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FALAVAM-ME DE AMOR

Segunda-feira, 23.12.13

(SONETO DE NATÁLIA CORREIA)

 

 

Quando um ramo de doze badaladas

se espalhava nos móveis e tu vinhas

solstício de mel pelas escadas

de um sentimento com nozes e com pinhas,

 

menino eras de lenha e crepitavas

porque do fogo o nome antigo tinhas

e em sua eternidade colocavas

o que a infância pedia às andorinhas.

 

Depois nas folhas secas te envolvias

de trezentos e muitos lerdos dias

e eras um sol na sombra flagelado.

 

O fel que por nós bebes te liberta

e no manso natal que te conserta

só tu ficaste a ti acostumado.

 

 

Natália Correia, O Dilúvio e a Pomba

Lisboa, Publicações D. Quixote, 1979

 

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publicado por picodavigia2 às 18:58

A FURNA

Segunda-feira, 23.12.13

Quando eu era criança,

Havia (ali, para os lados do Caneiro do Porto Velho),

Encastoada entre os rochedos negros do baixio,

Uma furna,

Que imaginava minha.

 

Naquela furna eu me refugiava,

Nela me escondia,

Naquela furna eu sonhava.

 

Sonhava que seria marinheiro,

Viajando em barcos de espuma branca,

Na demanda de terras distantes,

Povoados de castelos de gelo

E de cidades doiradas.

Atracava em portos com chaminés sem fumo

A balizarem o clarear das madrugadas.

Estivadores perdidos em neblinas!

 

Sonhava que seria pastor de ovelhas,

Blocos de gelo fumegante,

Nas longínquas pastagens da serra Nevada,

Como meu bisavô,

Cajado em punho,

Atento aos lobos, aos ladrões e aos índios.

Combatendo ursos e pumas,

Que sem tréguas,

Se atiravam ao odor idílico das ovelhas.

Lobos famintos em festivais de desejos.

 

Ou então sonhava que seria peregrino,

Caminhante solitário,

Perdido em terras distantes,

Salvo por princesas, vestidas de púrpura

Com diademas brilhantes a encimar-lhes o rosto.

Recolhiam-me em meigos requebros

E depositavam-me em salões perfumados com alabastro.

Espelhos de cristal em paredes de marfim!

 

Um dia cresci

E

Abandonei a furna.

Ela ficou deserta!

Ninguém, mais se refugiou naquela furna.

Já ninguém nela se abriga.

Pior…

Ninguém ali se esconde

Para sonhar

 

Agora,

Tarde,

Muito tarde,

Regresso.

(O Caneiro foi transformado em plataforma de cimento!)

A furna ainda ali está,

Carcomida,

Deserta,

Abandonada,

Triste e solitária.

Jaz em musgos,

Sem sonhos,

Como se estivesse morta,

Perdida entre o vai e vem das marés.

 

A furna,

A furna que imaginava minha,

Onde me refugiava outrora,

Hoje,

É um buraco desolado, na rocha negra do baixio..

 

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publicado por picodavigia2 às 16:43

NOITE DE NATAL

Segunda-feira, 23.12.13

A noite estava fria e escura. Das encostas do Pico da Vigia e do Outeiro desciam sibilos de vento, míticos e sonantes, que se diluíam sobre os telhados das velhas casas da Fajã, perdendo-se na imensidade escura do Oceano. No ar, pairava um cheiro a canela e um perfume de hortelã e, das janelas semicerradas das pequenas habitações, saía uma luz trémula, baça e insegura. As ruas eram um deserto escuro e quase terrificante.

Na torre da igreja, os sinos haviam, há pouco, anunciado a missa do galo. Esperavam-se, agora, as três badaladas, indicadoras da aproximação da hora. E estas não se fizeram esperar. Logo que soaram na velha torre, sobrepondo-se aos sibilos angustiantes do vento e ao bramido roufenho do mar, como que misteriosamente, de todas as portas, começaram a sair vultos negros, inseguros e indefinidos. Enrolados em roupas grossas, tapavam a cabeça com mantas ou bonés, amparavam-se à incerteza, balouçavam-se no escuro. Uns, seguiam em pequenos ranchos, transportando lanternas de vidro tisnado e luz amarelada, baça e trémula. Outros seguiam só, guiando-se no escuro, amparados a bordões e às paredes e muros dos pátios. Sincronamente, fechavam as portas e encaminhavam-se, para a igreja, situada no centro da freguesia.

