PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
ANOS BONS E TÃO BONS ANOS
O Pico da Vigia 2 deseja a todos os seus visitantes, leitores e simpatizantes, bem como a todos os amigos do Facebook um Feliz 2015, cheio de saúde, pleno de sucesso e repleto de paz e amor.
Que 2015 seja, para todos, um ano de realizações profissionais e pessoais!
Que se concretizem todos os sonhos e se realizem todos os desejos!
Que traga ao mundo, a paz, a justiça e a igualdade!
Que não haja mais vítimas da fome, da miséria, da violência, da opressão e da descriminação!
Que cesse, para sempre, a corrupção, a falta de respeito pelo outro e a violação dos direitos humanos!
Feliz 2015!
Recordando as cantigas que, na década de cinquenta, as crianças da Fajã Grande, em pequenos grupos, cantavam pelas casas da freguesia, na mira de obter 10 centavos, um figo passado, um biscoito ou um cálice de xixi do Menino Jesus:
“Anos bons e tão bons anos,
Deus nos dê de melhorados.
Tudo isto passou Cristo
Perdoai nossos pecados.”
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2014
2014 OU OS ACONTECIMENTOS QUE, PROVAVELMENTE, MAIS SENSIBILIZARAM PORTUGAL E O MUNDO
05 – 01 - Morre Eusébio, o maior futebolista português de sempre, Tinha 71 anos.
13 – 01 - Cristiano Ronaldo ganha o prêmio da FIFA de melhor jogador de futebol do mundo em 2013.
07 – 02 - Abertura dos XXII Jogos Olímpicos de Inverno em Sóchi na Federação Russa.
24 – 02 – Governo do Uganda promulga lei que pune homossexualidade com prisão.
27 – 02 – Reacendem-se os combates e aumenta a tensão entre Rússia e Ucrânia.
08 – 03 - Um avião da Malaysia Airlines desaparece na rota Kuala Lumpur – Pequim. Tratava-se de um B777-200, com 239 passageiros e 12 membros da tripulação.
01 – 04 -Sismo de magnitude 8,2 atinge o Chile deixando 6 pessoas mortas e dezenas de feridos e desalojados.
14 – 04 - Grupo radical islâmico sequestra mais de 200 meninas na Nigéria
17 – 04 -A NASA descobre o primeiro planeta potencialmente habitável.
15 – 05 - Explosão em mina de carvão na Turquia mata mais de 250 pessoas.
15 – 05 – O Benfica termina o campeonato nacional em primeiro lugar, vencendo ainda a Taça de Portugal
24 – 05 - O Real Madrid vence o Atlético Madrid, na final da Liga dos Campeões em Lisboa. Cristiano Ronaldo bate o recorde de golos da competição com 17 golos.
02 – 06 - Rei Juan Carlos da Espanha abdica do trono em favor de seu filho Filipe VI.
12 – 06 - Abertura da XX Copa do Mundo de Futebol.
13 – 07 - A Alemanha vence o Mundial de 2014, ao derrotar, na final, a Argentina.
17– 07 - O avião que fazia o voo MH17 da Malaysia Airlines, entre Amsterdam Kualae Lumpur, é abatido por um míssil disparado por um sistema antiaéreo na fronteira entre Ucrânia e Rússia, fazendo 298 vítimas, entre elas, três crianças.
24 – 07 - O voo AH5017 da Air Algérie, que cumpria rota Burkina Faso - Argel, em virtude de problemas meteorológicos cai em Mali, deixando 118 mortos.
04 – 08 – Após a crise no BES nascem dois novos bancos: o "Novo Banco" para garantir aos depositantes as suas economias. Os investidores ficam inseridos num "banco mau".
08 - 08 - OMS declara epidemia de ébola emergência sanitária internacional.
01 – 09 - Bloqueio da plataforma informática Citius no arranque do novo mapa judiciário, gerando caos nos tribunais portugueses.
22 – 09 - O nome de Pedro Passos Coelho, Primeiro-Ministro de Portugal, é envolvido no caso Tecniforma.
22 – 09 – Os EUA iniciam bombardeamentos contra Estado Islâmico na Síria.
26 – 09 - 43 Estudantes universitários desapareceram no México.
28 – 09 - António Costa vence as primárias do PS, contra António José Seguro.
05 - 10 - Nobel da Paz 2014 para Yousafzai, uma jovem paquistanesa que chamou a atenção do mundo para o direito à educação, e para Kailash Satyarthi, um ativista indiano pelos direitos das crianças.
15 -10 – Divulgação do Orçamento do Estado 2015, com novas medidas económicas para os portugueses cumprirem em 2015.
30 - 10 - Dois aviões de guerra russos são intercetados em território aéreo nacional.
21 - 11 - O ex-primeiro ministro José Sócrates é detido à chegada ao aeroporto de Lisboa no âmbito de um processo em que se investigam crimes de fraude fiscal branqueamento de capitais e corrupção.
15 – 12 - Sequestro de 16 horas num café em Sydney, na Austrália, deixa sequestrador e dois reféns mortos e 6 feridos.
16 – 12 - Um ataque do grupo terrorista Taliban faz massacre em escola militar de Peshawar, no Paquistão, matando mais de 140 pessoas, na sua maioria crianças.
17 – 12 - EUA e Cuba retomam relação após cinco décadas.
24 – 12 - A greve anunciada da TAP é desconvocada.
27 – 12 – Um avião da AirAsia, desaparece nas proximidades da ilha de Bornéu. Transportava 162 pessoas.
28 – 12 – Acidente com ferry no Adriático provoca 7 mortos.
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NATAL EM ENTREVISTA
Jovem professora, recentemente colocada em Oleiros de Cima, com um horário semanal de 12 horas, mãe de uma filha de dois anos, Natália Semedo está obrigada a uma deslocação diária de mais de cem quilómetros entre a sua residência e o local de trabalho. Além disso, está forçada a entregar a filha aos cuidados de uma senhora que, apesar de merecer a sua confiança, é uma desconhecida, por não haver jardins-de-infância na localidade. O marido trabalha numa pequena empresa de construção civil e recebe pouco mais do que o ordenado mínimo, pese embora consiga algumas horas extraordinárias e fins-de-semana, o que lhe permite duplicar o frágil e débil ordenado. Apesar de tudo, Natália, o marido e a filha viveram um Natal feliz e repleto de tradições, conforme o revelou na seguinte entrevista.
Pico da Vigia 2 – O seu Natal? Foi feliz.
Natália Semedo – O meu Natal, aliás o “nosso” Natal foi muito feliz. É verdade que pela primeira vez o vivi separada de meus pais e dos pais do Cristiano, dado que, este ano, fomos obrigados a nos mudamos para muito longe das residências deles. Mas em contrapartida vivemos o Natal, pela primeira vez, sozinhos, com a nossa filhinha. A longa distância, as dificuldades com que vivemos e a neve impediram-nos de nos deslocarmos à terra onde nascemos. Ficamos tristes por isso. Mas o viver o Natal pela primeira vez sozinhos, como família, trouxe-nos uma enorme alegria
P V 2 - Natal com frio ou com sol?
N S – Sempre adorei o frio e a neve do Natal. Quando decidimos mudarmo-nos aqui para o sul, cuidava que havia de ter um Natal mais quentinho. Afinal este ano o frio, pelos vistos atingi-nos a todos.
P V 2 – Pai Natal ou Menino Jesus?
N S – Ainda sou do tempo em que, na aldeia onde nasci, todas as crianças acreditavam que era o Menino Jesus que trazia os presentes. Depois tudo se modificou. Rapidamente, a atraente e bondosa imagem do Pai Natal cresceu, ultrapassou as grandes cidades chegou às mais pequenas e isoladas aldeias. Tudo se transformou e hoje nenhuma criança resiste à simpática figura daquele velhinho vestido de vermelho, de longas barcas brancas e carregado com sacos cheios de presentes com que nestes meses antes do Natal persiste em todos os meios de comunicação social. Nós, adultos acompanhamos, com muito amor e carinho, este fantástico sonho das crianças.
P V 2 - Esperar pela manhã ou abrir os presentes à meia-noite?
N S – A resposta é muito semelhante à anterior. Antigamente este salutar reboliço do Natal era menor e nós adormecíamos, com facilidade, embalados pelo sonho de acordar na manhã seguinte e ver, junto ao presépio, uma boneca, um carrinho, um conjunto de cozinha ou um embrulho de figos passados. Hoje os ruídos e as imagens são tantas que não é fácil resistir. Muito antes da meia-noite está tudo aberto. Em pequena, eu e os meus primos, não resistíamos ao sono e só abríamos as prendas de manhã.
P V 2 - Cânticos de natal? Sim ou Não?
N S – Adoro-os! O Natal sem eles não era Natal. Alguns são deliciosamente belos e duma musicalidade adorável. E o interessante é que só por altura do Natal têm este sabor mágico. Sempre enchi a minha casa com luzes e cânticos no dia de Natal. Vou continuar a fazê-lo, tentando deixar este legado à minha filha. A Música de Natal é eterna e transmite-se de geração em geração..
