PICO DA VIGIA 2
Pessoas, costumes, estórias e tradições da Fajã Grande das Flores e outros temas.
O NAUFRÁGIO DO PAPADIAMANDIS
No dia 22 de Dezembro de 1965 deu-se mais um memorável naufrágio nos mares da Fajã Grande. O navio, um cargueiro liberiano de nome Papadiamandis, com um calado de 14.300 toneladas, encalhu na Ponta da Coalheira, entre a Retorta e o Caneiro das Furnas. O cargueiro viajava de New Orleans para Hamburgo, com um carregamento de milho, trigo e feijão. Viajavam a bordo trinta e um tripulantes, tendo todos sido salvos e conduzidos para Santa Cruz onde se albergaram, com exceção de três que foram recolhidos por um navio que, navegando ao largo, ao pedido de auxílio, se aproximou da embarcação, a fim de prestar ajuda aos naufragos.
Este foi, na verdade, o ultimo grande naufrágio dos muitos que, sobretudo no século XIX, ocorreram por toda a ilha das Flores, com particular incidência na sua costa oeste, incluindo os extensos baixios da Fajã Grande, uma espécie de fronteira entre a Europa e a América, na qual, naturalmente, se inclui o ilhéu do Monchique – o torrão mais ocidental da Europa e a própria - e a Baixa Rasa, pese embora a maioria das embarcações naufragadas, a exemplo do Papadiamandis e da Bidart, se encafuassem nos próprios baixios e laredos que separam a terra do mar.
Assim como noutros casos este naufrágio atirou para terra uma quantidade enorme de utensílios do próprio navio e de grande parte da própria carga, o que fez com que muitas pessoas demandassem a costa, em primeiro lugar para prestar ajuda e auxiliar os náufragos mas, posteriormente, para recolherem restos de carga e peças ou utensílios do navio. No caso do Papadiamandis a recolha, porém foi muito limitada dada a acção permanente e continua da Guarda Fiscal que não deixava ninguém aproximar-se do navio nem da zona circumdante do baixio.
Na verdade quase sempre os naufrágios constituíram, para a população da Fajã Grande e de outras localidades, uma oportunidade suplementar de rendimento, desde que aos salvados conseguissem chegar primeiro que as autoridades aduaneiras. Estranho mas memorável para as gentes da Fajã Grande terá sido o Natal de 1869! É que nesse 25 de Dezembro, deu ali à costa, carregada de açúcar mascavado, um sabor de muitos ainda desconhecido, e de aguardente, a barca francesa Republique, que o povo logo invadiu, levando quanto pôde, numa abundância tal que, nas semanas seguintes, até com açúcar se temperaram caldos de couves. Foram, todavia, os grandes carregamentos de madeira de pinho resinoso que, de forma mais visível, ajudaram a perpetuar a memória, um pouco por toda a ilha, de algumas dessas já longínquas tragédias marítimas. Consta que a igreja da Ponta, a exemplo de outras da ilha, foi construida com madeiras de naufrágios.
Do espólio do Papadiamandis que transportava mais de 14 mil toneladas de milho, pouco ou nada recolheu o povo da Fajã Grande, devido sobretudo ao cerco eficiente e à vigilância permanente da Guarda Fiscal. Conta-se até que uma criança de tenra idade ao ser encontrada por um elemento daquela força policial com uma lata de milho, mais por ver ali um brinquedo estrando porque de milho cozido não necessitava, foi violentamente agredido pelo agente da autoridade e forçao a lhe entregar a respetiva lata.
Autoria e outros dados (tags, etc)
NAUFRÁGIOS NAS FLORES NO SÉCULO XVI
Desde os primórdios do seu povoamento, quiçá muito antes, que na ilha das Flores ocorreram inúmeros naufrágios, uma vez que a maior ilha do grupo ocidental açoriano e mais concretamente o seu ponto mais ocidental, a Fajã Grande era ponto de referência para a navegação que transitava no Atlântico, entre a Europa, a América e a África. Os relatos de muitos desses naufrágios, muito provavelmente, ter-se-ão perdido no tempo, no entanto, a partir do povoamento da ilha, ou seja, a partir do século XVI, a história das Flores regista alguns desses tão naufrágios.
O primeiro naufrágio nas Flores de que há registo ocorreu em Março de 1536 e foi resultante de um ataque de piratas franceses, sendo as vítimas quatro caravelas portuguesas. As quatro embarcações aguardavam na ilha, provavelmente numa das suas mais abrigadas baías, as naus que vinham da Índia, carregadas de produtos, a fim de os carregar e trazer para o reino. Quando menos esperavam foram atacados por corsário franceses que afundaram duas, apoderando-se das outras duas e levando-as consigo.
