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NORDESTE

Quarta-feira, 19.06.13

Por capricho ou por benevolência ou talvez por insensatez ou loucura (sabe-se lá), os deuses pintaram aquele torrão de lava do Nordeste micaelense de verde, mas de um verde tão verde que jorra por aqui, por além e por toda a parte, atulhando os campos, cobrindo as montanhas, enfeitando as beiras das ruas, ornando os caminhos, salpicando a orla das estradas, abalroando as casas e as igrejas, correndo pelo leito das ribeiras e até se reflectindo enigmaticamente na pureza imensa e infinita do Oceano. Ali tudo é verde! Apenas o céu, de dia clarificado por um Sol amarelado e risonho e de noite escurecido mas cravejado de uma infinidade imensa de estrelas, permanece, na sua essência, azul, muito azul, como se fosse um enorme manto protector de toda aquela aguarela monumental e sublime. Do mar sopra apenas e tão-somente uma brisa suave e fluente que se enrola e aconchega nos beirais das casas, penetrando por frestas e janelas como que a purificar e a fortalecer a esperança e o destino.

Mas não se ficou por aqui a douta e imensa generosidade dos deuses. É que também dotaram aquele extremo mais oriental das nove ilhas açorianas com paisagens naturais raras e extremamente belas, com vistas deslumbrantes e terrivelmente inesquecíveis como os miradouros da Ponta do Sossego, da Ponta da Madrugada, da Vistas dos Barcos, do Pico Longo, fortificaram-no com serras e montanhas alcantiladas de uma medonha excentricidade, como o Pico da Vara, a Serra da Tronqueira, estacaram-lhe as arribas e falésias com promontórios como a Ponta do Arnel, a da Achada, a de S. Pedro e a da Madrugada, encravaram-lhe ali bem no meio a Cascata da Ribeira dos Caldeirões e rasgaram-no com muitas outras ribeiras e grotões que serpenteiam e deslizam por ali, forçando as estradas a vertiginosos traçados curvilíneos, por entre uma vegetação luxuriante, alguma endémica e outra indígena, sob a tímida mas consoladora protecção do priolo.

E como se isto não bastasse os deuses ainda na sua desconhecida mas eficiente tarefa de criação, traçaram ou melhor permitiram que se traçasse por ali, nos contrafortes da Assomada, entre campos repletos de fresca alfombra e sulcados por pequenas ribeiras onde sussurra o murmúrio sibilante das águas, uma rua. Nessa rua há uma casa, apenas uma casa. A rua é erma mas singela e simples e a casa é de um basalto negro, tingido de branco onde sobressaem manchas de lava escura e onde foram rasgadas frestas e janelas por onde penetram a claridade do Sol, a brancura da Lua, o canto dos pássaros, o colorido das flores e o sabor adocicado das ervas perfumadas que a rodeiam.

Mas o mais interessante é que do interior da casa, mesmo quando a aguarela se tinge de um verde mais esbatido ou o priolo afrouxa e roufenha o seu canto, emerge uma enorme torrente de ternura e carinho e irrompe, continuamente, um gigantesco caudal de hospitalidade.

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publicado por picodavigia2 às 22:28





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