PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A MENINA E A ÁGUIA
Era uma vez menina que fora abandonada pelos pais, no meio duma floresta. Algum tempo depois, passou por ali uma águia que, vendo-a sozinha, apiedou-se dela e, poupando-a à sua famélica atrocidade, pegou-lhe com cuidado e trouxe-a consigo para a rocha, alta e abrupta, onde tinha o seu ninho, cuidando dela, alimentando-a e, sobretudo, amando-a, como se fosse uma filhinha. A menina cresceu e, embora com uma aparência rude e um aspecto selvagem, tinha um temperamento dócil e um feitio meigo, tornando-se numa linda, bela e atraente jovem.
Certo dia passou por ali um Príncipe que andava a caçar, naquela zona. Ao ver tão linda e atraente donzela, de imediato, se apaixonou por ela, decidindo trazê-la consigo para o palácio real, a fim de a apresentar aos pais, para a tomar por esposa. Mas algum tempo antes, os pais haviam celebrado um contrato de casamento entre o príncipe, seu filho, e uma ilustre princesa, filha do monarca de um reino vizinho. Apesar disso, percebendo o encantamento do filho pela jovem, aceitaram que ele lha apresentasse e que ela se hospedasse no palácio, por algum tempo. Cedo, porém, se aperceberam os zelosos monarcas de que a jovem, na verdade, era muito bonita, de boas maneiras e de brandos costumes, mas apresentava um aspecto rude e um temperamento esquisito e estranho, em nada abonatório da esposa do futuro monarca. Pelo contrário, a princesa que havia sido prometida em casamento ao filho, não sendo bonita era dotada de um exemplar educação, sendo exímia na arte de costurar, de tratar da casa e de se arranjar.
Convencidos de que lhes seria muito fácil resolver o problema, afastando a rapariga do palácio e obrigando o príncipe a abdicar dos seus intentos, os reis propuseram que o príncipe havia de aceitar como esposa e casar com aquela das duas noivas que costurasse o vestido mais bonito. Sabiam eles muito bem que seria a princesa prometida a cumprir a tarefa com excelência e qualidade e, assim, haviam de afastar a intrusa para as rochas de onde viera e onde fora criada. Fecharam cada uma no seu quarto e deixaram-nas sozinhas, disponibilizando-lhes os recursos necessários e impondo-lhes a tarefa, conforme haviam planeado. A rapariga muito preocupada e aflita pois nunca tinha costurado, nem sabia o que era uma máquina de costura ou uma agulha, chamou pela sua mãe águia. Esta apareceu-lhe, trazendo consigo o mais experiente costureiro que havia no reino, que, em pouco tempo, lhe fez um belo vestido. Quando foram apresentar os vestidos, os reis ficaram espantados com aquele que a rapariga da rocha costurara, porque ganhava, de longe, em qualidade, arte e beleza, ao da princesa. Ainda não convencidos e muito embasbacados, os reis decretaram, de novo:
- Agora será a que preparar o melhor banquete para o rei servir aos seus ministros é que casará com o príncipe.
Decidiram assim porque cuidavam eles que a rapariga criada na rocha não saberia cozinhar. Ela, porém, muito aflita, voltou a chamar pela sua mãe águia que, de imediato, se lhe apresentou, trazendo-lhe o melhor cozinheiro do reino. Este, vendo o quarto repleto dos mais diversos produtos, não teve dificuldade em preparar uma excelente refeição que superou em muito a que a princesa cozinhara.
Quando viram e, sobretudo, quando provaram o manjar apresentado pela rapariga, os reis ainda mais admirados ficaram com a rapariga da rocha, porque ganhava, em tudo, a princesa que, no entanto, tivera uma esmerada e cuidadosa educação.
