PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
NA CANADA DO MIMOIO
Por toda a freguesia já ia uma falação medonha. Na máquina, à saída da igreja, nas alvoradas do Espírito Santo e até à Praça, não se falava noutra coisa: “O coirão da Cremilde do Saavedra andava metida com outro homem”. Certinho como dois e dois serem quatro! Com quem era é que não se sabia.
E nunca se ficou a saber, ou melhor, foi apenas o Zé da tia Mariquinhas que o ficou a saber.
Certa tarde, em que ia levar uma moenda ao moinho de Tio Manuel Luís, o Zé de tia Mariquinhas decidiu, para encurtar caminho, atravessar pela Canada do Mimoio, uma sinuosa vereda que ligava a Fontinha à Ribeira das Casas. Qual não foi o seu espanto, quando, logo a seguir às primeiras voltas, num sítio mais recôndito, mas em plena Canada do Mimoio, deu de caras com o Simões engalfinhado na Cremilde que gemia e gritava que nem uma gata em cio.
Aflito e confuso, o Zé, muito educadamente, apenas pediu licença para passar e seguiu o seu caminho, enquanto os outros, muito nervosos e receosos do que os havia de esperar como castigo de tão ousada leviandade, em vão se tentavam esconder mais junto à parede.
Soube-se, algum tempo depois, que as investidas à Cremilde haviam terminado, mas o que o nunca se soube foi que era o Simões a por os cornos ao Saavedra. É que o Zé da Mariquinhas, por muitos defeitos que tivesse, possuía uma grande virtude: a de nunca contar a quem quer que fosse o que via ou ouvia por aqui e por ali.
Sorte teve o Simões que assim se livrou das más-línguas, dos arrufos da mulher e, sobretudo, de uma valente sova do Saavedra.