PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O APOJO
Na Fajã Grande, na década de cinquenta, toda a criançada se pelava por beber uma tampinha de leite, na altura da ordenha. Ainda morno, a cheirar a erva fresquinha, era sobretudo na altura do oitono, ou seja, nos meses de março, abril e maio, durante os quais o gado estava amarrado à estaca, nas terras do cultivo, alimentando-se das forrageiras e de erva fresquinha que era para ali acarretada, que o leite sabia melhor. Até parecia que tinha um agradável sabor ao trevo ou à erva da casta. Outras vezes, sobretudo nos meses de inverno, quando os pais chegavam a casa com as latas bem cheiinhas de leite, após a ordenha era um rodopio à volta das mesmas, a fim de se conseguir a tão desejada tigelinha do dito cujo. O leite era, incondicionalmente, um dos nossos principais e mais importantes alimentos.
Mas os nossos pais, melhor do que ninguém conheciam a força do leite e o seu valor como elemento fundamental na nossa alimentação, pelo que regra geral, quando os acompanhávamos na ordenha, davam-nos sempre para beber uma tampa não de qualquer leite mas pediam-nos que aguardássemos para o fim da ordenha, a fim de sermos agraciados com o último leite retirado do úbere da vaca, ou seja, o apojo. Bem sabiam eles que este era o mais saudável e nós que era não apenas o melhor, o mais saboroso e até o mais quentinho.
Na verdade o apojo é o leite mais consistente e mais espesso e por conseguinte o mais saudável e mais forte, extraído da vaca, depois de tirado o primeiro, que é bastante menos grosso. É também o que tem melhor sabor. Por isso mesmo sabia tão bem e, pelos vistos era muito saudável, uma tampa de apojo, sobretudo nos campos, após a ordenha quando as vacas estavam amarradas à estaca.
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A BRANCA DE NEVE
Este era mais um dos contos que tantas vezes ouvíamos aos serões que, por fim, já os sabíamos de cor. Rezava assim a história da Branca de Neve e dos seus amigos, os Sete Anões:
Era uma vez um rei que era viúvo e vivia num reino distante, com a sua filha pequena, que se chamava Branca de Neve. O rei, como se sentia muito só, voltou a casar, achando que também seria bom para a sua filha ter uma nova mãe. A nova rainha era uma mulher muito bela mas também muito má, e não gostava de Branca de Neve que, quanto mais crescia, mais bela se tornava.
A rainha malvada tinha um espelho mágico, ao qual perguntava, todos os dias:
- Espelho meu, espelho meu, haverá mulher mais bela do que eu?
E o espelho respondia:
- Não minha rainha, és tu a mulher mais bela do mundo!
Mas uma manhã, a rainha voltou a perguntar o mesmo ao espelho, e este respondeu:
- Tu és muito bonita minha rainha, mas Branca de Neve é agora a mais bela!
Enraivecida, a rainha ordenou a um dos seus empregados que levasse Branca de Neve até à floresta e a matasse, trazendo-lhe de volta o seu coração, como prova.
Mas o criado teve pena da Branca de Neve e disse-lhe para fugir em direção à floresta e nunca mais voltar ao reino.
Já na floresta, Branca de Neve conheceu alguns animais, os quais se tornaram seus amigos. Também encontrou uma pequenina casa e bateu a sua porta. Como ninguém respondeu e a porta não estava fechada à chave, entrou. Era uma casa muito pequena, que tinha sete caminhas, todas muito pequeninas, assim como as cadeiras, a mesa e tudo o mais que se encontrava na casa. Também estava muito suja e desarrumada, e Branca de Neve decidiu limpá-la e arrumá-la. No fim, como estava muito cansada, deitou-se nas pequenas camas, que colocou todas juntas, e adormeceu.
A casa era dos sete anões que viviam na floresta e, durante o dia, trabalhavam numa mina.
Ao anoitecer, os sete anões regressavam à sua casinha, quando deram com Branca de Neve, adormecida nas suas caminhas. Que surpresa! Com tanta excitação, Branca de Neve acordou, espantada e rapidamente se apresentou:
- Eu sou a Branca de Neve.
E os sete anões, todos contentes, também se apresentaram:
- Prazer em conhecê-los. Respondeu Branca de Neve, e logo contou a sua triste história. Os anões convidaram Branca de Neve a viver com eles e ela aceitou, prometendo-lhes que tomaria conta da casa deles.
Mas a maldita rainha, através do seu espelho mágico, descobriu que Branca de Neve estava viva e que vivia na floresta com os anões.
Então, furiosa, vestiu-se de senhora muito velha e feia e foi ter com Branca de Neve. Com ela levou um cesto de maças, no qual tinha colocado uma maça vermelha que estava envenenada!
Quando viu Branca de Neve, cumprimentou-a gentilmente, e ofereceu-lhe a maça que tinha veneno.
Ao trincá-la, Branca de Neve caiu, como se estivesse morta. A malvada rainha fugiu e, avisados pelos animais do bosque, os sete anões regressam apressadamente a casa, encontrando Branca de Neve caída no chão.
Muito chorosos, cuidando que ela estava realmente morta, os anões colocaram Branca de Neve numa caixa de vidro, rodeada por flores.
Estavam todos em volta de Branca de Neve, quando surgiu, no meio do bosque, um príncipe no seu cavalo branco. Ao ver Branca de Neve, o príncipe de imediato se apaixonou por ela e, num impulso, beijou-a. Branca de Neve acordou: Afinal estava viva!
Os anões saltaram de alegria e Branca de Neve ficou maravilhada com o príncipe que a levou para o seu castelo, onde casaram e viveram muito felizes para sempre.
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A FAJÃ DO RODOVALHO
Cuida-se que Gomes Dias Rodovalho e sua mulher Beatriz Lourenço Fagundes foram o primeiro casal que ocupou o território da ilha das Flores, onde se situa actualmente a freguesia da Fajã Grande. Mas o filho de Diogo Vaz Rodovalho e de Maria Esteves Cansado, para além de fundador da Fajã Grande, também foi capitão-mor e ouvidor da Ilha das Flores, sendo possuidor de muitas terras e, por isso mesmo, ficou sempre ligado à história daquela ilha e não apenas da Fajã Grande, já que terá sido ele o principal responsável pelo povoamento definitivo da maior ilha do grupo ocidental, iniciado por volta de 1504. Gomes Dias Rodovalho terá sido o primeiro capitão-mor, ouvidor e “sesmeiro” na ilha das Flores.
Sabe-se que era de origem francesa e que nasceu em Viana do Alentejo, junto de Évora, por volta de 1480, descendendo da Casa de Rodovalho, uma das mais importantes da Baixa Normandia, França. A sua mãe, Maria Esteves Cansado, era natural de Viana do Alentejo.
Na posse da ilha das Flores, sucedeu aos Teives e aos Telles, uns e outros desinteressados pela ilha, abandonando-a e fixando noutras paragens, uma vez que, sobretudo os Teives, estavam mais interessados em explorar a cana-de-açúcar na ilha da Madeira.
Sabe-se que foi o novo capitão-donatário das Flores, João da Fonseca, conterrâneo de Rodovalho, que o levou para às Flores, juntamente com outros colonos, com o intuito de o ajudar a povoar a ilha. Com eles terão chegado outros nomes conhecidos: Diogo Pimentel, Antão Vaz, Lopo Vaz, os irmãos Rodrigo Anes e Álvaro Rodrigues, Pedro Vieira e João Fernandes, tendo alguns deles perpetuado os seus nomes nos lugares da ilha que, provavelmente, ocuparam ou lhes pertenceram. Por essa altura, ou seja, no início do povoamento definitivo terão chegado outros colonos entre os quais, irmãos António e Pedro Fraga – com as respectivas mulheres – e Jordão Rodrigues, Gonçalo Anes Malho e João Fernandes, também eles a deixar registos da sua presença na toponímia da ilha.
Assim a Fajã Grande, a exemplo da Fajã de Lopo Vaz, da de Pedro Vieira, do Ilhéu de Álvaro Rodrigues, poder-se-ia muito bem ter chamado Fajã de Gomes Dias Rodovalho, ou simplesmente, Fajã do Rodovalho. Mas confesso que este último nome não soaria muito bem, podendo prestar-se a confusões ou graçolas.
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TIANA TENENTA OU VERDADEIRA ESTÓRIA SOBRE VELHA QUE SE AFOGOU NA CALDEIRA DA ÁGUA BRANCA
Do Daniel Mendonça de Sousa, meu primo, filho de Ti Antonho Britsa, residente em Edmonton, no Canadá recebi uma versão que me parece mais verossímil sobre a verdadeira e real estória da velha Tenenta. Chamava-se Ana Tenenta da Silveira e residia na rua das Courelas, tendo falecido por volta de mil novecentos e vinte. Consta que já de avançada idade, certo dia, deslocou-se a Santa Cruz, na companhia de Maria Júlia Amorim, a fim de ir registar, no escrivão, o testamento que decidira fazer-lhe. Prometera deixar em herança, à Maria Júlia Amorim, os parcos bens que tinha, ou seja, uma casa existente no local onde mais tarde foi construída a casa de José de Freitas Filipe e uma pequena parcela de terreno que possuía algures. Feito e registado o documento, as duas mulheres pretendiam regressar à Fajã nesse dia, mas, estranhamente, a velha Tenenta disse à Maria Júlia que apenas regressaria no dia seguinte. Esta, porém, regressou e, no dia seguinte, aguardou, em vão, a chegada da velha. Preocupada, Maria Júlia alertou as autoridades da Fajã Grande que, em conjunto com as da Fajãzinha, foram procurar Anta Tenenta nos matos da ilha no trajeto habitualmente percorrido por quem se deslocava entre a Fajã Grande e Santa Cruz. Como nesses tempos aquele trajeto era feito pela Rocha da Fajã, pelo Rochão do Junco e Burrinha, até à Mantosa, o percurso incluía a travessia da caldeira da Água Branca. Foi esse o primeiro local que as autoridades procuraram Tiana Tenenta, E realmente o corpo da velha lá estava, entrelaçado entre as ervas dos pântanos que ladeavam a caldeira e onde era impossível nadar ou caminhar. Os homens amarraram uns paus de cedro e de lá conseguiram retirar o corpo, trazendo-o para terra firme. De lá foi conduzida para a Fajã mas sem caixão uma vez que quando iniciaram as buscas cuidavam que ela ainda estaria com vida. No dia seguinte foi feito o funeral, sendo a pobre Ana Tenenta sepultada no cemitério da Fajã Grande. Daniel Sousa refere que o seu pai acompanhou as buscas e esteve à beira da Caldeira como tantos outros homens da Fajã, nomeadamente, António Luís de Fraga, José Caetano Teodósio, João da Costa Amorim, José Furtado Luís, João de Freitas Lourenço, João Joaquim Fagundes, António Lourenço, Francisco Inácio Cardoso, António Fagundes e muitos outros. Acompanharam as buscas muitos homens da Fajãzinha, entre os quais Manuel Rodrigues Henriques, dono da maioria dos terrenos baldios em quase toda a ilha, o seu irmão João, Manuel Jacinto Frade e o irmão José, José Jacinto Avelar, José Rodrigues Corvelo e muitos outros. Apesar de ser verão e, provavelmente, não haver nevoeiros nunca se soube se a velha Tenenta se quis suicidar, se foi mero acidente ou se devido à escuridão da madrugada se tenha perdido, confundindo o caminho. Consta que Ana Tenenta não tinha parentes na Fajã, os únicos que teria, já afastados, haviam emigrado para a América.
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DONOS DA VERDADE
“A Verdade não é de Ninguém; mas somente daqueles que a entenderem.”
