PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
MONUMENTO AO EMIGRANTE
Sobre uma nesga de basalto,
erguida à beira-mar,
(embora invisível)
uma estátua de pedra negra,
tosca e desornada,
mas robusta e destemida,
aponta o além,
Nas pontas dos seus dedos,
há um rumor
de saudades,
vindo de longe,
e que, trazido pelo vento,
atravessou a harmonia dos oceanos
No brilho fosco dos seus olhos
há um rastro
de dor,
camuflado de silêncio,
que, caído das nuvens,
se transformou em lágrimas ocultas.
Saudades que perduram
e nunca fizeram esquecer,
aos que partiram,
o sabor adocicado das laranjas sumarentas
que ficaram nas hortas a apodrecer
ou o perfume melificado das maças de polpa entumecida,
que rolaram pelo chão, sem proveito.
Lágrimas que crescem
ao relembrarem
os frescos murmúrios das ribeiras
ou o verde amarelado dos trigais em flor.
Saudades
que carregam
o mugido hesitante dos vitelos
e o som dolente das Trindades.
Lágrimas
que evaporam, pelos telhados esburacados,
os fumos tisnados das lareiras
e os vagidos do pão quente, a fumegar.
E onde for o lugar daquele além
quanta for a sua distância,
- porque são muitos os que o demandaram -
a estátua de pedra negra
do emigrante que nunca partiu,
(apesar de invisível)
permanecerá, ali,
presa para sempre,
com lágrimas nos olhos
e dedos apontados
ao Ocidente
como memória viva
de quantos partiram
e nunca mais voltaram.