P V 2 - Qual o menu da consoada? Deu continuidade às tradições que trouxe da sua aldeia?
N S - Na minha casa sempre se comeu bacalhau com batatas, ovo e couves, na noite de Natal, como era tradição na terra. No dia de Natal imperava a roupa velha e mais tarde, também, o cabrito assado no forno. Nos doces tinham lugar na mesa as rabanadas, os formigos, as filoses de abóbora e o bolo-rei, claro. Neste nosso primeiro Natal abdicámos do cabrito, até porque nem temos forno de lenha. Em contrapartida introduzimos a carne de peru, sob a forma de bife, sobretudo pela Joana, um pouco alérgica ao “fiel amigo”. Mantivemos todos os doces.
P V 2 – E no que a prendas diz respeito? O que recebeu ou gostava de ter recebido neste Natal?
N S – A melhor prenda que tive foi a de estar com a minha família, ou seja com o meu marido e a minha filha. Quando criança, em casa dos meus pais, passávamos este dia todos juntos. Quero manter essa tradição de estarmos juntos. Em relação a prendas propriamente ditas, a situação que vivemos não nos permitiu concretizar vontades. Apenas tentámos perceber os desejos da Joana. Felizmente e sem grandes gastos, conseguimos concretizá-los quase por completo. Aproveitamos a época para comprarmos algumas roupas e im ou outro utensílio necessário para a nossa casa.
P V 2 – Se pudesse escolher onde gostava de passar o ano?
N S – Precisamente onde e com quem passei o Natal.
P V 2 – Desejos para 2015?
N S – Só dois: saúde para a minha família e paz para o mundo.
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A LENDA DA VELA DE NATAL
Conta uma lenda que, há muitos, muitos anos, havia um sapateiro muito pobre mas muito humilde e trabalhador. Como ganhava muito pouco, pois sempre que conhecia algum aldeão pobre, não recebia dinheiro por lhe reparar o calçado e como vivia muito longe da cidade os senhores ricos não o procuravam a fim de solicitarem os seus serviços, vivia numa pobre e velha cabana, na encruzilhada de um caminho, perto de um pequeno e humilde povoado, situado num bosque.
Reza a lenda, ainda, que o sapateiro era tão generoso e tinha tão bom coração que para ajudar os pobres aldeões e também os viajantes que passavam junto à sua cabana, todas as noites deixava numa janela do pobre casebre, uma vela acesa, de modo a guiá-los no escuro da noite. Mesmo já velho, doente, abandonado e enfraquecido, nunca deixou de acender a vela, com intenção de ajudar todos quantos passavam junto à sua casa.
Impressionados com a persistência daquele pobre sapateiro, que continuava a viver a sua vida, cheio de amor e de bondade, não apenas os habitantes do pequeno povoado mas também os que viviam noutras terras mais distantes nas que por ali passavam muitas vezes decidiram imitá-lo. Assim, escolhendo uma noite, que era a véspera de Natal, decidiram juntar-se todos em frente à cabana do velho sapateiro acendendo cada um uma vela, iluminando todo o bosque. Até os que não puderam ir acenderam uma vela em cada janela das suas casas e iluminaram todo o povoado. À meia-noite mandaram tocar os sinos da igreja.
Consta que, a partir daquela noite, acender uma vela tornou-se tradição em quase todos os povos, na véspera de Natal.
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GRIPE, UM TORMENTO
Chegou o frio. Frio a valer. Embora não fosse previsível para quem, no início do inverno, sie vacinou contra a gripe, verdade é que a dita cuja não esteve com meias medidas e, mandando às ortigas a vacina, invadiu terreno que lhe estava interdito. A gripe este inverno foi mis forte do que a vacina ou melhor a vacina é que não teve a capacidade de obliterar toda a gama de vírus que são capazes de provocar a gripe, uma doença, incómoda, desgastante infeciosa, que pode, em casos de pessoas mais fragilizadas pela idade ou por outras doenças, ser fatal. Geralmente é provocada pelos tais diversos vírus que a vacina cuida que tenta abafar na globalidade. Traz consigo, uma vez que o tempo é de frio, calafrios, febre, corrimento excessivo do muco nasal, inflamação dores de garganta, dores musculares, dores de cabeça, tosse, fadiga e sensação geral de desconforto.
A gripe parece ser, geralmente, transmitida por via aérea através de tosse ou de espirros, os quais propagam partículas que contêm o vírus. A gripe pode também ser transmitida por contacto direto com excrementos ou secreções nasais de aves infetadas, ou através de contacto com superfícies contaminadas.
Os números falam por si. A gripe propaga-se e provoca anualmente entre três e cinco milhões de casos graves da doença e entre 250 000 e 500 000 mortes, número que pode ascender a milhões em anos de pandemia. Ao longo do século XX ocorreram três pandemias de gripe, cada uma delas provocada pelo aparecimento de uma nova estirpe do vírus em seres humanos, e responsáveis pela morte de dezenas de milhões de pessoas.
Cuidado pois. Com a gripe não se deve brincar. Há que curá-la bem. Isso demora o seu tempo. Há que evitar recaídas.
Estou, pois, de molho desde há dois dias e, embora com sensíveis melhoras, permanecerei mais alguns. Gripe, um tormento!
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ESCOLHER
"Escolher é excluir".
Henri Bergson
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CARIÁTIDE II
Alguns há, que seguros da tua ausência,
Te calcam aos pés, talvez convencidos
Que os destroços que pisam são resíduos
Que evaporou a natureza em sua demência.
Outros há que procuram tua essência,
Entre ruinas de templos já destruídos,
E de esforços d’arte enriquecidos
Dão à tua antiga forma revivência.
Exposta num museu, tu és agora,
Um ídolo que ostentam solenemente,
Uma maravilha de arte que se adora.
Ajoelhado, ante ti, puro e limpo
Eu quero contemplar-te, tão-somente.
Assim como adorada no Olimpo!
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A PADEIRINHA
Era uma vez um rapazinho chamado Carlos que vivia sozinho e trabalhava como guardador de sonhos, trabalho difícil, cansativo e extenuante o de manter bem vivos os sonhos dos outros e, sobretudo, os seus. Mas Carlos não se importava com a dificuldade do trabalho, dado que, em contra partida, todas as pessoas que conhecia e de quem guardava os sonhos, eram muito simpáticas para ele, pois enquanto passeava pelas ruas, as pessoas aproximavam-se dele e contavam-lhe os seus sonhos para que os guardasse. Assim, Carlos estava sempre tão ocupado com os sonhos dos outros que tina muito pouco tempo para se ocupar e guardar os seus.
Certo dia aproximou-se dele uma bela padeirinha muito simpática, com um sorriso no rosto, sempre disposta a partilhar os seus sonhos e fantasias. Ao vê-lo, exclamou, de imediato:
- Gostava tanto de poder ficar aqui um bocadinho e partilhar contigo os meus sonhos, talvez te os entregar para que me os guardes.
Ela nem por sombras sabia que o trabalho dele era o de guardador de sonhos e por isso ficou muito admirado quando Carlos lhe pediu dinheiro como forma de pagamento por lhe guardar os sonhos. Mas ela não tinha dinheiro para lhe pagar e, por isso, como o Natal estava próximo, propôs-lhe:
- Não tenho dinheiro para te pagar. Mas vou pagar-te doutra forma. Convido-te para vires passar a Noite de Natal comigo…
Carlos aceitou e aguardou, ansiosamente, que a noite mágica chegasse.
Finalmente chegou e Carlos dirigiu-se para a morada que a padeirinha lhe indicara. Foi ela que o recebeu, juntamente com o pai:
- Pai, este é o meu amigo Carlos. Ele é guardador de sonhos! Como recompensa por guardar os meus sonhos, convivei-o para vir passar o Natal connosco. Assim ele vai ter a oportunidade de guardar o mais belo sonho da minha vida e da dele, o sonho de um Natal muito feliz, do qual ele nunca mais se esquecerá…? Sabes, ele não tem família e não pode celebrar o Natal com ninguém porque vive sozinho…
O pai sorriu e disse:
- Claro que podes vir consoar connosco, Carlos, és muito bem-vindo. Mas agora vamos depressa, senão o peru ainda arrefece
Enquanto a padeirinha corria para o quarto para vestir o vestido mais bonito que tinha, o pai levou Carlos para a cozinha onde estava a mãe muito atarefada a preparar uma deliciosa consoada e que ao vê-lo logo o abraçou com muito carinho.
Pouco depois, sentaram-se todos à mesa repleta de louças e talheres a brilhar. No meio uma enorme travessa com um peru recheado e a fumegar. Ao redor, filoses, rabanadas, formigos, aletria e muitas outras gulodices.
Antes de começar o repasto, a mãe da padeirinha levantou-se aproximou-se de Carlos e, debruçando-se sobre ele, apertou contra o peito e, com os olhos rasos de lágrimas, exclamou:
- Bem-vindo à nossa casa, Carlos! Feliz Natal… Nenhuma criança deveria passar um Natal sozinha.
