PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A ANTIGA PARÓQUIA DAS FAJÃS (ILHA DAS FLORES)
A zona das Fajãs, ou seja o espaço encastoado entre a rocha e o mar que vai da Portal ao Risco e que constitui a costa mais ocidental das Flores terá começado a ser desbravada em meados do século XVI, com os primeiros núcleos populacionais estáveis a surgirem pouco depois Já estruturado como povoado, o lugar da Fajãzinha foi em Julho de 1676, por provisão do bispo de Angra D. Frei Lourenço de Castro, desanexado da paróquia das Lajes das Flores, à qual pertencia apesar da grande distância e dos maus ou inexistentes caminhos, e erecto na paróquia de Nossa Senhora dos Remédios das Fajãs, então com sede na igreja de Nossa Senhora dos Remédios da Fajãzinha, mas com jurisdição que abrangia toda a costa oeste da ilha, desde a Ponta da Fajã até ao Mosteiro, englobando assim os lugares de Ponta, Fajã Grande, Caldeira e Mosteiro e alguns outros desabitados desde o fim do século XIX. A freguesia da Fajãzinha é assim a quarta mais antiga da ilha, precedida em idade apenas pelas duas vilas e por Ponta Delgada.
Para constituir a nova freguesia, o lugar da Ponta da Fajã foi desanexado da paróquia de São Pedro de Ponta Delgada, à qual pertencia desde a criação daquela freguesia, e integrado com o lugar da Fajã Grande na nova paróquia, cuja delimitação teve lugar nos dias 12 e 13 de Julho de 1676, na presença do ouvidor eclesiástico, padre Domingos Nunes Pereira, e do primeiro pároco da freguesia, padre André Alves de Mendonça. A freguesia das Fajãs estendia-se por mais de duas léguas ao longo da costa oeste da ilha, desde a Ribeirinha do Miradoiro, na Rocha do Risco da Ponta da Fajã, até à Ribeira da Lapa, no Mosteiro. Para além das actuais povoações, incluía ainda alguns lugares então habitados, como sejam a Fajã dos Valadões, a Ribeira da Lapa, o Pico Redondo e os Pentes, todos hoje abandonados.
A escolha do lugar da Fajãzinha para sede da nova paróquia deveu-se ao facto de já lá existir, desde o ano anterior (1675), uma pequena igreja localizada no chamado Adro Velho, nas imediações da actual igreja. Esta igreja ou ermida era muito pequenina e incompleta, apenas vindo ter uma torre sineira no ano de 1747, conforme consta de uma lápide ainda existente e colocada no actual templo. A igreja hoje existente começou a edificar-se a 7 de Abril de 1776, embora em 1771 já se partisse pedra para a obra. A sacristia norte apenas foi construída em 1787. A torre ficou por acabar durante muitos anos, já que apenas no verão de 1896 se deu início à obra para a sua conclusão. O último enterramento no interior da igreja ocorreu a 23 de Maio de 1834, ficando o cemitério concluído antes de 1868.
Assim, desde muito cedo a Fajãzinha desempenhou um papel administrativo muito importante de relevo no conjunto da ilha das Flores, já que ela foi, desde o longínquo ano de 1676 e até meados do século XIX, sede paroquial das Fajãs, englobando na sua jurisdição quase toda a costa ocidental da ilha. O Mosteiro só em 1850 ascendeu a freguesia, a que se seguiu, em 1861, a criação da freguesia da Fajã Grande, estabilizando a actual divisão administrativa da zona.
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MONTANHA DO MEU DESTINO
(POEMA DE JOSÉ ENES)
Montanha do meu segredo
Montanha do meu destino
Tocaste-me com um dedo
Imprimindo em mim um signo:
Quando me viste nascer.
Montanha da minha dor,
Montanha do meu chorar;
Olhaste-me com amor,
Com um fundo e puro olhar:
Quando me viste nascer.
Montanha dos meus desejos,
Da minha louca ambição;
Encheste-me a alma com beijos,
Do fundo do teu vulcão:
Quando me viste nascer.
Montanha da minha sorte
Oh’ génio do meu viver;
Encomenda-me na morte
Quando me vires morrer.
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A FAJÃZINHA
Paredes meias com a Fajã Grande situava-se a freguesia da Fajãzinha. Separadas pelo imenso e por vezes intransponível caudal da Ribeira Grande, apesar de vizinhas ficavam, por vezes, tão distantes que deslocar-se da Fajã à Fajãzinha era quase um acto heróico, uma aventura, sobretudo para os mais pequenos, que ao vir esperar os americanos e outros passageiros vindos no Carvalho, se quedavam pela Eira da Cuada, junto ao Calhau de Nossa Senhora, lá no alto da ladeira do Biscoito.
