PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O JOSÉ AUGUSTO
O José Augusto ou o “José Augusto do Francisco Inácio”, como era vulgarmente conhecido na Fajã Grande, foi, durante um ou dois anos, meu colega de escola, na altura a funcionar na Rua Direita, na Casa do Espírito Santo de Baixo. Mais velho uns anos do que eu, frequentámos o ensino primário em classes diferentes mas, como partilhávamos todos a mesma sala, que neste caso era uma casa, era-nos proporcionada a nós, os mais novos, a oportunidade não apenas de brincar, confraternizar e conviver com os mais velhos mas até de apreciar as suas capacidades de aprendizagem e de observar a performance dos seus percursos escolares e a excelência dos resultados que obtinham. O José Augusto era um aluno muito inteligente, brilhante e aplicado, um dos melhores da escola, aliando à excelência das suas qualidades intelectuais uma bondade excessiva, uma camaradagem contínua e uma amizade abrangente. Era amigo de todos e, alem disso, carinhoso, atento e solidário para com os mais novos.
Fora da escola, sobretudo nas tardes de domingo e dias feriados, tinha também a oportunidade de me juntar e brincar com ele e com muitos outros, uns da minha idade, outros um pouco mais velhos, pela canada do Pico, ao “Pai Velho”, no pátio da Casa do Espírito Santo de Cima ao “Burrinho do Lamé”, na rua Direita à “Pesca à Baleia”, no Outeiro ao “Velhas às Escondidas”, de participar em lutas à pedrada, no Vale do Linho, contra os da Ponta, de tomar banho no Caneiro do Porto, onde aprendíamos a nadar ou ainda de colaborarmos na construção de alguns brinquedos com que nos divertíamos, nomeadamente as célebres “Músicas de Cana”, em cuja construção ele era exímio. Morava na Assomada, numa casa geminada com a do Cabral e era sempre o primeiro, nos domingos entre a Páscoa e o Pentecostes, durante os quais as coroas de Espírito Santo iam à missa, a colocar no seu pátio um altíssimo mastro, onde hasteava uma enorme bandeira branca com o símbolo do Paráclito. Muitos outros, incluindo eu, seguíamos-lhe o exemplo e a maioria das casas da freguesia ornamentavam-se com bandeiras, umas brancas, outras vermelhas, enquanto os foliões da Cuada, acompanhando a coroa e a bandeira, enchiam a Assomada com os seus cânticos: “Ó venha, hoje venha, Senhor venha…” Sobrinho de meu tio Cristiano, por parte da mãe que era irmã da minha tia, encontrava-me também com ele, muitas vezes, em casa do meu tio. Por tudo isso, o José Augusto estabeleceu sempre comigo e talvez ainda mais com meu irmão António, cujas idades eram mais próximas, grande amizade e cumplicidade em termos de jogos e brincadeiras.
O José Augusto cresceu, tornou-se homem, agricultor, pescador, jogador de Futebol do Atlético Clube Fajãgrandense, músico da Filarmónica Senhor da Saúde e cantor a Capela da Paróquia, dedicando-se, ainda, a muitas outras actividades. Finalmente casou e passou a viver, ali à Praça, na casa que outrora fora do seu Tio Antonino. Homem honesto e trabalhador, cidadão honrado e digno, membro activo e participante quer nas vivências quer nas actividades da freguesia e da paróquia, o José Augusto emergiu como uma das importantes figuras da Fajã Grande, contribuindo significativamente para o seu crescimento e desenvolvimento, nas décadas posteriores aos anos cinquenta, em que o conheci e com ele convivi, enquanto criança.
Infelizmente o infortúnio, feroz, violento, fulminante e cruel, havia de o atingir. O José Augusto, ainda muito novo, faleceu vítima de um acidente marítimo, quando se encontrava, juntamente com um familiar, a apanhar lapas no Monchique.