Depois, pegou-lhe na mão e seguidos pela padeirinha e pelo pai, entraram todos numa sala – a sala mais bonita que Carlos alguma vez tinha visto. Num dos cantos estava uma maravilhosa árvore de Natal enfeitada e junto à qual havia muitos presentes, que todos muito animados desembrulharam.
Foi o mais belo sonho que Carlos guardou.
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A VOZ DE DEUS
"O choro da criança é a voz de Deus”.
Papa Francisco
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A TODOS UM BOM NATAL
(EXCERTOS DE POEMAS DE NATAL DE POETAS PORTUGUESES)
Natal, Natalinho, chega de pressa, traz-me um presentinho.
Nasce mais uma vez, menino Deus! Nasce mais uma vez, neste Inverno gelado. Nasce nu e sagrado. Nasce e fica comigo.
Nasce mais uma vez, menino Deus, porque é Natal, é Natal, é Natal!
Vamos por o sapatinho, lá na chaminé. É a noite de Natal, no meu país, agora. Dois milhões de almas e outros tantos corações põem de parte ódios, torturas e aflições.
Vejo a estrela que percorre a noite larga. Vejo a estrela que perturba fundos mares, a estrela que revela a eternidade.
A noite já se avizinha, as luzes já estão a cintilar e os animais a descansar.
Guardavam os pastores o rebanho, nas vigílias da noite de Belém e a glória do Senhor resplandeceu, para lhes anunciar Supremo Bem:
- Ó pastores do monte e prado, acordai por vosso bem, ide já guardar o gado, para ver Jesus em Belém. Pastorinhos de Belém é pois certo, que na noite de Natal, num curral, baixou o Filho de Deus, lá dos céus.
Sede bem-vinda, noite sem par, trazes encanto a cada lar!
Noite de paz. Noite de luz. Numa gruta de Belém, nasceu o Menino Jesus:
- Eu vou dar ao menino uma fitinha pró chapéu. Ele também me dará um lugarzinho no Céu. É Natal! É Natal! É Natal!
Foi na noite de Natal, noite de santa alegria, em que o mundo parou e o Menino nasceu. Nasceu num estábulo, pequeno e singelo. Ao lado do menino, o homem e a mulher. Uma tal Maria, um José qualquer. O mundo parou e o menino nasceu.
Duas tábuas… Era um berço! Tudo escuro… Estaria Deus lá dentro? Lá estava! Hossana nas alturas. Estava dormindo, nas palhinhas, os anjos estão cantando:
- Glória a Deus nas alturas.
O Menino está dormindo, nos braços da Virgem pura, os anjos estão cantando. O Menino está dormindo nos braços de S. José, os anjos estão cantando.
E havia, lá na Judeia, um rei, feio bicho, de resto, um cara de burro, sem cabresto e duas grandes tranças. A gente olhava para ele, reparava e via que naquela figura havia, olhos de quem não gostava de crianças. E o malvado mandou matar quantos eram pequenos, só porque não gostava de crianças. Mas os anjos em coro, no reino da luz, entoam hossanas a Cristo Jesus.
O nosso Menino nasceu em Belém. Nasce tão-somente para nos querer bem. Adoremos o Menino nascido em tanta pobreza e Lhe oferecemos presentes da nossa pobre riqueza.
Jesus pequenino não quis ter um berço, numa manjedoura ficou. Adoramos o Menino, ofereçamos-lhe presentes: a nossa manta de pele, o nosso gorro de lã, a nossa faquinha amolada, o nosso chá de hortelã.
Os anjos cantavam hinos, a alegria era tão grande e nós cantamos também:
- Que noite bonita é esta, em que a vida fica mansa, em que tudo vira festa e o mundo inteiro descansa…
Chove! É dia de Natal. Na província neva. Lá para o Norte é bem melhor. Nos lares aconchegados. Um sentimento conserva os sentimentos passados. É dia de Natal e toda a gente está contente porque é dia de o ficar.
Chove no Natal presente. Antes isso que nevar. É Natal! É Natal! É Natal.
O jornal fala dos pobres em letras grandes e pretas. Traz versos e historietas, desenhos bonitinhos. Traz bodos, bodos, bodos:
- Hoje é dia de Natal mas quando será de todos?
- Hoje é dia de Natal! Natal de quem? Dos que trazem às costas as cinzas de milhões.
- Natal de paz nesta guerra de sangue? Natal de liberdade num mundo de oprimidos? Natal duma justiça roubada sempre a todos? Natal de ser-se igual mas ser-se esquecido? Natal de caridade quando a fome ainda mata? Natal de esperança, num mundo de bombas? Natal de honestidade num mundo de traição?
- Natal de quê? De quem? Daqueles que o não têm.
É Natal! É Natal! É Natal.
Entremos, apressados, friorentos, numa gruta, no bojo de um navio, num presépio, num prédio, num presídio, no prédio que amanhã for demolido. Entremos e depressa em qualquer sítio porque sofremos porque temos frio.
Entremos e cantemos: “A Todos um bom Natal”.
(NB - Texto elaborado com excertos de poemas de alguns poetas portugueses.)
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A NOITE DE NATAL
(UM POEMA DE MÁRIO SÁ-CARNEIRO)
Em a noite de Natal
Alegram-se os pequenitos;
Pois sabem que o bom Jesus
Costuma dar-lhes bonitos.
Vão se deitar os lindinhos
Mas nem dormem de contentes
E somente às dez horas
Adormecem inocentes.
Perguntam logo à criada
Quando acorde de manhã
Se Jesus lhes não deu nada.
– Deu-lhes sim, muitos bonitos.
– Queremo-nos já levantar
Respondem os pequenitos.
Mário de Sá-Carneiro
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UM CONTO DE NATAL DE MIGUEL TORGA
De sacola e bordão, o velho Garrinchas fazia os possíveis para se aproximar da terra. A necessidade levara-o longe demais. Pedir é um triste ofício, e pedir em Lourosa, pior. Ninguém dá nada. Tenha paciência, Deus o favoreça, hoje não pode ser - e beba um desgraçado água dos ribeiros e coma pedras! Por isso, que remédio senão alargar os horizontes, e estender a mão à caridade de gente desconhecida, que ao menos se envergonhasse de negar uma côdea a um homem a meio do padre-nosso. Sim, rezava quando batia a qualquer porta. Gostavam... Lá se tinha fé na oração, isso era outra conversa. As boas acções é que nos salvam. Não se entra no céu com ladainhas, tirassem daí o sentido. A coisa fia mais fino! Mas, enfim... Segue-se que só dando ao canelo por muito largo conseguia viver.
E ali vinha demais uma dessas romarias, bem escusadas se o mundo fosse de outra maneira. Muito embora trouxesse dez réis no bolso e o bornal cheio, o certo é que já lhe custava arrastar as pernas. Derreadinho! Podia, realmente, ter ficado em Loivos. Dormia, e no dia seguinte, de manhãzinha, punha-se a caminho. Mas quê! Metera-se-lhe na cabeça consoar à manjedoira nativa... E a verdade é que nem casa nem família o esperavam. Todo o calor possível seria o do forno do povo, permanentemente escancarado à pobreza.
Em todo o caso sempre era passar a noite santa debaixo de telhas conhecidas, na modorra de um borralho de estevas e giestas familiares, a respirar o perfume a pão fresco da última cozedura... Essa regalia ao menos dava-a Lourosa aos desamparados. Encher-lhes a barriga, não. Agora albergar o corpo e matar o sono naquele santuário colectivo da fome, podiam. O problema estava em chegar lá. O raio da serra nunca mais acabava, e sentia-se cansado. Setenta e cinco anos, parecendo que não, é um grande carrego. Ainda por cima atrasara-se na jornada em Feitais. Dera uma volta ao lugarejo, as bichas pegaram, a coisa começou a render, e esqueceu-se das horas. Quando foi a dar conta passava das quatro. E, como anoitecia cedo não havia outro remédio senão ir agora a mata-cavalos, a correr contra o tempo e contra a idade, com o coração a refilar. Aflito, batia-lhe na taipa do peito, a pedir misericórdia. Tivesse paciência. O remédio era andar para diante. E o pior de tudo é que começava a nevar! Pela amostra, parecia coisa ligeira. Mas vamos ao caso que pegasse a valer? Bem, um pobre já está acostumado a quantas tropelias a sorte quer. Ele então, se fosse a queixar-se! Cada desconsideração do destino! Valia-lhe o bom feitio. Viesse o que viesse, recebia tudo com a mesma cara. Aborrecer-se para quê?! Não lucrava nada! Chamavam-lhe filósofo... Areias, queriam dizer. Importava-se lá.
E caía, o algodão em rama! Caía, sim senhor! Bonito! Felizmente que a Senhora dos Prazeres ficava perto. Se a brincadeira continuasse, olha, dormia no cabido! O que é, sendo assim, adeus noite de Natal em Lourosa...
