PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
ENTRE A FAJÃ E PONTA DELGADA
Um dos mais emblemáticos caminhos da ilha das Flores, nos anos cinquenta era o que ligava a Fajã Grande a Ponta Delgada. Trilhei-o na totalidade, apenas uma vez, em criança, mas em sentido contrário, isto é de Ponta Delgada, mas de noite. Consequentemente com muitos sustos e atribulações.
Actualmente este trilho, de cuja uma boa parte da sua extensão se situa em terreno pertencente à freguesia da Fajã Grande, foi, actualmente, transfomado num dos mais interessantes trilhos turísticos não apenas das Flores, mas talvez dos Açores. Este trilho, antigamente começava no Calhau Miúdo e seguia o antigo caminho que dava para a Ponta. Até aquela localidade era um caminho empedrado, com calçada romana e nele transitavam pessoas, animais, caros de bois e corsões. Do lado de Ponta Delgada, iniciava-se no sítio onde hoje se construiu uma estrada agrícola de betão, que tem como objectivo principal ligar o casario da freguesia de Ponta Delgada ao Farol da Ponta de Albarnaz. Ontem como hoje, demora-se cerca de duas e meia a três horas a percorrer este trilho tem a duração total de cerca de 2h30m.
Para quem como eu, o inicia em Ponta Delgada e pretende chegar à Fajã Grande, deve seguir pela estrada do Albarnaz até encontrar um caminho, hoje devidamente sinalizado, virando à direita. Esta parte do trilho, ladeada de hortênsias, desce e atravessa várias ribeiras, relvas, grotões e valados até chegar a uma cancela que corresponde a cerca de metade do percurso percorrido. Nesse local pode desfrutar-se de uma maravilhosa e deslumbrante vista sobre a parte Noroeste da ilha, nomeadamente o mítico Ilhéu de Maria Vaz, a Ponta de Albarnaz com o seu Farol, grande parte de Ponta Delgada e, mais além, a vizinha ilha do Corvo, que dali assume a forma de um gigantesco e fumegante biscoito. O caminho segue na direcção do Cimo da Rocha da Ponta, entre os Fanais e a Caldeirinha. Era por ali que seguiam, outrora, muitos jovens que, pretendendo demandar a ilha na procura das Américas. Desciam a rocha até à Baía dos Fanais, onde as baleeiras, ali escondidas e a abastecer-se de água e viveres, os esperavam e nas quais embarcavam clandestinamente. Consta que geralmente iam munidos de caniços e apetrechos de pesca para enganar os guardas, que os vigiavam dos fortes que abundavam na orla costeira. Finalmente assoma-se ao Cimo da Rocha, ao local chamado Risco, donde se vislumbra uma outra assombrosa vista. Agora sobre a Fajã, a Ponta e oceano com o Monchique plantado ali bem perto. O trilho continua até à Ponta, por uma vereda de terra batida alternada com pedra de calçada escaleiras. Depois de atravessar o casario da Ponta, o caminho, hoje, é em piso alcatroado que terminar na Fajã Grande.
Autoria e outros dados (tags, etc)
LUXEMBURGO
“No Luxemburgo não se respirava este ar revolucionário. Reinava a ordem e o trabalho. A economia tinha outros comportamentos. Chocou-me muito, por isso, a presença massiva de portugueses na estação ferroviária do Luxemburgo, presença quase diária, sobretudo nas manhãs. Faziam-me lembrar pescadores à espera que o mar amansasse para saírem para o mar. Era gente cheia de saudades que esperava alguma coisa que estava a chegar, talvez de um país desconhecido ou do país donde vieram.”
Januário Pacheco
Autoria e outros dados (tags, etc)
O POCEIRÃO
Encastoado entre as abruptas e negras rochas do baixio, ligado a terra pelo Caneiro do Porto e pelo Varadouro e quase literalmente tapado do oceano pelo Calhau da Barra, o Poceirão impunha-se, na década de cinquenta como uma espécie de ex-libris de toda a orla marítima da Fajã Grande, quiçá de toda a costa ocidental da ilha das Flores.