Eu era um deles!... Dos mais pequenos, dos mais hesitantes e medrosos…

Era o primeiro Natal em que me fora reconhecido o direito de ir à missa do galo, o que, para mim significava a certeza de já ser um homenzinho. Por isso me preparara dignamente para tal evento. A roupa, apesar de pobre, era a melhor que tinha. Além disso, contrariamente ao habitual, ia calçado, o que me dava um ar de maior dignidade e me conferia uma importância desusada. O silêncio escuro da noite, apenas entrecortado pelo contínuo silvar do vento e pelo bater emaranhado dos sapatos nas pedras da calçada, porém, assustava-me.

Saíramos juntos de casa: meu pai, meus irmãos e eu. Porém, ao passarmos frente ao botequim do Aires, onde os homens, habitualmente passavam os serões e a cujo balcão alguns já estavam encostados, meu pai, assumidamente arredado das cerimónias religiosas e das celebrações litúrgicas, despediu-se de nós e ficou por ali, enquanto seguíamos num grupo que, a pouco e pouco, à medida que se aproximava da igreja, se avolumava e quase transformava em romaria.

Aquela noite, não apenas em minha casa, mas também em todas as da freguesia, fora diferente. De manhã, minha irmã Amélia matou um galo, depenou-o e fez-lhe vinha-d’alhos. A casa foi lavada de ponta a ponta, tarefa em que eu, contra a minha vontade, fui cúmplice. Passei a tarde a acarretar baldes e baldes de água, da fonte para casa. Um bom par de metros!... E os baldes eram pesadíssimos!... Era tal a dificuldade que tinha em fazê-lo, que, numa das viagens, uma das Silveiras, apiedando-se de mim, veio pôr-me o balde em casa. Que alívio! Pena ter sido só uma vez…

De tarde, minha irmã fez o arroz doce e polvilhou-o com canela. Cozeu um caldeirão de inhames e guisou o galo. À hora da ceia, sentámo-nos à mesa. Tudo era diferente, naquela noite. Sobre a toalha esbranquiçada, tilintavam pratos e talheres, contrariamente à habitual tigela de sopas de pão de milho, por vezes bolorento, e leite. Aos inhames, muito quentinhos, a fumegar, juntava-se, em cada prato, um pedaço do galo, acompanhado dum molho aromático, muito bem temperado. Depois o arroz doce, muito amarelado, salpicado com canela. E logo um prato a cada um! Cada qual poderia saboreá-lo, ali, inteirinho, ou então, comer apenas metade e guardar o resto para o dia seguinte:

- Guardá-lo na amassaria é um risco enorme – sentenciava o Alípio – É que o lambão do Justino, levantando-se, durante a noite, limpa tudo o que lhe aparecer pela frente.

Pelo sim pelo não, todos, seguindo a sugestão do Alípio, optámos por limpar, na íntegra, o pratinho do arroz doce. Ninguém quis arriscar. Comê-lo inteirinho era jogar pelo seguro… No dia seguinte se veria…

Ao lado, num dos cantos da sala, estendia-se um grande presépio. Para além da gruta, com as figurinhas, possuía casas, caminhos, ribeiras, lagos,montes, ovelhas, pastores, uma igreja, um anjo e uma estrela grande e brilhante. Num dos cantos o sumptuoso palácio de Herodes e no outro a humilde casa de Barbearias, onde São José fora pedir lume, para fazer a fogueira e aquecer a água para lavar o Menino. Fora montado alguns dias antes, com a colaboração das tias da Fontinha, depois de muita hesitação e discussão:

- Quem está de luto, ainda por cima, pela mãe, não faz presépio – opinavam os mais conservadores.

- São crianças, ninguém leva a mal. E um presépio não é nenhuma festa. – decretavam os mais tolerantes.