O segundo naufrágio ocorrido nas Flores foi o de um galeão português que fazia escolta a navios de carga oriundos do Brasil. Ocorreu em 1577. Apesar de se ter afundado, consta que algum tempo depois foram recuperadas algumas peças de artilharia que lhe pertenciam.
Em 1591 naufragou próximo das Flores a nau Ascencion, de nacionalidade espanhola, capitaneada por António Henriques. O afundamento da nau ocorreu durante a chamada Batalha da Ilha das Flores, em que uma frota espanhola, proveniente da Índia se envolveu em tiroteio com uma armada inglesa.
Finalmente, no ano seguinte, a embarcação portuguesa Santa Cruz, sentindo-se perseguida por barcos de piratas ingleses, de corso, comandados pelo célebre Sir Walter Raleight, foi voluntariamente encalhada e incendiada pela sua própria tripulação, evitando assim render-se ao roubo daqueles corsários. Consta, apesar de tudo, que os ingleses, desembarcando em terra em grande número ainda conseguiram recuperar e roubar uma poa parte da carga do Santa Cruz, tendo perseguido, de seguida, os tripulantes da embarcação portuguesa.
No século seguinte foram poucos os naufrágios de que há registo, sendo de destacar o de uma embarcação, vinda de Ponta Delgada, que naufragou perto do Monchique, morrendo dois dos seus tripulantes – Manuel Gomes e António Coelho, ambos residentes na freguesia de Ponta Delgada. O naufrágio ocorreu no dia 6 de setembro de 1679.
Fonte – Francisco António Pimentel Gomes, A Ilha das Flores, Da redescoberta à actualidade.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O NAUFRÁGIO DA BARCA BRILLANT
No dia 16 de Fevereiro de 1899, a Baía dos Fanais, na ilha das Flores foi palco de mais um trágico naufrágio. Rezam as crónicas que naquele fatídico dia deu à costa, num lugar conhecido por Quebrada Nova, a oeste da Ilha das Flores, uma embarcação norueguesa, sem leme e sem gurupés. Aparentemente, sem tripulação a bordo, a barca de nome Brillant, pertencia ao porto de Christianpand e transportava madeira de pinho.
Foi a Guarda Fiscal, sediada em Santa Cruz, com melícias nos postos de guarda da Fajã Grande que se dirigiu para o local apesar da falta de caminhos, atravessando ribeiras e gotas, saltando grotões e tapumes. A embarcação, desarvorada e já completamente abandonada, estaria a pouco mais de setecentos metros da costa. No entanto, devido à agitação do mar, não foi possível aos militares saltarem para bordo. Alguns dias depois, porém, foi possível fazê-lo identificando-se assim a embarcação naufragada e ainda retirar dela uma boa parte da carga, incluindo vigas, barrotes e tábuas.
A fim de impedir o roubo quer de parte da carga quer de alguns objetos de bordo que haviam dado à costa, foram colocados na Fajã dos Fanais alguns soldados e um remador da Alfândega da Horta, tendo inclusivamente, sido construídas duas barracas, uma defronte do navio e outra a meio do rolo da Quebrada Nova, a fim de que o pessoal que ali permanecia de plantão, nas suas horas de folga pudesse descansar e durante a noite pudesse dormir, uma vez que para se deslocarem às casas mais próximas, da Ponta, demorariam mais de duas horas a lá chegar.
Retirado do mar, mês e meio mais tarde, a barca Brillant foi entregue pelo Chefe do Posto de Despacho ao vice-cônsul de sua Majestade Britânica, nas Flores, uma vez que este era o representante dos donos e seguradores da mesma. Nunca se soube o destino da tripulação que, muito provavelmente, terá sido recolhida por outras embarcações, uma vez que durante aqueles dias e os seguintes não constam ter dado nenhum cadáver à costa.
