PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
OS TRÊS HERDEIROS
Era uma vez um homem que tinha três filhos. Quando chegou a hora da sua morte chamou-os e disse-lhes:
- Filhos eu estou a morrer, mas o que me custa mais é deixar-vos tão pobres, pois não tenho mais nada para vos deixar senão uma foice, um gato e um galo.
Os filhos, apesar de tristes por ver aproximar-se o fim de vida do seu progenitor, retiraram-se, conformados com a sua situação. Quando o pai morreu, dividíramos bens que o pai lhe deixara: o filho mais velho ficou com a foice, o do meio com o galo e o mais novo com o gato. Depois, decidiram correr o mundo, levando consigo, cada qual, o objecto que herdara.
Um dia o mais velho, passando por um campo de trigo viu os ceifadores a ceifar o trigo com facas e disse-lhes:
- Então vocês andam ainda a ceifar o trigo com facas? Eu trago aqui um bichinho que ceifa tudo num instante.
E entrando no campo, ceifou um pouco de trigo coma a foice. As pessoas admiradas com a rapidez do bichinho perguntaram-lhe quanto queria por ele. O rapaz pediu-lhes muito dinheiro. As pessoas acharam que era muito caro, mas, como precisavam dele deram-lho todo o dinheiro que ele pediu. Mas os ceifeiros não sabiam ceifar com ele e o primeiro que o experimentou cortou-se e disse:
- Ai raio do bicho já me mordeu! – E atirou a foice para o meio do trigo.
Os outros ceifeiros ao verem aquilo e a ferida do companheiro, começaram a bater na foice e a atirar-lhe pedras. Esta aquando as pedras lhe caiam em cima zunia:
- Zim, Zim, Zim...
- Atiremos-lhe mais porque o bicho está assanhado. – Diziam os ceifeiros uns para os outros. Depois, abandonando a tesoura num canto, voltaram a ceifar com facas.
Continuaram a correr mundo e, passado algum tempo, o filho do meio, ainda lusco-fusco, encontrou uns homens com carros de bois e disse-lhes:
- Então onde vão tão cedo com os caros de bois?
- Olha, vamos buscar a manhã; todos os dias nos levantamos cedo e vamos buscar a manhã. O rapaz, apesar de achar aquilo estranho, disse-lhes:
- Eu tenho aqui um bichinho que vos pouparia todo esse trabalho, pois é ele que, todos os dias, chama a manhã.
- Então quanto quer pelo bichinho? – Perguntaram os homens.
O rapaz fez como o irmão e pediu muito dinheiro pelo galo. Mas eles logo lho deram. Todos os dias o galo cantava: - Có-có-ró-có-có… e logo amanhecia.
Finalmente, o filho mais novo também teve oportunidade de vender o que herdara do pai. Certo dia, passou por uma cidade onde havia muitos ratos. As pessoas andavam com grandes varapaus a matá-los, mas por mais que matassem não conseguiam acabar com ele. Quando viu isto, o rapaz disse para as pessoas:
- Vocês andam aí com tanto trabalho a caçar ratos com paus. Eu tenho aqui um bichinho dentro desta saca que os comeria todos e vocês ficariam totalmente livres deles. - E tirando o gato do saco, atirou-o pelas ruas. O gato, ao apanhar-se cá fora, começa logo a matar e comer ratos.
As pessoas assim que viram esta espécie de milagre, perguntaram-lhe logo:
- Quanto quer pelo bichinho?
O rapaz, a exemplo dos irmãos, pediu muito dinheiro. Deram-lho e pôs-se a caminho. Quando lá ia longe as pessoas lembraram-se que não tinham perguntado o que o bichinho comia e começaram todos a chamá-lo perguntado:
- Olhe lá o que come o bichinho?
Ele responde:
- Do que a gente come.
Como já ia longe eles perceberam:
- Muita gente come.
Começaram então todos à pancada no gato até que o mataram. Assim ficaram de novo com muitos ratos na cidade.
Os três irmãos que apenas tinham herdado a foice, o galo e o gato ficaram ricos e viveram felizes.