Situava-se no lugar do Porto e, por isso, a ele se tinha acesso pelo principal e mais importante caminho da freguesia, que a atravessava de sul a norte, iniciando-se no cimo da Assomada, para terminar a uns escassos metros mais além junto ao Farol e ao Cais. As rochas lávicas que o cercavam, a sua forma quase redonda, com algumas ramificações onde sobressaía a que dava acesso ao Porto Velho, o fecho da Barra e a tranquilidade habitual das suas águas davam-lhe semelhança a uma enorme e gigantesca poça, uma espécie de piscina natural. Por isso lhe chamavam o Poceirão.
Do lado norte, a rocha de lava era mais baixa mas menos rectilínea. Aí proliferavam pequenas enseadas, minúsculos ilhéus, inúmeros caneiros e poças, povoados de caranguejos, moreias, polvos, cabozes, mujas e camarões esverdeados, que recolhidos em cestas, serviam de isca aos inúmeros pescadores que demandavam aquele local, na mira de rateiros, sargos, peixes-reis, carapaus e gorazes. No caso das vejas, que as havia também ali em abundância, a isca era moira que deveria ser apanhada noutras paragens. A sul, porém, o rebordo era alto, abrupto e escarpado, pouco utilizada por pescadores ou nadadores, formando, do lado de terra, uma espécie de baia, protegida de ventos e intempéries, onde, normalmente, era apoitada a Santa Teresinha, a gazolina utilizada na caça à baleia. A leste uma clareira onde se situava o varadouro e, mais no interior o mítico e enigmático Caneiro do Porto, onde a ganapada da freguesia se iniciava na natação mas que, em tempos de debulha do trigo na eira, situada um pouco mais acima, também servia para despejo dos dejectos dos animais que, circulando ao redor do moirão de olhos tapados, puxavam o trilho.
O Poceirão, não era utilizado apenas pelos pescadores de pedra e cana. Havia outros, mais afoitos que ali mergulhavam, sobretudo na mira de polvos e cavacos que abundavam, sobretudo, na parte mais exterior. O lado sul, entre o Caneiro e a baía onde se apoitava a Santa Teresinha, formava uma interessante plataforma lávica, quase plana e de fácil acesso. Um excelente local de pesca e uma plataforma de lançamento para água de quantos terminavam com sucesso a sua aprendizagem no Caneiro. Hoje está totalmente coberta de cimento, com um guindaste ali preso, a ornamenta-la.
O Poceirão, de facto, também servia como um excelente local de banhos, sobretudo no pequeno rectângulo em frente ao varadouro, onde após a aprendizagem no Caneiro, se atiravam os debutantes. Os mais experientes e mais fortes nadavam mais ao largo e muitos havia, que iam até â Barra. Ufanavam-se de subir o enorme calhau, de cujo cimo mergulhavam, pois o mar ali era bastante profundo, sobretudo do lado norte, onde havia uma espécie de portal, por onde as embarcações saíam e entravam.
No Inverno, porém, o Poceirão metamorfoseava-se. Dias havia que as suas águas se enchiam de um furor desusado, transformavam-se em ondas altivas que, cobrindo por completo a Barra, se atiravam com doidas, contra as rochas fazendo desaparecer, ilhéus, caneiros e enseadas, amedrontando os que por ali passavam e pondo em risco os barcos ancorados.
PS – Há dias, surgiu no FB uma foto deste Poceirão, na actualidade e que, pelos vistos e aparentemente, já perdeu quase tudo, até o nome!
Autoria e outros dados (tags, etc)
QUERO VOLTAR AO MAR
Eu quero voltar ao mar,
Disfarçada de sereia,
P’ra encontrar meu amor
Trazido p’la maré cheia.