Foi esta a opinião que prevaleceu e o presépio fez-se, mas sem a motivação habitual, pois era certo e sabido que o Menino Jesus, este ano, não traria nada, embora eu não percebesse bem porquê…

Era nisto que cismava quando transpusemos o tapa-vento. Entrámos no templo semi-escuro. Apenas a lâmpada do Santíssimo e, no altar-mor, algumas velas acesas. Esquivei-me de junto de minha irmã, de ir para os lugares das mulheres, e esgueirei-me, na companhia de meu tio Lúcio, para o coro.

O templo estava repleto de vultos negros, de tossidelas, de rouquidões, de arrastar de cadeiras, de bichanar de orações e de cheiro a velas a arder. De repente, tio Onofre, de opa vermelha, saindo apressadamente da sacristia tocou, veementemente, uma enorme campainha. Toda a gente se levantou e, de imediato, fez-se um enorme
silêncio. Padre Silvestre emergiu, de seguida, todo de branco, envergando, na cabeça, o barrete negro das três quinas, enquanto segurava na mão o cálice devidamente coberto com um véu esbranquiçado. Fazendo uma enorme genuflexão diante do altar-mor, tirou o barrete, preparou o altar do sacrifício, genuflectiu frente ao sacrário e bichanou, silenciosamente, as primeiras orações, em latim, às quais, apenas, tio Onofre respondia, sem se perceber nada ou coisa nenhuma:

O povo, de joelhos e contrito, batia com a mão direita no peito e inclinava, religiosamente, a cabeça...

Pouco depois, o padre aproximou-se do centro do altar, ergueu os braços e entoou:

- “Glo-ó-ó-ó-óó-ria in excelsis-sis De-e-e-o”.

Tio Onofre, já preparado, de campainhas em riste, começou a badalá-las prolongadamente com enorme intensidade, enquanto os sinos repicavam e a igreja se enchia de luz e de cor.

Passados estes momentos de êxtase, comemorativos do nascimento do Menino Jesus, a missa continuou, entre preces, louvores e orações. O povo levantava-se, sentava-se, ajoelhava e tornava a sentar-se, consoante as indicações da campainha de tio Onofre.

No fim, padre Silvestre, envergando a capa de asperges, dirigiu-se para o altar da Sr.a do Rosário. Era lá, na parte mais baixa, num gruta simulada, que estava o Menino, com a Virgem, São José, a vaca e o burro. Eram imagens enormes, comparadas com as do meu presépio.

O padre recebeu das mãos de tio Onofre o turíbulo fumegante. Deitou-lhe mais incenso, extraído da naveta com uma pequena colher e, balouçando-o diante das figuras do presépio, enchia a igreja de fumo, de odor e de louvor. Depois, tomou o Menino nas mãos, beijou-O e colocou-se no meio do cruzeiro, enquanto o povo formava uma enorme fila para também O beijar.

Eu não fui excepção. Também me incorporei, numa marcha lenta...

Ao aproximar-se a minha vez, verifiquei que tio Onofre segurava uma cesta, na qual, à medida que beijavam o Menino, a maioria dos fiéis deitava uma moeda.

De repente levei a mão a bolso. Lá estavam os vinte centavos que minha irmã me dera, para comprar um chocolate no dia seguinte. Apenas naquele dia e no da festa da Sra da Saúde gozava privilégio semelhante...

Sobre mim recaía a certeza de que, este ano, o Menino Jesus não nos traria nada. Todos confirmavam: - “A quem está de luto, ainda por cima pela mãe, o Menino Jesus não traz presentes.”

Eu, porém, achava esta razão tão indigna do Menino Jesus! Que culpa tinha eu de estar de luto!? Já não bastava ter ficado sem mãe!? E agora ficar sem prenda!? De repente, sem saber porquê, decidi negociar com o Menino. Preferia ficar sem a moeda, não comer o chocolate no dia de Natal, mas sentir a alegria de chegar a casa e ter uma prenda junto do presépio!... Disso não podia abdicar!... E depois dizer ao Câncio, ao Rodrigues e a tantos outros, que não tivera nada!?...Não podia ser...

Hesitei!... Levei a mão ao bolso, senti a moeda fria. Tirei-a, olhei-a e voltei a guardá-la no bolso e a hesitar... A minha vez de beijar o Menino, no entanto, aproximava-se... E eu não conseguia decidir!...Hesitava e continuava a hesitar...

