PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
LAVANDEIRAS – AS GALINHAS DE NOSSA SENHORA
Conta-se que antigamente havia uma mãe que vivia na companhia duma filha. O marido e pai morrera há muito, mas lembravam-no constantemente e, todos os dias iam ao cemitério chorar e rezar sobre a sua sepultura. A mãe, apesar dos cabelos brancos, possuía um rosto ainda belo e que evidenciava nobreza e caridade. A filha era muito jovem, alta e esbelta, de pele fresca e levemente corada, mas evidenciando no rosto a mesma expressão de bondade, que também tinha sido a maior virtude do pai, que sempre distribuíra o bem, enquanto vivo, por quem o rodeava.
Certo dia em que estavam ajoelhadas a rezar fervorosamente sobre a sepultura do marido e pai uma avezinha pousou perto delas, agitando constantemente a cauda como se estivesse chamando a atenção das duas mulheres. Era uma ave muito pequenina, de cor acinzentada, com manchas brancas e amareladas na cabeça e no pescoço e negras nas asas. De repente a avezinha, deixando mãe e filha pasmadas, começou a falar, dizendo:
— Escolhi-vos para que digais ao povo desta terra, dedicada a São José que eu fui eleita por Deus para proteger Nossa Senhora, o José na fuga para o Egipto, cobrindo de pó com a minha cauda em leque, o rasto da burrinha que os transportava. Dizei também aos habitantes desta, terra que a minha alimentação é o gorgulho do trigo e que lhes sou muito útil porque limpo os celeiros desse inseto tão indesejado.
Depois de dizer isto, levantou voo, enquanto mãe e filha recuperavam do susto. Já não tiveram mais tranquilidade para continuar as suas orações, regressaram a casa, contando a quem encontravam o que tinham visto e ouvido.
E consta que o povo acreditou nas duas mulheres e desde então começaram a acreditar que as lavandeiras eram aves sagradas, as galinhas de Nossa Senhora. Por isso é que na Fajã Grande, pelo menos até à década de cinquenta do século passado, não se perseguiam nem caçavam lavandeiras.