Autoria e outros dados (tags, etc)
CENTENÁRIO DO NAUFRÁGIO DA BIDART
Hoje, dia 25 de maio de 2015 faz, precisamente, 100 anos que aconteceu o maior naufrágio de sempre nos baixios da Fajã Grande, na ilha das Flores. Na verdade, foi na madrugada do dia 25 de maio de 1915, pelas 4h30 da manhã, que a barca francesa Bidart, mas que o povo da Fajã Grande havia de alcunhar de “Bidarta”, sob o comando do capitão Jacques Blondel, naufragou por fora da Poça das Salemas, no Canto do Areal. Acossada por um intenso nevoeiro, a embarcação, sem que ninguém se apercebesse, aproximou-se de uma zona de rebentação, embatendo nuns rochedos do baixio que ali existem. Transportava minério de níquel com o valor declarado de 500 mil francos e vinha de Thio, na Nova Caledónia, sulcando os mares dos Açores com destino ao porto de Glasgow, na Escócia,
Por entre a neblina matinal, perante as condições adversas de mar e do vento, não foi possível evitar que a barca encalhasse a uns escassos metros de terra. A bordo, o comandante Jacques Blondel tentava proceder à manobra da embarcação, uma tarefa que não era em nada facilitada pela escassez de tripulantes válidos. Com efeito, em pleno século XX, ainda se morria de escorbuto a bordo dos navios oceânicos. A longa viagem, sem escalas, que a barca Bidart realizava era propícia ao desenvolvimento desta doença, causada por uma deficiência de alimentos frescos e água doce. O escorbuto, causador de perturbações ósseas e de dores musculares, provocava também o aparecimento de fadiga e de depressões, o que em muito terá contribuído para a falta de capacidade da tripulação em evitar o pior. Um dos marinheiros havia morrido na véspera, pese embora o cadáver ainda se encontrasse a bordo.
Após vários dias de sol encoberto e da presença omnipresente de brumas e nevoeiros, durante os quais não fora possível posicionar o navio pelo sol, o comandante estava praticamente perdido, sem poder identificar as coordenadas de navegação. Para piorar ainda mais as coisas, durante o anoitecer do dia 24 de Maio, morreu um dos marinheiros, de nome Letloc. Outros estavam doentes e debilitados. Com o embate nos rochedos, o casco da Bidart partiu-se em dois, vindo a afundar-se até ao castelo de popa, a cerca de 8 metros de profundidade.
Dos outros 22 tripulantes, apenas 14 se salvaram, alguns deles feridos, uns com maior gravidade outros com pequenos ferimentos. Assim que foram recolhidos, por populares que, acordados com os silvos da embarcação, acorreram à costa, lançando cordas e tábuas ao mar. Os náufragos foram agasalhados e tratados pela população da freguesia e recolhidos na loja de uma casa das Courelas, transformada em centro hospitalar de apoio. Consta que o comandante Jacques Blondel, o último a ser salvo foi vestido com roupas de mulher, por já não haver de homem. No meio de todo este azar, no entanto, o mais azarado acabou por ser o imediato. Este, que estava para se casar e que iria assumir o comando da Bidart, já tinha naufragado anteriormente nos Açores quando, simples marinheiro a bordo da galera francesa Caroline, tinha encalhado na vila da Madalena, ilha do Pico, a 3 de Setembro de 1901. Sobreviveu ao primeiro naufrágio mas não sobreviveu ao segundo. Já ao fim da tarde, chegou apoio de Santa Cruz, incluindo o médico que procedeu aos primeiros socorros, fazendo embarcar os feridos mais graves para o hospital da vila de Santa Cruz, no dia seguinte, assim que as condições do mar o permitiram.
Por iniciativa do vice-vigário da freguesia, reverendo Caetano Bernardo de Sousa, fez-se o sepultamento de quatro dos cadáveres com toda a solenidade, com a presença de todo o povo da freguesia. Dois foram encontrados nos mares da Fajãzinha e sepultados nesta freguesia. Dias depois, os sobreviventes embarcaram para Lisboa, a bordo do paquete Funchal, com escala em Angra do Heroísmo a 15 de junho de 1915. Os salvados da barca e da carga foram avaliados em cerca de 300 mil francos, e arrematados por José Azevedo da Silveira por 210$000 réis, no dia 29 de maio. O resto do navio estava submerso a alguns palmos abaixo da linha d'agua, tendo dentro parte da carga e todos os objetos de bordo, conservas e algum dinheiro. Por vários dias, o mar em volta do naufrágio tomou uma cor avermelhada, devido à fuga do minério de níquel que vinha embarcado a bordo da Bidart. No entanto o povo nunca se aproximou na procura de destroços, por cuidar que aquela cor era devida à presença do cadáver de Letoc que nunca foi retirado da embarcação.