Autor desconhecido
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O CONCELHO DAS LAJES DAS FLORES
Cuidam alguns historiadores que a ilha das Flores terá sido descoberta, juntamente com a do Corvo, em 1452 por Diogo de Teive e seu filho João do Teive. Diogo de Teive foi também tendo o seu primeiro Donatário. Mas os Teive abandonaram a ilha pouco tempo depois e, aparentemente, os direitos sobre as Flores e sobre Corvo foram pertencendo a vários donatários, muitos dos quais nunca terão vivido da ilha. Finalmente, por volta de 1500, D. Maria de Vilhena, na altura administradora da capitania daquela ilha, em nome do seu filho Rui Telles, por este ser menor, com o intuito de promover o seu povoamento, convidou o flamengo Willem van der Hagen, também conhecido por Guilherme da Silveira a se deslocar para as Flores, a fim de iniciar um novo e definitivo povoamento
Muito provavelmente terão feito parte da comitiva alguns dos mais importantes e mais conhecidos povoadores florentinos, nomeadamente, Lopo Vaz, Antão Vaz, Diogo Pimentel e Gomes Dias de Rodovalho. Por volta de 1508-1510 terá ocorrido o povoamento definitivo da ilha sob a direção destes e de outros povoadores, com os quais nasceu a vila das Lajes, a primeira a ser criada na maior ilha do grupo ocidental açoriano:
"A descendência generosa dos primeiros povoadores desta ilha granjeou futura estima do Governo, que logo confiou neste lugar a instituição da primeira Vila, denominada Lajes. "
No entanto, o reconhecimento oficial da criação da Vila das Lajes ocorreu no ano de 1515, embora a data exata não seja consensual.
"A história desta ilha não oferece cenas sanguinolentas como a de outras partes do Mundo Novo, porque nele não se encontravam habitantes quando se a descobriu", contudo, dada a localização geográfica da ilha, a mesma não ficou imune às incursões corsárias, primeiramente de origem mourisca e anos mais tarde de origem inglesa e americana. Os primeiros denotavam alguma inaptidão para a atividade corsária, pelo que os prejuízos causados nunca atingiram grande monta, porém, os últimos demonstraram ter uma propensão inequívoca para a prática da pirataria, tendo os seus ataques causado estragos mais significativos. As populações locais construíram fortificações estratégicas e foram instaladas peças de artilharia que ajudaram a desencorajar tentativas de saque. Lamentavelmente hoje, os vestígios dessas defesas são quase inexistentes.
Assim sendo, temos que as Lajes das Flores é um concelho sito na metade sudoeste da ilha das Flores, no Grupo Ocidental do arquipélago dos Açores, com uma área de 69,59 km². É limitado a nordeste pelo município de Santa Cruz das Flores, rodeado por todos os demais lados pelo oceano Atlântico. A sede é a vila de Lajes das Flores, na costa sul da ilha e onde se situa o porto comercial que a serve. Está dividido em sete freguesias: Fajã Grande, Fajãzinha, Fazenda, Lajedo, Lajes das Flores, Lomba e Mosteiro.
A população do concelho de Lajes das Flores, decresceu sensivelmente ao longo do século XX, sofrendo grande influência da forte emigração que se fez sentir em todo o concelho, sobretudo durante as décadas de cinquenta e sessenta desse século. No início do mesmo, ou seja, em 1900 a população do concelho era de 4498 habitantes, mas nos trinta anos seguintes desceu para 3508. Em 1960 existiam no concelho das Lajes das Flores apenas 3376 habitantes e em 1981 esse número desceu para 1891. O decréscimo acentuado continuou até ao final do século XX, sendo a população do segundo concelho da ilha, no censos de 1991 de 1702 habitantes, no de 2001 de 1502 e no de 2004 de 1491 habitantes. No último censos, ou seja 2011, registou-se um ligeiro aumento sendo a população do concelho das Lajes das Flores de 1503 habitantes, dos quais 780 do sexo masculino e 723 do feminino. Segundo o mesmo censos existiam no concelho, em 2011 apenas 620 famílias.
O concelho possui um vasto património natural, com lugares de rara beleza com destaque para a Boca da Vereda, as lagoas Branca, Comprida, Funda, da Lomba, Funda das Lajes, Rasa, Seca, Pico da Marcela, Monte das Cruzes, Morro Alto, Pedrinha, Pico da Casinda, Pico da Sé, Pico do Touro, Pico dos Sete Pés, Rochas da Fajã Grande e Fajãzinha repletas de cascatas, Tapada Comprida, Tapada Nova e ainda a famosa Rocha dos Bordões. Destaque ainda para vários miradouros, com destaque para o Craveiro Lopes, e alguns lagos inesquecíveis como o Poço da Alagoinha. Possui excelentes zonas balneares.com destaque para as da Fajã Grande, e uma costa muito fértil em pescado. O concelho vive essencialmente da agricultura e da criação de gado.
No que ao património edificado diz respeito, destaque para a Bateria do Cais de Lajes das Flores, o Forte de Nossa Senhora do Rosário de Lajes das Flores, o Forte de Santo António de Lajes das Flores, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário na sede da vila e a igreja Matriz da Fajãzinha.
Dados e citações retiradas do Site da Câmara Municipal das Lajes das Flores.
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A VOLTA DO PINHEIRO
A construção da estrada entre o Porto da Fajã Grande e a ladeira do Pessegueiro, junto à ponte sobre a Ribeira Grande, trouxe grandes alterações na vida, nos costumes, nas tradições, nos hábitos e até na toponímia da mais ocidental freguesia açoriana.
No caso da toponímia, dado que o traçado da nova estrada, sobretudo a partir do sul da Cabaceira, se afastou sensivelmente dos caminhos antigos, rasgando um novo trajeto por lugares até então pouco conhecidos ou até inexistentes, surgiram novos lugares enquanto outros adquiriram nomes diferentes. N verdade, a nova estrada, aproximando lugares outrora distantes, trouxe a inexaurível vantagem de criar lugares novos. Foi o caso do lugar ainda hoje designado por Volta do Pinheiro, inexistente antes da construção daquela estrada.
Este lugar passou a designar-se assim porque junto à estrada, naquele local, um pouco antes do caminho que dava para Cuada, vindo do sul, existia um grande pinheiro. Além disso o troço da nova via desenhava, ali, no sítio onde vicejava o pinheiro, uma das suas maiores curvas, sendo que estas, nas Flores, popularmente, eram designadas por voltas. Aí paredes meias com a estrada erguia-se altivo e florescente o velho pinheiro que, pela sua altura se destacava no meio dos incensos, das faias, dos sanguinhos e dos loureiros circundantes. Assim, devido a um pinheiro tão imponente e a uma curva tão acentuada da estrada, tornou-se inevitável, na criatividade popular, batizar o novo lugar de Volta do Pinheiro.
O lugar da Volta do Pinheiro, cuja área era totalmente ocupada por terras de mato, tinha como limites, a sul o Vale Fundo e o Tufo da cuada, a oeste o Desarrassado, a norte a Cabaceira e a leste a a Pedra Vermelha.
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LAPAS EM MAIO E COUVES EM AGOSTO
“Mas morto por morto, antes lapas em maio do que couves em Agosto.”
Mais um interessante adágio outrora muito usado na Fajã Grande e que tem muitas semelhanças com este um outro, utilizado, com frequência, na mesma freguesia: “Quem quiser o marido morto, dê-lhe lapas em Maio e couves em Agosto.”
É pois fácil concluir-se que as lapas em maio, na mais ocidental freguesia açoriana, não eram boas e que piores ainda seriam as couves se comidas no mês de agosto. Na verdade, ambos os provérbios parecem confirmar uma crença comum que existia, de que no mês de maio as lapas não eram tão saborosas nem tão boas para comer como nos restantes meses do ano, o mesmo acontecendo com as couves, mas estas, no mês de agosto. Na realidade a sabedoria popular tinha a capacidade de muito bem selecionar as alturas do ano em que este ou aquele alimento deveria ser evitado nos cardápios diários, por não ter tão boa qualidade e não ser tão agradável ao paladar. Recorde-se por exemplo o caso da abrótea, que também por indicação da sabedoria popular, não era boa nos meses que não possuem a letra “r”: maio, junho, julho e agosto.
Sendo assim, com este adágio pretende-se, simplesmente, avisar os menos cautos de que havia alturas do ano em que os alimentos eram, eventualmente, menos saborosos e consequentemente deviam ser evitados, pelo que o mesmo deve ser entendido no seu sentido real, não se lhe conhecendo qualquer sentido figurado.
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O EMPRÉSTIMO
O Valério nasceu de pai incógnito e de mãe solteira. Criado pela progenitora durante os seus primeiros anos de vida, cedo se emancipou, passando a viver por sua conta e risco. Arrendou uma casa na rua Direita, mesmo ali ao lado da igreja, afastada do adro apenas pela entrada do Gil. Era uma casa alta, de dois andares, geminada com uma outra que pertencia a Tio José Luís, a qual segundo a tradição, em tempos remotos, teria pertencido à família do capitão Freitas Henriques e, na altura, seria dotada de uma ponte que a ligava a uma primitiva capela ali existente, antes da construção da actual igreja.
O Valério não era muito dado ao trabalho agrícola, alegando maleitas diversas, umas reais outras fictícias. Entendia que o seu futuro não passava por acarretar molhos de erva das Covas, cestos de batatas do Areal ou cargas de lenha e incensos do Pocestinho. Havia que ganhar a vida de forma mais leve, mais descansada e mais lucrativa.
Ora o primeiro andar da casa, que comunicava com o segundo por um enorme “saguão” de pedra, estava dividido em duas lojas que outrora haviam sido estabelecimento comercial, por isso possuíam balcão, prateleiras, secretária e outras bugigangas necessárias para montar negócio. “Aí está o teu futuro, Valério!” – Dizia para os seus botões. O problema estava somente no dinheiro para investir quer em pequenas obras de modernização da loja quer no pagamento das primeiras remessas de mercadoria encomendadas aos armazenistas de Santa Cruz e das Lajes, que não vendiam fiado.
Na Fajã poucos tinham dinheiro e quase ninguém o emprestava. O padre Silvestre recusava-se fazê-lo por razões canónicas, o Senhor Claudino porque tinha a filha a estudar em Lisboa, a Senhora Rosa tinha que investir no seu próprio negócio e assim por diante. Quem se dizia que tinha muito dinheiro e já emprestara algum era a Inácia e o marido. Mas eram uns sovinas, “uns porcos” e de juros bem altos não se havia de livrar. Apesar de tudo, encheu-se de ânimo e lá foi bater à porta da Inácia.
A velhota a princípio mostrou-se renitente e pouco disposta a abrir os cordões à bolsa. Mas como o Valério explicasse que era para negócio com lucros garantidos e que lhe pagava com os juros que ela quisesse, a Inácia, mesmo sem consultar o esposo, cedeu, mas com uma condição:
- Só com papel assinado por ambos. Sem papel, nada feito. Emprestar sem assinatura bastou com o Ventura da Ponta e deu no que deu!...
O Valério, que não era preciso, que não era como o Ventura, que confiasse nele, que era homem sério e de palavra, que papéis só davam trabalho e maçada e não adiantavam nada. Era a sua palavra que valia mais do que todos os papéis do mundo.
- Não senhor! Ou com papel ou não há dinheiro para ninguém.
E o Valério, cuidando que sem o dinheiro da Inácia “adeus negócio”, teve que anuir, ficando combinado que o empréstimo seria de cinco contos e que a Senhora Inácia é que havia de fixar os juros conforme a sua consciência e também havia de ser ela a tratar dos papéis, que ele disso não percebia nada, nem tinha tempo. Só assinava depois de tudo pronto.
No dia seguinte a Inácia partiu para a Cuada, para casa do José Pimentel, homem letrado e hábil, seguro em contas e que até usava óculos para as fazer, a quem pediu que lhe preenchesse os papéis e lhe fixasse os juros de modo a que não perdesse nem dez reis do seu dinheirinho. A balança tinha que pender sempre era para o seu lado.