Apressou mais o passo, fez ouvidos de mercador à fadiga, e foi rompendo a chuva de pétalas. Rico panorama!
Com patorras de elefante e branco como um moleiro, ao cabo de meia hora de caminho chegou ao adro da ermida. À volta não se enxergava um palmo sequer de chão descoberto. Caiados, os penedos lembravam penitentes.
Não havia que ver: nem pensar noutro pouso. E dar graças!
Entrou no alpendre, encostou o pau à parede, arreou o alforge, sacudiu-se, e só então reparou que a porta da capela estava apenas encostada. Ou fora esquecimento, ou alguma alma pecadora forçara a fechadura.
Vá lá! Do mal o menos. Em caso de necessidade, podia entrar e abrigar-se dentro. Assunto a resolver na ocasião devida... Para já, a fogueira que ia fazer tinha de ser cá fora. O diabo era arranjar lenha.
Saiu, apanhou um braçado de urgueiras, voltou, e tentou acendê-las. Mas estavam verdes e húmidas, e o lume, depois de um clarão animador, apagou-se. Recomeçou três vezes, e três vezes o mesmo insucesso. Mau! Gastar os fósforos todos é que não.
Num começo de angústia, porque o ar da montanha tolhia e começava a escurecer, lembrou-se de ir à sacristia ver se encontrava um bocado de papel.
Descobriu, realmente, um jornal a forrar um gavetão, e já mais sossegado, e também agradecido ao céu por aquela ajuda, olhou o altar.
Quase invisível na penumbra, com o divino filho ao colo, a Mãe de Deus parecia sorrir-lhe. Boas festas! - desejou-lhe então, a sorrir também. Contente daquela palavra que lhe saíra da boca sem saber como, voltou-se e deu com o andor da procissão arrumado a um canto. E teve outra ideia. Era um abuso, evidentemente, mas paciência. Lá morrer de frio, isso vírgula! Ia escavacar o ar canho. Olarila! Na altura da romaria que arranjassem um novo.
Daí a pouco, envolvido pela negrura da noite, o coberto, não desfazendo, desafiava qualquer lareira afortunada. A madeira seca do palanquim ardia que regalava; só de cheirar o naco de presunto que recebera em Carvas crescia água na boca; que mais faltava?
Enxuto e quente, o Garrinchas dispôs-se então a cear. Tirou a navalha do bolso, cortou um pedaço de broa e uma fatia de febra e sentou-se. Mas antes da primeira bocada a alma deu-lhe um rebate e, por descargo de consciência, ergueu-se e chegou-se à entrada da capela. O clarão do lume batia em cheio na talha dourada e enchia depois a casa toda. É servida?
A Santa pareceu sorrir-lhe outra vez, e o menino também.
E o Garrinchas, diante daquele acolhimento cada vez mais cordial, não esteve com meias medidas: entrou, dirigiu-se ao altar, pegou na imagem e trouxe-a para junto da fogueira.
— Consoamos aqui os três - disse, com a pureza e a ironia de um patriarca. — A Senhora faz de quem é; o pequeno a mesma coisa; e eu, embora indigno, faço de S. José.
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CANTATA DE NATAL, EM DOIS ANDAMENTOS
(TEXTO DE ARTUR GOULART)
1.º andamento – Larghetto affettuoso
- Mãe, quando é que fazemos o Presépio?
- Pode ser hoje. Vais com o teu irmão ao musgo. Naquele paredão de rocha ao fundo do quintal não falta. Arranquem-no com cuidado para não se desfazer. E vejam lá não escorreguem. Depois, dás um salto à carpintaria do senhor João e pedes-lhe para trazer um punhado de farelo de serra. Diz que é para o presépio que ele faz-te um embrulho.
- Mas para que é o farelo?
- É para fazer as estradas por onde vêm os pastores e depois os Reis Magos. Estes ficam mais ao longe, porque só chegam no dia 6 de Janeiro.
- Ó mãe, e a gruta para o Menino?
- Ainda temos do ano passado aquelas pedras vermelhas do pico da bagacina. Faz uma gruta linda. E temos aquelas figurinhas de barro que eram da tua avó. Vão caber lá dentro e, felizmente, que ainda estão todas, menos um anjinho que partiu as asas quando quiseste experimentar se ele voava. Mas ainda há um outro para chamar os pastores.
- E a estrela?
- É fácil. Recorta-se em cartão e forra-se com prata de chocolate. Lembras-te que andámos a alisar com a unha as pratas dos chocolates que te ofereceram nos teus anos e que metemos tudo numa caixa? E vão servir também para forrar bolas de papel e pendurar naquele ramo de pinheiro que teu pai trouxe ontem, que vai ficar a brilhar como um céu estrelado ou como a lua no mar.
- E não vamos cantar? Gosto mais é daquela da novena Entrai, pastores, entrai…
- Cantamos essa e outras que vocês também sabem, ó meu Menino Jesus, Noite feliz, O Menino está dormindo…
- O senhor Padre canta uma que eu não percebo, acho que é natusesnobis…
- Isso acho que é latim e julgo que quer dizer que nasceu o Menino.
- Mãe, ó mãe, achas que o Menino Jesus vai gostar?
- De certeza que vai gostar, e até é capaz de te trazer uma prenda.
2.º Andamento – Andante Patético alla breve
- Mãe, já escrevi ao Pai Natal!
- O que é que pediste?
- O que eu queria mesmo e pus em primeiro lugar foi uma consola, das últimas. A que eu tenho já não lê a maioria dos jogos novos. E depois um telemóvel. Os dos meus amigos na escola já são todos melhores do que o meu, tiram fotografias boas e filmam. Tens que me entregar a carta ao Pai Natal.
- Olha, pendura-a na árvore, que ele há-de passar a levá-la. O pai comprou este ano uma árvore grande, de plástico. Vai encher um canto da sala, quase ao tecto. Mais logo, passamos na loja do chinês, e trazemos uma caixa de lampadazinhas, daquelas que piscam, mais bolas coloridas de vários tamanhos, fitas prateadas e douradas. O pai depois ajuda a montar tudo e veremos se falta mais alguma coisa.
- E o que é que vamos cantar?
- Olha, temos uma gravação com o Jingle Bells, até dá para karaoke. E tu já começaste a aprender inglês.
- Mãe, achas que o Pai Natal me vai dar o que pedi?
- Não sei, filho, mas ele costuma dar as prendas aos meninos que se portam bem.
- …………….
- Mãe, ó mãe, e o Presépio?
Évora, 21 de Dezembro de 2009
Artur Goulart
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OS PRIMEIROS BATIZADOS DA FAJÃ GRANDE
A paróquia da Fajã Grande foi criada por alvará régio em abril de 1861, sendo, assim, desanexada da Fajazinha, só a partir de julho, por decisão do Bispo de Angra Dom frei Estevam da Sagrada Família, passou a ter pároco e começou a registar batismos, casamentos e óbitos. Até essa data, todos os registos eram feitos na igreja da Fajãzinha. Nesse ano em que se deu início aos primeiros registos, até esse mês, ou seja até julho, tinham sido registados os batizadas de 12 crianças na paróquia da Fajazinha. A partir de Julho realizaram-se na igreja Fajã Grande e foram registados os primeiros batismos, num total de 14. Os primeiros foram os seguintes:
Nº 1 Isabel, filha de Manuel Rodrigues Silvestre, trabalhador, e de Maria Thomazia do Coração de Jesus, nascida na Ponta. Os pais casaram na Fajãzinha em 16-11-1856
Nº 2 Raulino, nasceu no filho de Raulino José da Silveira, lavrador e de Anna Claudina da Silveira que casaram na Fajãzinha emOS15-1-1946
Nº 3 Claudina que nasceu na Rua Direita e era filha natural de Anna Isabel.
Nº 4 Manuel que também nasceu na Ponta era filho de Manuel Luís Furtado, trabalhador e de Isabel Inácia. Casaram na Fajazinha em -11-60
Nº 5 Manuel nasceu na Fontinha, filho de José Luiz Furtado, lavrador e de Maria Thomásia, residentes na Fajã Grande, mas naturais do Corvo, onde casaram em 2-9-1858
Nº 6 António, filho Manuel António Serpa, lavrador e de Maria de Jesus, naturais dos Cedros e curiosamente a residir no lugar do Areal que na década de cinquenta já era desabitado e onde havia apenas uma casa, velha e desabitada, conhecida como casa da Maria do Areal.
Nº 7 Malvina, filha de José de Freitas Cardoso, trabalhador e de Floripes Luiza da Silveira, residentes na rua da Via d’Água, que pode muito bem ser tia Malvina ou uma irmã com o mesmo nome, falecida em criança.
Nº 8 António que nasceu na Rua Direita e era filho de José António de Fraga, trabalhador e de Maria Emília Bernardo do Coração de Jesus
Nº 9 Tereza, nascida nas Courelas, filha de Francisco Augusto Rodrigues lavrador e de Anna Luiza.Amélia.
