PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
NATAL EM ENTREVISTA
Jovem professora, recentemente colocada em Oleiros de Cima, com um horário semanal de 12 horas, mãe de uma filha de dois anos, Natália Semedo está obrigada a uma deslocação diária de mais de cem quilómetros entre a sua residência e o local de trabalho. Além disso, está forçada a entregar a filha aos cuidados de uma senhora que, apesar de merecer a sua confiança, é uma desconhecida, por não haver jardins-de-infância na localidade. O marido trabalha numa pequena empresa de construção civil e recebe pouco mais do que o ordenado mínimo, pese embora consiga algumas horas extraordinárias e fins-de-semana, o que lhe permite duplicar o frágil e débil ordenado. Apesar de tudo, Natália, o marido e a filha viveram um Natal feliz e repleto de tradições, conforme o revelou na seguinte entrevista.
Pico da Vigia 2 – O seu Natal? Foi feliz.
Natália Semedo – O meu Natal, aliás o “nosso” Natal foi muito feliz. É verdade que pela primeira vez o vivi separada de meus pais e dos pais do Cristiano, dado que, este ano, fomos obrigados a nos mudamos para muito longe das residências deles. Mas em contrapartida vivemos o Natal, pela primeira vez, sozinhos, com a nossa filhinha. A longa distância, as dificuldades com que vivemos e a neve impediram-nos de nos deslocarmos à terra onde nascemos. Ficamos tristes por isso. Mas o viver o Natal pela primeira vez sozinhos, como família, trouxe-nos uma enorme alegria
P V 2 - Natal com frio ou com sol?
N S – Sempre adorei o frio e a neve do Natal. Quando decidimos mudarmo-nos aqui para o sul, cuidava que havia de ter um Natal mais quentinho. Afinal este ano o frio, pelos vistos atingi-nos a todos.
P V 2 – Pai Natal ou Menino Jesus?
N S – Ainda sou do tempo em que, na aldeia onde nasci, todas as crianças acreditavam que era o Menino Jesus que trazia os presentes. Depois tudo se modificou. Rapidamente, a atraente e bondosa imagem do Pai Natal cresceu, ultrapassou as grandes cidades chegou às mais pequenas e isoladas aldeias. Tudo se transformou e hoje nenhuma criança resiste à simpática figura daquele velhinho vestido de vermelho, de longas barcas brancas e carregado com sacos cheios de presentes com que nestes meses antes do Natal persiste em todos os meios de comunicação social. Nós, adultos acompanhamos, com muito amor e carinho, este fantástico sonho das crianças.
P V 2 - Esperar pela manhã ou abrir os presentes à meia-noite?
N S – A resposta é muito semelhante à anterior. Antigamente este salutar reboliço do Natal era menor e nós adormecíamos, com facilidade, embalados pelo sonho de acordar na manhã seguinte e ver, junto ao presépio, uma boneca, um carrinho, um conjunto de cozinha ou um embrulho de figos passados. Hoje os ruídos e as imagens são tantas que não é fácil resistir. Muito antes da meia-noite está tudo aberto. Em pequena, eu e os meus primos, não resistíamos ao sono e só abríamos as prendas de manhã.
P V 2 - Cânticos de natal? Sim ou Não?
N S – Adoro-os! O Natal sem eles não era Natal. Alguns são deliciosamente belos e duma musicalidade adorável. E o interessante é que só por altura do Natal têm este sabor mágico. Sempre enchi a minha casa com luzes e cânticos no dia de Natal. Vou continuar a fazê-lo, tentando deixar este legado à minha filha. A Música de Natal é eterna e transmite-se de geração em geração..
P V 2 - Qual o menu da consoada? Deu continuidade às tradições que trouxe da sua aldeia?
N S - Na minha casa sempre se comeu bacalhau com batatas, ovo e couves, na noite de Natal, como era tradição na terra. No dia de Natal imperava a roupa velha e mais tarde, também, o cabrito assado no forno. Nos doces tinham lugar na mesa as rabanadas, os formigos, as filoses de abóbora e o bolo-rei, claro. Neste nosso primeiro Natal abdicámos do cabrito, até porque nem temos forno de lenha. Em contrapartida introduzimos a carne de peru, sob a forma de bife, sobretudo pela Joana, um pouco alérgica ao “fiel amigo”. Mantivemos todos os doces.
P V 2 – E no que a prendas diz respeito? O que recebeu ou gostava de ter recebido neste Natal?
N S – A melhor prenda que tive foi a de estar com a minha família, ou seja com o meu marido e a minha filha. Quando criança, em casa dos meus pais, passávamos este dia todos juntos. Quero manter essa tradição de estarmos juntos. Em relação a prendas propriamente ditas, a situação que vivemos não nos permitiu concretizar vontades. Apenas tentámos perceber os desejos da Joana. Felizmente e sem grandes gastos, conseguimos concretizá-los quase por completo. Aproveitamos a época para comprarmos algumas roupas e im ou outro utensílio necessário para a nossa casa.
P V 2 – Se pudesse escolher onde gostava de passar o ano?
N S – Precisamente onde e com quem passei o Natal.
P V 2 – Desejos para 2015?
N S – Só dois: saúde para a minha família e paz para o mundo.