A Inácia voltou da Cuada com tudo direitinho, foi a casa buscar, de entre os colchões, os cinco contos e lá foi levar dinheiro e papéis a casa do Valério. Os juros que iria receber, só por si justificavam todas estas passadas. Estava tudo garantidinho… por causa do papel, claro!
Chegou junto do Valério, ocupado já no arranjo da loja e, entregando-lhe o dinheiro, prazenteira, apontou-lhe o lugar onde ele devia assinar. Ela só assinaria depois dele, não fosse o diabo tecê-las! O Valério olhou admirado para o papel, esboçou um leve sorriso e, agradecendo-lhe, rabiscou o seu nome onde ela lhe indicara e guardou o dinheiro. A Inácia gatafunhou a seguir.
O negócio do Valério floresceu mais do que o esperado. O Correio de que também passou a ser administrador, atraía muitos clientes.
Passaram-se meses e anos. O tempo estipulado para o empréstimo expirar e a Inácia, sem demora, procurou o Valério, sentado ao balcão da sua loja, à espera de clientes. Um ali estava, a senhora Inácia. Mas a velha não desejava nada, queria sim o seu dinheiro e os respectivos juros, conforme o que estava ali escrito no papel que ela lhe apresentava.
O Valério deu uma gargalhada, virou costas e apenas disse:
- O teu dinheirinho!? Hei-de t’o dar quando muito bem quiser e entender.
A Inácia enraiveceu:
- Ai vais dar, vais! Tenho aqui o papel e de duas uma: ou me dás já o dinheiro já ou vou daqui direitinha para o Regedor.
Como o Valério nem lhe respondesse, a velha saiu dali, entre vitupérios e imprecauções, e rumou direitinha à Assomada, a casa do José Caetano, então Regedor da Fajã. Bateu à porta, entrou, sentou-se na cozinha e esperou horas, excruciando a cabeça da Filomena. Quando chegou, o Caetano, assumindo com solenidade o seu papel de legítima autoridade, ouviu-a, leu e releu os papéis e, com ar de espanto e animosidade, disse-lhe:
- Ó Inácia, as coisas não estão fáceis para ti. Pelo que aqui está escrito tu é que deves cinco contos ao Valério e terás também que lhe pagar os juros.
A Inácia, emudeceu. Esbranquiçou-lhe o rosto, arroxearam-se os lábios e os olhos ficaram esbugalhados como maçãs podres. Parecia que perdera o tino. Foi uma chávena de café quente e forte que a Filomena, com a ajuda do marido, lhe enfiou pelas goelas abaixo que a trouxe a si.
Tentaram acalmá-la, sem nenhum resultado. A velha bufava, gemia, gritava, berrava e até roncava, lançando as mais temíveis ameaças, vitupérios e imprecações sobre o Valério: “Que a terra o havia de comer vivo. Mas que isto não ficava assim, não senhor.”
Constava que o Valério, apesar de tudo, passados uns tempos e com a Inácia mais amansada, lá lhe foi dando algumas compras de borla e que ainda, de acordo com a sua consciência, lhe devolveu uma boa parte do dinheiro.
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ANTIGOS FORTES E FORTALEZAS DAS FLORES
A ilha das Flores, como as demais ilhas açorianas, desde os primórdios do seu povoamento, foi forçada a defender-se e a proteger-se dos ataques e assaltos de piratas e corsários, que frequentemente demandavam a ilha na busca de víveres, de água, ou na procura das riquezas das embarcações que ali aportavam, oriundas da África, da Índia e do Brasil e até para roubar e violar a população feminina. Essa a razão pela qual foram construídas, por toda a ilha, no litoral, fortificações ou fortes militares.
Assim, ao longo dos tempos, foram-se edificando vários tipos de fortes militares, uns maiores outros menores, e que, geralmente, se situavam nos portos e ancoradouros, ou perto deles, sendo chefiados por militares guarnecidos pelas populações locais sob a responsabilidade dos respetivos concelhos.
Cuida-se que nas Flores terão existido cerca de 27 fortes militares, sendo 5 deles localizados na Fajã Grande, a saber: Castelo da Ponta, Vale do Linho, Castelhana, Estaleiro e Portal da Rocha, este já na freguesia da Fajãzinha. Entre estes destacou-se, na Fajã Grande, o Forte do Estaleiro, localizado no lugar a que lhe deu o nome, entre o Porto e o Calhau Miúdo, Em posição dominante sobre um boa parte do litoral e a ampla baía da Ribeira das Casas, constituiu-se como um forte destinado à defesa do ancoradouro ali sediado e do porto adjacente, defendendo um e outro dos ataques de piratas e corsários, outrora frequentes nesta região, virada a oeste e muito mais isolada. Dele ainda sobreviviam vestígios na década de cinquenta.
Outro forte florense notável foi A 'Bateria da Lomba' localizada na freguesia com o mesmo nome, na costa és-sudestes da ilha das Flores. Em posição dominante sobre a ribeira do Gil, constituiu-se em uma bateria destinada à defesa deste ancoradouro e, como os restantes, também na defesa contra os ataques de piratas e corsários. Deste forte também existem ainda hoje vestígios do alçado estando registada uma planta, com o título "Bateria da Lomba". O padre José António Camões, já refere a existência desta fortificação, existente na freguesia da Lomba:
O padre Camões refere-a nestes termos
"Passada a ponta do ilhéu Furado segue-se ao pé de uma rocha chamada a rocha do ilhéu furado um porto muito ridículo chamado o Coutinho, onde varam os barcos da freguesia da Lomba, tem capacidade ao menos para 4 ou 5 barcos pequenos, mas não tem refugio senão para dois, quando muito correndo para sueste cai uma ribeira chamada a ribeira do Gil, sobre a rocha da parte d’além está um forte com uma casa boa, e tem três peças.". O historiador acrescenta que esta fortificação foi erguida em 1820 (1810?), "de faxina, e por isso se acha já derrotado em parte", com o recurso à mão-de-obra dos, habitantes da ilha, obrigados a dar dias de trabalho à Coroa, razão pela qual o cuidado na sua construção não fora muito. A estrutura não chegou até aos nossos dias.
Outro Forte notável era o localizado na Ponta da Caveira, concelho de Santa Cruz, na costa este das Flores. Em posição dominante sobre este trecho do litoral, constituiu-se em uma bateria destinada à defesa deste ancoradouro contra a pirataria. Deste forte existe alçado e planta, com o título "Bateria da Ponta da Caveira", mas a estrutura não chegou até aos nossos dias.
A 'Bateria do Cais de Lajes” localizava-se na vila e freguesia de Lajes, em posição dominante sobre a costa, constituiu-se em uma bateria destinada à defesa do ancoradouro da vila contra os ataques de piratas e corsários. Segundo o padre António Cordeiro, esta fortificação remonta ao período da Dinastia Filipina, tendo, provavelmente, sido construída após o saque de corsários ingleses em 1587, no contexto da Guerra Anglo-Espanhola.
Um outro forte designado por 'Bateria sobre o Alto' localizava-se na freguesia de Ponta Delgada, concelho de Santa Cruz, na costa norte das Flores, em posição dominante sobre o mar, constituindo-se também ela como uma bateria destinada à defesa deste ancoradouro contra os ataques de piratas e corsários.
Notáveis ainda, em Santa Cruz, o 'Forte de Nossa Senhora da Conceição' e o de São Francisco, e, nas Lajes, o forte de Nossa Senhora do Rosário e o 'Forte de Santo António'. Finalmente, em Ponta Delgada existia um ouro forte, 'Forte de São Pedro de Ponta Delgada' localizado no sítio de São Pedro, freguesia de Ponta Delgada, a proteger a costa oeste do norte da ilha. O padre José António Camões referiu as defesas de São Pedro de Ponta Delgada nestes termos:
"(...) passada a ponta do Fornal segue-se logo ao nordeste o porto da freguesia de Ponta Delgada. Há nele, ao pé do mar, uma fonte de água doce de que se serve uma grande parte dos moradores daquela freguesia. Tem o dito porto uma casinha e uma peça, tudo sem fortificação alguma, mas com uma rocha que o fortifica. Continuando para nordeste começa a grande baía de Ponta Delgada, cai ao mar uma ribeira chamada a Ribeira da Fazenda a um tiro de peça pouco mais ou menos, mas ainda dentro dos marcos da dita freguesia fica um porto chamado o Portinho, onde só com uma bonança podem descarregar os barcos. Tem uma casinha de guarda com uma peça. Por fora do tal portinho estão os dois ilhéus chamados os ilhéus do Portinho – continuando por o mesmo vento segue uma ponta chamada a Ponta do Ilhéu.".
Como de todos os outros, a estrutura deste forte não chegou até aos nossos dias.
Existiram ainda outros Fortes notáveis, com destaque para o o 'Forte de São Sebastião sobre a Ribeira da Cruz'. Localizava-se na foz da Ribeira da Cruz, na freguesia da Caveira, concelho de Santa Cruz das Flores, na costa este da ilha das Flores, o 'Forte do Espírito Santo' localizava-se na vila e freguesia de Lajes, o 'Forte do Monte do Maio' localizava-se no concelho de Santa Cruz, o 'Fortim de Nossa Senhora dos Remédios' localizava-se na povoação e freguesia da Fajãzinha, História: No contexto da Guerra da Sucessão Espanhola (1702-1714) encontra-se referido como "O Fortim de Nossa Senhora dos Remédios." na Fajãzinha e o O 'Fortim de São Caetano' na Lomba.
NB – NB Dados retirados do Site da Marinha
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NOVA PONTE PEDONAL NA RIBEIRA GRANDE
De acordo com o site da Câmara Municipal das Lajes das Flores está ser reconstruída uma nova ponte pedonal sobre a Ribeira Grande, no sítio da Ladeira do Biscoito, local onde durante centenas de anos, antes da construção da estrada Porto da Fajã/Ladeira do Pessegueiro, se fez a travessia entre a Fajã Grande e o resto da ilha.
Reza assim aquela notícia, confirmada pelo “Forum Ilha das Flores”:
A Câmara Municipal em conjunto com o Governo Regional dos Açores, através da Delegação da ilha das Flores da SRTT, está a proceder à reconstrução de uma ponte pedonal na ribeira grande, entre as freguesias da Fajãzinha e da Fajã Grande. Desta forma pretendemos repor um percurso que havia ficado interrompido com a destruição da ponte, e dotar assim o concelho de mais uma rota pedonal para o setor do turismo das Lajes, numa das zonas mais procuradas e visitadas da ilha.
Recorde-se que a Ribeira Grande constitui o maior e mais caudaloso curso de água da ilha das Flores. Tem a sua nascente no Pico do Touro, situado lá bem no interior da ilha, a uma altitude de 670 metros e desagua no Rolo da Fajãzinha, muito próximo da rocha da Eira da Quada, pelo que possui uma bacia hidrográfica, muito vasta, possivelmente, a mais extensa das Flores e uma das maiores do arquipélago açoriano. Além disso, o seu leito ladeia a Lagoa da Lomba, a Comprida, a Funda e envolve-se em várias zonas pantanosas que abundam nas proximidades das mesmas. Ao cessar este longo e sinuoso percurso no Mato, a Ribeira Grande atira-se em catadupa, pela Rocha do Velho, transformando-se numa bela e monumental cascata, vindo cair cá em baixo já em terreno quase plano, deslizando por entre arvoredos e prados, ladeada de rochedos e pedregulhos, formando lagos e açudes e espalhando-se por veias e regatos, a alimentar moinhos e lagoas de erva, até desaguar no Oceano Atlântico.
