PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A CASA DE TI JOSÉ LUÍIS
A casa onde na década de cinquenta, morava a viúva de Ti José Luís, juntamente com algumas filhas e filhos ainda solteiros, constituía, na verdade, talvez o mais emblemático edifício habitacional da Fajã Grande, sob o ponto de vista arquitectónico e, sobretudo, histórico. Na realidade, hoje é por de mais confirmado que aquele edifício terá sido mandado construir, muito antes da construção da actual igreja, e, muito provavelmente, pertenceu e foi residência de António Freitas Henriques, um dos mais ilustres fajangrandenses de todos os tempos, nascido no lugar que naquela altura ainda pertencia à freguesia das Fajãs, a 30 de Março de 1721, onde foi capitão, entre 1751 e 1770, ano em que faleceu. Era filho do capitão Gaspar Henriques Coelho e de Francisca Rodrigues e foi também vereador municipal, juiz do ordinário e comandante, com patente real, da companhia de ordenanças das Lajes. Era irmão do padre Francisco de Freitas Henriques, o primeiro sacerdote que, pese embora a Fajã ainda não fosse paróquia, prestou serviço religioso na antiga ermida de São José, anterior à actual igreja. Sabe-se também que esta residência, mais concretamente do lado Sul, onde na altura vivia o José Natal, estava ligada com a respectiva ermida, através de uma ponte, a fim de que os “senhores” para ela se dirigissem sem ter que passar pela rua, evitando, à boa maneira aristocrática, misturar-se ou envolver-se com o povo. Não se conhecem, no entanto, os residentes intermediários, na posse e usufruto do imóvel, se os houve entre os descendentes da família Freitas Henriques e os moradores na década de cinquenta, embora muito provavelmente Ti José Luís, pertencesse àqueles descendentes, uma vez que tinha o mesmo apelido “Freitas”.
Tratava-se de um belo edifício, com aspecto exterior monumental, uma verdadeira casa solarenga, de planta rectangular, com dois pisos mais sótão, estando, na década de cinquenta dividida em duas habitações, uma ocupada pela família de Ti José Luís, outra pelo José Natal.
A fachada principal do edifício, voltada para a Rua Direita, é emoldurada, na parte inferior, contigua ao chão, por uma base ou soco invulgarmente alto e saliente e por uma cimalha com faixa, ornada com friso e cornija onde apoia o beiral, requintes arquitectónicos raramente encontrados na Fajã Grande. A mesma fachada ainda apresenta três portas alternadas com quatro frestas, e por cima de cada uma das portas e no enquadramento das mesmas, rasgam-se igual número de janelas de peito cujos aventais estão ligados às cornijas das portas que ficam por baixo. Quer as portas quer as janelas são encimadas por uma verga, com uma pequena cornija, semelhante à do telhado. A porta sul era a única que pertencia à residência de Ti José Luís e dava entrada para uma sala, através da qual, por uma escada se subia ao piso superior. A porta do central havia sido, na década de cinquenta ou antes, transformada em janela da referida sala e a do Sul era independente e dava acesso à loja do José Natal e mais tarde da Senhora Bernadete. Por sua vez na empena da direita, ou voltada a sul e na qual é visível o aproveitamento do sótão, havia uma porta ao nível do piso térreo também encimada por uma janela. Do lado direito da janela há uma outra porta mais pequena, a que se tinha acesso por uma escada com balcão e que dava para a cozinha. A cimalha da fachada principal prolonga-se pela empena direita formando a base de um frontão cujo remate superior é feito por uma faixa e uma cornija que acompanham a inclinação das águas da cobertura.
O edifício é construído em alvenaria de pedra rebocada e caiada, excepto os beirais das portas e janelas, a base ou soco e as cimalhas, que são em cantaria, pintada de cor cinza como a maioria das casas da freguesia.
Era na rua Direita, ao lado desta casa solarenga que se situavam os mais belos e imponentes edifícios da Fajã Grande, incluindo um outro, localizado mesmo em frente e também dividido por dois proprietários e formando dois fogos, um onde moravam três irmãos, filhos de Joãozinho e um outro onde morava o Francisco da Cuada.