PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O JUDEU ERRANTE
Uma estória, muito antiga, que ainda se contava, no início da década de cinquenta, durante os serões, na Fajã Grande, era a do Judeu Errante. Tratava-se duma lenda, onde o protagonista era uma figura mítica que se recusou a ajudar Jesus Cristo a carregar a cruz, durante a dolorosa viagem a caminho do Calvário e que, por isso mesmo, recebeu um castigo eterno. Rezava assim a estória:
Na Sexta-Feira Santa, enquanto caminhava a caminho do Calvário, depois de flagelado e coroado de espinhos, carregando uma pesada cruz, Nosso Senhor parou em frente à porta de um sapateiro, que trabalhava no arranjo de umas botas. Nosso Senhor, exausto, cansado e cheio de sede, pediu-lhe um pouco de água. O sapateiro interrompeu, de imediato o seu trabalho, mas não atendeu o pedido de Nosso Senhor. Antes pelo contrário, zombando d’Ele, disse-Lhe:
- Então tu não és o Filho de Deus? Faz um milagre, faz com que nasça aí, à tua frente, uma fonte, donde comece a correr água para beberes – ordenando, de seguida, a Nosso Senhor que seguisse o seu caminho, que caminhasse e não parrasse durante mais tempo, ali, à sua porta.
Nosso Senhor respondeu-lhe, dizendo que seria ele a caminhar, sozinho, pelo mundo fora, até ao fim dos tempos. E foi assim que o sapateiro, depois de ser assinalado com o sinal da cruz na testa, se tornou no Judeu Errante, que tem caminhado pelo mundo ao longo dos tempos e que ainda hoje continua a andar por todo o mundo, sem nunca poder parar a não ser quando conseguir colocar os pés precisamente no buraco onde esteve especada a cruz de Nosso Senhor. De facto, o sapateiro, deixando a mulher e os filhos, primeiro seguiu atrás de Nosso Senhor até o Calvário, depois saiu de Jerusalém e começou andar, iniciando, assim, uma longa peregrinação por todo mundo, a qual ainda não acabou e que só terminará no dia do Juízo Final, quando Nosso Senhor voltar para julgar os vivos e os mortos.