A barca Bidart fora construída em 1901, pelos estaleiros navais Chantier Nantais de Construction Maritime, de Nantes. Tinha 2199 toneladas de arqueação bruta e 1917 toneladas de arqueação liquida. O casco era de aço, tinha 84 metros de comprimento, com 12,30 metros de boca e 6,80 metros de calado. Como todas as barcas, tinha 3 mastros, largava pano redondo no de proa e no grande, e um latino quadrangular e gave-tope no de ré. Os mastros de proa e grande tinham dois mastaréus enquanto o de ré - denominado da mezena - tinha um só.
Autoria e outros dados (tags, etc)
NAUFRÁGIOS II
Foram muitos os naufrágios que, sobretudo no século XIX, ocorreram na ilha das Flores, com particular incidência na sua costa oeste, incluindo os extensos baixios da Fajã Grande, uma espécie de fronteira entre a Europa e a América, na qual, naturalmente, se inclui o ilhéu do Monchique – o torrão mais ocidental da Europa e a própria. a Baixa Rasa, pese embora a maioria das embarcações naufragadas se encafuassem nos próprios baixios e laredos que separam a terra do mar. Esta mortandade de embarcações nos mares das Flores atirou para terra uma quantidade de restos dos navios e da própria carga, o que fez com que muitas casas da ilha, na década de cinquenta, se podiam, com toda a propriedade, comparar a “autênticos cemitérios marítimos”, onde tudo, desde a madeira aos candeeiros, desde a ferramenta aos enfeites, provinha de barcos naufragados. A isto juntavam-se os produtos resultantes dos achados, o que constituía em muitos casos, verdadeiros arsenais.
Infelizmente, também se verificaram muitas mortes, com destaque para as nove dos vinte e dois tripulantes da barca francesa Bidart, encalhada em 1915 na Fajã Grande, seis dos 12 que trazia a barca italiana Severo, naufragada em 1882 na Lomba, etc.. No entanto, a generalidade das embarcações naufragadas transportavam essencialmente mercadorias, algumas das quais, pelos vistos, infetadas, permitindo o contágio, por essa via, como sucedeu no Lajedo, em 1843, onde uma epidemia proveniente de um naufrágio causou 18 mortes, para não falar na sífilis que os espanhóis do galeão Nossa Senhora das Angústias e São José trouxeram em 1727 e ajudaram a disseminar pela ilha. Mas verdade é que, regra geral, quase sempre os naufrágios constituíram, para a população costeira, uma oportunidade suplementar de rendimento, desde que aos salvados conseguissem chegar primeiro que as autoridades aduaneiras.
Estranho mas memorável para as gentes da Fajã Grande terá sido o Natal de 1869! É que nesse 25 de Dezembro, deu ali à costa, carregada de açúcar mascavado, um sabor de muitos ainda desconhecido, e de aguardente, a barca francesa Republique, que o povo logo invadiu, levando quanto pôde, numa abundância tal que, nas semanas seguintes, até com açúcar se temperaram caldos de couves.
Foram, todavia, os grandes carregamentos de madeira de pinho resinoso que, de forma mais visível, ajudaram a perpetuar a memória, um pouco por toda a ilha, de algumas dessas já longínquas tragédias marítimas. Pela sua dimensão, o antigo Hospital de Santa Cruz e as Igrejas da Lomba, Ponta da Fajã Grande, Fazenda e Fazenda de Santa Cruz relevam entre as várias obras cujas construções foram essencialmente alimentadas, nas suas mais exigentes necessidades em madeiras nobres, pelos naufrágios da galera Ocean, na Fajãzinha, em Maio de 1876, e da barca Brillant, na Quebrada Nova, em Fevereiro de 1899. Já com os seus 180 passageiros e tripulantes postos a salvo, em terra, Lajes das Flores assistiu também, nos primeiros dias de Março de 1727, ao afundamento do galeão Nossa Senhora das Angústias e São José, que, rebentadas as amarras e levado para o alto mar, ali foi a pique com quase toda a sua preciosa carga, uma parte do espólio anual de ouro e prata das minas do México e de Potosí, na Bolívia. Cuida-se, que em sinal de reconhecimento por se terem salvo, dois desses espanhóis, mandaram edificar a Capela de Nossa Senhora das Angústias, enquanto dois outros ofereceram algumas imagens ao convento de São Boaventura de Santa Cruz das Flores.
A história dos naufrágios nas Flores é corroborada com dois grandes desastres, já em pleno século XX,, o do paquete holandês Prins der Nederlanden, em Agosto de 1966, na Pedra dos Burros, entre o Lajedo e o Mosteiro, de onde só muito a custo foi rebocado, e o naufrágio do Papadiamandis, um cargueiro liberiano, de mais de 14 mil toneladas de milho, na ponta do Baixio, na Fajã Grande, em Dezembro de 1965.
