PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O PORCO E O AMIGO
“Quem não mata porco não cria amigo.”
A julgar pela importância que tinha, antigamente, na Fajã Grande a criação e, sobretudo, a matança do porco, este parece, na verdade, ser um adágio muito provavelmente típico desta freguesia. Na verdade, na década de cinquenta a matança do porco, depois do casamento dos filhos, constituía a maior festa realizada em casa de cada família para a qual se convidavam pessoas de fora: parentes e amigos. Assim ser convidado por alguém para a sua matança era sinal de amizade e tinha mais amigos quem mais pessoas convidava para a matança. Nas semanas antes do Natal ou do Ano Novo, chegava a altura da matança, a qual começava a ser preparada com alguns dias de antecedência, porque era preciso procurar, apanhar no mato as queirós, que iriam ser utilizadas para a chamusca, cortar, serrar e picar a lenha parra derreter o toucinho e afoguear as linguiças e ainda ceifar os fetos e a cana roca para secar o curral e lá se poder entrar no fia da matança para se apanhar o suíno sem grandes riscos de se enterrar até à cintura numa estrumeira. Depois faziam-se os convites aos familiares e aos amigos e preparava-se tudo o resto. Alguns, por vezes, faziam-se ao convite. Ficavam amigos, amigos de matança.
Mas este adágio também era utilizado em sentido figurado a querer significar que a amizade naqueles tempos, em muitos casos, era interesseira e só se era amigo de quem nos presenteasse com alguma coisa de bom, como era o caso de um convite para a matança. Atitude condenável, como o adágio indica sub-repticiamente. Na verdade, como já dizia o filósofo grego Platão, a amizade deve ser uma predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro. Na verdade a amizade que se restringe a um simples convite para uma matança ou outra dádiva passageira embora agradável e desejada, não pode ser verdadeira. Parece ser isto que o povo da Fajã Grande, na sua verdadeira e simples sabedoria, queria lembrar ao utilizar este interessante adágio