PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A PACIÊNCIA DE JOB
Era este também um dos muitos contos tradicionais que os nossos antepassados nos contavam aos serões, na Fajã Grande, na década de cinquenta. Neste caso, tratava-se de uma “estória” muito provavelmente inspirada numa passagem da Bíblia, narrada no livro de Job.
Havia, noutros tempos um homem chamado Job, bom, generoso, paciente e temente a Deus. Mas Job também tinha muitos bens, tinha esposa, tinha filhos, tinha criados e tinha muito gado, era muito rico. Certo dia, o Demónio, que tinha inveja daquilo tudo, pediu a Deus que pusesse à prova a paciência e a bondade de Job. Para isso propôs a Deus que o autorizasse a lhe retirar todos os bens e lhos desse a ele, Diabo. Assim Deus havia de ver como a paciência de Job se esgotava, de um momento para o outro. Mas Deus disse-lhe:
- Não, não te dou os bens dele, todos, de uma só vez, mas vai-lhos tirando aos poucos, um a um, conforme entenderes. Assim verás que ele se mantém bom e paciente.
Então, o Demónio que era mau e invejoso, pediu a Deus para retirar a alma de Job. Deus, porém, opôs-se, novamente, dizendo-lhe:
- Isso não. Podes tirar-lhe tudo, menos a alma pois essa, quero-a para mim.
Então, o Demónio, começou a sua tarefa de retirar todos os bens de Job. No primeiro dia tirou-lhe uma filha, matando-a. No dia seguinte matou-lhe a esposa e, de seguida, todos os filhos. Não contente com isso, matou-lhe o gado todo, as vacas, os porcos, as galinhas e até os criados. Incendiou-lhe a casa e, por fim, cobriu-lhe o corpo de feridas e de chagas.
Os vizinhos e os amigos admiravam-se com toda aquela tragédia que atingira Job, mas abandonaram-no porque julgavam que se ele tinha sido assim castigado por Deus, era por ser um grande pecador. Deus só castiga os que praticam o mal. E diziam uns para os outros:
É Deus que o está a castigar! Devem ser muitos e grandes, os seus pecados! – E dirigindo-se a ele com desprezo, perguntavam-lhe:
- Ó Job, o que é que tu fizeste de tão grave para Deus te castigar tanto?
Job, cheio de paciência e de generosidade, respondia sorrindo:
- Deus não castiga ninguém, nem me castigou. Os bens que eu tinha haviam-me sido dados por Ele. Assim Deus mos deu, Deus mos tirou.
Então Deus chamou o Demónio, fez-lhe ver a paciência de Job e exigiu que lhe devolvesse todos os bens que lhe havia retirado. Deu-lhe nova esposa, nova família, deu-lhe nova fortuna mas não permitiu mais que o Demónio se metesse na vida dele, nem pusesse à prova a sua paciência.
E concluíam os contadores da estória: - É esta a razão por que ainda hoje dizemos: “Quem me dera ter um pedacinho da paciência de Job”.