PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
PALAVRAS, EXPRESSÕES E DITOS UTILIZADOS NA FAJÃ GRANDE (XIV)
Aicecrime – Gelado.
Andando e cagando – Desinteressar-se de algo ou duma conversa.
Andor – Afasta-te. Desaparece.
Antesdonte – Anteontem.
Apegado – Avarento, aquele que gosta muito de dinheiro.
Apertado – Com muita vontade de obrar.
Ápesteres – Par de cima da casa.
Arrematado – Prendado, com educação.
Atiradeira – Corda comprida com que se apertavam os fueiros do carro ou corsão, a meio da carga.
Bem perfeitinho - Criança muito bonita e saudável.
Boiceiro – Cadeira mítica, com pontas de fregos no assento, escondida atrás do altar, destinada a castigar as crianças que se portavam mal.
Bucha naife – Grande faca.
Caganita – Coisa pequena. Pessoa fraca,
Cara abogangada – Cara arredondada, malfeita e feia.
Carnegão – Parte dura e esbranquiçada com restos de sague que se tira das feridas secas.
Carnina – Diminutivo de carne
Chapéu de feiticeira – Cogumelo.
Derreado- Que tem dores nas costas (geralmente resultantes de muito trabalho)
Encarrilhar ui dentes – Apertar dos dentes uns contras os outros com força, em sinal de muita zanga ou fúria.
Espadana – Plata com folhas em forma de espadas, que desfiadas faziam fios e cordões.
Espiga – Parte superior do caule do milho, entre a maçaroca e a flor.
Está rachando meio-dia. – São precisamente doze horas ou meio-dia.
Estar farto e cheio – Estar completamente aborrecido, não ser capaz de suportar mais ignomínias.
Facão – Instrumento de ferro, semelhante a uma chave de fendas para a apanha das lapas.
Faeira – Faia.
Farrispa – Lasca ou farripa de madeira.
Fazer uma terra – Trabalhar uma propriedade de outrem, pagando com produtos da mesma.
Froiva – Inflamação dos dedos dos pés.
Ir graduar a vista – Consultar otftalmologista.
José ou Zé da Góstia – O mesmo que José ou Zé da Véstia, mas menos ofensivo.
José ou Zé da Véstia – Personagem fálica, com que se pretende despreciar a conversa com alguém
Lustro – Pomada para os sapatos.
Maçaroca – Espiga do milho.
Mandar para trás – Devover.
Manga-d’água – Tromba-d’água.
Matar um piolho em cima da barriga – Ter comido muito.
Milheiro – Parte inferior do caule do milho, entre o pé e a maçaroca,
Mexim – Máquinas de cortar o cabelo.
Não haver bafuja de vento – Não haver nenhum vento.
Num zape – Num instante.
Pachocadeira – Mulher que provoca muitos mexericos ou confusões.
Pachola – Vaidoso. Bem apresentado.
Pandulho – Grande barriga.
Pão-adubado – Massa Sovada, pão doce.
Presente – Cagadela.
Raite – Viagem.
Santola – Pessoa inocente e sem maldade.
Ter bico doce – Ser muito guloso.
Triola mal-amanhado – Pessoa desajeitada.
Vento de cima da terra – Vento de leste que soprava do lado do mato.
Xelepas – Chinelos.
Zarabana – Uma grande admoestação feita a alguém por ter cometido um acto pouco correcto ou ilícito.
Zimbro – Zimbreiro
Zinaibre – Verdete de que os metais se revestiam.
Zoar – Correr uma notícia falsa ou um mexerico
Zuniar –Dizia-se do vento quando soprava com muita força e como que assobiava.
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A IGREJA DA SENHORA DO CARMO DA PONTA
Situada bem lá no alto de uma pequena colina, sobranceira ao povoado, quase entre as últimas casas da Ponta e muito próxima da rocha, ficava a igreja da Senhora do Carmo, como diz G. Monterrey “esbelta na sua própria singeleza”. Altiva e imponente, embora simples e modesta, era ela que servia de local de culto ao povo da Ponta. Todas as celebrações litúrgicas ali tinham lugar, excepto as do Baptismo, do Crisma e a Comunhão Solene das Crianças. A administração destes Sacramentos era feita na Igreja Paroquial, juntando todas as crianças da freguesia, excepto o Baptismo que na altura era celebrado individualmente, embora em tempos idos, ali tivessem sido realizados.
