PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
ERA-NÃO ERA
Era-Não-Era, no tempo das eras
Andava na serra,
Lavrando a terra
Com arado de carne
E bois de madeira.
Vieram-lhe dizer que o pai estava a morrer
E a mãe a nascer.
Foi tão grande o seu prazer.
Que prendeu os bois a uma moita
E pôs o arado a comer.
Vai por aí abaixo,
Encontra um ninho de marracho
- Onde hei-de pôr os ovinhos?
- Oh… debaixo da burrinha!
Saíram-lhe dois tentilhões;
E onde haviam de poisar?
Numa árvore que dava avelãs.
Começou a atirar-lhe pedras
E a caírem cebolas albarrans.
Foi vendê-las à vila e fez um dinheirão.
À volta dá com um meloal
E entra a apanhar um melão.
Vem de lá o dono e diz:
- Que fazes em faval alheio?
Atirou-lhe um melão, acertou-lhe com um torrão,
E fez-lhe sangue tão vermelho!
Seguindo o seu caminho,
Logo a seguir viu um passarinho
A sair do seu ninho.
Chegou às suas colmeias
Não pode contar os cortiços;
Mas foi contar as abelhas… e faltava-lhe uma!
N'isto ouviu resmalhar em uma moita,
E julgando que fosse a abelha,
Atirou-lhe com o machado.
Foi lá busca-lo, mas não o encontrou.
Atiçou fogo a uma moita,
Queimou o machado e lá apareceu o cabo.
Voltou para traz e foi falar ao professor,
Que lhe fizesse um machado.
Vai de lá o mestre ferreiro apresentou-lhe um anzol.
Que se havia ele lembrar?
Lembrou-se de ir á pesca.
Quando sente morder no anzol.
Puxa a linha e trouxe…
Um burro pelas orelhas, sem as ter!
Deixou o burro a comer,
E foi ás colmeias outra vez.
Estava a moita feita em mel.
Tirou dois piolhos da cabeça,
Das barrigas fez dois sacos,
e com elas carregou o burro,
Depois de as encher de mel.
Mas a carga era muito pesada,
E o burro ficou todo ferido.
O Era-Não-Era pôs-lhe favas em cima,
Cuidando que o burro morria
Pôs-lhe as favas mesmo cruas,
Por ser assim mais depressa,
E lá o deixou no campo a pastar.
Passado um ano voltou ao campo,
E viu um grande faval nascido em cima do burro.
Tratou logo de ir buscar uma foice para ceifar as suas favas;
Mas quando ia começar o trabalho,
Viu lá dentro um porco-espinho.
Jogou-lhe com a foice, e o cabo entrou-lhe pelo rabo,
Com o rabo o porco ceifava, com as patas debulhava…
E d'esta maneira o Era-Não-Era
Recolheu uma grande colheita.