Alguns destes batismos, apesar de registados na Fajã Grande, foram realizados na Fajãzinha pelo pároco José Maria Henriques Álvares, devido a ausência do pároco da Fajã Grande.
Era pároco na Fajã Grande o padre António José de Freitas. Como os padrinhos, regra geral, não sabiam assinar, todos os registos, a rogo deles estão assinados por um senhor de nome Lauriano José de Freitas Henriques. Os batismos números 5, 6, 9, 10 e 11 foram os realizados na Fajãzinha pelo pároco José Maria Henriques Álvares, enquanto os 7 e 8 foram realizados por um frade de Santa Cruz de passagem pela Fajã Grande, de nome Diogo António José de Freitas. Este frade franciscano nasceu em Santa Cruz, em Abril de 1788 e faleceu na mesma vila, em 1766. Foi capelão na Fajã Grande e esteve colocado na Fajãzinha como vice-vigário, coadjutor e cura Também foi cura e vice-vigário da Matriz de Santa Cruz, chegando a exercer o cargo de Ouvidor Interino.
Reza assim o termo de abertura do primeiro livro de batismos da Fajã Grande:
Este há-de servir para nelle se lavrarem os assentos dos baptizados na Par.ia do Senhor São José na freguesia da Fajã Grande, do Concelho da villa das Lajens, desta ilha das Floeres, na conformidade do decreto de 19 de Agosto de 1859, passar o resto do ano de 1861, com princípio na data da implementação da dita paróquia, Vai numerado com a rubrica do meu cognome e a frase que diz(?) Freitas e Silveira. Villa das Lajens da ilha das Flores. 30 de Julho de 1861.
O Ouvidor Ecle.º
João Pimentel Freitas e Silveira. “
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O CADERNO DIÁRIO (II)
A Dona Madalena era muito exigente, excedendo-se, frequentemente, em repreensões, castigos e reguadas. Eu pelava-me de medo e tremia como varas verdes. Não era pela preguiça ou desmazelo nos estudos, nem sequer pelos erros ou má caligrafia, parâmetros de avaliação em que era exímio, chegando mesmo, nas lições de cor, a ser o melhor da classe. Em História, desembuchava os reis de Portugal a eito e com os respetivos cognomes. Em Ciências definia, com rigor, cada órgão ou parte do corpo humano e em Geografia papagueava rios, afluentes, linhas férreas e até os países da Europa com as respetivas capitais. Onde eu prevaricava era na limpeza e asseio do Caderno Diário. Não havia mês, semana, talvez mesmo dia, em que não me apresentasse junto à secretária da senhora professora com o caderno sujo e besuntado. Esta ignomínia, que a Dona Madalena julgava de falta de cuidado, era fruto das precárias condições que reinavam lá casa. Isso revoltava-me, porque os outros tinham sempre o caderno limpinho e asseado, embora não me igualassem na leitura ou nas lições de cor. Mas quanto à limpeza, o meu caderno era o pior da classe. Uma autêntica vergonha! Todos os outros primavam por uma limpeza que acentuava mais e mais a imundície do meu.
A minha casa possuía umas instalações tão exíguas e precárias que me forçavam a fazer os trabalhos que a senhora professora mandava, em cima da mesa da cozinha, onde remanesciam migalhas de pão, restos de comida e pingos de café, de leite e de graxa. Além disso, a cozinha era mal iluminada de dia e, à noite, acendia-se uma pequena candeia alimentada a enxúndia de galinha, em que flamejava uma chama frouxa e titubeante que mal permitia divisar pessoas e objetos. A mobília era constituída por uma mesa, meia dúzia de bancos e um pequeno armário. Pelo chão abundavam sacos de serapilheira com batatas, inhames, cebolas e maçarocas de milho. Atrás da porta, o balde do porco, onde se iam armazenando os restos de comida, as cascas das batatas, dos inhames e as lavagens que, depois de cheio, constituía a principal refeição do suíno. Por baixo, uma loja dividida entre arrumos e estábulo.
Era nestas instalações que montava sala de estudo e, por essa razão, o meu caderno diário se transformava numa execrável e hedionda sujeira.
Certo dia, em que o esquecera sobre a mesa, caíram-lhe em cima umas brasas que saltaram do ferro de passar roupa, queimando, parcialmente, meia dúzia de folhas. Estarreci. Com que cara me iria apresentar, no dia seguinte, à Dona Madalena, tendo o caderno naquele estado? Ia ser o bom e o bonito! E não me enganei. Para além da chacota de que fui alvo, levei umas reguadas com a rigorosa imposição de, sem falta, ter que arranjar um caderno novo e passar tudo a limpo, para o dia seguinte.
Matutei a tarde inteira na forma de resolver o imbróglio em que estava exprobrado, apesar de inocente e que passava pela compra de um caderno novo, o que me forçaria a ter que desenvencilhar uns cinquenta centavos. Como só tinha amealhado trinta, recorri à generosidade de minha avó que me abonou os vinte que faltavam.
Ao fim da tarde, sentei-me à mesa e comecei a passar tudo a limpo. Estava prestes a chegar à última folha quando, de repente, me emborcaram uma tigela de café sobre o caderno que eu acabara de passar a limpo.
De nada valeram protestos, choradeiras e reclamações. E tive que me apresentar na escola, na manhã seguinte, com aquela espurcícia em riste, imaginando o que me esperava.
Foi então que, num gesto de grande nobreza, o Amâncio, apercebendo-se da minha angústia e atrapalhação, me acalmou. Desde há muito que eu era o seu maior amigo. Tirou um caderno limpo e novo da sua pasta e, com excessivo cuidado e engenho, cortou-lhe a capa, pedindo-me que na mesma escrevesse o meu nome. De seguida, cortou a capa do seu caderno, substituindo-a por aquela em que eu havia escrito o meu nome, colando-a, muito disfarçadamente, com goma-arábica. Quando, algum tempo depois, a senhora professora me chamou, ele, encorajando-me e incentivando-me com grande convicção, disse baixinho, perante a minha perplexidade:
- Vai! Vai! Não sejas parvo! Ela não vai dar por nada.
E não deu. Apenas, em tom de censura, me recriminou:
- Hum! Que caligrafia é esta?! Nem parece a tua – e, de imediato, perguntou - Foste tu que passaste?
- Fui, sim, senhora professora. É que… passei tudo à pressa…
- A caligrafia não está grande coisa. Mas lá que está limpinho, está – concluiu, sem hesitar, a senhora professora.
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ALIENANTE
MENU 57 – “ALIENANTE”
ENTRADA
Canapés de queijo fresco, legumes e pimentos.
PRATO
Strogonoff de peito de peru com repolho polvilhado com creme de queijo fresco
e ervas aromáticas
Tostas de pão embebidas em alho.
SOBREMESA
Strudel de maçã com laranja e geleia de ananás
Preparação da Entrada: - Colocar sobre as tostas o creme de queijo e os legumes.
Preparação do Prato: - Cortar os bifinhos em tiras finas, e tempera-los com alho e ervas
Levar uma frigideira ao lume a alourar a cebola e o resto do alho. Colocar a carne e a marinada e deixe estufar. Juntar o repolho picado e misturar. Desfazer a farinha maisena no leite e juntar à mistura de carne e repolho, deixando ferver até a mistura engrossar um pouco. Envolver o queijo creme e polvilhar com ervas aromáticas. Empratar ladeando pequenas tostas passadas por alho.
Preparação da sobremesa (strudel): Descascar e cortar as maçãs aos cubos, borrifar com raspa de laranja e juntar o sumo de laranja e um pouco de mel. Numa frigideira colocar as nozes e juntar o preparado das maçãs. Juntar o creme de queijo, o vinho do Porto e juntar duas bolachas Maria, picadinhas. Polvilhar com açúcar e canela e envolver. Servir
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O FILME DA VIDA
“A diferença entre a vida e os filmes é que nos filmes o guião tem de fazer sentido, e na vida não."
Joseph L. Mankiewicz
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A LENDA DA ILHA DO MONCHIQUE
Hoje o Monchique é um enorme ilhéu, situado a Oeste da ilha das Flores da qual dista cerca de cinco milhas. Situado precisamente em frente à freguesia da Fajã Grande, da qual é uma espécie de ex-libris, aquele ilhéu açoriano constitui, verdadeiramente, o ponto mais ocidental da Europa e, durante séculos, serviu como ponto de referência para acertar as rotas e verificar os instrumentos de navegação das inúmeras embarcações que navegavam entre a América e a Europa.