Mas o maior naufrágio e mais rentável naufrágio para a população da ilha foi o do RMS Slavonia, que, ainda hoje, continua presente no imaginário de muitos florentinos, numa memória que lhes é avivada, no Museu das Flores e em muitas das casas da ilha, incluindo algumas da Fajã Grande, por uma panóplia de objetos que pertenceram àquele navio, naufragado a sudoeste da ilha, nas costas do Lajedo. Até o papa Pio X, em sinal de gratidão pelo acolhimento que as gentes da ilha haviam dispensado às 597 pessoas que o RMS Slavonia transportava entre Nova Iorque e o porto italiano de Trieste, ofereceu à igreja Matriz de Lajes um cálice de prata.
(Dados retirados da net.)
Autoria e outros dados (tags, etc)
ENCALHADO NA PONTA
Segundo alguns registos, um dos vários naufrágios verificados ao longo dos anos nos mares da Fajã Grande, ter-se-á verificado por fora do lugar da Ponta, no dia 3 de Fevereiro de 1869. Os registos, no entanto, são poucos e incompletos, sabendo-se apenas que se tratava de um lugre, com bandeira francesa, que navegava entre a América e a Europa. Estando a ilha coberta de nevoeiros, a embarcação muito provavelmente, entrou pela baía dentro sem qualquer visibilidade, indo encalhar nos baixios da Ponta, junto ao ilhéu do Cão. Sabe-se que se salvou um dos seus tripulantes.
Autoria e outros dados (tags, etc)
ESTRANHOS BARRIS
Corria o ano de 1884. Vinte e três anos antes, uma das canoas baleeiras então existente na Fajã Grande caçara, pela primeira vez, uma baleia na ilha das Flores, a qual rendeu 80 barris de azeite vendidos para o Faial, Por essa altura, terminara a construção da Casa do Espírito Santo de Baixo e, mais importante do que tudo isso, o lugar da Fajã Grande, juntamente com os lugares da Ponta e da Cuada, fora elevado a paróquia e a freguesia.
Numa manhã escura e enevoada de Março desse ano, a freguesia foi alarmada por um acontecimento estranho. Uma enorme quantidade de barris de petróleo, durante a noite, havia dado à costa, enxurrando toda a zona do Canto do Areal, desde a Poça das Salemas até à Rocha do Pico. Inicialmente intrigada e sem saber o que fazer, a população depressa se apercebeu de que, muito provavelmente, se tratava dos despojos de um navio naufragado e que possivelmente se havia afundado, deixando, ao sabor das ondas, uma parte da sua carga. Algumas pessoas muniram-se de vasilhame diverso, no qual recolheram todo o petróleo que puderam, enquanto outras, sem sucesso, tentavam levar os barris cheios para as suas casas. Cedo porém chegaram as autoridades, incluindo a guarda costeira, nomeadamente os militares dos fortes do Estaleiro e do Vale do Linho, impedindo que continuassem a recolher mais petróleo. Os barris foram guardados e levados para Santa Cruz, sendo leiloados.
Quatro anos antes, ou seja em 1880, no mês de Junho, já haviam aparecido nos baixios da Fajã, alguns barris semelhantes, mas em pequena quantidade, não sendo possível trazê-los para terra. Mas nessa altura, porém, foram retirados do mar muitos paus de pinho, alguns dos quais foram guardados pelos homens que os retiraram do mar. sendo posteriormente usados na construção de algumas habitações.
Autoria e outros dados (tags, etc)
NAUFRAGIOS
É deveras impressionante o número de naufrágios que, sobretudo no século XIX, ocorreram na ilha das Flores, com particular incidência na sua costa oeste, a fronteira virtual com o continente americano, na qual se inclui, naturalmente, o ilhéu do Monchique, o ponto mais ocidental da Europa. De facto, por todo o litoral da ilha são visíveis vestígios e lembranças de naufrágios, não tanto materiais mas, sobretudo, toponímicos.
Apesar do desfortúnio que os naufrágios significavam para as suas vítimas, muitas das quais morriam, a população da ilha tirou alguns dividendos dos mesmos. Sabe-se que, por essa altura muitas casas da ilha podiam, com toda a propriedade, ser comparadas a “verdadeiros cemitérios marítimos, onde tudo, desde a madeira aos candeeiros, desde a ferramenta aos enfeites, provinha de barcos naufragados”. Na Fajã Grande havia casas com portas recolhidas de naufrágios, assim como camas e outras mobílias.
