PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
ROTA DO ROMÂNICO – VALE DO SOUSA
A Rota do Românico do Vale do Sousa é uma rota turístico-cultural, composta por 21 monumentos de estilo românico na região do Vale do Sousa. Esta rota surgiu a partir da necessidade, entendida pelos poderes políticos locais, de aproveitar o potencial de qualificação cultural e turística e desenvolver de forma sustentável a região. Assim e por iniciativa conjunta dos municípios do Vale do Sousa, foi criada esta rota, graças ao Plano de Desenvolvimento Integrado do Vale do Sousa, em colaboração com o Instituto Português do Património Arquitectónico e a Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais. Inicialmente, constituíam a Rota do Românico 19 monumentos identificados na região. Algum tempo depois, juntam-se mais dois e contratualizam-se os direitos e deveres de todas as entidades envolvidas, bem como o conjunto base de acções necessárias para a dinamização desta interessante iniciativa cultural e turística. Além disso, a criação desta rota turística teve um outro interesse, por quanto os monumentos a ela pertencentes foram alvo de várias obras de restauro e de conservação, entre 2003 e 2007.
Em Março de 2010, deu-se um novo alargamento da Rota do Românico, passando a abranger, agora, todos os municípios da sub-região do Tâmega, passando, os seus membros, de seis para doze. Aos concelhos pertencentes à Associação de Municípios do Vale do Sousa - Paredes, Penafiel, Lousada, Felgueiras, Castelo de Paiva e Paços de Ferreira - juntaram-se os concelhos de Amarante, Baião, Celorico de Basto, Marco de Canaveses, da Associação de Municípios do Baixo Tâmega, e ainda Cinfães e Resende.
No contexto do românico português, a arquitectura românica do Tâmega e Sousa apresenta características muito peculiares e muito regionalizadas.
No que à escultura diz respeito, esta mostra uma personalidade muito própria optando, quase sistematicamente, por elementos vegetalistas. A sua singularidade reside nos temas e nas técnicas. Nos capitéis e nos longos frisos a escultura é muito bem desenhada e plana, utilizando a técnica do bisel, muito utilizada nas Épocas Visigótica e Moçárabe. Correspondendo, quase sempre, a reformas românicas de igrejas anteriores, as novas construções utilizaram modelos patentes nas antigas igrejas pré-românicas, então reformadas, e inspiraram-se nos reportórios decorativos da Sé Velha de Coimbra, da Sé do Porto e da Sé de Braga/São Pedro de Rates, formando uma nova sintaxe, muito própria e muito regionalizada.
Nas igrejas do Tâmega e Sousa poucas vezes pontua a figura humana. Já os temas animalistas surgem sustentando os tímpanos dos portais, tendo claramente a função de defender as entradas do templo.
A arquitectura desta região adopta, geralmente, cabeceiras de perfil rectangular, embora haja exemplos mais eruditos que utilizam absides semicirculares, e fachadas onde se encaixam portais bastante profundos. Na maioria dos casos não existem, nestes portais, programas figurativos, mas o cuidado posto no seu arranjo e a profusão da escultura que ostentam mostram a vontade de os nobilitar e defender.
A Igreja do Mosteiro do Salvador de Paço de Sousa, em Penafiel, constitui um monumento nuclear no contexto da arquitectura românica da região. Terá sido em Paço de Sousa que se forjou uma corrente com base na tradição pré-românica influenciada, igualmente, por temas originários do românico de Coimbra e do Porto, dando origem ao que designou por românico nacionalizado. Este dialeto privilegia a decoração vegetalista aplicada em capitéis, frisos e impostas, usualmente plana, executada a bisel e de nítido desenho.
Outro dos aspectos mais significativos e peculiares da arquitectura românica do Tâmega e Sousa reside na aceitação dos modelos construtivos e das soluções decorativas, próprias da época românica, durante longo tempo.
A Rota do Românico recebeu, também, inúmeros prémios a nível nacional e internacional.