Anichada na encosta sueste de um largo vale, aberto sobre o mar, a Fajãzinha constitui, na realidade, uma pequena fajã delimitada a nordeste pelo curso da Ribeira Grande e a Sul pela rocha dos Bredos, no cimo da qual foi construída e inaugurada em 1949, a 14 de Setembro, dia em que a Igreja Católica celebra festa litúrgica da “Exaltação da Santa Cruz” um grande cruzeiro, num alto sobranceiro à freguesia, como que a abençoá-la. O território da freguesia, no entanto, prolonga-se para o interior da ilha, por um extenso planalto irregular, contendo diversas turfeiras e maciços de floresta natural, rica em plantas endémicas, entre as quais se destaca o cedro-do-mato, produtor de valiosa madeira utilizada no artesanato local. Nesta região existem algumas belas lagoas e diversas ribeiras, muitas das quais caem em impressionantes e magníficas quedas pela rocha que circunda o povoado e as terras baixas. A maior e mais bela destas cascatas, com cerca de 300 metros de altura, é da Ribeira Grande, a maior torrente de água da ilha das Flores, que, apesar de bela e majestosa, provocou inúmeras inundações ao longo da história da freguesia, muitas delas com trágicas consequências.
A região onde se situa a freguesia, com o seu relevo marcado pela presença de grandes falésias e enormes rochedos expostos, forma uma paisagem de grande beleza que João Vieira descreve assim: “Na encosta íngreme do vale, a mão do homem, com muito suor, construiu a sua igreja e as casas, abriu o caminho onde penosamente deslizaram "corsões" (zorras), meio de comunicação com o resto da ilha. Admirável exemplo da implantação no terreno em harmonia com a paisagem. Visto do alto, o casario, talvez por ciúme, corre para o mar, acompanhando a Ribeira Grande, que por mais de quatro séculos abasteceu de aguadas a navegação que sulcou os mares entre o Velho e Novo Mundo. Entre searas de milho que circundam o casario branco, uma estrada de asfalto negro serpenteia entre a verdura. Se o paraíso bíblico tivesse existido à beira-mar… bem poderíamos pensar que este recanto lhe pertenceu…”
Apesar de historicamente importante e de ter sido a partir dela que se originou a freguesia da Fajã Grande, a Fajãzinha é, actualmente uma das freguesias menos populosa da ilha das Flores, com apenas 72 habitantes, segundo os censos 2011. Apesar de pequena é a única freguesia da ilha que mantém, actualmente, uma Filarmónica: a Sociedade Filarmónica Nossa Senhora dos Remédios, fundada em 1951, com o apoio do pároco de então, o padre António Joaquim de Freitas, que paroquiou a freguesia durante mais de quarenta anos.
Desde a sua génese que a Fajãzinha foi uma freguesia voltada para as actividades agrícolas, hoje quase exclusivamente centradas na criação de gado bovino, aproveitando a riqueza dos seus viçosos e verdejantes pastos e a enorme quantidade água que brota do seu subsolo. Crê-se que a Fajãzinha seja mesmo a freguesia portuguesa com mais água no subsolo. Para além da pecuária apenas existe um restaurante, “O Pôr do Sol” e um pequeno estabelecimento comercial.
A Fajãzinha orgulha-se de ter no seu território algumas das paisagens naturais mais belas dos Açores, muitas delas disputadas com a Fajã Grande, com destaque para as cascatas da Ribeira Grande, do Ferreiro, o Poço da Cascata do Ferreiro, o Miradouro de Fajãzinha e as lagoas do planalto interior da ilha. Por sua vez, entre o seu património edificado destacam-se a igreja paroquial, edificada em 1778, com três naves, divididas por cinco arcos e uma torre sineira, o império do Divino Espírito Santo do Rossio, inaugurado em 1864, o moinho de água da Alagoa, junto à estrada, de duplo engenho e ainda pode laborar e a garagem dos Terreiros, há alguns anos o ponto de partida e de chegada obrigatório para quem se deslocava à freguesia em transporte público. Em frente da garagem, inicia-se também o caminho que conduz à Rocha da Figueira, percurso que se assemelha a uma autêntica escada de pedra. Quase no final da descida, desemboca-se na Lagoinha, um sugestivo paul repleto de ervas aquáticas e de inhames nas suas margens alagadiças e pantanosas.
A freguesia realiza a suas principais festas em honra de Nossa Senhora dos Remédios no último domingo de Agosto, a festa do Patrocínio em Outubro e a do Senhor dos Passos na Quaresma. Como em todas as povoações dos Açores, as festas do Espírito Santo, no Domingo de Pentecostes, têm uma partícular importância.
A gastronomia local tem como confecções mais específicas a sopa de agrião de água, o inhame com linguiça, o folar da Páscoa, as filhós do Entrudo e os molhos de dobrada, enquanto do seu artesanato fazem parte os trabalhos em vime, nomeadamente cestaria e mobília, fruto da abundância de água da localidade, de miniaturas em madeira de cedro-do-mato e de tapetes em casca de milho.