédito «Coisas e Loisas»

 

Dados retirados do CCA – Cultura Açores

 

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publicado por picodavigia2 às 23:40

QUEM NOS CRIOU

Quarta-feira, 30.10.13

Quase todos os domingos, a seguir à missa, as crianças da catequese de todas as idades tinham que permanecer na igreja por mais algum tempo, a fim de prestarem contas das aprendizagens da doutrina que iam fazendo, semana após semana, em casa das suas catequistas. É que o pároco aproveitava esse momento para inspeccionar a forma como tinham decorrido as horas de catequese semanais e para avaliar as crianças sobre o que tinham ou não tinham aprendido, seleccionando assim, os que possuíam os requisitos mínimos para fazer a primeira comunhão, a comunhão solene ou para crismar.

Depois de ir à sacristia retirar os paramentos, o padre Pimentel dirigia-se até ao cruzeiro, envergando a sua batina negra, com um botão ou outra por abotoar e, começando a andar de lá para cá, ia interrogando uns e outros, como que fazendo uma espécie de exame oral a todos. As crianças sentavam-se nos dois primeiros bancos da frente: as meninas do lado da epístola e os rapazes do lado do evangelho. As catequistas, uma ou outra beata, algumas mães e outros familiares esperavam sentados, por aqui e por acolá, espalhados por toda a igreja. O reverendo, exigindo silêncio absoluto, iniciava o interrogatório e, regra geral, os resultados eram muito bons. Quase todos tinham na ponta da língua e papagueavam as respostas do catecismo e cada um, na sua vez, respondia tintim por tintim às perguntas que o reverendo fazia, tal e qual estavam escarrapachadas no catecismo e que haviam decorado ao longo de semanas e semanas, com a ajuda das senhoras catequistas. Um ou outro entupia, um ou outro enganava-se, um ou outro deixava uma palavra atrás, mas quase todos lá se iam desenrascando, com um ou outro erro, sem que o prebendado desse muito por isso ou se aborrecesse, até porque era por demais evidente, que não estava ali para muitas demoras. Por isso olvidava ou fazia por olvidar, as falhas os enganos e os engasgamentos. Coisas de somenos importância. Nada que rondasse a heresia ou que cheirasse a apostasia.

Certo domingo, porém, ao perguntar ao Antonino da Cuada “Quem nos criou?”, o fedelho que, pelos vistos ou não estudara nada nas últimas semanas ou esquecera aquela parte do catecismo, ficou mudo e quedo.

- Então? – Insistiu o reverendo. – Não sabes quem te criou?

 O Antonino, depois de reflectir um pouco, saiu-se com esta;

- Ah! Quem me criou?! Foi meu pai, minha mãe, o leite da nossa Benfeita e o dinheiro da caixa verde!

Quebrando a tolerância habitual a pequenos erros e a uma ou outra incorrecção, o reverendo, desta feita, foi aos arames. Chamou-lhe paspalho, ameaçou puxar-lhe as orelhas se a cena se repetisse, mandou-o estudar e, no domingo seguinte, na homilia feita da grade, antes da missa, os da Cuada levaram um grande raspanete, por, alegadamente, não cumprirem um dos mais importantes e elementares mandamentos da Santa Madre Igreja, ou seja, ensinar a doutrina cristã aos seus filhos ou, pior do que isso, não os enviar a casa das catequistas que as havia na freguesia, muito competentes e sempre dispostas a ensinar a doutrina cristã.

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publicado por picodavigia2 às 17:59

A IDADE COM QUE SE CASAVAM AS NOSSAS AVÓS E BISAVÓS

Quarta-feira, 30.10.13

No seu livro “Casais das Flores e do Corvo” publicado em 2006, Francisco António Pimentel Gomes dá-nos a conhecer os extractos dos assentos de casamento realizados nas doze paróquias das duas ilhas do Grupo Ocidental Açoriano, entre os anos de 1675 e 1911. No que à paróquia de São José da Fajã Grande diz respeito, os extractos referenciados no livro mencionam apenas os matrimónios realizados a partir da data da criação da paróquia, ou seja a partir de 1861 pelo que enumeram apenas os cerca de trezentos casamentos realizados entre os anos de 1861 e 1911, na paróquia de São José da Fajã Grande. Sendo assim os nubentes que figuram nestes registos foram os avós e os bisavós da geração nada e criada, na Fajã Grande ou a ela ligada, nas décadas de quarenta, cinquenta e sessenta. Há alguns aspectos interessantes que ressaltam de uma análise dos dados referidos, sendo um deles o da idade com que se casavam, nessa altura, as mulheres. Efectuadas as análises dos referidos registos, tanto quanto foi necessário, verifica-se que a idade mais frequente com que casavam as meninas nossas avós, era a de entre os vinte e vinte cinco anos. De registar, no entanto que muitas mulheres casavam bastante mais novas, pois oito casaram com quinze anos, quatro com catorze e uma apenas com treze. Algumas mulheres casavam, no entanto, já com idade avançada, verificando-se muitos casamentos depois dos cinquenta, alguns após os sessenta e até uma mulher casou com a bonita idade de setenta e um anos. Muitas destas mulheres não eram viúvas e algumas eram bem mais velhas do que os maridos.