Formando, nos meses de Inverno e nos dias de chuvas torrenciais, um gigantesco e quase intransponível caudal, a Ribeira Grande assumiu-se, ao longo dos séculos como fronteira natural entre a Fajã Grande e a Fajãzinha que, apesar de vizinhas, ficavam, por vezes e por culpa dela, tão distantes e separadas que vir da Fajã à Fajãzinha ou vive versa, era quase um ato heroico, uma aventura e um risco, sobretudo para os mais pequenos, que ao vir esperar os americanos e outros passageiros vindos no Carvalho ficavam pela Eira da Cuada, junto ao Calhau de Nossa Senhora, lá no cimo da ladeira do Biscoito. Mas apesar do seu temível e perigoso caudal constituir uma ameaça permanente para as duas freguesias, a Ribeira Grande sempre constituiu uma benesse para as mesmas, na medida em que as suas águas se transformavam em força motriz para os moinhos, alimentavam as lagoas de erva para o gado, enriqueciam as relvas, fertilizavam os campos e até serviam para branquear as roupas e lavar as tripas dos porcos.
Assim foi sempre difícil construir pontes capazes de resistir às enormes enxurradas e às monumentais enchentes e caudalosas torrentes da Ribeira Grande. Uma das muitas tentativas ocorreu em 1789, sob a orientação do juiz de fora José Gonçalves da Silva, sendo, nessa altura, construída uma ponte de pedra sobre a Ribeira Grande. Tratava-se, segundo rezam as crónicas, de uma construção técnica e arquitetonicamente muito avançada para a época, mas que ficou totalmente destruída com uma monumental enchente ocorrida cinco anos depois, que a derrubou por completo. Iguais destinos tiveram várias outras pontes, quase todas construídas no enfiamento da Ladeira do Biscoito, mas todas elas destruídas, mais cedo ou mais tarde, pelas caudalosas e destruidoras e tão frequentes enxurradas. Os últimos desses incidentes aconteceram em 1964, com a destruição da ponte de madeira ali colocada alguns anos antes, e em Novembro de 1996, quando mais uma vez o revoltoso caudal da Ribeira Grande destruiu a ponte da estrada que liga a Fajãzinha à Fajã Grande, no sítio do Pessegueiro. Nessa altura foi construída, a jusante da antiga, uma grande e moderna ponte em betão, com um vão dezenas de vezes superior ao anterior, a fim de que resista àqueles temíveis e violentos caudais.
Finalmente vai ser construída uma nova ponte a ligar a Fajã e a Fajãzinha, hoje, especialmente, com objetivos turísticos
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EDUINO DE JESUS
Eduíno Moniz de Jesus nasceu em Ponta Delgada, a 18 de Janeiro de 1928. Frequentou o Liceu Nacional de Antero de Quental na mesma cidade e iniciou a sua carreira académica na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra em 1951. Licenciou-se em Filologia Românica, em Lisboa, com dissertações em Linguística e Literatura, em 1976. Foi ensaísta, dramaturgo e principalmente poeta do modernismo. Interessado em divulgar na sua terra a nova moda literária, fundou, juntamente com outros companheiros de tertúlia, à data finalistas do secundário, uma espécie de cenáculo a que se chamou Círculo Literário de Antero de Quental, grupo que passou a ser notado no meio citadino, dado que tinha a modesta dimensão da insularidade e os tempos iam por uma estrita fiscalização por parte de quem governava. Por essa altura Eduíno de Jesus começou a publicar um artigo no jornal Correio dos Açores intitulado «O que se deve entender por uma Literatura Açoriana».
São diversos os estudos e prefácios deste autor que então foram aparecendo na imprensa insular e que dedicou a autores nascidos nos Açores, entre os quais, Armando Côrtes-Rodrigues, Vergílio de Oliveira, Madalena Férin. Prefaciou ainda a Obra Completa do poeta António Moreno (pseudónimo do padre José Jacinto Botelho da ilha de S. Miguel, nos Açores).
Na sua obra poética publicada, é de destacar Caminho para o Desconhecido; O Rei Lua; A Cidade Destruída durante o Eclipse. Esta nova moda poética fez com muita gente entendesse que a poesia se tinha tornado uma arte frívola e vã. Verdade é que a poesia de Eduíno de Jesus já foi traduzida em francês, por Gaston Henri Aufrère. Ultimamente Eduíno de Jesus publicou Os silos do silêncio, com prefácio de António Manuel Conto Viana e posfácio de Onésimo Teotónio Almeida.
Também escreveu teatro. Apesar de episódica, a escrita dramática de Eduíno de Jesus é significativa. Na sua comédia em um acto Cinco Minutos e o Destino afirma-se partidário da «arte pela arte»: as personagens são remetidas ao anonimato e designadas no diálogo cénico pelo papel que desempenham...
Em Coimbra, em 1951, fundou com Jacinto Soares de Albergaria, a «Colecção Arquipélago» que publicou textos de Bruno T. Carreiro, poemas de Vergílio de Oliveira e Madalena Férin, entre outros. Na mesma cidade universitária, colaborou nas revistas Vértice e Estudos e em 1958, a convite do poeta Couto Viana, na Graal.
Foi conselheiro pedagógico do Ministério da Educação Nacional e, nessa função, colaborador em estudos literários e linguísticos – como em Sintaxe Básica do Português. Também participou em Introdução à Semiologia de Toussaint. Em 1979 a Universidade Nova de Lisboa convidou-o para reger a cadeira de Teoria da Literatura, sendo também convidado pela Universidade Clássica, onde leccionou História da Literatura Portuguesa.
É diretor da Revista de Cultura Açoriana, órgão da Casa dos Açores em Lisboa.
Dados retirados do CCA – Cultura Açores
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SINDICATOS AGRÍCOLAS NA ILHA DAS FLORES
Há dias encontrei na net um interessante texto sobre os Sindicatos agrícolas na ilha das Flores e a intensa atividade desenvolvida pelo padre José Mota, pároco do Lajedo durante décadas, em prol dos agricultores da ilha das Flores. Apesar de desconhecer o seu autor, aqui o reproduzo parcialmente, transcrevendo as partes mais significativas:
Uma autêntica revolução é como poderíamos qualificar o movimento pela libertação da Lavoura, que, sob a liderança do jovem padre José Furtado Mota (1878-1963), varreu toda a ilha das Flores a partir da segunda década do século XX. Não deixa, porém, de ser curioso o facto de este grande movimento – que, de certo modo, dava também resposta ao apelo que o papa Leão XIII lançara na sua carta encíclica Rerum Novarum, em 1891, para que os trabalhadores católicos se associassem – ter nascido na pequena freguesia do Lajedo, onde o padre Mota fora colocado em Janeiro de 1909, e não numa das duas vilas da ilha…
A causa próxima do movimento, que, em escassa dezena de anos, haveria de levar à criação de vários sindicatos agrícolas na ilha, num processo que foi praticamente pioneiro no arquipélago e no país, pelo menos na área dos lacticínios, radica na drástica descida do preço do leite à produção, imposta sobretudo a partir de 1912 pelos industriais das Flores. É então que o padre Mota, primeiro sozinho, depois já com o apoio do regente agrícola Guilherme Joaquim da Mata, por ele convidado a deslocar-se do Faial, de alguns colegas do clero… e das páginas do Jornal-Rádio, desencadeia a sua campanha a favor da criação de um grande sindicato agrícola que, abrangendo toda a ilha, tivesse como objeto o fabrico de lacticínios e a exportação de gado a liquidar em Lisboa por conta própria.
A semente lançada pelo padre Mota … e os bons resultados obtidos pelo primeiro sindicato florentino. referenciado, já em 1918, por um jornal faialense como “a melhor organização do género no distrito da Horta”, depressa fizeram engrossar o número de simpatizantes do sindicalismo agrícola. Formalmente, o Sindicato Agrícola da Ilha das Flores nasceu a 5 de Janeiro de 1918, data em que foi celebrada a respetiva escritura constitutiva, e os seus estatutos foram aprovados por alvará de 27 de Agosto desse ano, assinado pelo Presidente da República, Sidónio Pais. A verdade, porém, é que este primeiro sindicato já vinha funcionando no Lajedo, de forma irregular, é certo, com o estatuto da mútua confiança dos seus sócios, pelo menos desde 1915. De resto, no verão de 1918 estava calculado em 18 contos de reis o valor da manteiga exportada pelo sindicato, que então já possuía, também, uma dúzia de fabriquetas em plena laboração e contava com mais de 400 sócios, maioritariamente do Lajedo, da Fajã Grande e de Lajes das Flores (Morros e Monte).
Os sucessos iniciais do sindicato, que, pela primeira vez, conseguia colocar os seus produtos em Lisboa, sem intermediários, a preços bastante remuneradores, depressa tornaram o movimento imparável. Mas, também por isso, em vez de um único sindicato, como idealizara o seu mentor, eis que, rapidamente, se vão constituindo, um pouco por toda a ilha, outras organizações similares. E nem a vila de Santa Cruz das Flores, onde o conúbio entre os industriais e a autoridade concelhia era mais estreito e constituía uma barreira cimentada por interesses comuns ao avanço da nova “doutrina económica” do padre Mota, logrou resistir de todo, sendo certo que, em 1919, também já lá existiam duas “frutuárias”, que, por não terem embora um enquadramento legal bem definido… declaravam pertencer ao “Grande Sindicato do Lajedo”.
Não foi fácil, porém, o caminho que conduziu ao estabelecimento desses sindicatos agrícolas, cuja progressão e sucesso, ao bulir com os interesses de alguns comerciantes e políticos locais, suscitou, da parte destes, violenta e impiedosa reacção. Nas Flores, proibiram-se, então, reuniões aos cooperativistas, mandou-se a tropa fiscalizar outras, fizeram-se ameaças e esperas em caminhos mal frequentados, recusaram-se arrendamentos de terras aos associados e renunciaram-se outros contratos.
Em 1920, as autoridades locais proibiram mesmo a exportação para Lisboa de gado e de manteiga dos sindicatos, os quais chegaram a ter em armazém, com o inerente risco da sua fácil deterioração, cerca de 30 toneladas deste produto. A situação, deveras calamitosa, foi exposta ao Alto-Comissário do Governo nos Açores que prontamente fez deslocar às Flores o navio Granja para escoá-los.
Num embarque clandestino, que haveria de valer depois multas de 400$00 a cada barco e respectivo mestre, o navio carregou então 430 cabeças de gado e 32 toneladas de manteiga, mas, a instâncias das autoridades da ilha, logo, em sua perseguição, foi mandado sair do porto da Horta uma canhoneira de guerra. Valeu ao movimento cooperativista a circunstância de o navio Granja se ter apressado em arribar à Calheta de S. Jorge, onde procedeu à legalização do despacho alfandegário.
Em Santa Cruz das Flores, a fábrica do movimento cooperativista foi também assaltada pela guarda republicana, preso o seu funcionário, feitas buscas às casas de alguns associados e arrematada em hasta pública a manteiga ali apreendida nessas rusgas. A própria exportação de gado foi igualmente condicionada a autorização do administrador do concelho, filho do mandante político local.
Poucos meses depois de o padre Mota ter denunciado, num extenso relatório que enviou ao Governo da Nação, essas arbitrariedades acabaram sendo demitidos das suas funções o juiz e o delegado do procurador na Comarca das Flores.
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TRINTA E UM
Um dos jogos mais comuns a que se dedicavam as crianças, na Fajã Grande, na década de cinquenta, era o jogo do Trinta e um. Tratava-se de um jogo muito simples e podia ser jogado em qualquer sítio e em qualquer ocasião ou momento, uma vez que a sua prática não exigia qualquer tipo de material. Era necessário, apenas, um bom número de crianças participantes e, por isso era jogado, fora da escola, enquanto se esperava a chegada da Senhora Professora, aos domingos, antes da missa, no adro da igreja ou nas tardes solarengas do verão enquanto os nossos pais descansavam à Praça ou nas banquetas da Casa do Espírito Santo de Baixo. Quanto maior fosse o número de crianças melhor e mais emotivo seria o jogo.
