PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
MAROIÇOS DE MANUEL TOMAS
Foi lançado, no passado dia 9 de Março, na vila da Madalena, na ilha do Pico, por ocasião da celebração do 290º centenário da elevação daquela localidade a concelho, o livro Maroiço da autoria do Dr Manuel Tomás da Costa. Trata-se do último trabalho deste escritor e poeta picoense, apresentado no salão solene dos Paços do Concelho, com a presença dos presidentes da Câmara, José António Soares, da Assembleia Municipal, Dr Álvaro José Alves Manito e de muito público. Trata-se de um livro de poesia, editado pela Companhia das Ilhas, sediada nas Lajes do Pico e cuja apresentação esteve a cargo do Dr Júlio Aroeira, professor da Escola Cardeal Costa Nunes e do Dr Manuel Costa Júnior, Director do Museu Regional do Pico, sendo a mesma precedida pela encenação do espectáculo cénico, “Entre a terra e o mar”, apresentado por um grupo de alunos da EBS da Madalena, sob orientação das professoras Carla Silva e Gilberta Goulart.
Natural da Madalena do Pico, Manuel Tomás fez uma boa parte da sua formação académica no Seminário de Angra, tendo dedicado toda a sua vida profissional ao serviço da educação, quer como professor, quer como dirigente de algumas escolas, sendo actualmente director da escola básica e secundária Cardeal Costa Nunes, da Madalena. Manuel Tomás faz parte da “ínclita geração” que frequentou e se formou no Seminário de Angra, na década de sessenta, sob a competência, a sabedoria, o humanismo e a dignidade de um excelente punhado de mestres que, na altura, constituíam o corpo docente daquela instituição. Manuel Tomás que, segundo as palavras do autarca madalenense, José António Soares, tem dado “ um contributo inestimável no campo da Informação, na nossa região e, sobretudo, na nossa ilha, como co-fundador do jornal: “Ilha Maior”, pelo qual foi responsável durante largos anos como Director”, iniciou a sua actividade literária em 1978 com alguns ensaios, publicou em 1996, “Miragem do Tempo” de Tomás da Rosa, em 1999, A Música das Sete Cidades e em 2011 Eu Sei Lá o Quê, o seu primeiro livro de poesia. Este ano, para além da obra agora apresentada, já publicou Picolândia, uma colecção de crónicas divulgadas ao longo de alguns anos, em jornais da região.
Telúrica, acutilante, realista mas deslumbrantemente enternecedora, a poesia de Manuel Tomás em Maroiço apresenta-nos um Pico espelhado em emoções e sentimentos, “a terra dos ilhéus” descrita “à maneira antiga” onde as cores, os sons, os perfumes e os sabores da natureza, pura, original e genuína, nos penetram, dominam e como que nos cristalizam numa simbiose ente “as pedras pedrinhas e pedregulhos” que desde os primórdios do povoamento, os nossos antepassados foram arrancando do chão pétreo, para conquistar uma “nesga de terra”. Da sua pachorrenta e sofrida arrumação formaram-se os maroiços, autênticos zigurates recheados de funchos e heras, testemunhos vivos da persistência picoense, ecos de um passado egrégio e progénie, a envolverem-nos em sensações dinâmicas, que nos enlevam em encanto e nos sublimam em deslumbramento. Ladeados por atalhos e veredas, atapetados de musgo, balizados por bardos de incenso e faia ou ornados de madressilva e poejo, erguidos nas encostas pedregosas da ilha, muitos deles, talvez, nos primórdios do povoamento da mais jovem ilha açoriana. Manuel Tomás ainda nos transporta por viagens de sonho, pelos mares que rodeiam a ilha e a separam das outras que por ali abundam, em barcos recheados de memórias, muitos deles com a história escrita nas ondas e agora a apodrecer sobre o cais. Depois, chegam as gaivotas que “já não cantam, nem voam à noite”, o mar, a espuma, “as sombras” da montanha e “o vento e o vinho destes mares verdes e sem limite”.
A encerrar a apresentação, Manuel da Costa Júnior, surpreendeu o autor e o público presente ao cantar, acompanhando-se à viola, um dos poemas do livro de Manuel Tomás - “Canção do Garajau”, com música da sua própria autoria:
“Partir na voz do vento
ouvir as asas do vento
estar e não estar
tocar no seio do vento
e ver a onda
no momento de salgar a alma
Partir na voz do vento
regressar em toada molhada
pela rocha e pelo relento
sem sotavento
sem barlavento
sempre à deriva
na amura de um fado”.
Texto colocado no Pico da Vigia em 19 de Março de 2013