PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
TRÊS NAUFRÁGIOS EM TRÊS ANOS
A falta de faróis ou de outros meios de sinalização da ilha das Flores, a grande quantidade de escolhos, baixas e ilhéus da sua costa e a não existência de meios de apoio à navegação, foram os culpados de grande parte de um bom número de naufrágios verificados ao redor das costas florentinas, desde o seu povoamento até à primeira metade do século passado. A Fajã Grande, ponto de referência de toda a navegação proveniente das Américas com destino ao Norte da Europa e ao Mediterrâneo, não foi excepção. Foram inúmeros os acidentes verificados desde o início do povoamento daquele lugar, sendo que de muitos desses naufrágios não há registo ou memória. Alguns, no entanto, marcaram definitivamente a história e a toponímia da freguesia, como foi o caso da “Bidart”, barca francesa naufragada no Canto do Areal, na madrugada de 25 de Maio de 1915, precisamente num local que mais tarde passou a chamar-se, “o lugar da Bidarta”.
Neste longo decurso do tempo, houve, no entanto, um período negro ou de grande ocorrência de naufrágios, nas costas fajãgrandenses. Foi no início da década de setenta do seculo XIX, quando a Fajã Grande como freguesia ainda era uma criança. Nessa altura, num curto espaço de, aproximadamente, três anos, verificaram-se três grandes naufrágios.
No dia de Natal de 1869 deu à costa, nos baixios mais ocidentais da Europa, a barca francesa “Republique”, vinha da Martinica e dirigia.se para França, carregada de açúcar. Rezam as crónicas que foi tal a abundância de açúcar despejado em terra, na altura escasso na ilha, que uma parte foi arrematada, tendo, no entanto, o povo recolhido tanto que, pelos vistos, houve quem chegasse a utilizá-lo como tempero nas couves, em vez do sal, também escasso na freguesia, naqueles recuados tempos. Felizmente salvou-se toda a tripulação.
Ano e meio depois, a 15 de Julho de 1871 verificou-se um outro naufrágio nos mares contíguos à Fajã Grande. Desta feita foi um brigue inglês, de nome “Concórdia” com capacidade de 180 toneladas, que transportava açúcar e aguardente, embora, neste acidente, grande parte da carga se tenha perdido no mar, não sendo recuperada e a que o foi, pelos vistos uma pequena parte, terá sido guardada pelas autoridades e arrematada mais tarde. A embarcação naufragada seguia com destino a Queentown e salvaram-se todos os tripulantes, num total de 8 homens.
Finalmente, a 9 de Janeiro do ano seguinte deu-se mais um grande naufrágio na Fajã Grande, Desta feita foi o lugre francês “Alexis”, capitaneado por Boncherie que faleceu no acidente, juntamento com dez dos onze tripulantes que, com ele, seguiam a bordo. O navio navegava de Rio Grande com destino ao Sul para a Europa, carregando couros, lã, chifres e clina. Uma parte deste carregamento salvou-se e foi arrematada.
A esta série negra de três naufrágios em tão curto espaço de tempo, poder-se-á juntar um quarto, acontecido no dia 26 de Fevereiro de 1866. Trata-se do naufrágio do patacho inglês “Greffin”, capitaneado por Philip de Boutellier. Salvou-se a tripulação e uma boa parte da carga que transportava, neste caso fardos de algodão, dos quais se recuperaram alguns, os quais, como era hábito na altura, foram arrematados na ilha.