A igreja, que tem como padroeira a senhora do Carmo, ficava implantada num adro nivelado, com acesso apenas por uma escada de degraus de pedra, voltados a Noroeste. O edifício é composto pelo corpo da nave, pelo corpo mais estreito da capela-mor, pela torre sineira que encosta, do lado esquerdo, à face da fachada e pelo corpo da sacristia que encosta à fachada lateral esquerda da capela-mor.
A fachada principal, a que se liga a torre sineira, é enquadrada pelo soco, pela própria torre sineira, pelo cunhal direito e por uma cornija que acompanha a inclinação das águas da cobertura, terminando a parte superior em forma triangular, encimada por uma cruz. Tem uma porta principal, em duas metades, encimada por um arco de volta inteira assente em impostas e duas janelas, em posição simétrica, situadas ao nível do coro que se sobrepõem logo na entrada do templo e delimitado por uma grade rectilínea. No eixo, acima das janelas, há um óculo circular, divido em pequenos vidros. Igualmente, por cima da porta de entrada, há uma pequena moldura rectangular que enquadra a inscrição "A. EGREIJA / D.N.S.D.C. / D.P.F.IDF. / N. ANNO. D. / 1898" , cuja leitura deverá ser a seguinte: A igreja de Nossa Senhora do Carmo da Ponta foi edificada no ano de 1898. Nesta altura era pároco da Fajã Grande o padre Alfredo Mariano de Sousa.
A torre sineira é composta por duas secções. A inferior é rematada pelo prolongamento horizontal da cornija de remate da fachada e tem um óculo em losango ao nível do baptistério. A secção superior assenta na cornija e tem dois vãos de sino rematados em arco de volta inteira assente em impostas: um na fachada principal e outro na fachada lateral esquerda. É rematada por uma cornija com um pináculo em cada vértice e encimada por um coruchéu hexagonal. Todos os vãos exteriores e interiores restantes são rematados em arco de volta inteira. Na parte inferior da fachada principal, a torre tem uma janela em forma de losango. A parte superior, a que se tem acesso por uma escadaria de pedra, tem janelas em cada uma das faces, mas apenas duas têm sinos.
A entrada principal da nave está protegida por um guarda-vento sobre o qual se situa o coro alto, em madeira, cujo acesso se faz do lado da epístola por uma escada em "L" também de madeira. Do lado do evangelho há uma porta de acesso ao piso térreo da torre sineira onde fica um pequeno baptistério, raramente utilizado. O acesso aos restantes pisos da torre sineira faz-se por uma porta no coro alto do lado do evangelho. Ao centro, em cada uma das paredes laterais da nave, há uma porta de comunicação com o exterior, ladeada por janelas ao nível superior. Do lado do evangelho, entre a porta lateral e o arco triunfal situa-se um púlpito com guarda em madeira pintada, sendo a consola (em forma de mísula gigante) e a escada de acesso em madeira envernizada. O corpo da capela-mor é acessível por um degrau de pedra onde assenta o arco triunfal. O acesso interno à sacristia faz-se por uma porta na capela-mor do lado do evangelho. A capela-mor tem um retábulo em talha pintada de sabor revivalista. Tanto o tecto da nave como o da capela-mor são em madeira a imitar abóbadas de berço. Por trás do altar mor existe um camarim que funciona como local de armazenamento de algumas alfaias e utensílio litúrgicos e objectos relacionados com a ornamentação e limpeza do templo.
O edifício é construído em alvenaria de pedra rebocada e pintada de branco, excepto o soco, os cunhais, as cornijas, as molduras dos vãos e os pináculos que são em cantaria à vista. As coberturas são de duas águas em telha de aba e canudo com beiral simples, excepto no corpo da sacristia que é de uma só água.
Na capela mor para além da imagem da padroeira estavam colocadas outras imagens, entre as quais a de São José, e no corpo da igreja, que não possui altares laterais, as da Senhora de Fátima e a do Coração de Jesus.
A igreja da Ponta foi construída em 1898. Contava-se que a sua construção se havia devido ao empenho e vontade do padre Henrique Augusto Ribeiro, padre natural dos Cedros e que deixou o seu nome ligado à construção de outras igrejas na ilha das Flores. A construção do templo ter-se-á iniciado cerca de três anos antes. Até 1922 a igreja da Ponta esteve provida de um sacerdote residente, pois ali existia um passal. O primeiro cura da Ponta foi o padre José Leal Furtado que ali permaneceu desde a edificação do templo até 1906, altura em que foi substituído pelo padre Alfredo Augusto Meneses e Santos, que ali permaneceu apenas durante dois anos. Nos dois seguintes o curato esteve a cargo do padre José Furtado Mota. O último cura da Ponta foi o padre Francisco José Gomes que ali permaneceu desde 1909 até 1922.