Assim, com a tenra idade treze anos casou apenas uma menina, com catorze anos casaram quatro, com quinze, oito, com dezasseis, nove, com dezassete também nove, com dezoito, o maior número, ou seja vinte e cinco e com dezanove casaram dezasseis meninas. Por sua vez o número de mulheres que casaram com vinte anos de idade foi de dezanove, com vinte e um, vinte duas, com vinte e dois anos vinte, com vinte e três catorze, com vinte e quatro casaram dezasseis, com vinte e cinco dezoito, com vinte e seis catorze, com vinte e sete também casaram catorze, com vinte e oito igual número, ou seja catorze e com vinte e nove contraíram matrimónio cinco mulheres. Com a idade de trinta anos casaram quatro mulheres, com trinta e um casaram seis, com trinta e dois, quatro, com trinta e três, dez, com trinta e quatro, seis, com trinta e cinco também casaram seis, com trinta e seis casaram dez, com trinta e sete, com trinta e oito anos, nenhuma e com trinta e nove apenas duas. O número de quarentonas que casaram durante este período foi de vinte e oito: com quarenta, quatro, com quarenta e um, três, com quarenta e dois, duas, com quarenta e três, uma, com quarenta e quatro, duas, com quarenta e cinco, uma, com quarenta e seis, duas, com quarenta e sete, quatro, com quarenta e oito, três e com quarenta e nove, duas. Já na casa dos cinquenta, apenas casaram seis mulheres: uma com cinquenta anos de idade, uma outa com cinquenta e um, duas com cinquenta e dois, uma com cinquenta e três e uma outra com cinquenta e seis. Finalmente e com a provecta idade de sessenta anos casaram duas mulheres e com sessenta e um, uma. A mulher com mais idade que casou, nesta época, na Fajã Grande tinha, nada mais nada menos, do que com a bonita idade de setenta e um anos. Durante estes anos casou uma mulher considerada exposta e, portanto, sem pais identificados e sem idade certa.

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publicado por picodavigia2 às 16:04

O CLARINETE

Quarta-feira, 30.10.13

A década de sessenta, embora demarcada por um adocicado sabor de inocência a contrastar com um abrupto despoletar das mais diversificadas manifestações musicais, provocara um enorme e atrofiante desgaste na filarmónica da freguesia. A avalanche de músicos desabrochada nos anos anteriores, transformara-se num reduzidíssimo elenco que ameaçava por em causa a continuidade de um dos maiores orgulhos da terra, a União Musical Santestevense, a muito custo fundada, estruturada e organizada, na década anterior. Uma razia!

A aquisição dos instrumentos havia custado uma fortuna. Os fardamentos e outros acessórios aumentaram, substancialmente, o montante. Não houve subsídios e foi a generosidade do povo da pequena freguesia que, unindo esforços e conjugando sacrifícios, ombreou com uma despesa estonteante. Agora, se não lhe acudissem, estava prestes a fenecer. A maioria dos músicos desertara. Uns haviam partido para a tropa, outros emigrado para América, um outro dos mais velhos falecera, enquanto alguns desmotivando-se, pura e simplesmente haviam desistido. O elenco amplo, excessivo e volumoso dos tempos áureos da sua fundação, ia-se, aos poucos, afunilando e atrofiando, aos solavancos, como se fosse um enorme balão a esvaziar-se, lentamente. Agora, apenas uma dúzia de carolas! Muitos instrumentos dias e dias sem emitirem uma nota que fosse, enferrujavam nos armários.

Impunha-se, pois, recrutar pessoal, a quem os mais velhos haviam de dar formação. Mas a rapaziada, cada vez mais reduzida e, além disso, aliciada pelo aparecimento dos Beatles e pelo despoletar do Rock and Roll, todo o dia de rádio ao ouvido, gravador debaixo do braço, encolhia os ombros. Recrutar mulheres, impossível, naqueles tempos regidos e demarcados ainda por uma pesada oposição ao vacilante dealbar dos movimentos feministas.

A Maria José, uma das mais belas moçoilas da freguesia, fora nada e criada num ambiente de sedutoras vivências musicais. Vivaça, afoita e despida de complexos, a música estava-lhe no sangue. O pai, recentemente falecido, fora um dos mais brilhantes clarinetistas da freguesia e a mãe, quando nova, em festas e serões, dedilhava com alguma habilidade, uma antiga viola da terra que havia lá em casa, habitualmente colocada em cima da cama da sala, envolvida por um belo xaile de merino e que lhe havia sido doada, por um tio-avô.