Apesar de tudo e ainda não satisfeitos, nem muito menos convencidos, os reis decidiram dar um grande baile, para o qual convidaram príncipes, princesas, os nobres e todas as ilustres donzelas do reino. Estariam presentes, também, a princesa prometida ao príncipe em casamento e a rapariga da rocha. A que dançasse melhor, seria considerada a verdadeira princesa e, por conseguinte, seria a eleita para esposa do príncipe, vindo a ser a futura rainha. De novo a rapariga se entristeceu e afligiu, cuidando que agora sim, não poderia ser melhor do que a sua rival. Apesar de tudo voltou a chamar pela mãe águia.
Iniciou-se o baile e, mal a rapariga começou a ensaiar os primeiros passos de dança, começaram a entrar na sala, trazidas pela águia, um bando de pombas brancas que rodeando a jovem donzela, a elevavam e erguiam, fazendo com que dançasse com arte, sabedoria e elegância, como jamais se vira no reino. Então os reis, nada mais puderam fazer do que aceitá-la como a futura esposa do filho.
Agendou-se a boda, fez-se uma grande festa e celebrou-se o casamento com tão grande pompa e solenidade como já mais se vira no reino.
E passados nove meses, entrou, mais uma vez, por uma das janelas do palácio, a águia, desta feita acompanhada por uma cegonha branca que trazia, numa cestinha, uma bela menina.
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ANTÓNIO CORTE-REAL
António Moniz Barreto Corte-Real, nasceu em Angra em1804, tendo falecido na mesma cidade em 1888. Foi pedagogo, escritor, árbitro de elegâncias literárias e uma das mais interessantes e celebradas figuras da intelectualidade açoriana da primeira metade do século XIX. Bacharel em Cânones pela Universidade de Coimbra, em 1831, nesse mesmo ano e na cidade do Mondego, publicou a sua mais célebre obra literária, Belezas de Coimbra, um livro de prosa romântica de descrição de monumentos e paisagens da urbe do Mondego. Manteve-se sempre na literatura como um conservador, mas um apaixonado pela língua portuguesa, que estudou e defendeu denodadamente.
Foi professor, por concurso, na cidade de Évora, regressando, mais tarde, a Angra como advogado, sendo nomeado director e revisor da imprensa da prefeitura e redactor da Crónica Constitucional de Angra. Dirigiu com Jerónimo Emiliano de Andrade, o Anunciador da Terceira, onde publicou um estudo sobre as festas do Espírito Santo que fez dele o precursor da etnografia açoriana. Foi colaborador e redactor em vários jornais, quase todos de cariz literário, como o Pregoeiro, o Terceirense e o Lyceo fundado por ele próprio e onde publicou boa parte da sua obra de pedagogo.
Em 1847 foi nomeado professor do liceu de Angra, tendo exercido uma notável missão de pedagogo, com os compêndios, gramática e orientações aos professores de Português e Latim. Nestas áreas era um erudito, como latinista e helenista. Como cidadão, exerceu cargos na administração, sendo juiz de Direito substituto, vereador da Câmara, membro da Junta Geral e do Conselho de Distrito.
Obras principais: Bellezas de Coimbra, Uma festa do Espírito Santo, Cartilha para uso das escolas do distrito de Angra do Heroísmo. Selecta em verso, Epítome de Gramática Portuguesa, Selecta Clássica acomodada ao uso das escolas do Distrito de Angra do Heroísmo, Circular aos professores sobre o ensino do português e latim, Proposta de reforma ortográfica submetida à Academia Real das Ciências de Lisboa, etc.
Dados retirados do CCA – Cultura Açores
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BURRICE
“Simular burrice na hora certa é alta sabedoria."
Erasmo de Rotterdam
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MEMÓRIA DO PEDRO
(TEXTO DE GABRIELA SILVA)
Acordei esta madrugada a pensar no Pedro. Era um velhinho querido.
Quem o visse com o bordão apoiado, o tronco levemente inclinado, diria que se tratava de um velho lavrador florentino cansado da enxada, a cair de cansaço.
Quem se sentasse ao seu lado por uns minutos percebia que o Pedro era um admirável contador de histórias inventadas para divertir rodas de amigos.
