PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A ALIMENTAÇÃO
Na Fajã Grande, até à década de cinquenta a alimentação era muito limitada. Embora houvesse abundância de alguns produtos, nomeadamente, pão, leite, ovos, carne de porco, fruta, etc., outros rareavam e muitos, simplesmente não existiam. A ceia, à noitinha, era, geralmente, reduzia a pão migado no leite. Eram as tradicionais Sopas de Pão e Leite. Algumas vezes o bolo ou as escaldadas substituíam o pão, quando este faltava ou abolorava. Outras vezes eram as papas misturadas no leite. As habituais feitas de farinha fina, ou as grossas feitas do milho verde, abruptamente moído num moinho caseiro. Às vezes enriquecia-se este mísero cardápio com uma sopa de agrião ou de couve. Uma colherada de pão e leite alternada com uma de sopa. Às vezes um pedacinho de queijo, sobretudo nas alturas em que havia crostes, o leite que as vacas davam após o parto e que não era levado para a máquina, para desnatar, aproveitava-se para queijo. Isto à ceia, à noite, porque ao meio dia, ao jantar a ementa era mais completa: batatas cozidas, brancas ou doces, por vezes inhames a acompanhar peixe frito, tortas de ovos, linguiça, torresmos e pão de milho. Geralmente não se bebia vinho e era uma boa tigela de café que substituía o vinho. Por vezes o cardápio do almoço era enriquecido com maçarocas de milho verde e tenro que se coziam junto com as batatas, ou, separadamente, em água com funcho. Outras vezes fatias de abóbora também cozidas com as batatas brancas. Outras vezes eram as batatas-doces assadas no forno depois de cozer o pão, que de tão saborosas que eram até se comiam sem nada. Às vezes mesmo ao jantar, ao meio dia comia-se, uma sopa de couves ou de agrião ou de feijão com uma bela talhada de toucinho. Outras vezes era o peixe frito. O feijão assado com pedacinhos de linguiça só aparecia nos dias mais importantes. Lapas em tortas ou guisadas também serviam de conduto, sendo comidas com pão ou bolo, pois havia muitas mulheres que se aventuravam a ir apanhá-las para os lados do Areal, enquanto alguns homens iam pescar, sobretudo vejas, sargos, polvos e moreias pretas. O café era de mistura com cevada, chicória e até favas torradas e com pouco ou sem nenhum açúcar. Muitas vezes as mulheres ou as crianças iam levar o jantar aos homens, que andavam a trabalhar nos campos e costumava ser peixe frito ou conduto de porco, pão de milho e café, sempre café. Não havia sobremesa, a não ser arroz doce pelo Natal, filoses pelo Carnaval e pão adubado pelo Espírito. A fruta, geralmente, comia-se nos intervalos das refeições, muitas vezes na própria terra onde havia árvores, carregadinhas da dita cuja. Pela Páscoa comiam-se os folares e na Sexta-feira Santa sopa de funcho.Um prato que se fazia quando não havia conduto era o mangão, feito à base de batata branca cozida e esmagada, misturada e bem envolvida num refogado de graxa de porco, cebola e alho. Outras vezes eram as migas simples, feitas de pão fervido e misturado na banha. Quando não havia conduto também era o queijo feito em casa que o substituía. Por vezes, sobretudo as crianças comiam o pão barrado com a graxa da linguiça. Raramente se matava uma galinha. Só em caso de doença e pelo entrudo. Muitos homens e crianças bebiam uma boa tapa de leite na altura em que ordenhavam as vacas.
Carne e pão de trigo, só pelas festas do Espírito Santo ou quando algum americano dava um jantar ou ainda pelos casamentos, mas neste caso só para convidados. Os dias de matança do porco eram uma exceção a tudo isto.