Um dos maiores naufrágios ocorridos na Fajã foi o da barca francesa Bidart, encalhada em 1915, com 22 tripulantes a bordo, um dos quais morrera na véspera vítima de escorbuto, mas que ainda não fora sepultado no mar Morreram vários, estando alguns sepultados no cemitério da Fajã Grande. Seis, dos 12 tripulantes que trazia a barca italiana Severo, naufragada em 1882, na Lomba, também, faleceram quando esta embateu nos baixios das Flores. Como estes, faleceram muitos outros homens, vítimas mar, sendo que os corpos de alguns nunca foram encontrados. Mas como muitas das de naufrágios, de embarcações acidentadas, que transportavam essencialmente mercadorias. Mas verdade é que os naufrágios sempre constituíram, para a população da ilha, um beneficio, uma vez que eram uma oportunidade suplementar de rendimento, desde que conseguissem chegar primeiro que as autoridades fiscais e arrecadar os mais diversos produtos.
O Natal de 1869 foi célebre para a população da nova freguesia da Fajã Grande! É que, precisamente, no dia 25 de Dezembro desse ano, nos baixios da Coalheira, carregada de açúcar mascavado, um sabor de muitos ainda desconhecido na ilha, e de aguardente, a barca francesa Republique, que o povo logo invadiu, levando tanto açúcar quanto pôde, numa abundância tal que, nas semanas seguintes, até com açúcar se temperaram caldos de couves.
Foram os grandes carregamentos de madeira de pinho resinoso que, de forma mais visível, ajudaram a perpetuar a memória, um pouco por toda a ilha, de algumas dessas já longínquas tragédias marítimas. Pela sua dimensão, o antigo Hospital de Santa Cruz e as Igrejas da Lomba, Ponta da Fajã Grande, Fazenda e Fazenda de Santa Cruz relevam entre as várias obras cujas construções foram essencialmente alimentadas, nas suas mais exigentes necessidades em madeiras nobres, que deram à costa, provenientes de naufrágios, como o da galera Ocean, na Fajãzinha, em Maio de 1876, e da barca Brillant, na Quebrada Nova, em Fevereiro de 1899. Com 180 passageiros e tripulantes, antecipadamente, postos a salvo, em terra, a vila das Lajes das Flores assistiu, nos primeiros dias de Março de 1727, ao afundamento do galeão Nossa Senhora das Angústias e São José, que, rebentadas as amarras e levado para o alto mar, ali foi a pique com quase toda a sua preciosa carga, uma parte do espólio anual de ouro e prata das minas do México e de Potosí, na Bolívia. Em sinal de reconhecimento por se terem salvo, dois desses espanhóis fizeram edificar a Capela de Nossa Senhora das Angústias. A história trágico-marítima nas Flores regista, como últimos grandes naufrágios, o encalhe do paquete holandês Prins der Nederlanden, em Agosto de 1966, na Pedra dos Morros, de onde só muito a custo foi rebocado, e o naufrágio do Papadiamandis, um cargueiro liberiano, de mais de 14 mil toneladas, perdido na Fajã Grande, em Dezembro de 1965.
A quase já cem anos de distância, é o naufrágio do Slavonia, que constitui o maior e mais trágico naufrágio ocorrido nas Flores e ainda hoje, continua presente no imaginário de muitos florentinos, numa memória que lhes é avivada, no Museu das Flores. O papa Pio X, em sinal de gratidão pelo acolhimento que as gentes da ilha haviam dispensado às 597 pessoas que o Slavonia transportava entre Nova Iorque e o porto italiano de Trieste, ofereceu um cálice de prata à Igreja Matriz de Lajes das Flores.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O NAUFRÁGIO DO GREFFIN
Amanhecia, desassossegado e intranquilo, o dia 26 de Fevereiro de 1866. Uma manhã invernosa e o mar a parecer que queria comer gente, de tão bravo que estavaA maioria dos habitantes da nova paróquia da Fajã Grande, como que ainda comemorava a euforia da sua elevação a paróquia e a freguesia, separando-se, definitivamente, da paróquia da Senhora do Remédios e da freguesia da Fajãzinha, por alvará do bispo de Angra, D. Frei Estêvão de Jesus Maria, datado de 20 de Junho de 1861.