Tinha um bigode pequenino, um rosto liso, limpo e uma careca branquinha, quase rosa, uma pele delicada como a de um bébé e um sorriso muito, muito maroto, qual rapaz de escola que esconde o ninho que roubou na curva da estrada.
Contava as histórias apoiado no bordão, raramente olhando os interlocutores (não por medo porque se alguém morreu sem medos foi o Pedro) mas porque a inclinação da coluna já não lhe permitia uma “actuação” mais erecta do corpo. Nem havia necessidade porque a sua verticalidade sempre foi uma atitude interior e não uma mera postura de manequim sem massa encefálica.
Quem ficasse mais um pouco percebia que o Pedro sabia tudo e só falava do que sabia. Conhecia as famílias da sua terra como ninguém até à quinta geração, com defeitos e qualidades que não ocultava.Pelo contrário. A coisa que mais fascinava esta criança grande era escalpelizar até ao fim os defeitos de duas gerações de uma família qualquer. Mas sempre achei que o fazia sem má intenção. Eram essas as histórias que lhe vinham à memória.
Ele era um pouco o registo oral de coisas que nunca se escreveram e os encontros com ele eram uma tertúlia de gargalhadas e de prazer. E ninguém queria saber se a tia Maria, grávida do Padre “de não sei” abortara espontaneamente, a pedido de sua reverência ou de motu próprio com vergonha das más-línguas ou tivera um filho para ser registado com a paternidade singular de um inocente da paróquia e ser o afilhado mais querido do senhor Padre até à morte.
Para o Pedro tudo tinha um nome e ele dava-o sem medo. Mas limitava-se muito ao registo técnico e cultural dos acontecimentos. A história tinha sempre principio e fim mas o sumo, quem o quisesse que o procurasse. E ele sabia que ninguém teria paciência para ir aos arquivos de onde quer que fosse, à procura de um padre morto, cuja única glória fora engravidar a “beata” mais recatada de uma paróquia.
Referia-se à homossexualidade como um vício de charme e referia, num tom cheio de graça, que o neto de fulano ou o filho de sicrano era um “paneleiro” desajeitado, sem chegar a pensar, julgo, se as criaturas em apreço haviam chegado a materializar em prazeres da carne esse falhanço hormonal
O Pedro tinha quase os mesmos inimigos que amigos. Por ser como era. Mas ninguém duvidava, ainda em vida, que, com a sua morte, se perdia uma das cabecinhas doutas nascida nas fragas da Fajã Grande com aquela dose de loucura acima do qb que tempera as emoções florentinas de quem sabe que o mundo não acaba ali.
Pedro da Silveira morreu. Mas deixa uma longa história de vida. Para mim, enquanto chorava o poeta e amigo, apenas pensei no que o Pedro não disse nunca, nas coisas que não contou, e não falo das piadas porque piadas todas contam quando querem omitir os desgostos e as humilhações.O que estaria por detrás de algum sarcasmo algumas vezes? Dor? Os biógrafos do poeta hão-de estudar estas coisas.
Pedro: deixaste vazio na minha alma e na nossa terra. Eu sei que tu amavas as Flores e que, tal como eu, partiste, não para as Califórnias de abundância que tão bem pincelaste, mas para algum lugar onde fosse possível fazeres e vida sem dares nas vistas a quem não querias.
A nossa terra Pedro, não é mãe que se queira nem madrasta que se ajeite aos nossos temperamentos. Tu eras corrosivo demais para viver entre eles. O teu brilho mexia com a paz das estrelas dos nossos curtíssimos metros quadrados de verde. Tu tocavas na nevralgia em ferida de muitas ganhoas sem asas. Tu mandavas arpões como quem brinca na estrada a marinheiros de mar e bote, tu que nunca foste à baleia. Ninguém gosta de se ver retratado, sem estar em pose, bem vestido e de sorriso afivelado para a câmara.
