PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
AGUARELA
Fajã Grande! O ponto mais ocidental da ilha das Flores, dos Açores e, simultaneamente, o ponto mais ocidental de Portugal e da Europa. Olhando em frente, apenas o Monchique e o mar. O mar é tudo o que a vista humana alcança. Lá ao longe, apenas o horizonte a separar o mar do céu e a impedir que se enxergue, talvez com uns bons binóculos, aparentemente muito longe, mas apenas 3500 quilómetros, Manhattan, a personificação da América. Encastoada entre o Outeiro e o Pico da Vigia, com a rocha lá ao fundo, recortada por inúmeras quedas de água, a Fajã Grande, pintada de verde na Primavera e colorida de amarelo e lilás no Outono, teve uma enorme importância num passado recente, pois foi ponto de paragem dos baleeiros americanos e ponto de partida de grande parte dos emigrantes açorianos que abalaram para os Estados Unidos e Canadá. No final do século XIX e na primeira metade do seguinte, a freguesia continuou a prosperar, adquirindo uma estrutura urbanística que a diferencia claramente das restantes freguesias rurais das Flores e até dos Açores. A rua principal da Fajã Grande, a Rua Direita, a que, mais tarde, foi dada o nome de um dos seus mais ilustres filhos, o Senador José Joaquim André de Freitas, é ladeada por um conjunto de imóveis de traça erudita e com dimensões e qualidade construtiva que atestam a riqueza que a emigração americana trouxe e a relação com a baleação propiciou. Por isso mesmo, foi muitas vezes considerada como um lugar que, embora pequeno, bem merecia o estatuto de vila. Hoje em dia é, essencialmente, uma zona balnear com cada vez mais procura nos meses quentes de Verão. Entre a Fajã Grande e a vizinha freguesia de Ponta Delgada não existe qualquer tipo de ligação rodoviária. A única hipótese de percorrer os 12 quilómetros da costa oeste da ilha é através de um longo e irregular percurso pedestre de cerca de 3 horas e meia, mas que é o mais interessante de todos. Ao longo do troço destacam-se paisagens deslumbrantes sobre as falésias, calçadas de pedra antigas, vários cursos de água, cascatas e a magnífica mostra de exemplares da vegetação endémica. A Fajã Grande conta, actualmente, com várias colectividades, entre as quais se destacam a Tuna Sol Mar da Fajã Grande, fundada em 1993, por Jesuíno Pimentel, sendo composta por amantes da arte musical, tocando e cantando as modas regionais e tradicionais da ilha das Flores. Embora actualmente inactiva, a Filarmónica União Musical Nossa Senhora da Saúde, instituída em 1950, com a oferta, por parte de todas as famílias, do leite do primeiro domingo de cada mês, divulgou, durante décadas, a arte musical das Flores por toda a ilha, actuando em festas locais e regionais. No desporto foi o Atlético Clube da Fajã Grande que também durante décadas ocupou dezenas de jovens na prática desportiva. A Casa do Povo de Fajã Grande, ainda hoje em actividade, possuindo uma moderna sede onde funciona um gabinete de assistência social e um salão polivalente para reuniões e espectáculos, continua a ser uma mais valia, para os seus cerca de actuais duzentos habitantes. Para além do porto e área de lazer adjacente, a freguesia apresenta alguns locais de interesse, nomeadamente a sua Igreja paroquial de São José, edificada em 1868, com a sua génese numa primitiva capela com a mesma invocação, erigida em 1755. Este templo possui dois altares no encontro do arco que separa a restante parte do edifício da capela mor. Possui ainda na Ponta uma ermida da invocação da Senhora do Carmo. A vigia da baleia, uma cabina empoleirada em cima no alto do Pico da Vigia e que se projecta sobre o mar, donde se goza um estupendo panorama. Em tempos serviu a indústria baleeira, assinalando a presença de cachalotes na zona e coordenando a caça pelos botes baleeiros baseados no porto da freguesia. A capela de Santo António, no antigo largo do mesmo nome a Casa do Espírito Santo no lugar da Cuada, datada de 1841 e teatro da festa homónima no dia de Pentecostes, são outros locais de enorme interesse. A Cuada é um lugar pertencente à freguesia, habitado até aos anos sessenta, altura em que todos os seus habitantes emigraram para a América. Foi, então, recuperado e transformado num local de turismo de excelência, como um enorme testemunho de perseverança a seguir. A Cuada, com as suas casas e ruas recuperadas, personifica uma viagem entre o passado e o presente, uma recuperação da traça rural das pequenas casas de pedra, no meio duma paisagem delirantemente bela e estranhamente acolhedora. A Fajã Grande orgulha-se de ter sido o berço de algumas personalidades que, no seu tempo e à sua maneira, se notabilizaram. De entre esses, destacam-se o padre José António Camões, o padre José Luís de Fraga, pelos seus dotes de orador, escritor e músico; o senador André de Freitas e Pedro da Silveira crítico literário, historiador e poeta, com múltiplos trabalhos publicados.