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A FEITICEIRA DA RIBEIRA DAS CASAS (DIÁRIO DE TI’ANTONHO)

Sexta-feira, 27.02.15

Antigamente não havia água canalizada nesta freguesia e as mulheres tinham que ir lavar a roupa à Ribeira. Umas iam para os lados da Ribeira de Cima, no início da canada que dá para a Rocha mas a maioria procurava a a Ribeira das Casas, no Caminho da Ponta, pois aí havia um lago maior e mais pedras a servirem de lavadouro. As mulheres iam a pé com os cestos ou as trouxas da roupa à cabeça. Costumavam ir de manhãzinha, muito cedo, para apanharem um lavadouro livre, para terem a água limpa, para aproveitarem o fresquinho da manhã e para evitarem o calor do Sol. Muitas combinavam ir juntas.

Contava meu avô que certa vez, duas mulheres vizinhas que moravam na Tronqueira tinham combinado de véspera ir juntas lavar a sua Roupa à Ribeira das Casas. A que acordasse primeiro chamava pela outra. Aconteceu que uma delas acordou e, como viu tudo muito claro, pensou que já era de dia e que a vizinha se tinha esquecido de a chamar. Vestiu-se à pressa, pôs a trouxa à cabeça e caminhou apressada para a Ribeira das Casas. Foi andando, sempre muito lesta. Estava tudo claro como se fosse de dia. Depois de descer a ladeira do Calhau Miúdo e de passar o Lago do Sargaço viu que já havia uma grandeza de roupa branca estendida a corar na relvas do lado do Rolo e uma grande quantidade de outra de cor, posta a secar sobre as paredes de pedra, como era costume as mulheres fazerem. Dali não podia ver quem estava a lavar na Ribeira. Mas como viu tanta roupa a secar pensou que deviam estar muitas mulheres a lavar e que de certeza já não apanharia lavadouro livre onde pudesse lavar a sua roupa.

Continuou a andar, ainda mais depressa pôr julgar que já ia atrasada e que ia ter de esperar muito tempo para ter um lavadouro livre. Levava colchas e cobertores e tinha que apanhar um lavadouro desocupado porque só assim podia lavar à vontade. As galochas batiam nas pedras do caminho e faziam um barulho seco e cadenciado que ecoava ao longe. Já muito próximo da Ribeira viu uma mulher de costas para ela a lavar a roupa. Julgando que era a vizinha, chamou:

 - Ó vizinha, esqueceste-te de chamar por mim ou que foi!?

A mulher, sem nunca virar a cara, retorquiu:

 - A sorte que tu tens é que te confessaste e comungaste no domingo passado, senão já ias comigo. Ficavas encantada e eu acabava o meu encantamento.

Depois levantando-se começou a recolher a roupa que estava estendida na relva, a juntar a que estava sobre as paredes e a fugir na direção da ladeira das Covas, talvez para se esconder nalguma furna.

Vendo isto, a lavadeira ficou cheia de medo e desatou a correr para casa com tanta força que parecia que um pé não apanhava o outro. Ao chegar a casa, viu que era só uma hora da manhã e que aquela claridade era da lua. Com certeza que aquela mulher era uma feiticeira.

A notícia espalhou-se pela freguesia e daí por diante as mulheres só iam lavar para a Ribeira, depois do Sol nascer, com medo das feiticeiras que viviam encantadas por aqueles lados. Contava-se que não era a primeira vez que ali apareciam. Um homem, noutros tempos, tinha visto uma com os pés iguais aos das cabras. Precisamente na ladeira das Covas. E toda a gente dizia que uma feiticeira só quebrava o seu encanto quando conseguisse levar uma outra mulher consigo.

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publicado por picodavigia2 às 06:48





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