PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
COSTA OCIDENTAL DAS FLORES (VISTA POR GASPAR FRUTUOSO - SEC. XVI)
Na parte final do Livro VI, de “Saudades da Terra”, Gaspar Frutuoso descreve a Costa Ocidental da ilha das Flores, desde Ponta Delgada até à Fajã de Lopo Vaz,, no último quartel do século XVI. Reza assim a crónica d G. Fructuoso:
“…Dali a meia légua de rocha, de pedra viva e por baixo penedia, estão dois ilhéus… Criam-se neles muitos pássaros de toda sorte e muito marisco, e algum mato; chamam-se os ilhéus de Maria Vaz.
Daqui, a um tiro de bombarda, vai fazendo a rocha uma enseada, onde moram sete ou oito vizinhos, que lavram pão e pastel e têm um moinho em uma ribeira, que sai ao mar, chamada do Moinho.
Dali a um quarto de légua está uma fajã, chamada Grande, que dá pão e pastel, em terra rasa, com algumas engradas onde entram caravelas de até cinquenta moios de pão a tomar o pastel que nela se faz, onde também há marisco e pescado de toda a sorte, e no cabo dela está um areal, de meia légua de comprido, em que sempre anda o mar muito bravo; e dali por diante, a outra meia légua, é tudo rocha talhada, onde se apanha muita urzela, e de muita penedia por baixo, em que se cria infinidade de marisco e grandes cranguejos, e desta mesma maneira corre a rocha um tiro de bombarda até uma ponta, que sai ao mar um tiro de arcabuz, com um baixo de pedra, que tem lapas e búzios; e, logo adiante desta ponta, se faz uma baía, onde com ventos levantes ancoram navios de toda sorte e também naus da Índia.
No meio deste ancoradouro cai da rocha no mar, a pique, uma grande ribeira…
Pera o qual nordeste, virando esta ponta de alta rocha, de penedia e alguns pesqueiros por baixo, passado espaço de um tiro de bombarda, está um ilhéu, chamado de Maria Vaz, no mar, de grandura de um alqueire de terra, em que criam pássaros, como nos outros atrás ditos, onde há encoradouros de navios, defronte do qual vai beber no mar uma grande ribeira, chamada dos Moinhos, por ter um só que abasta à freiguesia de São Pedro, que está nesta ponta, e tem anexa uma ermida de Sant'Ana, que primeiro foi paróquia. Há nela homens nobres, Pimenteis, Homens, Costas, Fernandes, Vazes, Gomes e Vieiras; e é da jurdição de Santa Cruz. Fronteiro deste encoradouro, é terra tão alta, que se chama o Vento, por ali haver sempre grandes ventos que levam a terra, quando a acham lavrada.”
“…Dali a meia légua de rocha, de pedra viva e por baixo penedia, estão dois ilhéus, de grandura de alqueire de terra cada um, afastados da rocha um tiro de bombarda, que podem passar por antre eles e a terra navios e naus grandes, onde têm bom encoradouro. Criam-se neles muitos pássaros de toda sorte e muito marisco, e algum mato; chamam-se os ilhéus de Maria Vaz.
Daqui, a um tiro de bombarda, vai fazendo a rocha uma enseada, onde moram sete ou oito vizinhos, que lavram pão e pastel e têm um moinho em uma ribeira, que sai ao mar, chamada do Moinho.
Dali a um quarto de légua está uma fajã, chamada Grande, que dá pão e pastel, em terra rasa, com algumas engradas onde entram caravelas de até cinquenta moios de pão a tomar o pastel que nela se faz, onde também há marisco e pescado de toda a sorte, e no cabo dela está um areal, de meia légua de comprido, em que sempre anda o mar muito bravo; e dali por diante, a outra meia légua, é tudo rocha talhada, onde se apanha muita urzela, e de muita penedia por baixo, em que se cria infinidade de marisco e grandes cranguejos, e desta mesma maneira corre a rocha um tiro de bombarda até uma ponta, que sai ao mar um tiro de arcabuz, com um baixo de pedra, que tem lapas e búzios; e, logo adiante desta ponta, se faz uma baía, onde com ventos levantes ancoram navios de toda sorte e também naus da Índia.
No meiodeste ancoradouro cai da rocha no mar, a pique, uma grande ribeira.
Adiante um quarto de légua estão dois ilhéus no mar, afastados da terra um tiro de besta, que têm pouco mato em cima, onde criam diversas aves, e antre eles e a terra há encoradouros de navios, e ao lível com o mar corre uma ribeira, onde abicam as barcas dos
navios e dentro enchem as pipas de água, sem as tirar fora. Chama-se esta parte os Lagedos.
É terra lançante e a rocha pouco alta, que dá pão e pastel. Foi de um João Soares, dos Mosteiros, desta ilha de São Miguel, o qual, morando nestes Lagedos, por sua mão fez,
calafetou e breou um batel, sem saber nada destes ofícios, em que ia com sua mulher e filhos ouvir missa à vila das Lagens. Diziam dele que, quando tornava para sua casa, dizia à filha mais velha que pusesse o batel em e ela o tomava à cabeça e o punha onde queria, por ser muito pequeno e mal feito, mas servia-lhe, pelo caminho por terra ser trabalhoso, e muitas vezes este João Soares ia só às Lagens no barquinho e, às vezes, pescar nele.
Por diante um tiro de berço corre alta rocha dependia, até chegar a uma fajã, chamada de Lopo Vaz, de três moios de terra e rasa com o mar, ao longo do qual, antre grossa penedia há lapas e cranguejos, e pela banda da terra tem uma rocha de penedia, de altura de um tiro de besta, pela qual a través fez Lopo Vaz um caminho, por onde vão bois abaixo, que lhe custou e custa ainda muito, porque, quebrando a rocha muitas vezes, lho quebra, e logo lho torna a fazer, por ser a fajã de muito proveito de pastel e trigo, que nela amadurece primeiro que em nenhuma parte da ilha, e ter muitas fontes de água.
Desta fajã, espaço de meia légua, é tudo alta rocha, no cabo da qual está a vila das Lagens…”