Tu és um pintor. Na tua paleta de cores, a ilha teve sempre um lugar muito especial. Pegaram no teu poema e usaram-no de mil maneiras porque era sempre bonito. Usei-o também, muitas vezes, para pintar trabalhos meus. E quando me mandaste os teus “Poemas ausentes” passei a ter-te à cabeceira para te ler. Tu dizias tudo o que eu sinto. E dito por ti era tudo tão lindo.
Uns anos atrás, em Tulare, deste tanto prazer a tanta gente. Sempre pensei que o Álamo, o Diniz e o Onésimo acabassem contigo com tanta história que te encomendavam. Mas tu mudavas de história, de árvore genealógica e de sobrenomes sem nunca te enganares. Feliz o momento em que o Diniz te levou lá, porque assim pude privar contigo e com a tua encantadora esposa numa intimidade ilhoa muito bonita.
Não posso falar mais de ti Pedro. Porque não sei coisas muito científicas a teu respeito e tu ainda entornavas as cinzas se eu citasse como tuas, coisas que não disseste.
Gosto muito da tua memória, Pedro.
Na minha banca de cabeceira, escrito à mão, está o teu poema, o poema universal, o nosso poema, o Poema com que nossa ilha te rende homenagem
ILHA
O CÉU FECHADO
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OLHOS DE FOME A ADIVINHAR-LHE Á PROA
CALIFÓRNIAS PERDIDAS DE ABUNDÃNCIA
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O GRACIOSA
O Graciosa era um dos mais interessantes e típicos restaurantes da cidade da Horta. Situada nas traseiras do largo do Infante, o acesso às suas instalações fazia-se através de uma espécie de arco, situada no primeiro piso de uma habitação que, aparentemente havia sido transformado numa espécie de pequeno beco. O restaurante, que herdara o nome do seu proprietário, por ser oriundo da ilha Graciosa, para além da cozinha, tinha duas enormes salas, onde se serviam as mais variadas vitualhas, a maioria delas, comum aos tradicionais pratos açorianos, sobretudo, das ilhas do grupo central. Era lá que as pessoas vindas das Flores iam almoçar sempre que o Carvalho, nas suas idas e vindas entre as ilhas, ancorava na doca ou até quando vinham ao Faial e ali ficavam a acompanhar algum familiar doente, a consultar médico ou a fazer algum tratamento impossível de realizar-se nas Flores.
Foi na minha primeira viagem entre as Flores e São Miguel, acompanhado pelo Senhor Aurélio, que demandei pela primeira vez as instalações do Graciosa. Depois de deambular pela cidade, propôs o meu paraninfo que fossemos, ali almoçar. Manifestei uma reservada recusa em acompanhá-lo. Cuidava eu que almoçar num restaurante ficaria muito caro e corria o risco de gastar ali todo o dinheiro que levava, ou pior, nem sequer ter dinheiro para pagar a despesa. A minha intenção era entrar num café e comprar um pão com queijo e uma laranjada. Ele, porém, apercebendo-se da razão porque me esquivava, encorajou-me:
- Anda lá. Não vais ficar aqui, sozinho, na cidade. Sei que tens pouco dinheiro. Mas podes vir à vontade. O Graciosa enche muito os pratos. Hei-de repartir alguma coisa contigo.
O Graciosa estava repleto. Soldados, estudantes, seminaristas, padres, professores, homens e mulheres, muitos dos quais se haviam cruzado comigo a bordo. Outros, envergando fatos de cotim, chapéus de aba virada e calçando albarcas, não escondiam a sua origem de picarotos. Havia também senhores de fato e gravata, homens de negócio, funcionários do estado e um ou outro marinheiro. Como era dia em que o Carvalho chegava das Flores, a ementa era variadíssima, dado que a clientela estava assegurada, sobretudo, por se tratar duma viagem no mês de Setembro, quando muitas pessoas regressavam de férias. O prato principal e o mais solicitado era feijão assado, mas havia também molha de carne com inhames, torresmos de porco com batata-doce e veja frita com bolo do Pico. Homens, mulheres, soldados, estudantes e seminaristas de toda a ilha das Flores demandavam e enchiam aquele prodígio pantagruélico da gastronomia faialense ou para se desaforarem dos miseráveis cardápios que lhes proporcionava a Insulana, a bordo do Carvalho ou para se prevenirem da fome que haveriam de passar nos dias seguintes.