O ilhéu é um enorme rochedo de sólido basalto, constituindo os restos de um cone litoral desmantelado pela erosão marinha. Eleva-se a partir de uma plataforma sita a 40-50 m de profundidade, constituída por escoadas lávicas de morfologia irregular, o que confere aos fundos circundantes um micro relevo acentuado. São numerosas as cavidades submarinas nas encostas deste ilhéu. A região mais profunda da formação é recoberta por depósitos de blocos, calhaus rolados areias. Nas zonas próximas à linha de costa do ilhéu as escoadas lávicas apresentam grandes fraturas, originando paredes verticais. A baixa profundidade existem covas de gigante de grandes dimensões. O ilhéu está no centro de uma região de grande diversidade biológica, com cerca de uma centena de espécies identificadas. A flora litoral é dominada por uma alga castanha, junto das quais existem cracas. Nas águas circundantes são abundantes, entre outros, os peixes-rei.
Mas o Monchique nem sempre foi um simples ilhéu. Segundo uma lenda muito antiga, acredita-se que em tempos muito recuados, o Monchique terá sido uma bela e grande ilha, com uma área igual ou superior à sua congénere de São Miguel e um com formato, no que à orla marítima diz respeito, em parte semelhante à ilha do Pico, com a chamada “ponta da ilha” voltada a oeste. Isto significa que o que a parte mais oval da ilha, assaz mais volumosa do que a da ilha do Pico mas também onde se situava um cone vulcânico de que o Monchique é o último resíduo, se situava a lesta e, por conseguinte, voltada para as Flores que, assim, disfrutaria de uma vista desta ilha muito semelhante à que do Pico se visiona do Faial. Era esta parte daquela ilha mistério, voltado a este, que delineava uma espécie de canal muito estreito, que, separado das Flores, na direção norte/sul, permanecia, frequentemente agitado, devido à força das correntes marítimas que por ali passavam e dos ventos fortíssimos que se faziam sentir, chamado, por isso mesmo, de “Rio Mau”. Por sua vez a sul, e a unir os extremos do bojo com a aguçada ponta situava-se uma descomunal baía ocupando uma área de aproximadamente metade da superfície da ilha.
Contam outras lendas que os piratas europeus ficavam hipnotizados por essa ilha do Atlântico norte, sobretudo pelo seu tamanho, altitude e beleza, muito descomunal relativamente às vizinhas ilhas do Corvo e Flores, com que formavam uma espécie de segundo arquipélago. Tratava-se, segundo relatos de alguns documentos escritos deixados por aqueles piratas, de uma ilha de rara beleza, que encantava quem por ela passa e se aventurava a penetrar nela e a descobrir as inúmeras belezas, vistas maravilhosas, árvores frondosas e as diversas praias. Em meio do Atlântico, protegidas pelo sol e pelo oceano, abençoada pelos deuses, cheia de montes,
Acredita-se que muito antes do povoamento e colonização dos Açores, conforme consta de alguns portulanos muito antigos, assim como as Flores e o Corvo e em conjunto com estas, a ilha tinha o nome de Insulae Corvis Marinis, nome dado pelos navegadores que ao largo passavam e viam as ilhas cobertas de vultos que pareciam corvos negros. Já por esse tempo, no entanto, a ilha do Monchique parecia destacar-se do conjunto das três. Como estava mais próxima das Flores do que o Corvo, terá sido designada por “mui tcenca” ou seja, muito próxima, o que, mais tarde terá evoluído para Monchique. A ilha possuía uma importância incomum graças a sua posição geográfica estratégica e de proteção à navegação que ancorava na sua enorme baía não só para se abrigar de ventos e tempestades mas também para se abastecer de água e frescos.
Muitas lendas foram criadas à volta desta ilha que ainda hoje se continua a vislumbrar mas apenas nas manhãs de São João e se estas nascerem cobertas de uma densa e inebriante bruma.
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BURROS VALENTES
“A puxar para casa/todos os burros são valentes.”
Este era um provérbio, também, muito utilizado na Fajã Grande, o qual encerra uma interessante duplicidade. Nele está patente, por um lado, uma certa ideia de egoísmo ou egocentrismo, contido na expressão puxar para casa, fazendo lembrar um outro dito, também ele expresso na sabedoria popular, o de puxar a brasa para a sua sardinha”. Na verdade, o ser humano muitas vezes mistifica-se e isola-se como que usurpando um querer para si, um açambarcar, um possuir ou ter de seu não somente mais do que os outros mas também o melhor, esquecendo os que estão ao seu lado, a partilha, a doação, a entrega e o deixar que os outros tenham ou possuam o melhor. E para se conseguir isto o ser humano, por vezes, não olha a meios, pelo que esta atitude ou este instinto parece caracterizar-se por se aproximar um pouco duma atitude meramente animalesca, e que o adágio exemplifica comparando-a com a dos animais, escolhendo-se como arquétipo o animal, aparentemente, mais estúpido – o burro. Assim como os burros, os homens no seu instinto puramente animalesco, preocupam-se primeiro consigo e depois consigo. Mas, por outro lado, o uso do provérbio também pretende, com alguma dose de cinismo, insinuar uma certa preguiça ou desmazelo revelado em atividades ou trabalhos que se destina a outros em prol de um maior empenhamento em tarefas pessoais.
Na verdade neste amplo império do egoísmo humano, que o uso do provérbio pretende recriminar, os homens assemelham-se a uns valentes burros. Não esqueçamos que é usado no seu sentido real, pelo que a comparação é totalmente válida, tanto a néscios como a doutos.a
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A RUA DATRONQUEIRA
A palavra tronqueira utilizada como nome comum tem um significado interessante. Com ela pretende-se designar uma espécie de cancela ou porteira duma cerca, construída com três a quatro peças de madeira mais finas que os mourões, presas com quatro ou cinco fios de arame farpado ou liso. Uma das peças da extremidade deve ficar ajustada em meias-luas de arame, com possibilidade de girar em torno do seu eixo fazendo, assim, que a que fica na outra extremidade possa encaixar-se nas meias-luas de arame (liso ou farpado) fixadas uma rente ao chão e a outra na parte superior do mourão da cerca. Portanto o significado desta palavra parece ser o de cancela ou portão de cerca e a rua da Tronqueira pese embora herde o seu nome de um lugar com o mesmo nome, situado ao seu redor, pode considerar-se uma espécie de portão de saída duma espécie de cercal que é o povoado da Fajã Grande. Trata-se de uma espécie de saída para o norte, mais concretamente de uma fuga para os lados das Covas, da Ribeira das Casas, da Ponta e até para a longínqua freguesia de Ponta Delgada. A Tronqueira parece ter sido em tempos idos e era-o ainda na década de cinquenta uma viela extremamente movimentada, porquanto para além dos seus moradores que nela transitavam diariamente, passavam por ali muitas outras pessoas, não só com destino à Ponta ou a Ponta Delgada, mas nas suas idas e vindas para as terras e relvas que possuíam para aqueles lados, desde o Calhau Miúdo à Ribeira do Cão. Era também a principal via de acesso ao mar, mas para os lados do Rolo e este, em dias de saída de sargaço, era procurado por quase todos os habitantes da freguesia. Assim, o epíteto Tronqueira atribuído à rua que liga o centro da freguesia ao Calhau Miúdo pode advir-lhe, simplesmente, desta sua funcionalidade e até ter sido a rua a dar nome ao local e não ao contrário.
A Rua da Tronqueira iniciava-se no fim da Rua Direita ou na sua parte mais próxima do mar e prolongava-se para nordeste, em forma de um L com o ângulo invertido. Por isso a sua primeira parte e a mais próxima da rua Direita e do centro do povoado, seguia perpendicular à rua Direita e quase paralela à Fontinha, sendo, nessa parte, quase roda ladeada de casas, com exceção da entrada, do lado sul, onde era ladeada pelas altíssimas paredes de uma terra que pertencia ao Francisco Tomé. Do outro lado e após estas paredes eram casas e casas, muito aconchegadas umas às outras, seguindo quase em linha reta até ao palheiro do Lucindo Cardoso, antes do qual, no entanto, havia um outro espaço, neste caso de ambos os lados, sem casas. Aí, junto ao palheiro do Lucindo Cardoso, a rua que até então segui na direção nordeste, muda o seu rumo e seguia na direção do norte, com algumas pequenas curvas e contra curvas. A meio desta reta, junto à casa do Senhor Rodrigues, havia um bebedouro ou poço do gado beber e, logo adiante, uma fonte, a única existente nesta rua. Aqui as casas também ladeavam a rua quase por completo, sendo que nalguns sítios existiam pequenas veredas ou canadas dando acesso a habitações construídas for da berma da estrada, por nesta não caberem todas. A rua, com as casas mais espaçadas lá para o norte, terminava no Alto do Calhau Miúdo, junto à casa do Manuel Branco, onde havia um emblemático descansadouro.
A Tronqueira pode orgulhar-se de nela ter nascido um dos mais ilustres filhos da Fajã Grande, o padre José Luís de Fraga que, para além de sacerdote, distinguiu-se como músico e poeta, neste caso utilizando o pseudónimo de Valério Florense.
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AGOSTO DE 1869
Quando a freguesia da Fajã Grande era ainda uma criança, com oito anos de existência, no longínquo ano de 1869, no mês de agosto, para além de dois adultos, faleceram oito crianças, numa população que, muito provavelmente, não ultrapassaria às mil pessoas, em menos de trezentos fogos.