Nesta rota destacam-se, entre outros, os seguintes monumentos: Ermida da Nossa Senhora do Vale, Paredes, Igreja de Santa Maria (Meinedo), Lousada, Igreja de Santa Maria de Airães, Felgueiras, Igreja de São Gens de Boelhe, Penafiel, Igreja de São Mamede de Vila Verde, Felgueiras, Igreja de São Miguel de Entre-os-Rios, Penafiel, Igreja de São Pedro de Cete, Paredes, Igreja de São Pedro de Ferreira, Paços de Ferreira, Igreja de São Vicente de Sousa, Felgueiras, Igreja do Salvador de Aveleda, Lousada, Igreja do Salvador de Cabeça Santa, Penafiel, Igreja do Salvador de Unhão, Felgueiras, Igreja Matriz de Abragão, Penafiel, Marmoiral de Sobrado, Castelo de Paiva, Memorial da Ermida, Penafiel, Mosteiro de Paço de Sousa, Penafiel, Mosteiro de Pombeiro, Felgueiras, Ponte de Espindo, Lousada, Ponte de Vilela, Lousada, Torre de Vilar, Lousada e Torre do Castelo de Aguiar de Sousa, Paredes.
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UMA LATINHA DE MILHO
Nos dias seguintes ao naufrágio do Papadiamandis, nos escolhos da Ponta do Baixio, nos mares revoltos e bravios da Fajã Grande, a área circundante ao acidente, quer em terra quer no mar, encheu-se, não apenas de destroços do navio, mas também de todo o tipo de objectos, latas, caixas, caixotes e bugigangas diversas. Como era natural em situações semelhantes, a maioria dos habitantes da freguesia dirigiu-se, depois de salvos os náufragos, para o local do acidente, não apenas para ver e observar de perto os restos do navio naufragado, mas também, para vasculhar o baixio de uma ponta à outra, na esperança de juntar um ou outro objecto que tivesse alguma utilidade ou simplesmente pudesse ser guardado, para a posteridade, como recordação e testemunho de tão trágico evento. É que, para além da destruição do navio, foram vinte e oito vidas que estiveram em perigo durante horas e horas, as quais, a muito custo, foram salvas devido aos esforços e empenho não só das autoridades mas também da população da freguesia.
Perante esta “caça ao tesouro”, cedo se prontificou a Guarda-Fiscal para defender, com unhas e dentes, o local dos “temíveis predadores”. De Santa Cruz, veio uma brigada de homens, que fez círculo àquela zona do baixio, na tentativa de impedir que, quem quer que fosse, tirasse dali coisa nenhuma. Nunca se soube o que cada um conseguiu encontrar e, à socapa dos guardas, levar para casa. Uns terão levado muito, outros, alguma coisa, alguns pouco e a maioria, nada. Francisco, apesar de criança, órfã, frágil e indefesa também tentou a sua sorte. Deslocou-se ao Areal, transpôs a orla negra do baixio e observou, de perto, o navio com o seu casco negro a desfazer-se nos rochedos e as ondas altivas a saltarem-lhe sobre o convés, já quase desfeito. Por fim decidiu regressar a casa, afastando-se do local, sem procurar muito ou se esforçar por encontrar o que quer de fosse. Eis senão quando, de repente, viu, debaixo da aba duma pedra, uma pequena lata. Baixou-se e juntou-a, num misto de alegria e felicidade. Era uma lata, uma pequena lata, uma simples lata, mas era o seu troféu. Talvez levasse apenas um quarto de litro de leite. Mas estranho! As letras que tinha nos papéis que estavam colados naquela lata, eram iguais às que já aprendera na escola, mas não conseguia ler o que ali estava escrito. Grego não era, devia ser americano. Curiosamente no papel, ao lado das letras, estavam desenhadas maçarocas de milho. O enigma estava decifrado: a lata continha milho. Francisco achou aquilo muito esquisito. Então os gregos ou os americanos metem milho dentro de latas!? Ele cuidava que dentro de latas só se metiam sardinhas e atum! Pensou atirar com a lata, pois milho pronto para cozer ou assar tinha ele muito, nas Furnas, no Porto, no Mimoio, na Bandeja e no Descansadouro. Não precisava daquele, nem nunca havia comer milho guardado dentro duma lata. Bom para comer era o milho fresquinho, com a maçaroca bem assada e embrulhada na própria casca, ainda verde. Mas depois lembrou-se do orgulho que seria chegar a casa com aquele pequeno troféu, mostrá-lo aos irmãos, aos tios, aos amigos e até na escola, aos colegas e à senhora professora. Por isso guardou-a muito bem escondida, debaixo da soera, sobre a barriga, o mais disfarçadamente possível. É que um guarda estava mesmo ali, à frente dele, à mão de semear. Este, vendo o fedelho a esquivar-se, desconfiou. Aproximou-se e de imediato, carregando no tom de voz e na postura da autoridade que cuidava representar, gritou:
- Olha lá, ó badameco! Mostra o que levas aí escondido!
