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AS SENHORAS MENDONÇAS

Sábado, 31.01.15

Na rua da Assomada, a uns escassos metros da minha casa, um pouco mais acima, na década de cinquenta, viviam três mulheres, conhecidas pelas “Senhoras Mendonças”. A mais velha, chamava-se Luísa, a segunda, em idade, Anina e a mais nova Rosária. Viviam sozinhas, porquanto as duas mais novas eram solteiras e a mais velha, familiarmente, tratada pela “Senhora Luisinha Mendonça”, era viúva. Esta senhora, de nome completo, Luísa Matilde Mendonça da Silveira, casara com, José Lourenço da Silveira, no entanto ficara viúva, havia alguns anos. É verdade que desse casamento nasceu um filho, Pedro Laureano e Mendonça da Silveira, escritor, jornalista, poeta, crítico literário e ensaísta, considerado hoje como um dos maiores vultos da cultura literária açoriana no século XX. No entanto, Pedro da Silveira, possuidor de uma inteligência privilegiada e rara, cedo abandonou a terra natal, fixando-se em Angra, onde fez os estudos liceais, vivendo, posteriormente, em Ponta Delgada e, a maior parte da sua vida, em Lisboa. Raramente e apenas no verão visitava a Fajã, pelo que as três senhoras viviam sozinhas.

A Senhora Rosária, pese embora fosse a mais nova, queixava-se de algumas maleitas e padecimentos, pelo que mais se reservava para as tarefas domésticas. Era a senhora Luísa e, sobretudo, a senhora Anina que se dedicavam aos trabalhos dos campos, pois era deles que viviam, cavando, sachando, mondando, ceifando fetos e cana roca, cortando lenha, acarretando-a para casa, criando galinhas e porcos.

Eram senhoras de uma educação esmerada, respeitadoras de todos, carinhosas, muito atenciosas e favoráveis. Lembro-me de ir, em criança, a casa delas e era recebido com muito carinho e amizade. Ofereciam-me sempre uma fatia de pão com doce. Em frente à sua casa, havia um pequeno largo e neste um fontenário público, onde eu ia buscar baldes de madeira cheios de água, pois nesses tempos, na minha casa não havia água canalizada. Por vezes, os baldes eram pesadíssimos e eu aflito para os carregar. Sempre que me via em tais dificuldades a senhora Anina ajudava-me a trazer os baldes. Lembro-me, também, de que ela era muito amiga da minha mãe e, sobretudo, durante a sua doença, visitava-a com muita frequência, sempre muito prestável e disposta a ajudar no que ela precisasse.

A senhora Luísa, apesar de muito velhinha, ainda se deslocava aos campos não apenas para os trabalhar mas também para, no regresso, trazer sempre à cabeça um molhinho de lenha ou de couves, um saco de batatas ou um cesto de inhames. Mas, na verdade, o braço forte da casa era a senhora Anina, sempre forte, sempre rija, a desempenhar com grande esforço e competência invulgar todas as atividades agrícolas comuns a qualquer casa de lavrador da freguesia. E era uma casa farta, a das Senhoras Mendonças e as suas donas muito generosas, pois contribuíam sempre em peditórios e derramas e quando, nós crianças, lá íamos cantar os Anos Bons ou os Reis, tínhamos sempre uma moedinha branca, o que era raro acontecer noutras casas.

 

 

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publicado por picodavigia2 às 11:32





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