O jogo começava do seguinte modo: um dos participantes, geralmente por vontade própria ou designado por sorteio era escolhido para contar, pausadamente, de um até trinta e um, com os olhos bem tapados num determinado local, que deveria ser conhecido de todos os participantes e, junto do qual, no chão havia sido desenhado um pequeno quadrado e colocado um pedaço de pau ou um simples focho. Enquanto este jogador contava os outros participantes escondiam-se, cada um onde pudesse, procurando os esconderijos mais ocultos e esconsos, que evitassem que fosse visto pelo jogador que contava mas que permitisse ver a movimentação do mesmo. Ao chegar a trinta e um o jogador que contava terminava com a expressão trinta e um, barbas de pirum, não aparece nenhum. Só então destapava os olhos. Após a contagem, se visse algum jogador que ainda não tivesse encontrado esconderijo, proferindo o nome, riscava, de imediato, o mesmo nome com o pau, no sítio onde este fora colocado. Em seguida tentava encontrar cada um dos outros jogadores escondidos e ao avistar ou descobrir cada um, gritava o seu nome e corria a riscá-lo com o pau. Se alguma dos jogadores que se haviam escondido conseguisse chegar junto do pau antes dele e riscar o seu nome sem ser visto por aquele que está procurando, o jogador em causa seria obrigado a contar de novo. Nessa altura, todos os jogadores que ainda estavam escondidos eram chamados a aparecer. O jogo repetia-se com o mesmo contador até que este conseguisse descobrir o esconderijo de todos os participantes e riscar os seus nomes. Só então era escolhido outro jogador para contar, recomeçando todo o processo do jogo outra vez.
Com o mesmo nome também existia um jogo de cartas em que ganhava ou empata quem fizesse trinta e um, ou ficasse em ponto mais próximo a eles que o contrário. Neste jogo, distribuíam-se três cartas a cada jogador que, de seguida, pode pedir as que julgar necessárias para se aproximar dos trinta e um pontos. Se uma carta pedida ultrapassar os trinta e um pontos, o jogador sai de jogo. Trata-se de uma variante de um outro jogo, o Sete e Meio.
Talvez, por isso a expressão trinta-e-um significa significava «embrulhada, zaragata ou desordem». É que, por vezes, os jogos, especialmente os de cartas, são ruidosos, conflituosos e podem dar lugar a embrulhadas, zaragatas e desordens.
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A ROUPA QUE VESTIAM OS NOSSOS ANTEPASSADOS
A maneira de vestir, noutros tempos das gentes açorianas, sobretudo das freguesias, não variaria muito de ilha para ilha. Seria muito parecida. Por isso a descrição que o escritor picoense Dias de Melo faz nalguns dos seus livros da maneira de vestir das gentes do Pico é muito próxima, para não dizer igual à da ilha das Flores e, consequentemente da Fajã Grande. Segundo aquele escritor, natural da freguesia da Calheta do Nesquim, ilha do Pico, através do retrato que faz em Mar Rubro da Mariquinhas, mulher de António Pequeno, a maneira de vestir de outrora na ilha do Pico e, consequentemente, nas Flores, era a seguinte: «Era uma velhinha morena, alta, delgada, vestida à moda de outros tempos: uma saia de lã caída até aos tornozelos, uma blusa de chita ajustada ao peito, um lenço escuro que, amarrotado por baixo do queixo, lhe emoldurava o rosto simpático». Por sua vez em Pedras Negras onde refere que a mãe de Francisco Marroco usa xaile cuja lã de que é feito ela própria fia e tece assim como a das roupas que vestem os seus familiares, sendo tudo isto feito ao serão na companhia de outras mulheres que se juntam em casas umas das outras, passando as a fiar, a cardar, a tecer a lã e a fazer meias e sueras. No mesmo livro ainda refere que a viúva de João Peixe-Rei veste «roupa miserável», e que ela e o filho «não têm roupa que vistam p'ra virem à festa» do Espírito Santo.” Segundo Dias de Melo a emigração teve grande influência no que à maneira de vestir dos picoenses diz respeito: «Todas aquelas roupas, e todos aqueles enfeites, todos aqueles luxos dos velhos e de Maria que usam na festa, tinham sido trazidos da América». Dias de Melo de facto, refere-se frequentemente à roupa da América e o jeito que dava, uma vez arranjada, a quem não tinha posses para a comprar nova. Assim, declara que ele próprio, «… vestia um fato vindo da América, de fazenda de lã muito espessa, nunca menos de dois milímetros de espessura, uma suera também de lã e também espessíssima, fizera-ma minha Mãe, por cima de todas estas vestimentas enrodilhava-me um sobretudo, igualmente de fazenda de lã e igualmente vindo da América.» Curioso também é a descrição do conjunto de peças de roupa que um amigo do autor distribuiu pela família quando chegou da América com um baú recheado de prendas: «Aqui tá, oh yes, esta vestimenta inteira para vós, minha mãe, estes alvarozes e este sute para vós, mê pai, e este pra ti, mê irmão, e mais este naitigão pra ti, irmã, pra vós, minha avó, esta mantilha e este xaile de seda, pra vós, mê avô, este alvacoto para vos aquecerdes no Inverno, pra ti, mê primo, esta froca de angrim do bom». Mas «também havia os que vestiam pela Festa fatiotas novas «feitas, os fatos de casimira, preta ou azul, dos homens do alfaiate, os vestidos das mulheres nas costureiras do lugar, naquela quadra não tinham mãos a medir»
O calçado do dia-a-dia, segundo Dias de Melo, resumia-se nesses tempos recuados e de pobreza e miséria, para além das albarcas que tanto podem ser feita de coiro de boi ou de porco como de enjarroba, e que se podiam substituir pelos sapatos de pele de cabra nas Flores, segundo Dias de melo passava pelos tamancos de cepos de cedro e os coturnos de coiro atanado. Quanto a chapéus, encontra-se uma referência em Aquém e Além Canal ao «abeiro de palha» de Alfredo Saca, mestre duma lancha que fazia a ligação entre a vila da Madalena e a cidade da Horta. Acrescente-se que na Fajã Grande era muito frequente o uso de galochas e botas de enjarroba, estas sobretudo para ceifar erva nas lagoas-
NB – Alguns destes dados assim como todas as transcrições foram retirados da Net.
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OS QUE NOS AJUDAVAM
Nas décadas de cinquenta e sessenta existia no Seminário de Angra um grupo dedicado e exemplar de pessoas, regra geral homens, que com o seu trabalho e dedicação nos ajudavam no nosso dia-à-dia, nomeadamente na cozinha e na limpeza e asseio daquele enorme casarão. Embora não sendo professores, nem alunos, partilhavam com estes, nalguns casos dia e noite, a mesma casa, constituindo uma verdadeira família. Na globalidade eram homens bons, amigos e alguns partilhavam a casa com alunos e professores pois era ali que, para além de trabalhar, comiam e dormiam, permanecendo no Seminário durante quase toda a sua vida. Entre eles o mais mítico e emblemático, o Tomé, homem simples, generoso, sempre solícito a ajudar os alunos e os professores e a fazer tudo por todos. Sempre de vassoura e apanhador nas mãos quando em casa, acompanhava sempre os alunos nos passeios grandes, responsabilizando-se pelo transporte das refeições. O Tomé era natural da ilha Terceira mas não tinha família. A sua família éramos o Seminário. O senhor Julinho, mais tarde, veio ajudá-los nas limpezas. O porteiro era o senhor José Natal, natural da Fajã Grande das Flores, mais tarde deslocado para o Seminário de Ponta Delgada foi substituído pelo senhor Vargas, oriundo do Faial. De realçar ainda o cozinheiro, Senhor António, natural da Graciosa, que nos brindava às segundas-feiras com um excelente feijão assado e muitos outros, com destaque para um grupo de religiosas que tomaram conta da alimentação e limpeza do Seminário, nos finais da década de sessenta e da Senhora Maria, a primeira mulher a trabalhar no Seminário. Deve-lhes ser prestada homenagem, deve-se-lhes um sentimento de gratidão por quanto de todos eles se guardam melhores recordações e excelentes sentimentos de amizade, de respeito e de carinho.
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O DESASTRE DO CORVO
Quase todos os anos, por altura da Festa da Senhora dos Milagres, partia das Flores uma lancha com pessoal da Fajã Grande para participar na mais importante e maior festa da ilha vizinha. Muitas famílias da mais ocidental freguesia açoriana tinham os seus amigos e “conhecidos” no Corvo, em casa de quem se hospedavam, sempre que ali se deslocavam para a festa, ou simplesmente para efectuar algum negócio ou por outro motivo qualquer. Pela Senhora da Saúde, acontecia o contrário. Eram os corvinos que então se deslocavam à Fajã, hospedando-se nas casas dos que lhes haviam dado guarida pela Senhora dos Milagres. Algumas pessoas da Fajã, até seguiam para Ponta Delgada a pé e daí, da freguesia das Flores mais próxima do Corvo, faziam viagem para aquela minúscula ilha.
Corria o ano de 1942. Muitos peregrinos da Fajã decidiram ir ao Corvo, à Festa da Senhora dos Milagres, uma tradição que se mantinha desde há muitos anos. Organizou-se a excursão, fretou-se o gasolina e, na tarde do dia treze de Agosto, partiu, do cais, com quarenta e cinco passageiros, quase todos da Fajã e da Ponta, com destino ao Corvo, o gasolina “Senhora das Vitórias” também conhecido pela “Francesa”. A partida atrasou-se e a embarcação chegou ao Corvo, já noite escura. Ao aproximar-se da ilha, o mestre viu uma luz em terra e, cuidando que era o pequeno farol que indicava o porto, rumou a terra. Infelizmente a luz não era a do farol, nem o porto era ali e “A Senhora das Vitórias” enfiou-se, precipitadamente e de rompante, sobre as baixas dos Laredos, abrindo um enorme rombo a meio, enchendo-se de água e provocando grande pânico entre os passageiros. A confusão foi geral, a precipitação tremenda e o terror gigantesco. Não havia luz alguma, por ali perto, cada qual procurava salvar-se e salvar os seus familiares que a muito custo encontravam ou nem chegavam a encontrar, acabando por perder a vida neste acidente dezasseis passageiros e ainda um dos proprietários da embarcação de nome António Jorge de André Freias, residente nas Lajes. Da Fajã Grande morreram: António Cardoso de Freitas, Maria Garcia Ramos, Elvira Vitória Ramos, Maria dos Anjos Freitas Henriques, Ercília Garcia Ramos, José Inácio Luís, Glória Barbeiro, João Furtado Sousa, Ana Fagundes e Violante Cândida. Da Ponta faleceram Lídia Freitas Dias, Aurora Inês Freitas, José António Filipe, Manuel Furtado Silveira e Teresa Serpa. Também perdeu a vida neste acidente José Caetano Gangão, natural e residente da Fajazinha.
Diziam as pessoas mais antigas que quando a notícia, no dia seguinte, chegou à Fajã, “parecia um dia de juízo”, pois todos os que tinham familiares embarcados na véspera, para o Corvo, cuidavam que eram eles os falecidos. A freguesia encheu-se de gritos e de prantos, de confusão, de terror, de angústia e desespero, à medida que os nomes dos mortos iam sendo conhecidos.