- Mas eu não levo nada! – Respondeu a criança, tentando esquivar-se.
- Ai levas, levas – e agarrando-o por um braço, ordenou. – Ora deixa ver o que levas aí debaixo da soera.
Como o garoto teimasse, tentando fugir e resistir às potentes garras da autoridade, o guarda pegou no cacete, atirando-lhe uma forte paulada nas pernas. A lata de milho caiu, rolou pelo chão, enquanto o miúdo, lavado em lágrimas, fugia dali a sete pés, não fosse o guarda dar-lhe uma segunda cacetada, mais forte e mais dolorosa do que a primeira.
Passados alguns dias, toda a Fajã ficou alarmada com o fumo e o fogo que saíam da chaminé duma casa, pertencente aos pais de um dos guardas que tinham feito vigilância ao naufrágio do Papadiamandis. Cuidando que era um incêndio, acorreram os vizinhos, acudiram os transeuntes e até os sinos da igreja tocaram a rebate. Labaredas de lume enormes e alaranjadas saíam pela chaminé, acompanhadas por negros rolos de fumo e de rebentamentos e estalidos estranhos. Nada de grave, afinal. Apenas alguém, inadvertidamente, incendiara alguns very lights retirados do Papadiamandis. Além disso, espalhados por toda a casa, podiam ver-se variadíssimos objectos e bugigangas diversas retirados dos destroços do navio naufragado. Entre eles estavam várias latinhas de milho.
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PADRE LUÍS CARDOSO
O Padre Luís Cardoso faleceu no dia 3 de Junho de 2011, com 80 anos de idade. Luís Cardoso era natural da Fajã Grande, Ilha das Flores, onde nasceu a 11 de Outubro de 1930, numa das últimas casas da Rua da Via d’Água. Filho de António Augusto Cardoso (Ti Francisco Inácio) e de Maria Augusta Fagundes Cardoso. Era também irmão do Pe António Cardoso, também já falecido e que durante muitos anos paroquiou na ilha do Faial, mais concretamente nas freguesias da Praia do Norte e Feteira. Frequentou o Seminário de Angra ente os anos de 1946 e 1958, a expensas da Diocese de Fall River dos Estados Unidos da América, dadas as dificuldades económicas dos pais, comuns à maioria das famílias da Fajã Grande, na altura. Essa foi a razão também porque entrou para o seminário, já um jovem com dezasseis anos.Terminado o curso Teológico, ordenou-se sacerdote em 15 de Junho de 1958, na Sé Catedral de Angra, pelo então bispo da diocese, D. Manuel Afonso Carvalho. Após a ordenação seguiu para os Estados Unidos, mais concretamente para a diocese de Fall River onde trabalhou ao longo de toda a sua via, paroquiando como Vigário as Paróquias de S. João Batista e da Imaculada Conceição em New Bedford e como Pastor as Paróquias de Nossa Senhora da Saúde, do Espírito Santo e de S. Miguel em Fall River. Desde 2008, altura em que se deslocou a Angra para celebrar as bodas de ouro sacerdotais, que residia na Casa Sacerdotal "Cardeal Medeiros" naquela cidade. Tendo abandonado a Fajã Grande ainda jovem, a ela voltava durante uma boa parte das suas férias de verão, quando seminarista. Anos mais tarde, quando já residia e paroquiava nos Estados Unidos, também visitou a sua terra natal por várias vezes. Na década de cinquenta ainda viviam na Fajã alguns de seus irmãos: o Francisco, o Antonino, o José, o João e a irmã Maria., com os quais passava as suas férias, dado que, nessa altura, os seus pais já haviam falecido devido à sua avançada idade, uma vez que ele era o filho mais novo.
