PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
A SOPA DE PEDRA
(CONTO TRADICIONAL)
Era uma vez um frade que andava no peditório. Chegou à porta de um lavrador, não lhe quiseram aí dar esmola. O frade estava a cair com fome, e disse:
- Como não tenho nada para comer, vou ver se faço um caldinho de pedra …
Dizendo isto, pegou numa pedra do chão, sacudiu-lhe a terra e pôs-se a olhar para ela, para ver se era boa para fazer um caldo. A gente da casa pôs-se a rir do frade e daquela lembrança. Perguntou-lhes o frade:
- Então nunca comeram caldo de pedra? Só lhes digo que é uma excelente sopa.
Responderam-lhe os da casa, ao mesmo tempo que o convidavam a entrar:
- Sempre queremos ver isso!
Foi o que o frade quis ouvir. Entrou para a cozinha e, depois de lavar a pedra muito bem lavada e pediu:
- Se me emprestassem aí um pucarinho…
Deram-lhe uma panela de barro. Ele encheu-a de água e deitou-lhe a pedra dentro.
- Agora, se me deixassem estar a panelinha aí ao pé das brasas…
Deixaram. Assim que a panela começou a chiar e água a ferver, tornou o frade:
- Com um bocadinho de unto, é que o caldo ficava um primor!
Foram-lhe buscar um pedaço de unto. Ferveu, ferveu, e a gente da casa pasmada pelo que via. Dizia o frade, provando o caldo:
- Está um bocadinho insosso. Bem precisava de uma pedrinha de sal.
Também lhe deram o sal. Temperou, provou e afirmou:
- Agora é que, com uns olhinhos de couve o caldo ficava tão bom que até os anjos o comeriam!
A dona da casa foi à horta e trouxe-lhe duas couves tenras. O frade limpou-as e ripou-as com os dedos, deitando as folhas na panela.
Quando os olhos já estavam aferventados, disse o frade:
- Um naquinho de chouriço é que lhe dava uma graça…
Cada vez mais animados com o que viam, trouxeram-lhe um pedaço de chouriço. Ele deitou-o na panela e, enquanto cozia, tirou do alforje pão e arranjou-se para comer com vagar. O caldo cheirava que era um regalo. Comeu e lambeu o beiço. Depois de despejada a panela, ficou a pedra no fundo. A gente da casa, que estava com os olhos nele, perguntou:
- Ó senhor frade, então a pedra?
Respondeu o frade:
- A pedra lavo-a e levo-a comigo para fazer um caldo outra vez.