Muito trabalho terá tido o reverendo António José de Freitas, o primeiro pároco da Fajã Grande, mas que anteriormente já exercia as funções de capelão da mesma.
Assim, no dia 7 de agosto, faleceram duas crianças: uma menina de nome Celestina, com apenas 13 meses de vida, moradora na Rua da Tronqueira, filha de Manuel de Freitas Branco e de Maria de Jesus e um rapaz de nome João de 12 meses, residente na Via d’Água, sendo seus pais António Inácio Júnior e Maria de Jesus. No dia 10, faleceu Maria, de 14 meses, nascida nas Courelas, filha de João de Freitas Fragueiro e de Maria Margarida e ainda Ana, de 2 meses, da Fontinha, filha de Manuel Inácio Furtado e Ana Joaquina. No dia 12 faleceu, Maria de 11 meses, nascida também nas Courelas, filha de Ana de Jesus e pai incógnito. No dia 18, faleceu Tomásia de 13 meses, residente na Fontinha, filha de João Furtado de Sousa e de Ana Margarida e no dia 19, João, de 6, nascido no lugar da Ponta, filho de João de Freitas Botelho e de Isabel Luísa Finalmente, no dia 25 faleceu Mariana, com a idade de 4 anos, nascido na Tronqueira, filha de Manuel de Freitas Carneiro e de Júlia Emília e no dia 28, João de 16 meses, filho de Manuel Inácio Serpa e de Catarina Joaquina, nascido na rua da Via d’Água.
Neste ano de 1869, no entanto morreram mais dez crianças, perfazendo assim um total de dezoito, num conjunto de trinta e um óbitos, ou seja, 58% dos óbitos verificados nesse ano foram crianças. De realçar ainda que, destas dez mortes infantis, ocorridos fora do fatídico mês de agosto, cinco ocorreram no mês seguinte, ou seja em setembro, pelo que se poderá concluir que, por esta altura, a freguesia terá sido assolada por alguma epidemia infantil, até porque, no ano anterior faleceram apenas vinte e cinco pessoas e no seguinte, ou seja em 1870, registaram-se apenas vinte e quatro óbitos.
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REGISTO UM - ANO DE 1909
“Aos onze dias do mez de Janeiro do anno de mil novecentos e nove, nesta egreja parochial de São Jose da Fajam Grande, concelho das Lajens, ilha das Flores, Diocese de Angra, na presença do Reverendo Caetano Bernardo de Souza, Reitor da freguesia do Mosteiro, deste mesmo concelho, com aucthorisação minha, padre Joaquim Francisco Campos, vicevigário desta dita freguesia, compareceram os nubentes José Fagundes da Silveira Junior e Joaquina de Souza Fagundes, os quaes soube serem os próprios, com todos os papeis do estylo corrente, e sem impedimento algum canonico ou civil, para o casamento, elle de edade de vinte e cinco annos, solteiro, trabalhador, natural e morador na rua da Fontinha, desta dita freguesia, filho legitimo de José Fagundes da Silveira e de Mariana Fagundes da Conceição, também naturaes desta supra dita freguesia da Fajã Grande e ella de edade de dezoito anos, filha legítima de José Maria de Souza e de Maria José Theodósio, também naturaes desta já nomeada freguesia da Fajã Grande, os quaes nubentes se receberam por marido e mulher e os unio em matrimónio procedendo em todo este acto conforme o Rito da Santa Madre Jgreja Catholica e Apostholica Romana. A este acto compareceram José Maria de Souza, pae da nubente, como legítimo superior, declarou verbalmente na presença do Reverendo oficiante e das testemunhas abaixo mencionadas, que dava seu consentimento para o casamento da sua filha Joaquina de Souza Fagundes e assignaria este assento. Foram testemumhas presentes que sei serem os próprios, José Joaquim Cardozo, professor official de instrução primária e José Caetano Rodrigues casados, todos moradores nesta freguesia, digo casado, proprietário, todos moradores nesta freguesia. E para constar lavrei em duplicado este assento que depois de lido e conferido perante os cônjuges e testemunhas, o legítimo superior da cônjuge e do reverendo officiante commigo todos assigmaram. Era ut supra. Vão collados dois sellos no valor de mil e setecentos reis, sendo mil e seiscentos reis por a nubente ser menor e cem reis devidos por este assento, que vão devidamente enutilisados “
Seguem-se as assinatura de: “José Fagundes da Silveira Junior, Joaquina de Souza Fagundes, José Maria de Sousa, José Joaquim Cardoso, José Caetano Rodrigues, padre Caetano Bernardo de Sousa, O vicevigário Joaquim Ferreira de Campos.”
Este é o registo do assento de casamento dos meus avós maternos, conforme consta do livro de Registos de Casamentos da Paróquia de São José da Fajã Grande, ano de 1909, digitalizado no Centro de Conhecimento dos Açores, Direção Regional da Cultura, Secretaria Regional da Educação e Cultura.
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A SEREIA E O PESCADOR
Era uma vez um pescador que, certo dia, na sua ida para o mar, a fim de se dedicar à faina diária, ao chegar junto aos rochedos do baixio, ouviu um choro muito triste. De imediato parou e, pondo-se à escuta, percebeu que o choro vinha duma pequena furna que se encontrava ali perto entre as rochas negras. Seguindo na direção da furna, aproximou-se da entrada, espreitou e viu, lá dentro, uma linda sereia a chorar. O pescador, condoído com tamanha dor mas encantado com tão grande beleza, embora um pouco hesitante e tímido, entrou na furna e aproximando-se daquele estranho mas sublime ser, perguntou:
— Porque estás assim tão triste?
A sereia, erguendo-se, explicou que tinha vindo até à praia e que sem que se apercebesse, a maré tinha descido. Estava ali, isolada, triste porque com a maré baixa não conseguia regressar para o mar. Um pouco a medo, pediu ao pescador que a levasse para o mar.
O pescador, cada vez mais nervoso por se aproximar de um ser tão belo mas estranho, aceitou o pedido, dizendo:
— Levo-te, sim, se tu em troca voltares aqui amanhã para que eu te possa contemplar mais uma vez.
O choro da sereia acalmou-se. Com um suave gesto de cabeça concordou e, deslocando-se a muito custo, aproximou-se do pescador, a fim de que lhe pegasse ao colo e a levasse para o mar. O pescador, cada vez mais admirado com o que encontrara, pegou na sereia com cuidado e levou-a até ao mar, onde ela logo mergulhou com agilidade e graça.
No dia seguinte o pescador voltou ao mar. Passado pouco tempo a sereia emergiu das águas, conforme o combinado. Muitas outras vezes o pescador voltou a passar pelo lugar onde encontrara a sereia. Algumas vezes ficava parado à espera da sereia e pouca depois ela voltava, outras, porém, ficava horas a fio à espera e ela nunca aparecia. E um dia, finalmente, a sereia partiu e nunca mais voltou.
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REGISTO ONZE - ANO DE 1882
“Aos trinta dias dumes de Novembro do anno de mil outocentos e outenta e dous, nesta jgreja parochial de São Jose da Fajamgrande, concelho da villa das Lajens, das Flores, Diocese de Angra, na minha presença comparecerão os nubentes Antonio Lourenço Fagundes e Maria de Jesus Fagundes, os quaes sei serem os próprios, contados os papeus do estilo corrente, e sem impedimento algum canonico ou civil, para acasalamento dos mesmos nubentes visto terem sido dispensados os contraentes do impedimento de segundo grau de consanguinidade em linha colateral e igual pelo Excelentissimo e Reverendíssimo Bispo desta Diocese ele de jdade de trinta e três anos, solteiro, lavrador, natural e morador nesta freguesia e batpizado na Paochia de Nossa Senhora dos Remédios da Fajansinha deste mesmo concelho e Diocese, filho ligitimo de José Lourenço Fagundes, trabalhador e de Maria Joaquina da Silveira de occupação doméstica, ambos naturaes desta freguesia e ella de vinte anos de idade achandosse authorisada pelo consentimento paterno, como digo, authorisada pelo consentimento paterno para contrair matrimónio, como consta do mandato que apresentar, solteira de occupação doméstica, natural, moradora e baptizada nesta freguesia, filha ligítima de António Joaquim Fagundes, lavrador e de Policena de Jesus, ambos naturaes e residentes nesta freguesia, os quaes nubentes se receberão por marido e mulher e assim em matrimónio procedendo em todo este acto conforme o Rito da Santa Madre Jgreja Catholica e Apostholica Romana, perante testemumhas presentes que sei serem os próprios, Manuel Lourenço e José Garcia, casados, lavradores e moradores nesta freguesia. E para constar lavrei em duplicado este assento que depois de lido e conferido perante os cônjuges e testemunhas. Commigo assigmam os cônjuges, não assignando as testemunhas por não saberem escrever. Era ut supra. “
Seguem-se as assinatura de: Maria de Jesus Fagundes, António Lourenço Fagundes, o vigário José Maria Henriques Álvares.”