Alvoroçados com silvos estridentes de uma embarcação em apuros, os habitantes levantara-se, sobressaltados e correram em direcção ao mar. Lá para os lados do Areal, entre a ponta da Coalheira e o Redondo, como se previra, estava naufragada uma embarcação. Tratava-se de um patacho de nome Greffin, um barco à vela, de dois mastros, sendo, a vela de proa redonda e a de ré do tipo latina, muito utilizado agora nas viagens de transporte de produtos e mercadorias entre a América e a Europa e que começara a ser utilizado no final do século XVI, altura em que foram construídos os primeiros exemplares. Com um deslocamento variando entre 40 e 100 toneladas, o patacho era utilizado para o transporte de cargas e mercadorias. Fora utilizado, principalmente, pela Armada Espanhola, nos séculos XV, XVI, XVII e XVIIII, como navio de guerra, para a protecção e monitoramento dos territórios do império espanhol no exterior. Pelo seu pouco peso e elevada velocidade de movimento foi utilizado, também, por piratas espanhóis e holandeses para atacar os navios comerciais.
Agora um exemplar, com capacidade para transportar cerca de 98 toneladas, estava ali a terminar os seus dias. Ligava a América à Europa carregado de fardos de algodão.
Com a ajuda da população local, que foram lançando de terra, cordas, cabos, pranchas e tabuões, todos os tripulantes se salvaram, assim como grande parte do carregamento, não havendo feridos.
Durante alguns dias os tripulantes foram alojados em várias casas da freguesia, sendo depois enviados para Santa Cruz, onde aguardaram embarque para a Inglaterra. O algodão recuperado foi vendido na ilha das Flores a 450 reis o quilo.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O PRIMEIRO NAUFRÁGIO NA FAJÃ GRANDE
O primeiro naufrágio acontecido na Fajã Grande e de que há registo, porque naturalmente muitos houve antes e dos quais muito pouco ou nada se sabe, uma vez que dos mesmos não há memória, aconteceu a 5 de Setembro do ano de 1779. Tratou-se do naufrágio de um pequeno barco que, muito provavelmente, terá efectuado uma viagem da Fajã Grande a Santa Cruz, procedimento muito normal na altura, uma vez que as deslocações por terra eram quase impossíveis. Não havia caminhos e a rocha, os grotões e as ribeiras eram obstáculos quase intransponíveis. Além disso a possibilidade de qualquer transeunte se perder entre nevoeiros e temporais era muito provável. Assim o recurso ao mar para as viagens às freguesias mais distantes, deveria ser muito frequente, sobretudo quando o destino era Santa Cruz, Lajes ou Ponta Delgada. No acidente, que se terá verificado no regresso da viagem, já por fora da Fajã Grande, morreram três pessoas, não se sabendo se a embarcação traria mais tripulantes ou passageiros, o que seria bastante provável.
Foram três as vítimas deste naufrágio, todas naturais e residentes no então lugar da Fajã Grande, pertencente à freguesia das Fajãs. O mais velho chamava-se Cristóvão Valadão de 58 anos. Era filho de António Valadão e de Maria Fraga e casado com Francisca Rodrigues, filha de José Valadão e Isabel Rodrigues. A segunda vítima foi José Mateus de 32 anos, que muito provavelmente seria solteiro. Relativamente à terceira vítima, sabe-se apenas que talvez se tratasse de um jovem ou criança, que se chamava António e que era filho de Domingos de Freitas da Sumada ou da Assomada e de Maria de Freitas, contando estes dados no registo do respectivo registo de óbitos da Paróquia de Nossa Senhora dos Remédios. No entanto o pai, que casou nesta paróquia, em 5 de Maio de 1778, ou seja um ano antes do desastre e da morte do filho, com Delfina dos Santos, natural da freguesia dos Cedros e viúva de João Pimentel. Trata-se, no entanto do terceiro casamento de Domingos de Freitas, uma vez que já teria casado e enviuvado, anteriormente e por duas vezes. No entanto, como, curiosamente, uma e outra das mulheres com quem casou, nas primeiras e segundas bodas, tinham o mesmo nome, Maria Freitas, não se sabe qual delas seria a mãe do infortunado António, falecido neste trágico acidente. Além disso, não consta que Domingos de Freitas da Assomada tenha realizado os seus dois primeiros consórcios na paróquia onde residia, ou seja a das Fajãs.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O NAUFRÁGIO DO PADRE ANTÓNIO VIEIRA AO LARGO DAS FLORES E DO CORVO
É por de mais conhecida a passagem pelos Açores do grande orador e escritor português, o padre António Vieira. Esta presença de Vieira, nalgumas ilhas açorianas, verificou-se no ano de 1654 e terá sido meramente casual, pois aconteceu devido a um naufrágio de que foi vítima a embarcação em que viajava, oriunda do Brasil e com destino a Lisboa. Mais curioso ainda é o facto daquele naufrágio se ter verificado relativamente perto das ilhas do grupo ocidental açoriano – Flores e Corvo, embora aquele célebre orador, ao que se crê, não tenha aportado a nenhuma destas ilhas.