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OS BOIS DO CORVO
Contavam as pessoas mais antigas da Fajã Grande que, noutros tempos, quando não havia gado suficiente nas Flores para matar pelas festas do Senhor Espírito Santo, as pessoas, por vezes, tinham que ir ao Corvo comprá-lo para assim o poder matar, a fim de que todos, ricos e pobres, no dia de Pentecostes, tivessem pão e carne, à sua mesa, em honra do Divino Espírito Santo. A dada altura do ano, os cabeças da festa iam à ilha vizinha, escolhiam as rezes que achavam mais gordas e bonitas e apalavravam-nas. Mas os animais continuavam lá, a crescer e a engordar até às vésperas da festa, altura em que eram trazidos, de barco, para as Flores.
Num certo ano, em que se apalavrou uma junta de bois no Corvo, chegou-se à quinta-feira antes do domingo de Pentecostes e o mar embraveceu. O barco em que iam buscar os animais era pequeno e fraco e não aguentava com a braveza do mar e a altivez das ondas. Ficaram todos consumidos sem saber o que haviam de fazer e pensaram que só se fossem à volta da ilha, ver se encontravam alguém que tivesse uma junta de bois e a pudesse e quisesse vender. Ainda tentaram, mas não o conseguiram e o tempo já era muito pouco, pois no dia seguinte, como era costume, teriam que matar o gado. Estavam os cabeças, juntamente com outras pessoas a discutir o que haviam ou não haviam de fazer, quando, de repente, viram chegar junto deles dois bois gordos e grandes mas todos alagados e a tremer de frio. Muito espantados, perguntaram uns aos outros:
- De quem serão estes lindos bois? Quem os terá trazido para aqui? De onde terão vindo para estarem assim todos alagados e enregelados?
Mas ninguém sabia dar respostas a estas perguntas. Um dos homens, porém, chegou-se para junto dos animais e passou-lhes a mão pelo lombo e depois de levar um dedo molhado à boca percebeu que os bois estavam molhados com água do mar.
Muito admirados os homens compreenderam, então, que aqueles eram exactamente os bois que tinham sido apalavrados no Corvo, algumas semanas antes, os quais, face à impossibilidade de serem transportados de barco, se tinham atirado à água e tinham feito a nado a viagem, de várias milhas, entre o Corvo e as Flores, para que assim se cumprisse a promessa que os cabeças tinham feito de dar pão e carne a toda a gente, em louvor do Divino Espírito Santo.
Todos louvaram e agradeceram aquele milagre do Senhor Espírito Santo e a festa, naquele ano, foi de arromba e feita ainda com mais fé e com muita alegria do que era costume.