No entanto, no Corvo, as autoridades e os responsáveis pelos destinos da ilha, com os limitadíssimos recursos e meios de salvamento que dispunham, tentavam recolher os náufragos e prestar auxílio às vítimas. O local, porém, era longe do povoado e de difícil acesso. Os meios de transportes nulos e os náufragos, quer os mortos quer os vivos, foram transportados a ombros. Havia apenas um médico na ilha. Após muito esforço conseguiram levar os mortos para a Casa de Espírito Santo do Outeiro, onde foram estendidos no chão, sem lhe serem prestados os primeiros socorros, não sendo, provavelmente, assistidos da melhor forma.
O desastre do Corvo que assinala o dia mais trágico da história fajagrandense perdurou anos e anos na memória de todos e muito especialmente na dos familiares daqueles e daquelas que tão tragicamente perderam a vida, naquela fatídica noite de 13 para 14 de Agosto de 1942.
Contava-se que a única criança que viajava se salvou. Um dos passageiros, instintivamente, ter-lhe-á pegado, trazendo-a para terra sã e salva. Só que esse salvador terá voltado atrás na tentativa de salvar algum familiar, tendo, infelizmente, perdido a própria vida. A criança salvou-se, mas nunca soube quem foi o seu salvador.
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PERDÃO
O António Tenente era um exímio pescador mas tinha um feitio dos diabos. Autoritário, impulsivo, rabugento, teimoso e, sobretudo, incapaz de perdoar ofensa que lhe fizessem. Anos a fio, na “Senhora da Ajuda”, à pesca da albacora, o afastamento prolongado da família como que o abrutalhara, filtrando-lhe a sensibilidade, arrefecendo-lhe os sentimentos, gravando-lhe, na alma, o restolho da solidão, da apatia e da indiferença. Tornara-se frio, solitário, insensível, implacável e, sobretudo, casmurro. Agora, apenas o mar e só o mar lhe domava os sentimentos e satisfazia os desejos. O mar, para o Tenente, parecia ter-se tornado numa paixão rude, num fascínio relutante, num encanto achaboucado. O mar era algo de que jamais se havia de separar e, mesmo agora, já trôpego e pouco afoito a aventuras em águas distantes e profundas, longe da costa, arrastava-se, até ao Cais e passava horas e horas ali, ora sentado sobre a rocha a olhar, sombriamente, o horizonte perdido, ora a pescar de pedra. Hábil e expedito, caniço bem aparelhado, peixe bem engodado e era um abarrotar de sargos, prumbetas, vejas, garoupas, castanhetas, salemas e um ou outro peixe-rei. Enchia a casa, a mulher pagava favores às vizinhas e ainda vendia uma ou outra cambulhada mais robusta e substanciosa.
O Tenente tinta três filhas. A mais velha, a Ermelinda havia-se perdido de amores pelo Augusto, o filho do Chico do Cabeço, ele, também, um velho e experiente pescador de traineira. O Tenente e o Chico, porém, não se falavam. Pior. Odiavam-se a tal ponto que nem se podiam ver. Enredos e discussões a bordo da “Senhora da Ajuda” geraram ameaças, despoletaram insultos e, sobretudo, cimentaram ódios, que, dificilmente, se haviam de dissipar. Ermelinda sabia-o e temia que o progenitor algum dia anuísse ao namorico. O coração, porém, fora mais forte. A simpatia inicial transformara-se em paixão e esta, em namoro. Afinal, ele, o Augusto, também a amava e muito.
Correram os dias, intensificou-se o namoro, divulgou-se pela freguesia a novidade, a qual, rápida e célere, foi parar aos ouvidos do Tenente. Muniu-se o facínora duma corda dobrada em quatro e esperou a filha, ao lusco-fusco, perante os choros e imprecações da mulher que, adivinhando a borrasca, implorava clemência.
Mal entrou Ermelinda em casa, surge-lhe, pela frente, o Tenente, furibundo e terrífico, de chicote em riste, indagando, em tom ameaçador:
- É verdade que namoras o filho daquele pulha? – Perante o silêncio comprometedor da rapariga, o Tenente insistiu, ao mesmo tempo que lhe assapava, como rito inicial da zurzidela, uma forte chicotada nas costas, com a corda que, momentos antes, dobrara em quatro.
Como Ermelinda continuasse calada, pese embora os gritos da mãe que a todo o custo tentava libertar a filha da fúria do pai, este, empurrando a mulher, assapou na rapariga uma nova vergastada e ainda uma terceira. A moça, por entre gemidos de dor e gritos de angústia, caiu por terra, esvaindo-se em sofrimento. Prostrada, ao lado, a mãe alvoroçara-se em choros e berreiros que em nada demoviam o facínora da sua pertinaz atrocidade. Encarando a filha, com os olhos a abarrotar de raiva, furioso e colérico, o Tenente ameaçou:
- Ou esqueces o filho daquele bandido para sempre ou sais por essa porta fora imediatamente.
Muito a custo, Ermelinda, lavada em lágrimas e arquejar em dor, levantou-se em silêncio, abriu a porta e saiu, enquanto o pai continuava a vociferar impropérios e injúrias.
Com o corpo dorido e a alma perfurada, Ermelinda foi procurar alento em casa dos pais do Augusto. Recebeu-a a mãe que o rapaz passava os dias no mato, a roçar. Saia alta madrugada, levava consigo um pedaço de bolo e queijo, uma garrafita de vinho e lá ia, trabalhando à jorna. Regressou já noite, surpreendendo-se com a presença de Ermelinda. O pai, ao lado, até parecia que saboreava com enlevo mesquinho o desprezo a que o Tenente botava a filha, vangloriando-se, cinicamente, de a ver ali, destronada, sofrida, humilhada, pedinte, afastada do aconchego familiar. Casasse o filho com quem quisesse mas ali em casa, rebento de tão ruim cepa, filha daquele Caim, nunca havia de pernoitar, nem lhe havia de lhe chegar uma febra que fosse de comida, nem uma coberta de cama, ou outro provento qualquer.
Fez-se o casamento à socapa, sem boda e sem enxoval e foi o Aníbal, para quem o Augusto, habitualmente, trabalhava e que lhe alojara a moça, que lhe arranjou uma casa, velha e decrépita, um pardieiro, onde, apesar de tudo, poderiam, ao menos, colocar uma barra, uma mesa e acender o lume. Nesse dia o Tenente, a propósito de renovar a cédula, partiu para o Faial na lancha da manhã e voltou na da tarde…
Envoltos em penúria, abalroados por privações mas dignificados pelo amor, sem terras, sem vinhas, sem gado, com parcos recursos, mas fugindo aos vitupérios dos progenitores, Augusto e Ermelinda fixaram-se ali, recuperando e melhorando, aos poucos a velha casa que o amigo lhe emprestara.
Chegou o primeiro rebento. Novamente os ouvidos do Tenente se aferroaram com a novidade. Vociferou, uivou, recalcitrou e protestou, jurando que neto do pelintra do Chico do Cabeço nunca lhe haveria de entrar em casa.
Certa tarde, porém, ao passar junto ao pobre casebre onde morava a filha, parou, espreitou e viu. Viu que um garotito, talvez já com dois anitos, saltava, pinchava, corria com alegria e deslumbramento como se fosse a criança mais feliz do mundo. Cabelos loiros e encaracolados, olhos azuis, rosto muito branco e pele macia, a criança aspergia docilidade, irradiava ternura, emanava inocência. O Tenente, não se conteve. Impulsivamente, saltou o muro e viu-se no pequeno quintal, junto à porta do humilde casebre. O petiz, como que descobrindo, no rosto calejado do velho, uma onda de ternura tão grande como o mar, pressentindo que aquele homem o desejava abraçar, correu na sua direcção, de braços abertos, agarrando-o e abraçando-o, como se sempre o tivesse conhecido. Lágrimas grossas, amargas, dolorosas mas emotivas escorriam dos olhos e cobriam o rosto calejado do Tenente, que, simultaneamente, também se abraçava ao neto, idolatrando-o na sua cândida inocência.
E quando Ermelinda, apercebendo-se de que alguém lhe rondava o casebre, assumiu à porta, chamando o “António”, o pai voltou-se. Ela vendo-o embebido naquele idílio, também se dirigiu para ele de braços abertos, exclamando:
- Está perdoado, meu pai!
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DESCIDA AO PROMONTÓRIO DOS COXOS (EM SÃO CAETANO DO PICO)
Na tarde de um dos últimos domingos solarengos de julho, desci ao mais enigmático e histórico promontório de São Caetano, quiçá do Pico, os Coxos! Há bastante tempo que não o fazia e cuidei que nunca mais voltasse a fazê-lo. Desci na companhia de alguns familiares, sob a astuta e audaz orientação do Senhor José Rodrigues, hábil pescador, exímio apanhador de lapas e que conhece aqueles e outros andurriais da rochosa e abrupta costa de São Caetano, melhor do que ninguém. A descida é íngreme, penosa, dolente, audaciosa, perturbadora e, sobretudo perigosa. Parecia que me atirava abruptamente para o abismo.
Ainda cá em cima, comecei por emergir de entre uma floresta jovem, repleta de faias, incensos, urzes, sanguinhos e paus-brancos, entrelaçados com figueiras raquíticas e abandonadas. Logo me surge, à frente, um miradouro rústico, intratado mas belo e sublime. Encontro o mar, num vai e vem contínuo e caricioso, de ondas suaves e maviosas, a baterem nos baixios, a emaranharem-se nos escolhos que do alto do miradouro avisto. O espetáculo, encafuado numa paisagem delirante, é belo, doce e transcendente. Ao redor o silêncio dos rochedos negros e o odor das figueiras a definharem, amordaçadas e perdidas entre silvados arrogantes. Apenas o mar domina o mundo, ligando-o ao universo do silêncio, quebrado pelo esvoaçar erótico das gaivotas em cio.
Muito a custo, roçando o “sim-senhor” no pontiagudo dos calhaus, agarrando-me às pontas mais ásperas e escarpadas das pedras, desço e chego ao promontório. Alcanço o mar, azul, límpido, claro e acariciador. Este mar não pode ser feito só de espuma amordaçada, nem de ondas entontecidas, nem de reflexos de raios de sol perdidos no horizonte. Neste mar há uma rigidez tremenda, uma força telúrica, jatos de lava adormecida, rochedos que as gaivotas escolheram como habitat. O mais mítico e emblemático de todos é este, metamorfoseado em promontório, a que deram nome dos Coxos, a emergir do seio da ilha, como se fosse um falo, na sua exuberância pubescente.
Já o descera e o contemplara inúmeras vezes quer como ubérrimo e fertilíssimo recanto de pesca, quer como inexaurível e indelével marco de um roteiro, sob a forma de trilho tortuoso e íngreme, mas inebriante e sonhador. Nessa altura ainda não se sentia a desertificação dos vinhedos primitivos, originais e puros. Agora tudo parece florescente, cativante e atrativo mas sem utilidade ou proveito. Emoção forte e vibrante, conjugada com a serenidade do oceano.
As lembranças envolvem-me como sonhos suaves duma história apenas contada mas que não deixa de ser verdadeira, somente por não ser escrita. Os rumores do passado reclamam ali, outrora, um cais natural, desenhado no recorte das falésias, patrocinado pela rigidez milimétrica das formas, estampado nos posicionamentos da lava basáltica. E assim, na inebriante penumbra das escarpas enegrecidas, vejo, como se existissem, vultos de homens de albarcas, calças de cotim e chapéus de palha, a subir e a descer, a carregar pipas de vinho, molhos de lenha, sacos de trigo, rolos de couro, o que a terra ressequida mas trabalhada produzia. Lá em baixo, batelões vazios, à espera de serem carregados com todo aquele entulho lávico e que depois partem na direção ao Faial: pão, vinho, bolo do forno, peixe salgado, fruta, e uma ou outra garrafa de bagaço. Tudo rasteja e se esgana por entre as pedras negras, tingidas com excrementos de gaivotas.
