PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A FERRADURA
Era uma vez um rapaz muito preguiçoso e pouco obediente aos pais.
Certo dia o pai precisou de ir à vila e decidiu levar rapaz consigo. A viagem era longa e cansativa. Não tinham dinheiro e nada levaram para comer. Ainda nem haviam chegado a meio do caminho e o rapaz começou a lamentar-se porque, para além de cansado, morria de fome. O pai que caminhava, indiferente às lamentações e queixumes do filho, a determinada altura viu uma ferradura no chão. Parou, voltou-se para o filho e pediu-lhe que a juntasse:
- Era o que faltava, - respondeu o mandrião com altivez, - baixar-me e juntar uma porcaria duma ferradura velha, cheia de ferrugem e que já não presta para nada.
O pai não respondeu. Baixando-se, juntou a ferradura e meteu-a no bolso, enquanto o rapaz continuava a lamentar a fome que sentia, arrependendo-se de acompanhar o pai em tão cansativa caminhada.
Finalmente chegaram à vila. O pai dirigiu-se a um ferreiro que na sua forja transformava o ferro velho em belas peças de metal, e vendeu-lhe a ferradura. Com o dinheiro foi a uma padaria comprar um enorme pão. De seguida, partiu-o em grossas fatias que foi deixando cair no chão, de maneira que não se sujassem. O rapaz, morto de fome, a cada fatia que o pai deitava ao chão, baixava-se logo para a apanhar, comendo-a sofregamente. Já saciado, interrogou o pai:
- Por que fez isto, meu pai? Porque não me deu as fatias para a mão em vez de as deixar cair no chão?
O pai retorquiu:
- Se me tivesses obedecido e se tivesses baixado para apanhar a ferradura não terias que te ter curvado tantas vezes para apanhar o pão de que tanto necessitavas.
O rapaz compreendeu a lição e, a parir daquele dia, tornou-se mais obediente e trabalhador.
NB - Inspirado no conto “São Pedro e a Ferradura”, in Contos Populares e Lendas, J. Leite de Vasconcelos.