PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
SALTO NA BURRA
Meus irmãos mais velhos, dedicadíssimos às atividades agrícola e pecuária que não apenas lhe garantiam a subsistência como também lhe permitiam amealhar alguns troquitos, em determinada altura, decidiram comprar uma burra. Era uma enorme mais-valia para os seus carregos e tarefas. A bicha aliviava-lhes as cargas e ainda a montavam nas suas idas e vindas para os campos mais distantes do Pocestinho e dos Lavadouros. A burra era forte, mansa e afeiçoara-se a eles, cumprindo ordens e adquirindo hábitos que só eles conheciam.
No verão seguinte, ao regressar de férias, fascinou-me a burra. E num dos primeiros dias decidi-me por um passeio a cavalo. Pretendia iniciar-me numa inédita aventura de cavalgar no lombo da jumenta. Mas a famigerada era teimosa que nem um burro e sonsa como um touro. Além disso, tinha hábitos que eu desconhecia.
Soltei-a do palheiro, trouxe-a para o caminho e tentei saltar. Impossível! A burra era muito alta e eu de perna curta. Mudei de plano. Aproximei o estafermo de um muro que havia em frente da minha casa. Eu a puxar para a frente ela para trás. Quando a consegui aproximar do muro, coloquei-me em cima dele e zás. Atirei-me de rompante para o dorso do animal. O que havia de passar pela cabeça da maldita, enquanto eu jimpava pelos ares, para me encavalitar? Aproximar-se do muro, como, pelos vistos, era seu hábito. Só que eu, como já impulsionara o corpo com a força que julgava necessária para atingir-lhe o lombo, fui estatelar-me quase inconsciente, do outro lado, sobre o pedregulho da calçada.
E enterraram-se ali os meus sonhos de cavalgar toda a sela.