Nunca me sentei sobre o rochedo dos Coxos, saboreando o prazer da sua essência, ou circulando os rebordos das suas extravagâncias, mas postei-me ali, tantas e tantas vezes, sonhando como se tivesse partido para terras distantes. Para lá do oceano, há uma América imensa e sempre sonhada pelos açorianos. Há os que, prisioneiros do sonho partiram na luta por uma vida melhor. Apenas sorvem, nos momentos em que filtram o barulho das festas e o tédio do trabalho, a saudade, imensa, infinita e perene da sua ilha, o Pico.
Voltando ao promontório, onde agora me sento de caniço em riste, à espera de que uma veja se atire à moira, observo-o, na sua magnífica e vivencial exuberância. Dali terão partido baleeiras americanas, a abarrotar de fugitivos, calejados com a rudez da lava, abalroados pelo cheiro do enxofre, sufragando uma insustentável coragem de enfrentar a aventura do sonho, onde tudo é tido e possuído. Mas hoje definharam todos os sonhos nos abismos deste rochedo/promontório, onde há a magia necessária para tentar construir um futuro sustentável. A proposta, apresentada à edilidade madalenense, de ali se construir um marco turístico e histórico já foi engavetada. Cuidei que era o dono deste rochedo, que o envolvia num cometimento ousado e perturbador, que o purificava do abandono e o edificava como baluarte eterno e infinito dos meus sonhos de deficitário pescador ou caminhante perdido. Sou descendente de sonhos naufragados, destruídos pela lava dos vulcões. Sou herdeiro dos que tentam preservar as memórias não escritas, dos que decalcam a tradição, dos que despejam, em vasos de terra adubada, as lendas que se perderam ao desbarato.
Não sei se no promontório dos Coxos, existem vestígios de tesouros, colónias de recifes multicolores, restolhos de navios naufragados ou magia de destinos perdidos. Mas nas forças lávicas dos seus laredos existem lendas e memórias vivas de um passado escrito com lágrimas, embalsamado com sofrimento, galvanizado de honra e dignidade.
E se de nome ouve assim, talvez a sua génese esteja gravada na gesta dos que ali, sob o olhar e proteção de Santa Catarina que ainda hoje o espreita pela janela da sua capelinha, na vila das Lajes, subiam e desciam, vergados às estravagâncias da lava vulcânica, a coxear, não porque fossem “coxos” mas apenas e tão só, porque pareciam “coxos”, devido aos pesados carregamentos que transportavam e às íngremes agruras do trilho. Nem sempre o que parece é
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OS TRÊS FIGOS
Conta-se que certa vez um homem da Fajãzinha teve que se ausentar para Santa Cruz. Nesses tempos estas viagens faziam-se subindo a rocha da Figueira e atravessando os matos. Ao passar à Cova da Pedra viu uma mulher ao longe que lhe acenou:
“Que me quererá ela?” - pensou o homem, encaminhando-se na sua direção.
Quando chegou junto da mulher ela tinha um pano estendido com uma grande quantidade de figos passados em cima e disse-lhe para tirar quantos quisesse.
O homem tirou apenas três fgos, mas desconfiado meteu um no bolso e deu os outros dois ao cão que, de imediato, os comeu. Depois retomou o seu caminho. Ao descer a Ventosa lembrou-se dos figos e meteu as mãos aos bolsos, mas não encontrou o figo que ali guardara. Porém, no seu lugar tinha uma libra em ouro.
Muito arrependido por ter tirado apenas três figos, imediatamente, pôs-se a correr, voltando ao local onde encontrara a mulher, a fim de tirar mais figos. Muitos figos. Mas, para grande tristeza e desespero seu, a mulher já lá não estava. Furioso, o homem matou o cão, a fim de lhe tirar do estômago os figos que ele comera e que supostamente também se haviam transformado em libras de ouro. Mas nada encontrou no ventre do pobre animal que estrebuchava com dores, acabando por morrer. Meteu a mão ao bolso para agarrar a única libra que cuidava ter, mas nada mais encontrou no bolso do que um figo já apodrecido e mal cheiroso.
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O CIMO DA ASSOMADA
A rua da Assomada, na década de cinquenta, era incontestavelmente a rua mais populosa da Fajã Grande. A rua, com pequenas vielas u canadas no seu percurso, tinha a forma de um ípsilon, isto é, no seu cimo, ramificava-se em duas vielas que se prolongavam em caminhos. Encafuada e num vale formado pelo Pico e pelo Outeiro, à esquerda de quem a subia, ou seja do lado do Outeiro, a Assomada delongava-se pelo início do caminho que dava para as terras de cultivo, de mato, para as relvas, para o Covão e Outeiro Grande, para a Quada, para os Lavadouros e terminava no Curralinho. Por sua vez e do lado direito. Ou seja do lado do Pico a maior rua da Fajã continuava através do chamado Caminho da Missa, que dava para a Eira da Quada, para Fajãzinha e às outras freguesias e vilas da ilha. No meio ficavam-lhe os férteis cerrados de milho e batatas do Vale da Vaca.
O Cimo da Assomada era pois uma espécie de porta de saída da Fajã Grande, para o mundo. Era por ali e pelo Caminho da Missa todos os que abandonavam a freguesia em pequenas e rápidas deslocações às Lajes ou a santa Cruz ou em viagens maiores ao Faial ou à Terceira, geralmente por doença ou para cumprir o serviço militar. Mas era também por ali que transitavam todos os que abandonaram não apenas a freguesia mas a ilha em procura de melhor vida na América e no Canadá.
Era por ali também que todos regressavam e era por ali que entrava a maleira, com a mala às costas, carregadas de cartas e de avisos amarelos, vinda das Lajes. E era por ali que nos dias seguintes partíamos, alta madrugada, de aviso amarelo em riste e chegávamos à tardinha, contentes e felizes, com uma encomenda vinda da América, às costas.
Por tudo isto e por muito mais o Cimo da Assomada deveria ser considerado um marco histórico, um verdadeiro ex-libris da Fajã Grande.
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A FILARMÓNICA SENHORA DA SAÚDE
Foi à Praça, areópago de crítica e da má-língua mas também berçário de projectos e planos, onde os homens descansavam à sombra nas tardes escaldantes de Verão, que, no final da década de quarenta, nasceu a ideia de criar uma Filarmónica, na Fajã Grande, ilha das Flores. A decisão final, no entanto, só seria tomada, naquele ano em que a Filarmónica da Lomba, contratada para abrilhantar a festa da Senhora da Saúde, uma das maiores da ilha das Flores, falhou o compromisso assumido, faltando à festa, por alegadas razões de mau tempo.
Inicialmente poucos apoiavam tão ousado desiderato. Com o tempo, porém, tão grande foi a insistência dum pequeno grupo que pouco a pouco a ideia foi germinando, nas mentes dos mais afoitos: comprar uma Filarmónica não era um projecto de todo impossível, para a freguesia. Para isso bastava que todas as casas oferecessem o leite do primeiro domingo de cada mês. As contas eram fáceis: mais ou menos duzentas casas a uma média de dez litros de leite por mês, eram dois mil litros. Em doze meses seriam vinte e quatro mil litros. Se todos entrassem, daria à volta de trinta e cinco a quarenta contos por ano. Em nove ou dez anos, porque havia que pagar os juros, a Filarmónica estaria paga.
O plano era aliciante. Para a sua concretização bastou que, num domingo, no fim da missa, o pároco anunciasse da grade:
- Hoje à tarde há uma reunião na Casa do Espírito Santo de Cima, na qual devem participar todos os chefes de família. Vamos decidir se a freguesia vai comprar uma Filarmónica. Basta que cada um ofereça o leite do primeiro domingo de cada mês, durante alguns anos. Os poucos que, como eu, não têm vacas, darão o valor correspondente em dinheiro. É preciso é que todos participem!
No Verão de 1951, houve grande agitação em toda a freguesia. Os instrumentos estavam a chegar. Vinham de Lisboa, no Carvalho de Julho.
Um grupo de jovens com melhor ouvido e mais apetência para a Música, já há muito que se havia iniciado no solfejo, enquanto outros aperfeiçoavam o que tinham aprendido na tropa. Finalmente chegaram os instrumentos! Vinham dentro de enormes caixotes, protegidos com palha e farripas e brilhavam como prata! Dois contrabaixos, dois bombardinos, duas trompetes, dois trombones, duas trompas, dois cornetins, um saxofone, cinco clarinetes, uma requinta, o bombo, a tarola e os pratos. Tudo direitinho e em óptimas condições. Distribuíram-se pelos diversos músicos, de acordo com as capacidades de cada um e intensificaram-se os ensaios, agora sob a orientação de um sacerdote, professor de Música do Seminário de Angra, que vinha habitualmente, passar férias à freguesia, donde era natural.
No fim de Agosto estava tudo preparado e afinado. A banda estava, na abalizada opinião do maestro, preparadíssima para actuar. A inauguração e a primeira apresentação em público foram agendadas para o dia da festa da Senhora da Saúde, a maior festividade que se realizava na freguesia e uma das maiores da ilha.
A festa foi de arromba! Vieram, como convidadas, todas as Bandas Musicais das Flores e até Lira Corvense! Veio clero, autoridades e povo de toda a ilha.
Na Casa do Espírito Santo de Cima, os músicos fardados a rigor, calças e boné brancos, casaco azul com botões amarelados, acotovelavam-se nervosos, apreensivos e de instrumento em riste. Fora as restantes Filarmónicas esperavam pacientemente que o cortejo se organizasse. O Ouvidor das Lajes, paramentado a rigor, leu algumas orações em latim e aspergiu água benta sobre homens e instrumentos, traçando, vezes sem conta, cruzes no ar.
Pouco depois formou-se o cortejo em que seguiam as bandas convidadas. As ruas estavam engalanadas com bandeiras multicolores e o chão atapetado de pétalas e verdura, como se duma procissão se tratasse. Das varandas e janelas pendiam colchas de seda, no ar estalejavam foguetes e os sinos repicavam festivamente.
A seguir à missa, num coreto provisório, colocado no adro da igreja, as bandas tocaram à porfia. E a opinião era unânime: - a que melhor tocava era da Fajã. Pudera! Se os instrumentos estavam tão fresquinhos… Passou a chamar-se “Filarmónica União Musical Senhora da Saúde” e a partir de então abrilhantava todas as festas da freguesia, sendo muitas vezes convidada para tocar noutras partes da ilha, enquanto o leite do primeiro domingo de cada mês, com que quase todos contribuíam, ia pagando os juros.
Os anos passaram e a Filarmónica foi paga com o dinheiro do leite oferecido por todos, no primeiro domingo de cada mês. Dezenas e dezenas de jovens aprenderam música, para substituir os que se ausentavam ou simplesmente desistiam. Todos se orgulhavam da “Senhora da Saúde” e acarinhavam-na, porquanto consideravam a importância que ela tivera no desenvolvimento sócio cultural da freguesia.
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A BELEZA NATURAL DA ILHA DAS FLORES
A beleza natural da ilha das Flores é espelhada na hospitalidade da sua gente.
A ilha das Flores ainda se debate com o problema da sazonalidade no turismo. Porém, e a condizer com a oferta da natureza, há toda uma hospitalidade que se estende por hotéis, hospedarias e particulares.
A ilha das Flores, atendendo à sua dimensão e localização geográfica, regista uma sazonalidade turística mais acentuada do que outras ilhas açorianas. Ainda assim, por altura das festas Cais das Poças, Santa Cruz vê crescer a chegada de turistas e o regresso de jovens estudantes e emigrantes.
Em Agosto, o bom tempo, a disponibilidade, o gozar de férias, a natureza e as instalações hoteleiras são aspetos que se conjugam para que a ilha rosa possa ser ainda melhor anfitriã para os que a (re)visitam.
