PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O MANUEL MANQUINHO
No início da década de cinquenta chegavam, habitualmente, à Fajã Grande muitos baleeiros vindos do Pico e um ou outro do Faial. Geralmente traziam as famílias, fixavam-se na freguesia, alugavam casas e ali permaneciam durante o verão, apenas regressando às suas terras quando a safra baleeira terminava. Alguns voltavam no ano seguinte e um ou outro fixou-se por ali durante anos e anos.
Entre estes experientes baleeiros picoenses que demandavam a freguesia mais ocidental da Europa, geralmente oficiais e trancadores, chegou um vigia. Chamava-se Manuel Caetano da Silva e vinha da Calheta de Nesquim, de onde era natural. Ali nascera em 1924, sendo mais tarde funcionário das Finanças nas Lajes do Pico, onde viveu durante alguns anos. Viveu na Fajã Grande, na companhia da família, alugando a casa que pertencia o José Tomé, paredes meias com a Praça
Na Fajã Grande, Manuel Caetano da Silva, coadjuvado durante muitos anos pelo António Machado, dedicou-se à vigia da baleia, de que era um exímio praticante. Tanto na Fajã, como noutros lugares das Flores e até no Corvo, onde também foi vigia de baleia durante alguns anos, assim como no Pico, Manuel Caetano da Silva era conhecido por “Manuel Manquinho”. A razão de ser deste epíteto devia-se a facto de desde de nascença ser dotado de um grande defeito físico, uma vez que não tinha a parte inferior da sua perna esquerda, a partir do joelho, nem o antebraço do mesmo lado.
Esta deficiência obrigava este homem a que, quando na posição de pé, parecesse que estava de joelhos, uma vez que fixando o coto da perna esquerda no chão, sempre protegido por uma bota adequada, era forçado a ter a perna direita flectida. Esta distorção, pouco funcional quando o homem se deslocava em terreno plano, era-lhe, no entanto, muito útil e prática quando ascendia escadas, degraus ou escaleiras. É que, ao subir, projectava a perna pequena sempre à frente, impulsionando-a com a direita, como se fosse uma mola. Assim subia os degraus da canada do Pico da Vigia com uma destreza e agilidade impressionantes.
Outra característica interessante deste homem que era bastante culto, lia muito, falava inglês correctamente e sabia música, era a agilidade que demonstrava a tocar trompete. Como tinha uma só mão, a direita, era com esta que segurava o instrumento, ao mesmo tempo que com uma agilidade notável dos dedos, accionava os pitões, para emitir os sons. Mesmo só com um braço e metade do outro, colocando o membro inferior diminuído em cima de um banco, o Mestre Manuel Manquinho conseguia reger a filarmónica Senhora da Saúde com mestria e excelência.
Manuel Manquinho, um bom homem, simpático, atencioso, educado, amigo de todos, bom conversador, um grande músico e, sobretudo, um excelente vigia de baleia, apesar da grande deficiência física com que nascera mas que ele sublimara de forma excepcional, transcendente e sublime, conferindo à sua vida, uma alegria contagiante e uma felicidade permanente.
Um grande exemplo de vida, de força, de coragem e de capacidade de ultrapassar os problemas e as deficiências, o deste grande pequeno homem!