PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
ANTÓNIO JOAQUIM FAGUNDES
Rezam as crónicas que António Joaquim Fagundes foi um dos meus bisavós paternos, pois foi o pai da minha avó Maria de Jesus Fagundes. Orgulho-me deste antepassado, que, pelos vistos foi homem bondoso, honrado e trabalhador. António Joaquim Fagundes era filho de Manuel Joaquim Fagundes e de Clara de Jesus e nasceu na Fajã Grande, onde casou, pela segunda vez, com Policena de Jesus ou Policena Joaquina da Silveira filha de António José de Freitas e de Maria de Jesus, pais de minha avó Maria de Jesus. O casamento realizou-se na igreja paroquial da Fajãzinha, no dia 10 de agosto de 1858. António Joaquim Fagundes, no entanto, era viúvo de Mariana Júlia de Jesus, filha de João Jacinto Rodrigues e Catarina Maria, com quem casara em 8- de novembro de 1855. Ainda jovem e antes de casar, emigrou para a Califórnia, embarcando numa escuma, de noite e às escondidas, na Ribeira das Casas, onde se havia escondido na véspera, misturando-se com os marinheiros que haviam ido a terra abastecer-se de água e de víveres. Depois de chegar duma longa e desgastante viagem, que pagou com serviços prestados a bordo, trabalhando como um escravo, dormindo em péssimas condições e alimentando-se com as sobras e restos da tripulação., chegou à costa leste dos Estados Unidos. Como o seu sonho era demandar a Califórnia, percorreu o continente americano de lés-a-lés e, fixando-se na costa oeste, foi parar à cidade de Ione, no condado de Amador. Aí dedicou-se a todo o tipo de serviços que lhe permitiam ganhar algum dinheiro. Desgostoso com a vida de escravo que levava decidiu mudar-se para outros condados do interior e norte, pastoreando ovelhas nos montes e serras, ordenhando vacas em ranchos, trabalhando na agricultura, o que de melhor sabia fazer. Eram terras de abundância e os donos eram generosos, possibilitando que também criasse gado e comprasse terras. O trabalho era mais agradável e os ganhos maiores o que lhe permitiu armazenar algum dinheiro. Alguns anos depois arrependeu-se e, cheio de saudades da sua terra natal, suspendeu a sua aventura americana, regressando à Fajã Grande, com o dinheiro que ganhara e religiosamente poupara. No entanto e porque sabia que o sonho americano nunca havia de se apagar, tirou e trouxe os célebres “papeles” para que os filhos, anos mais tarde, se assim o entendessem, pudessem fixar-se na terra do Tio Sam. Chegou à Fajã com algum dinheiro e, depressa surgiram algumas pretendentes Casou uma primeira vez mas o infortúnio bateu-lhe à porta e, anos depois a esposa faleceu. Casou então em segundas núpcias com aquela que foi a minha bisavó. Construi uma casa, logo ali no início da Assomada, a seguir à Praça e teve vários filhos entre eles Maria de Jesus Fagundes, que casou com António Lourenço Fagundes, no dia trinta dias de novembro de mil oitocentos e oitenta e dois, na igreja paroquial de São José da Fajã Grande, numa cerimónia muito simples mas digna onde foram apresentados os documentos necessários e do estilo corrente, e sem impedimento algum canónico ou civil. No entanto, para poderem casar, os mesmos nubentes tiveram que ser dispensados do impedimento de segundo grau de consanguinidade em linha colateral e igual pelo Excelentíssimo e Reverendíssimo Bispo da Diocese. Ele tinha trinta e três anos, sendo solteiro, lavrador de profissão, natural e morador nesta freguesia e batizado na Paróquia de Nossa Senhora dos Remédios da Fajãzinha e ela tinha apenas vinte anos de idade achando-se autorizada pelo consentimento paterno para contrair matrimónio, como consta do mandato que apresentaram. Consta que os nubentes se receberam alegremente por marido e mulher e assim em matrimónio procedendo em todo este ato conforme o Rito da Santa Madre Igreja Católica e Apostólica Romana.
António Joaquim Fagundes viu a filha casas com muita alegria. O genro, para além de sobrinho, era um bom homem, respeitado e trabalhador. Também havia tentado a sua aventura na América, mas regressara como tinha partido. Sem dinheiro. António Joaquim ainda comprou terras e teve filhos muito filhos. Uns nasciam mortos, outros morriam depois de nascer e outros vingaram. Quando cresceram alguns zarparam na procura do “Eldorado”, deixando os pais, aos cuidados do irmão mais novo. Impusera-se no entanto, na freguesia António Joaquim Fagundes pela sua bondade e sabedoria. Junto com os filhos trabalhava as terras, lavrava-as, semeava-as, sachava-as e cavava-as. Guardava na loja, ali por baixo da cozinha a Mimosa e a Formosa juntamente com um gueixo que depois de engordar, matava e distribuía a carne pelos pobres em louvor do Divino Espírito, que tanto o havia ajudado enquanto permanecera na Califórnia. As vacas iam-lhe dando leite e ajudavam-no a lavrar os campos e puxar o corção. À noite rezava pelos antepassados que se haviam finado e pelos filhos que haviam emigrado. Foi folião do Espírito Santo e nas noites da Quaresma ia cantar para o Outeiro. Foi sempre um homem pacato e humilde não se entregando a grandes aventuras e devaneios. Transmitiu aos filhos a riqueza da lealdade, a excelência da honra e o prazer do dever cumprido. Não era vingativo nem provocador de brigas e guerrilhas. Dava-se com todos e todos os respeitavam. Cumpria com dignidade os seus deveres morais e religiosos.
Sua mãe, Clara de Jesus era natural de Ponta Delgada e faleceu na Fajã Grande, a 2 de dezembro de 1864, com setenta e três anos. Após o casamento, juntamente com o marido, decidiu fixar residência na Fajã Grande, na rua Assomado onde viveu até ao ano do deu falecimento. António Joaquim Fagundes foi o seu filho mais velho.
António Joaquim Fagundes, já viúvo de Policena que faleceu em 4 de agosto de 1896, faleceu em 9 de Agosto de 1899 e teria cerca de 88 ou 89 anos, dado que os pais casaram em 1809 e ele era o filho mais velho.