PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A LENDA DA PEDRA VERMELHA
Na Fajã Grande, entre o Vale Fundo e o Espigão, havia um lugar chamado Pedra Vermelha, sobre o qual se contava a seguinte lenda:
Há muitos anos, dois jovens apaixonaram-se perdidamente, um pelo outro. Os pais, inimigos ferrenhos, opuseram-se ao casamento. No entanto, como os jovens teimassem em viver o seu amor, mesmo contra a vontade dos progenitores, estes furiosos, expulsaram-nos de casa, deserdaram-nos e obrigando-os a irem viver para um lugar ermo, bem longe do povoado. Os jovens, abandonados á sua sorte, caminharam até encontrar a enorme pedra em cuja aba se haviam abrigado. É que a pedra assinalava, precisamente, o local hoje chamado Pedra Vermelha, onde dois jovens, anteriormente e às escondidas, se encontravam para viver seu romance, afastados dos pais.
Ninguém sabe os nomes deles, nem muito menos os dos pais e possivelmente, nunca terão existido. Mas diz a lenda que passado algum tempo o pai da jovem, encontrando o rapaz matou-o, apertando o seu corpo junto ao tronco de uma árvore. O jovem morreu sem que ninguém pudesse ajudá-lo. Cuidava o facínora que, assim, a filha havia de regressar a casa. Diz a lenda que a jovem permaneceu escondida, sozinha, sem ninguém lhe por a vista e que chorou tanto, tanto, durante muito tempo sentada todas as noites sobre pedra e, com muito amor, que esta tomou a cor avermelhada que ainda hoje tem e lhe deu o nome. A rapariga dedicou aquele local aos que buscam encontrar o amor verdadeiro, pois muitas vezes, na sua dor, ela fez ali uma oração a Deus, pedindo que cada casal que, sentados naquela pedra, dessem um beijo de amor, passariam a ter a felicidade com a qual ela sonhou e que não conseguiu alcançar.
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FESTAS DO ESPÍRITO SANTO
Nos Açores, em todas as ilhas, as festas em honra e louvor do Divino Espírito Santo dominam esta altura do ano, atingindo o seu epicentro no domingo de Pentecostes, estendendo-se, no entanto, não apenas nos dias que o antecedem, mas também nos primeiros dias da semana seguinte, repetindo-se ou prolongando-se, em muitas freguesias, até ao domingo da Trindade. Estas festas, para além da parte litúrgica, onde sobressaem as celebrações da eucaristia e a organização de procissões e cortejos, constam geralmente da distribuição e da partilha da carne e do pão, entre todos e, de modo muito especial, junto dos mais pobres.
Na ilha do Pico este sentido de partilha tem um significado ainda mais abrangente e a ela, muito provavelmente, estão ligados rituais e costumes ancestrais, geralmente relacionados com promessas feitas pelos nossos antepassados em momentos de enorme angústia e aflição, em virtude de crises sísmicas devastadoras ou outras catástrofes dramáticas, durante as quais o povo solicitava o auxílio divino para acalmar as correntes de lava ou os ventos ciclónicos que assolavam e arrasavam a ilha, destruindo habitações, povoados e culturas, por vezes, pondo em causa a sobrevivência das populações.
Na realidade, os festejos em honra e louvor do Divino Espírito Santo constituem, na ilha montanha, uma genuína e fortemente enraizada tradição, muito provavelmente trazida pelos primeiros povoadores mas implementada com um cunho religioso e cultural muito forte entre a actual população de toda a ilha, incluindo os mais jovens, mantendo-se, ainda hoje, com rituais e celebrações muito semelhantes às dos tempos antigos, com destaque para um inusitado e interessante cerimonial em que os "imperadores" levam, em procissão, a coroa, até à igreja, com a qual, após a celebração da Eucaristia, são “coroados”. Realce também para a "função", evento peculiar, genuíno e agregador, que consiste, fundamentalmente, na participação colectiva num almoço em que praticamente se integra toda a população da freguesia, para além de muitos convidados, sentando-se à mesma mesa, saboreando as típicas e tradicionais sopas do Senhor Espírito Santo.
Mas o que mais revela este sentido de partilha mútua e de comunhão recíproca das festas do Espírito Santo, no Pico, é o facto de em todas as freguesias e até em alguns lugares de uma mesma freguesia, se distribuir por todos os habitantes e também pelos forasteiros massa sovada, numas localidades sob a forma de pão, noutras de rosquilhas e noutras de vésperas. Esta distribuição obedece a um calendário rígido, histórico e imutável, permitindo assim que a mesma pessoa possa receber o pão doce, não só em dias diferentes mas até, no mesmo dia, em várias freguesias e localidades da ilha. São milhares e milhares as rosquilhas, os pães e as vésperas cozidos, por estes dias, com o primordial objectivo de, simplesmente, os oferecer em louvor do Divino Espírito Santo, facto, aparentemente, tão transcendente que quase imperceptível por quantos visitam, pela primeira vez, a ilha nestes dias.
É o seguinte o calendário de distribuição do pão, oferecido pelos irmãos e levado em cortejo até à igreja para ser benzido, em louvor do Divino Espírito Santo, sendo que, freguesias há que partilham as suas ofertas em mais de um dia:
Sábado véspera de Pentecostes – Silveira.
Domingo de Pentecostes – Bandeiras, Candelária, S. Mateus, Companhia de Baixo (São João), Ribeira do Meio (Lajes), Santa Bárbara (Ribeiras), Calheta do Nesquim, Ribeirinha, Piedade, São Roque, Santo António e Santa Luzia.
Segunda-feira – Valverde (Madalena). Monte (Candelária), Santa Cruz (Ribeiras), Calheta do Nesquim, Ribeirinha, Piedade, Santo Amaro, Prainha do Norte e Cais do Pico (S. Roque).
Terça-feira – Madalena, São Caetano, (Companhia de Cima (São João) e Santa Cruz (Ribeiras).
Esta distribuição tem lugar junto aos "impérios", pequenas e singelas construções tendo no vértice do telhado a pomba branca do Espírito Santo e no frontispício a coroa e a data da construção e que ao longo dos séculos, foram sendo construídas em todas as freguesias e localidades mais importantes da ilha, constituindo um elemento interessante da arquitectura popular açoriana. Actualmente, ao lado de muitos destes pequenos templos construíram-se amplos salões que permitem uma maior funcionalidade a estes tradicionais e únicos festejos.