PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O COELHO BRANCO E O GALO PRETO (DIÁRIO DE TI’ANTONHO)
Uma outra estória muito engraçada que meu avô contava era da do Coelho Branco e do Galo Preto. Se bem me lembro a estória era mais ou menos assim: Havia em tempos antigos um homem muito bruto e mau mas que era muito devoto e tinha por hábito rezar todos os dias um Pai Nosso a Senhor São Francisco. Quando estava para morrer apareceu-lhe um anjo e disse-lhe:
- Para te salvares não chegam as orações. Terás que dar uma esmola avultada a um pobre. Caso contrário irás parar ao Caldeirão de Pero Botelho.
Passado algum tempo entrou um velhinho no pátio da casa onde homem morava e os cães não lhe fizeram mal. O criado que trabalhava para o homem quando viu o velhinho dirigiu-se até ele e disse-lhe:
- Como é que entraste aqui sem os cães te impedirem?
O velho respondeu:
- Eles são mansinhos, fiz-lhes umas festas e eles não me fizeram mal.
O velhinho entrou em casa e foi visitar o homem que estava deitado na sua cama, às portas da morte e pediu-lhe uma esmola. O homem virando-se para o criado disse-lhe:
- Dá-lhe cinquenta alqueires de milho.
- Mas ele não trás saco. - Contrariou criado.
- Dá-lhe um saco dos melhores e maiores que temos para levar o milho.
- Mas o pobrezinho também não tem carro para transportá-lo.
- Então carrega tu o milho no carro de bois e vai levá-lo a casa dele.
O criado assim fez e lá foi mais o velhinho.
Quando já iam a meio caminho ouviram o sino da igreja tocar a finados. Era o sinal de que o homem que tinha dado o milho ao velhinho tinha falecido. Nisto passou-lhes por perto um coelho branco a fugir de um galo preto. O velhinho voltou-se para o criado e disse-lhe:
- O teu patrão já morreu, e o coelho branco, que passou, significa que ele se salvou, o galo preto era o inimigo que vinha a correr atrás dele, mas não o apanhou porque ele foi generoso e deu uma grande esmola. Aquele que fizer o bem neste mundo e repartir os seus bens com os pobres há-de salvar-se e tu, meu amigo, podes levar o milho e ficar com ele para alimentar os teus filhos, porque eu não preciso dele.
Dito isto o velhinho desapareceu.
O criado percebeu, então, que aquele velhinho, a quem o homem deu a esmola e com que o acompanhara com o carro carregado de milho era São Francisco, o sento a quem o seu patrão rezava todos os dias um Pai Nosso.