Corajosa e destemida, apresentou-se, pois, a moça, entre meia dúzia de bigorrilhas, desajeitados, chavascos e desmiolados, como candidata a um lugar na filarmónica da freguesia. A notícia, inesperada e abrupta, correu célere, sofreu cerrada oposição, e originou os mais disparatados e inverosímeis comentários. Nem o respeito que a memória do pai impunha salvou a moça de lascivos e mal-intencionados comentários. Parecia que o céu caía em catadupa. Uma mulher a tocar na banda…metida no meio de homens!... Totalmente inconcebível! Nunca tal se vira, nem nunca tal se havia de ver. Uma vergonha! Uma ofensa! O fim do mundo, em cuecas…

Persistente, voluntariosa e disposta a contrariar tabus e a destruir preconceitos, Maria José lutou contra cerradas oposições, venceu inexcedíveis obstáculos, ultrapassou desmesuradas barreiras, esqueceu malévolos mexericos. Manejando o clarinete com arte, destreza e sabedoria, não se lhe podia negar o desiderato. A sua persistência e uma excelsa apetência para a música, tornou-se numa enorme mais-valia para a banda, assumindo-se também como pioneira duma presença feminina na mesma. Choveram as intimidações, desabaram as críticas, abundaram os comentários malévolos e as apreciações mordazes. Mas tudo ultrapassou, erguendo-se como pioneira da presença feminina uma banda de música.

Depois dela muitas outras jovens, seguindo-lhe o exemplo, se candidataram à aprendizagem da música e ao manejo dos instrumentos, fazendo com que o elenco da União Musical Santestevense crescesse e tornasse sólido e a banda regressasse aos momentos áureos e aos êxitos da sua existência inicial

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publicado por picodavigia2 às 10:27

A RIBEIRA DO FERREIRO

Quarta-feira, 30.10.13

A Fajã Grande, integrada numa das maiores fajãs açorianas, era ladeada a Norte, a Leste e a Sul por uma rocha elevadíssima, com uma altura média superior aos 400 metros, atingindo, nos píncaros mais elevados, como o da Rocha da Figueira, quase os seiscentos metros de altitude. Desta alta rocha emanavam numerosas grotas e diversas ribeiras, onde, em muitos casos se soltavam belas e interessantíssimas cascadas. Estas, ora rápida ora lentamente, iam galgando penhascos, saltando andurriais e descendo encostas até caírem por completo no chão. Aí como que se perdiam em pequenos poços ou se dissipavam em lagos, escoando-se, de seguida, por entre pedregulhos e rochedos, ladeando relvados e veredas, serpeando outeiros e planícies, ora formando e alimentando pequenos regatos que penetravam nas relvas e as transformam em lagoas ou correndo caprichosamente por entre penedos e maroiços, alimentando moinhos, dando de beber aos animais e formando aqui ou além pequenos lagos que, ladeados por pedras a servir de lavadouros eram locais privilegiados, onde as mulheres se reuniam para lavar a roupa, para amaciar os cestos de vime ou para branquear as tripas dos porcos.

Uma destas ribeiras, talvez a mais enigmática e misteriosa de todas as da Fajã Grande, era a Ribeira do Ferreiro. Nascendo lá bem no alto, para os lados do Rochão Grande, atravessando o Rochão do Junco e o Rochão Tamujo, a Ribeira do Ferreiro descia a rocha, rápida e flamejante, formando uma das mais belas e graciosas cascatas que proliferavam, na zona do Curralinho e Lavadouros, bem próximo do Poço da Alagoinha. Depois corria ora suave ora altiva e revoltosa, por entre penhascos e ravinas, circundando penedos e desenhando lagos, como uma espécie de fronteira natural entre os Lavadouros e o Curralinho, sem, no entanto deixar de parar, a fim de a enriquecer a beleza e graciosidade do Poço da Alagoinha, o qual também ajudava a alimentar com as suas águas frescas e cristalinas. Continuando a manter-se grandiosa e imponente, a Ribeira do Ferreiro seguia o seu percurso por entre relvas, terras de mato e uma ou outra horta, como que se escondendo por entre um denso e verde matagal, até se juntar, ali para os lados da Fajã das Faias, à Ribeira Grande, da qual constituía o seu maior e mais caudaloso afluente.

Quase esquecida por que encoberta por densa vegetação, a Ribeira do Ferreiro tornou-se mais visível quando da abertura da estrada entre o Porto da Fajã e a Ribeira Grande. Posto a descoberto, nessa altura, uma boa parte do seu leito, foi necessário construir uma ponte, no lugar do Vale Fundo, a fim de ligar a Fajã à Fajãzinha. A abertura da estrada, neste local, no entanto, ficaria assinalada e ensombrada para sempre por um trágico acidente em que perdeu a vida o Corvelo e em que ficaram feridos o Francisco Facha e o Roberto de José Padre.

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publicado por picodavigia2 às 09:31

VENDAVAL

Quarta-feira, 30.10.13

Há barcos perdidos

no meio do oceano.

 

Há velas destroçadas

e gaivotas refugiadas em terra.

 

As nuvens correm amedrontadas

como se fossem bonecos embriagados.

 

Dos cumes dos montes

e das encostas menos soalheiras

emana um desespero arrepiante.

 

As folhas das árvores

caem,

rodopiam e enrolam-se

nos troncos nus

dos candeeiros apagados.

 

Ruas desertas

portas fechadas,

trancadas

à espera

dum novo amanhecer…

 

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publicado por picodavigia2 às 00:00





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