PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A LENDA DOS TREMOÇOS
Consta que no início do povoamento da Fajã Grande e nos anos que se seguiram a população daquele lugar, encurralada entre o mar e a rocha, vivia num sobressalto permanente e sob um medo constante devido às frequentes ameaças de alguns barcos de piraras que, demandando a ilha na procura de água e víveres, por vezes, aproveitavam para assaltar, roubar, destruir, violar as mulheres e matar. A população indefesa e sem ter onde se refugiar, umas vezes fugia para o mato, outras recorria às mais diversificadas artimanhas para afastar os malditos. Destas espécies de luta em que o rato se escondia, habilmente, a fim de fugir às terríveis e mortais ameaças do gato, contavam muitas estórias. Naturalmente também nasceram muitas lendas, algumas das quais, muito provavelmente, se terão diluído e extraviado no tempo. A que se segue é uma destas. Consequentemente, se não aconteceu, poderia muito bem ter acontecido.
Consta-se que certa vez em que o povoado foi invadido pelos tiranos, um grupo de pessoas não teve tempo de fugir para o mato como fazia habitualmente. Assim refugiou-se, num lugar que julgava seguro, nas margens da Ribeira das Casas, entre os pedregulhos e rochedos que por ali abundavam. Como ficassem ali muitos dias, esgotaram-se os alimentos que haviam levado consigo e que eram poucos, Restavam apenas uns sacos de tremoços cozidos, mas muito amargos.
Ao perceber que os piratas estavam próximos e os iriam atacar, talvez até matar, depois de violarem as mulheres, afastaram-se para junto da rocha, para um lugar mais escondido, deixando as panelas cheias de tremoços amargos. Os piratas saltaram para terra e, ao aproximar-se, viram as panelas com os tremoços. Como vinham cheios de fome, começaram a comê-los. Porém, achando-os muito amargos cuidaram que o povo os tivesse envenenado. Cheios de medo e cuidando que iam morrer fugiram para o barco que, de imediato, abandonou a ilha, podendo o povo, finalmente, regressar às suas casas salvo e tranquilo.