PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A CANADA DO CALHAU MIÚDO/MIMOIO
O Mimoio era um dos mais belos e mais produtivos lugares da Fajã Grande. Lugar de grandes cerrados para milho, trevo e erva-da-casta, onde se amarrava o gado à cordada, sítio de excelentes belgas para o cultivo da batata-doce e de uma outra relva de muito boa qualidade de erva. Paraíso de beleza excêntrica, celeiro privilegiado, recanto de quietude. Situado num amplo planalto, a encosta que o projetava sobre toda a zona da Tronqueira era fértil em canas, espadanas, faiais, sanguinhos e uma ou outra babosa. Mas o diabo eram os acessos. Pese embora houvesse três trilhos de acesso ao Mimoio, qualquer um deles era pior do que o outro. O primeiro e o mais usado era o que se fazia através duma canada, conhecida por Canada do Mimoio e que tinha o seu início na Fontinha, junto ao palheiro da porta sempre aberta, de Tio José Teodósio. Um segundo acesso era efetuado por uma outra canada que se iniciava na Ribeira das Casas e se prolongava até ao centro do Mimoio. Como esta canada era menos perigosa e menos íngreme do que a primeira, era por aqui que transitava o gado com destino às relvas e às terras do Mimoio. O terceiro acesso e, curiosamente, o mais alcantilado e escabroso, era o da Canada do Calhau Miúdo, a qual se chamava assim por se iniciar no lugar como mesmo nome, ou seja no Calhau Miúdo. Relativamente aos outros acessos ao Mimoio, este tinha a vantagem de ser o mais curto, embora fosse muito difícil de transitar, porquanto o seu trajeto desenhava uma muito inclinada subida quase toda ela constituída por degraus em pedra rústica, alguns deles muito soltos, a desfazerem-se. A canada iniciava-se quase no cruzamento dos caminhos da Tronqueira, Porto e Ponta, num largo que se servia de descansadouro e que numa das altas paredes que o ladeavam, do lado Porto, era encimada por uma pequena e tosca cruz de madeira. Ali mesmo, ao lado, situava-se a Pedreira, ou seja uma rocha esburacada no termo dos enclaves da Ladeira do Mimóio e que abastecia a freguesia de pedras para a construção de casas e palheiros. Depois e até ao planalto do Mimoio a canada apenas subia, persistente e teimosa. Eram degraus atrás de degraus numa íngreme e sinuosa escalada. No entanto, à medida que se subia e, sobretudo ao chegar-se ao alto, desfrutava-se duma bela e abrangente vista. O casario da Fajã, toda a zona da orla marítima e do baixio, desde o Areal ao Cantinho, a prolongar-se no Rolo, até ao ilhéu do Cão e à Rocha da Ponta.
A Canada do Calhau Miúdo era utilizada como via de acesso sobretudo por altura da apanha do milho que era acarretado em cestos às costas desde dos cerrados até al Largo onde ficavam estacionados os carros de bois. Como o percurso era mais curto, o gado estava menos tempo á espera, menos sujeito à mosca e ao calor e, além disso, a subida efetuava-se de cestos vazios, isto é, sem carga. Apenas na descida se carregavam os pesados cestos às costas ou à cabeça, a abarrotar de belas maçarocas de milho. E como para baixo todos os santos ajudam, na altura da apanha do milho o trajeto da Canada do Calhau Miúdo era o eleito.