Sentei-me à mesa com o Senhor Aurélio que optou pelo feijão assado. O empregado ou porque fosse muito generoso nas doses que servia ou porque o Senhor Aurélio lho pedisse sem eu me aperceber, exagerou-lhe na dose, servindo-lhe um prato bem acuculado de feijão. Ele, pedindo um prato vazio, repartiu-o, gratuitamente, comigo. Apenas paguei um pão e uma laranjada.
Saímos do Graciosa ainda era muito cedo. Demos uns passeios pela cidade e sentámo-nos nos bancos do Largo do Infante, a acompanhar o movimento da cidade, a ver os automóveis que circulavam pelas ruas em grande número e a contemplar a mansidão do mar, os navios e os iates ancorados na doca, os respectivos desenhos dos que por ali haviam passado, as pequenas embarcações que entravam e saíam da doca e a imponência da montanha do Pico que, erguida mesmo em frente, começava a lançar uma ténue neblina sobre o Oceano.
O Carvalho desatracou da doca da Horta, com rumo ao Cais do Pico, já passava das cinco. Assim que regressei de terra, subi ao convés da primeira e deparei com uma espreguiçadeira vazia. Estava exausto, cheio de sono e com a barriguinha cheia. Encostei-me o mais comodamente possível. Foi tiro e queda…
Quando acordei o Carvalho balouçava ancorado fora do Cais do Pico. A noite já ia alta e a faina habitual das lanchas entre o navio e o porto do Cais, como que se resumia a uma pequena lancha que de meia em meia hora ia a terra e voltava pouco tempo depois ao navio, arrastando os pesados barcos que transportavam carga diversa e mercadoria. O número de passageiros que embarcava no Pico era muito reduzido. A maior parte, sobretudo os da parte Sul da ilha e da Madalena, preferiam atravessar o canal nas lanchas e embarcar na Horta, por isso, os poucos que entravam no Cais já haviam embarcado todos e o paquete aguardava a madrugada a fim de rumar às Velas. A noite estava muito escura e o céu pejado de estrelas. A sombra da montanha confundia-se com a escuridão e penetrava no universo celeste, parecendo aproximar-se das próprias estrelas. Apenas na faixa costeira da ilha quer a leste quer a oeste do Cais do Pico e de São Roque, tremelicavam aqui e além algumas luzes cravadas na massa basáltica da montanha, por trás da qual, para o lado das Bandeiras, parecia emanar uma espécie de claridade a anunciar que dentro em breve a Lua, havia de aparecer e iluminar a ilha e o Oceano.
Percorri novamente o barco de lés-a-lés e voltei à terceira classe, onde nunca mais entrara desde a tarde do dia anterior, quando o Senhor Artur exarara a sentença que me condenava a passar três noites e três dias ao relento. Pensava eu que, tendo desembarcado, no Faial, muitos passageiros oriundos das Flores, os camarotes e beliches ocupados por eles estariam agora livres. Assim, ia solicitar-lhe um beliche para as duas noites seguintes. Mas o que eu não sabia, ou não queria saber, na opinião do Senhor Artur, é que no Faial tinham embarcado ainda mais passageiros do que os que tinham desembarcado vindos das Flores e que até muitos deles, como eu, também viajavam sem acomodação. Saí muito triste, com os olhos rasos de lágrimas, mas resignado com a suprema certeza de que não havia mais nada a fazer. Estava definitivamente determinado que eu havia de passar mais duas noites ao relento, sem ter cama onde me deitar.