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O FOGÃO PRIMUS
No final da década de quarenta e início da de cinquenta, a maioria das casas da Fajã, no que concerne à cozinha, sofreram uma grande e vantajosa revolução, com a chegada do “Fogão Primus”, utensílio doméstico hoje praticamente considerado peça de museu ou objecto de adorno. Na altura porém era de uma utilidade extrema, devido à sua eficácia, rapidez, eficiência, limpeza e facilidade de manuseamento, vantagens obtidas sobre as vetustas grelhas de ferro, colocadas sobre os lares, debaixo das quais se fazia o lume para em cima se colocarem os caldeirões, as chaleiras, os tachos ou as panelas. É que os Primus, para aqueles que os podiam comprar e que dispunham de dinheiro para o petróleo sobrepunham-se, inequivocamente, aos processos tradicionais de fazer o lume para cozinhar, sujos, tisnados, demorados, cansativos, gastadores de lenha e sobre os quais praticamente só se podiam utilizar caldeirões e chaleiras de ferro. Tacho colocado sobre grelha de lume ficava todo sujo e defumado.
O Fogão Primus era uma pequena e simples máquina que funcionava a petróleo. Este era colocado num recipiente ou depósito redondo, feito de latão amarelado, ao redor do qual estavam cravadas três hastes de ferro, arqueadas na parte superior, de forma a que pudessem sustentar uma grelha, também feita de ferro, sobre a qual eram colocados os tachos para cozinhar, os fervedores para ferver o leite ou os simples canecos de alumínio para o aquecer. O depósito do petróleo tinha três orifícios: um, muito fininho, bem no centro, outro na parte superior com um rosca accionada por um manípulo e que se destinava a introduzir o combustível e um outro na parte lateral onde estava colocada uma bomba a que se anexava uma espécie de êmbolo. Uma vez accionada, esta bomba forçava o petróleo a subir através do orifício existente no centro do depósito, com uma espessura cujo diâmetro era mais estreito do que uma corda de viola e no qual estava aplicada a “cabeça” do fogão. Esta era feita de um tubo de metal, no qual estavam aplicados, na parte mais baixa uma espécie de pequeno prato, também de metal, e na parte superior uma ampola, também de metal com pequenos orifícios. Para acender o Primus colocava-se um pouco de álcool ou petróleo no pequeno prato a que se ateava lume. Passado algum tempo e, quando o combustível do prato estava prestes s consumir-se, dando-se à bomba, o petróleo subia, sob pressão, através do fino tubo central e ia alimentar a parte superior da cabeça, saindo pelos pequenos orifícios, formando uma chana azulada que se poderia tornar mais forte ou mais fraca consoante a maior ou menor pressão que se dava na bomba. Quando o tubo entupia, desentupia-se com um espevitador, feito com uma tirinha de lata a que se prendia, numa das extremidades, um pedacinho de arame muito fino ou de corda de viola rebentada. Depois era colocar o tacho em cima da grelha e esperar que os alimentos cozessem. No caso do leite, porém, era preciso estar muito atento. É que caso ele fervesse e não estivesse ninguém ali por perto para apagar a chama ele subia, transbordava o tacho, sujava o fogão e, pior do que isso, derramava-se todo pelo chão.
O grande problema do Fogão Primus, para muitas famílias é que a sua compra implicava um custo elevado e, além disso, gastava muito petróleo, bastante mais caro e, sobretudo, mais difícil de adquirir do que a lenha ou os garranchos de incenso e “faeira” que consumiam os velhos lares e que eram apanhados nas terras de mato. Além disso, a pequena e frágil estrutura do Primus, não permitia que se lhe colocassem em cima grandes tachos, dado que a maioria das famílias era bastante numerosa. Por estas razões algumas pessoas não compravam o Fogão Primus
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A POPULAÇÃO DAS FLORES
Segundo os «Censos 2011», realizados em Portugal, no pretérito mês de Março, a população actual da ilha das Flores é de apenas 3.789 habitantes, dos quais 2.228 pertencem ao concelho de Santa Cruz e 1.501 ao das Lajes. Relativamente às freguesias, obviamente que a mais populosa é a freguesia de Santa Cruz, que inclui a Vila com o mesmo nome e o lugar da Fazenda e tem, de acordo com aqueles censos, 1.810 habitantes, enquanto a freguesia das Lajes, na qual se situa a outra vila da ilha, tem, apenas, na actualidade 627 habitantes. Quanto às restantes freguesias da ilha o seu número de habitantes é o seguinte, a começar pelas mais populosas: Ponta Delgada 358 habitantes, Fazenda das Lajes 257, Lomba 206, Fajã Grande 199, Cedros 152, Lajedo 93, Caveira 77, Fajazinha 76 e Mosteiro apenas 43 habitantes.
