PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
MARÉS DE JUNHO
Sobem pelo cais, destemidas e afoitas, glorificando-se. Ora aparecem ora desaparecem ora se confundem com a inequívoca serenidade do oceano, imenso e infinito. Vêm carregadas, desejosas de lucubração e justiça e, se a ironia as persegue, escondem-se, passivas, temerosas, dispostas a carregar sobre si a amargura perturbante do silêncio eterno. Ao redor, uns sentados nas escadas, outros encavalitados em guindastes, videntes de todas as espécies, orgulham-se, como pavões, ironicamente vitoriosos. Julgam-se dominadores, os déspotas, presunçosos e altivos, arrogantes e sarcásticos. Envolvem-se em sorrisos malévolos, masturbam-se numa sabedoria aparente e ejaculam ignorância apodrecida. São dejectos da mais vil ignomínia.
E elas, as marés de Junho, perdem-se neste marulhar de ironias agonizantes. Vão e vêm. Partem incertas, sem destino e regressam destruídas, desfeitas como se nada mais conhecessem do que a insurgência pútrida daqueles desmazelados facínoras, de convicção errónea, que transmitem um niilismo degradante. Mas é, exclusivamente, a elas que cabe a culpa de quanta insegurança existe na transfiguração passiva de ilhéus, baixios e escolhos. Baías, enseadas, caneiros e poças sem vida porque sem marés de Junho