A igreja da Ponta teve obras de beneficiação em 1971, altura em que foi construída o novo adro e a actual escadaria.
NB – Parte destes dados foram retirados do Inventário do Património Imóvel dos Açores
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BOMBARDEAMENTO CONTÍNUO
“Vivemos ameaçados por um bombardeamento contínuo de notícias. Umas são boas e aliviam-nos. Outras menos boas, atormentam-nos. Mas ainda há as ridículas que nos deixam pasmados.”
Autore Ingnote
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JOGRAIS - O NABO GIGANTE
(BASEADO NO LIVRO DE ANTÓNIO MOTA COM O MESMO TÍTULO)
TODOS - Numa aldeia / à beira duma montanha / havia uma pequena casa / coberta de musgo.
SETE - Junto da casa havia uma horta.
UM - Na horta havia uma laranjeira.
UM- Que dava laranjas muito doces.
UM - Um limoeiro.
UM - Que dava limões muito grandes.
UM - Uma cerejeira.
UM - Que dava cerejas brancas.
UM - Três videiras.
UM - Que davam enormes cachos de uvas saborosas.
UM - Uma capoeira que tinha:
UM - Galinhas e galos.
UM - Perus.
UM - Codornizes e patos.
TODOS - Junto da casa havia uma horta.
SETE - Na horta havia um tanque.
UM - Por cima do tanque havia uma bica que deitava água fresca todo o ano.
TODOS - Numa aldeia / à beira duma montanha / havia uma pequena casa / coberta de musgo.
SETE - Na casa viviam duas pessoas.
UM - Um velho.
UM - Muito magro e baixinho.
UM - E a sua mulher.
UM - Alta / gorda e velhota.
SETE - Na casa viviam duas pessoas.
UM - O velho.
UM - Sachava.
UM - Regava.
UM - Mondava
UM - Colhia.
TODOS - E comia o que a terra dava.
UM - Também repartia
UM - Com as galinhas e os galos.
UM - Com os perus.
UM - Com as codornizes e os patos.
SETE - Que viviam na capoeira.
TODOS - Numa aldeia / à beira duma montanha / havia uma pequena casa / coberta de musgo.
UM - Num ano.
UM - Quando os primeiros dias da Primavera trouxeram sol e calor.
SETE - Os pássaros começaram a voar sobre a terra.
UM - À procura de raízes finas.
UM - De penas.
UM - De trapinhos e ervas secas.
SETE - Coisas leves que levaram no bico.
UM - Para cima das árvores.
UM - Para os buracos dos muros.
UM - Para os telhados.
UM - Para os beirais.
TODOS - Para aí construírem os ninhos.
SETE - Caminhas fofas.
SETE - Onde haviam chocar os ovos.
SETE - Para que outros passarinhos nascessem.
SETE - Bem protegidos e agasalhados.
TODOS - Os pássaros começaram a voar sobre a terra.
UM - Um dia...
TODOS - Na aldeia onde havia uma pequena casa / coberta de musgo,
UM - Onde viviam duas pessoas,
UM - O velho, muito velhinho,
UM - Levantou-se muito cedo,
UM - Tomou o pequeno-almoço,
SETE - E foi trabalhar para a horta.
SETE - Que ficava junto à casa / coberta de musgo.
UM - Encheu uma carreta com estrume do galinheiro,
UM - E levou-a para a horta,
SETE - Que ficava junto à casa coberta de musgo.
UM - Com um ancinho espalhou o estrume sobre a terra,
UM - E cavou-a com a sua enxada,
SETE - Muito velha,
SETE - Muito pesada,
SETE – Muito usada.
TODOS - E o velho muito transpirado,
UM - Pôs a terra muito lisinha,
IM - Tirou do bolso um pacotinho com sementes de nabo
SETE - E semeou-as no chão cultivado.
UM - Delicadamente.
UM - Com muitos vagares,
UM - Com muito amor.
TODOS - Na horta que ficava junto à casa / coberta de musgo.
UM - Depois cobriu as sementes com terra,
UM - Regou-as com água do tanque
UM - E disse.
RAPAZES - Façam favor de crescer, / está bem?!
UM - Os dias passaram ... muito devagar,
UM - Os passarinhos nasceram nos ninhos / e começaram a pedir comida aos pais / que voavam muito atarefados.
TODOS - E na horta que ficava junto à casa / coberta de musgo.
UM - O sol aquecia a terra,
UM - Fazia desabrochar as folhas,
UM - E as flores.