Porém, ao aproximar-me do padre, os meus olhos fixaram-se nos do Menino. Enchi-me de confiança e de uma enorme coragem, beijei-lhe um dos pezinhos, ao mesmo tempo que, levando a mão ao bolso e pegando novamente na moeda, deitava-a na cesta e fazia com Ele um contrato:

- Vou dar-te a moeda, mas tens que me dar um presente.

Terminada a cerimónia regressámos a casa. No adro as pessoas cumprimentavam-se e desejavam umas às outras, incondicionalmente:

- Bom Natal!... Bom Natal!...

Nós tivemos que nos esquivar à frente. Era-nos interdito, porque de luto, receber as boas-festas ou dá-las aos outros!...

Ao passar, de novo, em frente ao Aires, meu pai, sentindo a nossa presença, juntou-se a nós...

Chegámos a casa! Dirigi-me para a sala, numa correria louca, na esperança de saber se o Menino Jesus fora fiel ao nosso contrato...

E não é que foi!... Lá estava, junto à gruta, um enorme embrulho. Fui eu que o abri! Eram figos passados!...Tantos figos passados!...

Sentámo-nos todos à mesa da cozinha e comemo-los com pão. Que maravilha! Valera a pena hipotecar os vinte centavos, embora, nunca o tenha confessado a ninguém.

 

...

 

Só algum tempo depois, soube que o Aires vendia figos passados no botequim e que meu pai, a propósito de tratar das vacas, tinha vindo a casa, durante a missa do galo.

 

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publicado por picodavigia2 às 15:02

ALENTEJO

Segunda-feira, 23.12.13

O Alentejo nem sempre teve o vigor e a beleza que hoje se reflectem quer na imensidade das suas planícies, quer na alta nobreza dos seus montados de sobro e azinho, ou ainda no esteval cerrado, na giesta ramalhuda ou no piorno em mata, que por toda a parte florescem. Hoje, a terra senão fecunda é atraente, a planície senão fértil é serena e dos seus rios transborda uma esperança de tranquilidade quase transcendente e infinita. Há qualquer coisa de imponente na sua aridez, na sua secura e no seu aspecto semidesértico. A paisagem transtagana transporta-nos na contemplação dum idílio permanente e bucólico entre o céu e a terra, numa aspiração infinita de sonhos transcendentes e inatingíveis. Se por um lado, o Alentejo é um sertão árido, uma gândara ou um chavascal povoado de feras e de uma secura desesperante, por outro é um recanto ubérrimo onde a paisagem tem um cunho de grandiosidade e beleza que se impõem em cada momento e em cada espaço Delimitado pelas serras de S. Mamede e do Monchique, pelo Oceano Atlântico e pela serra Morena, já em Castela, é uma vastidão de planícies, fragmentadas pelas serras de Ossa, Monfurado e Portel e banhada pelos rios Tejo, Guadiana, Mira e Sado.

Assim como a terra, a sua grei também tem uma fisionomia especial, estigmatizada numa nobre independência e numa contumaz personalidade. Altivo e trabalhador, atlante de bondade e carinho, o povo alentejano mistifica-se numa mudez de reflexão e num silêncio observador, com um coração aberto e uma alma hospitaleira. Marca a sua individualidade, não apenas quando veste o pelico ou quando calça os safões, mas quando na sua rudeza e simplicidade manifesta a sua idiossincrasia, quer através da sua linguagem salpicada de frases típicas e de termos próprios e impressivos, quer por meio dos seus cantares e tradições, das suas festas e folguedos. A sua maneira de falar e de dizer, a riqueza e a variedade dos seus vocábulos transmitem-nos a sensação duma polifonia sublime e transcendente, repleta de irisações que o tempo e os homens, lentamente, mistificaram.

O Alentejo é, além do mais, um manancial infinito de costumes e tradições, muitas das quais, apesar de perdidas no tempo, reflectem o Alentejo árido de outrora, povoado de criações míticas e mitológicas, multisseculares, dos povos que séculos após séculos, milénios após milénios o foram povoando e construindo, na inevitável tarefa de o dominar e transformar, civilizando e domesticando os elementos da natureza.