Numa altura em que é esperado um aumento do fluxo turístico no município de Santa Cruz, os agentes dizem-se preparados para fazer face à procura.
Santa Cruz das Flores tem três unidades hoteleiras: Hotel Servi-Flor, Hotel Ocidental e o Hotel das Flores. Para uma estadia mais despretensiosa existe ainda a possibilidade de se recorrer às acolhedoras hospedarias florentinas, que sempre deixaram a melhor impressão a quem por lá passou.
E se a procura exceder a que para já se adivinha, “não há motivos para preocupações” refere a organização das festas, uma vez que também as residenciais e alguns particulares se preparam e se disponibilizam para o aluguer de quartos. Poder-se-á estranhar o facto de particulares abrirem espaços das suas casas para abrigar os forasteiros, mas é preciso recordar que mesmo durante o ano a ilha das Flores recebe muita população flutuante, como sejam os professores.
Para os mais aventureiros e amantes do contacto com a natureza, o acampamento pode ser também uma possibilidade. Apesar do concelho de Santa Cruz não dispor de um parque de campismo, locais propícios para esse fim não faltam na ilha.
Aliada ao campismo, a natureza inspiradora e envolvente é convidativa aos passeios pedestres, ao canyoning, à observação de aves, assim como ao mergulho e à pesca desportiva.
NB - Notícia: suplemento especial do jornal «Açoriano Oriental» e publicado por Fórum ilha das Flores
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PARA SEMPRE (MÃE)
Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
— mistério profundo —
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.
Carlos Drummond de Andrade, in 'Lição de Coisas'
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MARIA BRITES
Maria Luís Roldão Brites, nasceu em 1934 e licenciou-se na Universidade de Coimbra. Foi professora do quadro docente da Escola Secundária Augusto Gomes, de Matosinhos. Ela própria confessa na sua autobiografia "Há 25 anos publiquei duas obras, um livro de poesias, A Cigarra do Mar, e um livro de contos, Um Saco de Diabelha, ambos ainda sob o nome de Maria Brites. Completamente isolada num contexto socio-político, profissional e familiar adversos à actividade literária, tive que adiá-la com desgosto. Neste espaço de tempo empenhei-me a fundo no processo educativo antes e depois de Abril de 1974. Dediquei-me também à elaboração de obras didácticas orientadas para o ensino do Inglês e do Alemão, colaborei na imprensa e na rádio. A partir dos anos 80 o quotidiano foi implacável para com a escritora em potencial. Ultrapassei no entanto todas as agressões e aqui está o resultado de cinco anos de luta pela sobrevivência. O triângulo do meu próprio espaço tem um vértice enterrado em Pombal, outro com raízes igualmente fundas no Litoral-Oeste e outro, ainda que de um modo difuso, aponta para o interior da região. Não é esta a explicação única para justificar o título desta obra ambiciosa que pretendeu ser uma saga do vidro. Aqui fica ao julgamento dos leitores com todo o meu empenho, com todo o meu profundo sentir por este triângulo litoral que faz parte de mim."
Dados retirados do CCA – Cultura Açores
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MATANÇA
O Silvestre todos os anos, uns dias antes do Natal, matava um porco. Engordado ao longo do ano com os cuidados excessivos da mulher que passava horas e horas a alimentar o bicho, os porcos que o Silvestre matava em cada ano eram coisa que se visse. Grandes, gordos, pesados, com uns bons palmos de toucinho no lombo. Os porcos do Silvestre eram sempre muito gabados por todos.
A matança do Silveste era um verdadeiro dia de festa. O Silvestre convidava sempre os familiares e os amigos, muitos amigos. E no dia da matança a casa do Silvestre enchia-se como nunca. Muitos ajudavam-no a apanhar o bicho, a meter-lhe a faca, aparar o sangue, lavá-lo, raspá-lo, barbeá-lo e até a abri-lo. Depois de um lauto almoço, onde não faltava, inhames, peixe assado, polvo guisado, a molha de carne e até bifes de toninha, tudo acompanhado com o vinho de cheiro que o próprio Silvestre ia buscar à adega, era o “desfranchar” do bicho, esquartejando-o, partindo, cortando, serrando, picando a carne para a linguiça, derretendo os torresmos. As mulheres numa azáfama medonha, a lavar tripas, a preparar as morcelas e a fazer os bifes para o jantar.
E à noite a casa do Silvestre enchia-se, não apenas dos que haviam ajudado durante o dia mas tmbém de muitos outros amigalhaços que, a convite doSilvestre, ali chegavam apenas com a intenção de jantar e depois, quiçá talvez jogar as cartas.
Quem nunca faltava â matança do Silvestre era o amigo Matias. Era um costume de há muitos anos, uma espécie de tradição que não podia diluir-se. Todos os anos o Matias, a mulher e os filhos eram presença certa na matança do Silvestre.
Um ano houve em que o Matias tinha em sua companhia um sobrinho. Filho duma irmã que morava na Serreta, na ilha Terceira. O rapaz ao acabar os estudos no liceu de Angra, fora estudar economia para Coimbra, onde se formara. Terminado o curso, ao regressar aos Açores, decidiu-se por concorrer para as Finanças. Como rareassem vagas na Terceira, a pedido da mãe, concorreu para o Pico, sendo colocado na Madalena, para gáudio da progenitora. O convite que o Silvestre fazia era para toada a família, incluindo o sobrinho.
O rapaz, embora tímido e pouco à vontade, acabou por aceitar o convite, comparecendo em casa do Silvestre, apenas à noitinha, para o jantar. Sentaram-se à mesa, aumentando os cuidados e exagerando nas atenções que em casa nunca lhes havia entrada tão ilustre visitante. O senhor doutor merecia todas as atenções e comidinha à farta. A abundância do cardápio e a excelência do repasto havia de ocultar e sublevar a pobreza e humildade do casebre do Silvestre.
Quem mais se esmerou em cuidados e atenções à volta do senhor doutor, foi a filha mais velha do Silvestre, a Lucília, muito solícita, a colocar-lhe na frente travessas de inhames fumegantes, bifes de lombo muito bem temperados e rodelas de morcela frita, muito frescas e a cheirar a cebola e temperos. Lucília não era bonita, mas era deliciosamente bela e encantadora. Não era linda, mas era fascinante e atraente. O rosto acentuadamente moreno, com uma boa parte encoberta por um cabelo muito negro, liso e sedoso. Tinha um ar destemido, ousado, quase selvagem embora simulasse, sobretudo ao aproximar-se de tão ilustre hóspede com uma simulada timidez. Tinha um sorriso muito límpido e transparente e resplandecia um encanto sublime e uma ternura atraente.
Terminado jantar os homens fumaram, a maioria tomou o seu traçadinho, outros um copo de aguardente pura, mas da boa, da safra do Silvestre. Mas o senhor doutor não estava habituado a estas bebidas… O Silvestre que sim e ele que não… Insistência daqui e recusa dacolá, até que a Lucília veio resolver a contenda com um cálice de angelica, pese embora, perante os protestos da rapariga que, com unhas e dentes defendia o senhor doutro das risotas e garçolas dos outros que afirmavam, à socapa, que aquilo era bebida de mulheres.
Sentaram-se, de novo á mesa, à mesa para as cartas. E como o senhor doutora fazia par com o Silvestre, logo após a primeira partida a dar um capote, fosse muito elogiado o senhor doutor pela sua hábil e sábia arte de jogar e Lucília nem por nada queria perder aquele momento. Inquieta, a arfar desejos e a vassalar-se numa tremenda paixão que o primeiro olhar dele, terno meigo e sedutor consubstanciara veio sentar-se ao seu lado. Pouco depois os seus corpos tocavam-se, ao de leve, inicialmente e depois com uma maior e mais destemida intensidade…
No dia seguinte foi ela que se adiantou, a, como era costume, ir levar uma postinha de carne e uma morcela a casa do amigo Matias. Foi o senhor doutor que a recebeu porque não estava mais ninguém em casa. Ele muito preocupado e aflito e ela nervosa e decidida. Iam despedir-se. O tio Matias havia de agradecer ao pai.
Mas antes de sair, Lucília, num impulso da sua gigantesca e indomada paixão, sem que ele o persentisse, deu-lhe um enorme beijo que havia de selar o amor que entre eles, nascia naquele momento.
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ILHA DAS FLORES, UMA MARCA DE DEUS
(TEXTO DO PADRE RICARDO HENRIQUES)
A ilha das Flores, no arquipélago dos Açores, é um dos mais belos locais a visitar actualmente em Portugal! A razão desta afirmação, aparentemente exagerada, prende-se com o facto de a natureza naquela ilha açoriana se encontrar ainda, parafraseando a antropologia teológica, num estado de justiça original. A comprova-lo está também o facto de ter sido declarada reserva da biosfera pela Unesco! As variedades na tonalidade do verde, bem como a riqueza orográfica verificada nas encostas escarpadas, nos declives por entre montanhas e vales fazem da ilha das Flores um cenário paradisíaco onde se pode contemplar inúmeras cascatas que durante todo o ano caem pelas rochas fazendo correr para o mar diariamente milhões e milhões de litros de água! É este o cenário real que encontrará se tiver a ousadia de visitar a ilha das Flores! Ademais, há nela cenários inesquecíveis como por exemplo a Rocha dos Bordõe a fazer lembrar a majestade dos tubos de um grande órgão de uma catedral! Uma maravilha da natureza para quem entra na ilha pelo lado sul, a vila das Lajes, após percorrer o vale com o mesmo nome. Percorrendo a ilha para a zona oeste, encontra o deslumbrante vale da Fajãzinha que pode ser apreciado desde os miradouros Craveiro Lopes e da Cruz. Aqui as cascatas e ribeiras que de verão e de inverno correm para o mar são autêntica força da mãe natureza a reportar-nos ao Criador. Ainda desde o miradouro Craveiro Lopes poderá apreciar o Poço da Ribeira do Ferreiro, erradamente apontado nas placas toponímicas como poço da Alagoinha. Continuando para o lado oeste da ilha das Flores deparará coma Aldeia turística da Cuada, um microclima no contexto da ilha, lugar propício à realização de um autêntico retiro espiritual. Silêncio, durante o dia, aliado á sinfonia dos pássaros com raiar da madrugada, é um cenário natural ideal para o encontro com Deus. Continuando o percurso pelo lado oeste da ilha encontrará a Fajã Grande situada á beira-mar, com um belo promontório, uma pequena praia, e o peso da proximidade das rochas quase fazer lembrar a narração da glória(kebod) de Deus que encontramos na literatura profética do Antigo testamento. Destaque para a ribeira das Casas com a famosa poça do bacalhau onde é possível tomar banho. Da Ponta da Fajã Grande até à freguesia de Ponta Delgada poderá apenas percorrer um trilho que durará umas duas horas até chegar ao farol do Albernaz no extremo norte da ilha. Cerca de vinte quilómetros separam esta freguesia do Norte da vila de Santa Cruz. Neste percurso não deixe de apreciar a vizinha ilha do Corvo, em curvas que oferecem panoramas de grandiosidade inigualável. Santa Cruz é a porta de entrada numa ilha de 12×10 de superfície, (142 km quadrados), com o seu aeroporto de 1400 metros. Das onze igrejas da ilha destaque para a Matriz de Santa Cruz das Flores que apresenta uma frente verdadeiramente imponente. O vale da Fazenda, o Pico da Sé e os panoramas dos miradouros do Pico da Casinha e da Ribeira da Cruz completam um ambiente natural que envolve a mais populosa povoação da ilha, a vila de Santa Cruz! Termino aguçando a curiosidade para ver as sete lagoas a que o povo chama caldeiras, talvez a roçar a perfeição que o número sete indica na Sagrada Escritura!
*Este texto está publicado no site Igreja Açores e no Semanário Ecclesia disponível em www.agenciaecclesia.pt