UM - E as sementes dos nabos
UM - Bem estrumadas
UM - Bem regadas
UM - Bem mondadas
SETE - Transformaram-se em pequeníssimos rebentos verdes
MENINAS - E mais tarde em grandes plantas.
UM - E numa tarde o velho descobriu que um nabo crescia mais do que os outros,
UM - Ficou curioso,
UM - Contou à mulher
UM - E todos os dias corria para a horta para ver o nabo.
RAPAZES - E o nabo estava cada vez maior.
TODOS - Na horta que ficava junto à casa / coberta de musgo.
UM - E o nabo ia crescendo...
SETE - Crescendo...
RAPAZES - Crescendo...
TODOS - O nabo era gigante.
UM - O nabo tinha a altura do velho
UM - O nabo continuava a crescer
SETE - Hora a hora,
SETE - Dia a dia.
TODOS - Na horta que ficava junto à casa / coberta de musgo.
UM - E o nabo já incomodava
UM - As alfaces
UM - As abóboras
UM - As couves
UM - E o velho muito velho
TODOS - Que morava na casa coberta de musgo,
UM - Decidiu ir arrancar o nabo.
UM - E foi para a horta
TODOS - Que ficava junto à casa coberta de musgo.
UM - Agarrou-se ao nabo
UM - E puxou uma vez,
UM - Duas vezes...
UM - Três vezes,
UM - Com muita força.
TODOS - Mas o nabo não se mexeu.
UM - E o velho chamou a mulher para o ajudar.
UM - A velhota veio e puxou o velhinho,
UM - O velhinho puxou o nabo
TODOS - Mas o nabo não se mexeu.
UM - E a velhota chamou uma menina que vivia lá perto.
UM - A menina veio e puxou a velhota
UM - A velhota puxou o velhinho,
UM - O velhinho puxou o nabo.
SETE - Fartaram-se de puxar.
TODOS - Mas o nabo não se mexeu.
UM - E a menina foi chamar o irmão que andava a brincar,
UM - O rapaz veio e puxou a menina.
UM - A menina puxou a velhota
UM - A velhota puxou o velhinho,
UM - O velhinho puxou o nabo.
SETE - Fartaram-se de puxar.
TODOS - Mas o nabo não se mexeu.
UM - E o rapaz resolveu chamar o seu cão / que era grande, meigo e muito forte.
UM - E o cão veio ajudar a puxar o nabo.
UM - O cão puxou o rapaz.
UM - O rapaz puxou a menina.
UM - A menina puxou a velhota
UM - A velhota puxou o velhinho,
UM - O velhinho puxou o nabo.
SETE - Fartaram-se de puxar.
TODOS - Mas o nabo não se mexeu.
UM - O cão ladrou a um gato
UM - E o gato veio a correr para ajudar a tirar o nabo.
UM - E o gato puxou o cão.
UM- O cão puxou o rapaz.
UM - O rapaz puxou a menina.
UM - A menina puxou a velhota
UM - A velhota puxou o velhinho,
UM - O velhinho puxou o nabo.
SETE - Fartaram-se de puxar.
TODOS - Mas o nabo não se mexeu.
UM - O cão ladrou a um gato
UM - E o gato pôs-se a miar
UM - E apareceu um rato muito pequenino.
UM - O rato puxou o gato
UM - O gato puxou o rato.
UM - O cão puxou o rapaz.
UM - O rapaz puxou a menina.
UM - A menina puxou a velhota
UM - A velhota puxou o velhinho,
UM - O velhinho puxou o nabo.
SETE - Puseram-se a puxar...
SETE - A puxar...
MENINAS - E de repente...
TODOS - O nabo saiu da terra / na horta que ficava junto à casa / coberta de musgo.
UM - E o gato caiu sobre o rato,
UM - E o cão sobre o gato,
UM - E o rapaz sobre o cão.
UM - A menina sobre o rapaz,
UM - A velhota sobre a menina,
UM - O velhinho sobre a velhota
TODOS - E o nabo ao lado de todos.
UM - A velhota era boa cozinheira,
UM - Cortou o nabo em pedacinhos,
UM - E fez um cozinhado
UM - Muito apetitoso,
UM - Muito saboroso,
TODOS - Na casa coberta de musgo.
UM - E o rato,
UM - O gato,
UM - O cão,
UM - O rapaz
UM - A menina
UM - A velhota,
UM - E o velhinho
TODOS - Comeram um fabuloso cozinhado / feito com o nabo / apanhado na horta / da casa coberta de musgo / na aldeia à beira da montanha.