PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
CANTAR OS REIS
No chamado “Dia de Reis”, em que a Igreja liturgicamente comemora a Epifania, outrora celebrado a seis de Janeiro e na altura considerado “dia santo abolido”, mas que o povo na Fajã Grande, como em muitos outros locais, respeitava como se de “dia santo de guarda” se tratasse, a garotada percorria as casas da Fajã, de forma semelhante à que fizera no primeiro dia do ano ou dia de “Ano Bom”.
Os grupos eram os mesmos, o líder não mudava, os percursos também eram idênticos, assim como todos os procedimentos tidos no dia um. A única diferença estava na cantoria, que agora, em dia de Reis, continha temas relacionados não apenas com os três reis mas sobretudo com o atribulado percurso que fizeram, guiados por uma estrela, desde os seus países de origem, até encontrar o menino deitado em palhinhas, na gruta de Belém, oferecendo-lhe os seus melhores presentes: oiro, incenso e mirra.
Entre outros versos cantávamos os seguintes:
“Os três Reis do Oriente,
Sonharam, sonharam bem
Sonharam que era nado
O Menino em Belém.
Os três Reis que eram santos
Uma estrela os guiou
Do alto duma montanha
Brilhantes raios deitou.
Herodes como malvado
Como perverso e malino
Aos três reis lhes ensinou
Às avessas o caminho.”
Mais tarde, surgiu na Fajã Grande, trazido da Lomba por pessoas que para ali vieram morar, o canto do “Rei Preto”, celebrado no fim-de-semana seguinte aos Reis. Os cantores eram adultos, percorriam todas as casas, mas à noite, acompanhados de alguém fantasiado de rei com a cara pintada de preto, cantando entre outras quadras a seguinte:
“Eram três raças diferentes
Cada um em seu falar
O que dava mais nas vistas
Era o Preto Baltazar.”
Assim como os das crianças, o grupo de adultos também percorria todas as casas, batia a todas as portas e muitas das quais se abriam para os brindar com aguardente, traçado, licores e figos passados.