Este é o registo do assento de casamento dos meus avós paternos, conforme consta do livro de Registos de Casamentos da Paróquia de São José da Fajã Grande, ano de 1882, digitalizado no Centro de Conhecimento dos Açores, Direção Regional da Cultura, Secretaria Regional da Educação e Cultura.
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NATAL
O Inverno é frio,
Frio com muita neve.
Neve branca,
Branca é uma parte da roupa do Pai Natal.
Pai Natal traz presentes,
Presentes ficam no dia de Natal ao lado do presépio,
Presépio traz Jesus.
Jesus nasce no dia 25,
25 é dia de Natal!!!!
Por Catarina Fagundes
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O ACIDENTE NA QUEBRADA DOS FANAIS
No dia 3 de Abril do ano de 1871 foi encontrado morto na Quebrada dos Fanais, no lugar da Ponta da freguesia da Fajã Grande, Francisco Inácio Serpa, natural e residente no mesmo lugar da Ponta. O falecido que muito provavelmente se deslocara para ali sozinho era casado com Ana de Freitas, deixou três filhos e, naturalmente, muitos outros parentes e amigos que choraram a sua morte. Era filho de Manuel Caetano Serpa, natural da freguesia do Lajedo, e de Mariana de Jesus natural do lugar da Ponta, ambos já falecidos.
Francisco Serpa não deixou testamento e foi sepultado no cemitério da freguesia, tendo presidido às cerimónias fúnebres o pároco António José de Freitas. Muito provavelmente terá sido encontrado apenas quando procurado, depois da sua família estranhar a sua demora naqueles andurriais.
A Quebrada dos Fanais fica situada na rocha dos Fanais e na baía com o mesmo nome, tendo em frente o ilhéu de Maria Vaz ou da Gadelha e resultou de uma antiga derrocada da rocha, sobre o mar, formando uma pequena fajã. Apesar de muito distante do povoado da Ponta e de ser local de difícil acesso, era um lugar muito procurado, por ser muito fértil, onde floresciam bons inhames e, sobretudo, por ser um ótimo pesqueiro. Além disso também era lugar privilegiado, por ser muito escondido, permitindo assim que as baleeiras americanas se abastecessem de água e por onde se esquivavam, muitos homens na demanda da América. Mas era um sítio muito perigoso, uma vez que o seu acesso obrigava a descer uma rocha íngreme, de onde, frequentemente, caíam pedregulhos e derrocadas. Muitos outros acidentes ali se terão verificado, sobretudo no século XIX.
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DEZEMBRO TRAVESTI
Este dezembro parece ter-se transformado num travesti da primavera. Brinda-nos com dias, é verdade que frios, diria mesmo muito frios, mas claros, luminosos, cheios de sol, a abarrotar de calmaria, apesar de pequenos. Não há chuva, nem vento nem nuvens e o céu abre-se num abraço acolhedor, num impressionante elo de luminosidade entre o mar e a terra, ornando os montes e os vales duma sublimidade verde, reluzente e atrativa.
É doce, salutar e transcendente acordar neste verão de um santo qualquer que não de São Martinho, abrir a janela e sentir o astro rei a penetrar pela casa, a despertá-la do ronronar da noite, enchê-la de luz natural e doce, avivar-lhe os recantos mais escuros, a despeja-la do silêncio morno da noite. Se há lua na noite, a claridade do dia não se esconde em nuvens sonolentas, nem se aterroriza com tempestades invernais. Por isso, se o luar da noite é belo a claridade do dia não lhe fica atrás. É sublime! O problema será pensar-se que este sol, nunca seguirá o exemplo da lua, pelo que terá os seus dias contados, poderá muito bem nem sequer chegar ao Natal. Mas recordemos que, afinal, dezembro não é todo outono. Uma pequena parte também inverno e não creio que este tenha a generosidade de, imitando este outono de dezembro também se trasvestir de primavera. Impossível.
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MÃE SENHORA
Mãe:
sobre o restolho do lodo apodrecido
esmagaste o estrondo das vielas desertas.
Mãe:
sobre o raiar duma aurora atordoada
semeaste o perfume dos trigais abandonados.
Mãe:
sobre o sufoco duma aventura cerceada
resgataste o brilho das ondas revoltadas.
E apenas tinhas,
ao teu lado,
uma titubeante brisa matinal.
Mãe:
Senhora!
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INDEPENDENTISMO
Sabe-se, hoje, que o lugar da Fajã Grande terá sido povoado logo após o segundo povoamento da ilha das Flores, pelo que nos finais do século XVI, já existiriam seres humanos no lugar onde hoje se situa aquela que é considerada a freguesia mais ocidental da Europa.
As razões que levaram alguns dos primeiros colonos a fixarem-se neste aprazível local ter-se-ão prendido, decerto, com o seu clima, com a riqueza do seu solo, com a abundância da água das suas ribeiras e com o fácil acesso ao mar. Na verdade Gaspar Frutuoso em Saudades da Terra, referindo-se ao lugar da Fajã Grande escreveu: “Dali a um quarto de légua está uma Fajã, chamada Grande, que dá pão e pastel, em terra rasa, com algumas engradas onde entram caravelas de até cinquenta moios de pão a tomar o pastel que nela se faz, onde também há marisco e pescado de toda a sorte, e no cabo dela está um areal, de meia légua de comprido, em que sempre, anda o mar muito bravo; e dali por diante, a outra meia légua, é tudo rocha talhada, onde se apanha muita urzela, e de muita penedia por baixo, em que se cria infinidade de marisco e grandes caranguejos e desta mesma maneira corre a rocha um tiro de bombarda até uma ponta, que sai ao mar um tiro de arcabuz, com um baixo de pedra, que tem lapas e búzios; e, logo adiante da ponta, se faz uma baía, onde com ventos levantes ancoram navios de toda a sorte e também naus da Índia. No meio deste ancoradouro cai da rocha no mar, a pique, uma grande ribeira.”
O povoado, embora, integrando a paróquia das Fajãs desde 1676 como um simples lugar, cresceu rapidamente, sobretudo porque cedo se transformou num verdadeiro centro de estranhas mas frequentes transações comerciais, chegando mesmo as caravelas da Índia a encontrar ali um desembarcadouro para refresco e víveres na seu regresso, já que esta era a primeira terra que encontravam ao demandar a Europa vindas da África e Ásia. Piratas e corsários também terão encontrado ali, um local, com uma população com que podiam estabelecer uma relação colaborativa, já que isolado do mundo o povoado da Fajã Grande não poderia obviamente defender-se, mas poderia beneficiar com a venda de comestíveis frescos e outros produtos.
Tudo isto fez com que a população da Fajã Grande, ao longo dos tempos, manifestasse interesse em firmar-se como freguesia independente. O primeiro sinal deste independentismo deu-se com a construção de uma pequena ermida dedicada a São José em 1757 e que permitia ao povo evitar deslocar-se à igreja da Fajãzinha, a fim de participar nos ofícios e celebrações religiosas, uma vez que a ermida, nesse mesmo ano, foi dotada de um capelão, em regime de exclusividade, o padre Francisco de Freitas Henrique, natural do mesmo lugar. Foi com muito esforço e sacrifício mas com uma enorme força de vontade que o povo conseguiu este empreendimento, pois conta-se que, ao regressar da missa, da Fajãzinha, calcorreando o atual Caminho da Missa, o povo aproveitava para carregar as pedras com que construiria a sua ermida.
Porém, os sinais mais claros deste espírito independentista surgiram, sobretudo na década de cinquenta do século XIX, altura em que é feito, formalmente, um pedido ao Governador da Junta Geral do Distrito, no sentido daquele lugar se tornar independente. Por essa altura surgem vários testemunhos em prol da criação da futura paróquia da Fajã Grande. O próprio chefe do distrito da Horta considera que criar ali uma freguesia será de grande serviço feito aquele povo.
A constituição da nova freguesia contou, também, com a colaboração do próprio pároco da paróquia da Senhora dos Remédios que se deslocou a Lisboa, a bordo do iate Santa Cruz, “para tractar duma pretenção com que andam há muitos anos os povos da Fajam Grande que desejam que se crie n’ella uma freguesia independente da Fajãazinha, a que estãi sujeitos.
Finalmente as pretensões dos fajãgrandenses foram satisfeitas em 4 de Abril de 1861, data em que foi autorizada, por decreto real, a desanexação das povoações da Fajã Grande, Ponta e Cuada, a fim de que passem a constituir uma freguesia independente. A ereção da nova paróquia foi formalizada por alvará, no mesmo ano, do Bispo de Angra, D. Frei Estevão de Jesus Maria.
Finalmente a Fajã Grande atingia o objetivo de há muito desejado – ser uma freguesia independente.
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A ARTE DE ENGANAR
«É tão fácil enganar-se a si mesmo sem o perceber, como é difícil enganar os outros sem que o percebam»!
François de La Rochefoucauld