Números muito reduzidos, se tivermos em conta que na década de setenta a ilha das Flores tinha mais de seis mil habitantes e na de cinquenta, quase oito mil. Nessa altura, ou seja no início da década de cinquenta a Fajã Grande tinha 794 habitantes ou seja mais do que a vila das Lajes tem actualmente. Em meados da referida época esse número já seria aproximadamente de 550 habitantes. De todos os recenseamentos de que há memória, realizados nas Flores, sabe-se que aquele em que o número de habitantes da ilha foi mais elevado foi o de 1814, altura em que foram recenseados 11.827 pessoas na ilha, um número bem mais elevado do que o actual. No último recenseamento realizado no ano de 2002, a população das Flores era de 3.992 habitantes. Assim, verifica-se que a ilha, numa década perdeu 206 dos seus habitantes.
Texto publicado no “Pico da Vigia “ em 07/06/11
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O MÊS DE NOVEMBRO E AS NOVENAS DAS ALMAS
A devoção e o culto das almas ocupavam literalmente um lugar de relevo no top da religiosidade e das celebrações litúrgicas, na Fajã Grande. Havia entre toda a população uma muito acentuada espécie de “cultura do além”, repleta, por um lado, de mitos, lendas, tradições, extravagâncias, ingenuidades e medos, mas, por outro, eivada de convicções embora limitadas, certezas geralmente inconsequentes, esperanças inexplicavelmente obscuras e de quotidianas e convictas realizações. Daí que o mês de Novembro se tornasse um mês especial, uma espécie de mês mítico, do além, por ser o mês das almas. Todos os dias, com excepção dos dias um e dois e dos domingos, realizava-se, na igreja paroquial, a “novena das almas”. Tratava-se logicamente de uma expressão popular pouco correcta, uma vez que as celebrações não se limitavam aos tradicionais nove dias próprios das novenas, mas prolongavam-se por todo o mês. Por isso, o mês de Novembro também era chamado mês das almas.
Já noite escura a igreja enchia-se de gente como se de domingo se tratasse e era celebrada missa, geralmente missa dos defuntos, excepto nos dias em que tal não era permitido liturgicamente, por se tratar duma festividade de 1ª classe. A igreja permanecia propositadamente escurecida, sendo apenas iluminada pelas velas do altar-mor e por outras seis encravadas em outros tantos gigantescos castiçais colocados ao redor de um enorme tapete preto debruado a amarelo, estendido bem no centro do cruzeiro, logo a seguir à capela-mor. A escuridão do templo, por um lado, convidava e proporcionava aos crentes um ambiente mais propício à oração e à reflexão sobre o mistério da sua própria morte e, por outro encenava uma espécie de enquadramento daquilo porque todos, sem distinção, já tinham passado – a lembrança da morte de algum familiar.
De seguida o pároco envergando a capa de asperges preta e barrete de três quinas, colocava-se estrategicamente à cabeceira do tapete e, voltado para o povo, rezava um responso por cada um dos agregados familiares da Fajã, agrupados ao longo dos vários dias, desde o cimo da Assomada e até ao fim Via d’Água. Como as famílias obviamente eram muitas mais do que os dias do mês, o pároco agrupava em cada dia o número razoável e adequado de agregados familiares, sendo que, no entanto, rezava separadamente os responsos, ou seja um pelos defuntos de cada família. Entre a reza de cada responso o pároco pegando no hissope encharcava-o na caldeirinha da água benta que o sacristão lhe apresentava, dava uma volta ao tapete e aspergia-o em cruzes sucessivas dos quatro lados, enquanto os sinos dobravam a finados.