PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O SOLDADO QUE FOI PARA O CÉU
(CONTO TRADICIONAL)
Era uma vez um soldado que adoeceu quando estava no quartel. O Comandante mandou-o para casa a fim de se curar, com a condição de que, quando ficasse bom, regressasse ao quartel.
O soldado assim fez e, pelo caminho, ao passar por uma ponte encontrou um velhinho muito pobre e fraco, que nem forças tinha para atravessar a ponte. O soldado nunca tinha feito bem a ninguém, mas naquele instante teve pena do velhinho e decidiu ajudá-lo. Para isso carregou-o às costas e atravessou a ponte. Logo que chegou ao outro lado, pôs o velho no chão, e ia despedir-se dele, quando este lhe disse:
− Amigo, obrigado por me ter ajudado. Agora peça-me alguma coisa, a fim de que eu lhe possa agradecer a ajuda que me deu.
− Ora essa – disse o soldado - o que lhe hei-de eu pedir?
− Peça tudo o que quiser. – Respondeu o velho
O soldado pediu-lhe então o seguinte: - Sempre que disser: "Salta aqui para a minha mochilinha!" nenhuma coisa deixe de obedecer às minhas ordens. E que onde quer que eu me assente ninguém me possa mandar levantar.
O velho disse-lhe que estava concedido o que desejava e desapareceu.
O soldado partiu para casa, muito contente, até se curar. Quando ficou bom decidiu não regressar ao quartel e nunca mais trabalhar. Assim viveu durante algum tempo sem fazer nada, sem lhe faltar coisa nenhuma. Se queria pão, carne, vinho, dinheiro, bastava dizer: "Salta aqui para a minha mochilinha", e tinha logo tudo o que queria.
Um dia o soldado adoeceu novamente e estava quase a morrer. O Diabo aproximou-se dele para lhe levar a alma, mas o soldado logo que o viu, gritou: "Salta aqui já para a minha mochilinha!". O Diabo saltou logo para dentro da mochila a qual o soldado mandou, de imediato, levar a casa do ferreiro para que lhe malhasse em cima até desfazer o Diabo por completo. Poucos dias depois o soldado morreu, e como tinha passado sempre na má vida, sem trabalhar e sem ajudar mais ninguém, foi parar à porta do Inferno. O Diabo assim que o viu, com medo de ser batido outra vez, mandou fechar todas as portas e janelas do Inferno, a fim de que o soldado ali não entrasse.
Foi o que o soldado quis, porque assim foi logo a correr bater à porta do Céu. São Pedro assim que o viu, disse-lhe:
− Vens enganado! Não entras cá. Não te lembras a vida de preguiçoso que levavas enquanto vivias?
Responde-lhe o soldado:
− Ó Senhor São Pedro, o Diabo não me quis no Inferno. Eu agora para onde hei-de ir?
− Arranja-te lá como puderes. – Respondeu São Pedro, fechando a porta.
Mas como São Pedro demorasse a fechá-la, o soldado aproveitou para pegar no seu barrete e atirá-lo lá para dentro, dizendo:
− Ó Senhor São Pedro, deixe-me ir apanhar o meu barrete.
O soldado viu meia porta do Céu aberta, e pega no barrete e atira-o lá para dentro, e disse:
− Ó Senhor São Pedro, deixe-me ir apanhar o barrete.
São Pedro deixou e o soldado, então, aproveitou para se sentar, por um momento na cadeira de São Pedro que, bem o queria mandar sair mas não conseguia. Foi, então, queixar-se a Nosso Senhor, que lhe disse:
− Deixa-o entrar Pedro, não tens outro remédio, porque assim lhe estava prometido, desde o dia em que ele fez uma boa acção, ajudando o velhinho a atravessar a ponte.
E assi, o soldado, por ter praticado apenas uma boa obra, ficou para sempre no Céu.