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publicado por picodavigia2 às 14:38

NATAL DE ONTEM E DE HOJE

Segunda-feira, 23.12.13

{#emotions_dlg.xmastree}Num canto da sala, alcatifada e muito bem aquecida, junto à televisão, a mãe erguera-lhe a árvore de plástico, comprada numa promoção do Continente. Encheu-a de bolas de mil cores, de lâmpadas a piscarem alternadamente e pendurou-lhe sininhos de chocolate embrulhados em papéis prateados, debruados ornados a amarelo. De seguida, dirigindo-se ao garoto que, sem pestanejar, não tirava os olhos da “consola” que lhe algemava todos os gestos, movimentos, palavras e olhares, impedindo-o de qualquer contacto recíproco com quem quer que fosse, perguntou-lhe:

- Alvarinho, já escreveu ao Pai Natal, a pedir as prendas?

O garoto continuava absorto, alheado e insensível ao que quer que fosse, indiferente a quem dele se aproximasse, mouco perante quem com ele falasse.

A mãe insistiu:

- Alvarinho, já pediu as prendas ao Pai Natal?

O miúdo nada. A mãe repetiu mais uma vez, uma outra e ainda outra. O resultado, porém, foi o mesmo ou parecia ser pior ainda, uma vez que quanto mais a mãe repetia a pergunta mais o garoto parecia imiscuir-se nos meandros daquela pequena mas atractiva obra das novas tecnologias.

A mãe desistiu e, dando mais uns arranjos à árvore e colocando na mesinha ao lado um presépio de porcelana branca da Vista Alegre que retirara de um dos armários da sala, dirigiu-se para a cozinha, com a denodada intenção de orientar a empregada, na confecção das rabanadas, dos formigos, da aletria, dos sonhos, das filhoses e dos outros doces de Natal. Tudo deveria ficar pronto naquela tarde. Apenas o bacalhau, as couves, as batatas, a canja e o peru recheado ficariam para o dia seguinte, para a véspera de Natal.

O avô Álvaro, sentado numa confortável poltrona, no outro canto da sala e que se havia deslocado dos Açores exclusivamente para passar o Natal com o filho, a nora e o neto que moravam no Continente, observando aquilo tudo, quebrou o silêncio e contestando o que acabava de observar, comentou:

- Isto é que são tempos modernos! Quando eu era criança, o Natal era muito diferente deste Natal de hoje. Nem sequer existia o Pai Natal ou pelo menos não chegava às casas das crianças açorianas. No meu tempo quem dava as prendas era o menino Jesus. E que prendas, meu Deus. Por vezes não havia nada. Outras vezes um embrulho de figos passados. Era eu que fazia o presépio, era eu que preparava e arrumava tudo, de fio a pavio. E ficava tão feliz. Que diferença, meu Deus! Que diferença!

Levantou a cabeça. Um dos canais da Televisão transmitia, em directo, a festa do Natal dos Hospitais. Um dos apresentadores anunciava um convidado especial que iria dar o seu testemunho de Natal. Instintivamente ou porque já estivesse cansado, Alvarinho desligou a consola e também olhou a televisão. O entrevistado afirmava:

- …Mudam-se os tempos, mudam-se os costumes. Antigamente era o menino Jesus que trazia os presentes e hoje é o Pai Natal, o melhor amigo das crianças. Antigamente eram as crianças que construíam os seus presépios, hoje compram-nos feitos e as árvores de Natal são de plástico, compradas nos supermercados ou nas lojas dos chineses. Mas o espírito do Natal esse é o mesmo e, hoje como ontem, o mundo, nessa noite mágica, enche-se de paz, de amor, de alegria. Isso é o mais importante. Ontem como hoje o espírito do Natal é o mesmo, as vivências, os hábitos e os costumes das pessoas é que constroem um mito natalício diferente. Ontem como hoje, o Natal é, sem sombra de dúvida, uma festa de amor, de compreensão e de paz, sentimentos que devemos preservar e que as crianças, melhor do que ninguém, nos conseguem transmitir. Feliz Natal para todos!

Avô e neto olharam-se, reciprocamente, e sorriram.

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publicado por picodavigia2 às 00:36





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