Reza a história que, algum tempo depois de proferir o mais que conhecido "Sermão de Santo António aos Peixes" em São Luís, no estado do Maranhão, no Brasil, o padre António Vieira embarcou, às escondidas das autoridades e dos brancos, a 17 de Junho de 1654, com destino a Lisboa, a bordo de um navio da Companhia de Comércio, que carregava açúcar do Brasil para a Metrópole. No entanto, o padre António Vieira só chegou a Lisboa em Novembro do ano seguinte, depois da mais tormentosa de todas viagens que alguma vez realizou. O padre António Vieira vinha em missão diplomática, cujo objectivo era defender, junto do rei de Portugal, D. João IV, os direitos dos indígenas, escravizados pela ganância e pela cobiça dos colonos portugueses. Após cerca de dois meses de viagem, já à vista das ilhas das Flores e do Corvo, a Oeste dos Açores, abateu-se sobre a embarcação em que viajava o ilustre orador, uma violenta e terrível tempestade. Uma rajada mais forte de vento terá arrancado uma das velas, deixando a embarcação à deriva. No meio do mar revolto, entre um vento fortíssimo e ondas altivas, na iminência do naufrágio, o padre António Vieira cuidando que a embarcação não resistiria à tormenta, concedeu a todos os tripulantes e outros passageiros a absolvição geral, bradando: "Anjos da guarda das almas do Maranhão, lembrai-vos que vai este navio buscar o remédio e salvação delas. Fazei agora o que podeis e deveis, não a nós, que o não merecemos, mas àquelas tão desamparadas almas, que tendes a vosso cargo; olhai que aqui se perdem connosco."
Após essa exortação, todos fizeram em conjunto, a Nossa Senhora a promessa que lhe rezariam um terço todos os dias, caso escapassem à morte, por demais, iminente. O navio permaneceu adernado durante mais um quarto de hora, até que os mastros se partiram. Felizmente e com o peso da carga, o navio voltou à sua posição normal, mas permanecendo à deriva, ao sabor do vento, das ondas e das correntes, durante algumas horas.
No entanto, uma embarcação passou por ali e, vendo-os, aproximou-se. Por azar dos azares, tratava-se de um navio de piratas holandeses que tudo saquearam e deixaram Vieira e os companheiros sem roupas e sem bens. Mas como que por milagre, os piratas, acabaram por condoer-se dos náufragos e recolheram-nos, mas afundaram a sua embarcação. Nove dias mais tarde, consta que todos os tripulantes, despojados de seus bens pessoais, foram desembarcados, às escondidas e em lugar ermo, na ilha Graciosa, onde o padre António Vieira, com o auxílio dos religiosos da Companhia de Jesus, procurou providenciar roupas, calçado e dinheiro para todos, durante os dois meses que permaneceram na ilha, após os quais, seguiram para Terceira, onde Vieira pretendia arranjar uma embarcação para que ele e os seus companheiros de infortúnio pudessem seguir para Lisboa. Em Angra, o padre António Vieira ficou instalado no Colégio dos Jesuítas, onde permaneceu algum tempo. Foi durante o tempo que permaneceu em Angra que terá instituído a devoção do terço, que pela primeira vez foi cantado na Ermida da Boa Nova. Além disso foi muito solicitado a pregar em diversos templos da ilha, destacando-se o sermão que proferiu na Igreja da Sé, na festa da Senhora do Rosário. Consta que a catedral se encheu de fiéis como nunca, embora sem presença de bispo diocesano, pois, nesses anos, entre os governos de Dom Frei António da Ressurreição e Dom Frei Lourenço de Castro, a sede da diocese estava vacante.
Uma semana mais tarde, Vieira passou à Ilha de São Miguel. A sua estadia em Ponta Delgada também ficou historicamente ligada à pregação, na Igreja que os Jesuítas possuíam nesta cidade, a igreja de Todos os Santos, do memorável sermão em louvor de Santa Teresa. O estilo vigoroso e inconfundível que o celebrizou como pregador encontra-se bem visível neste sermão, onde também é comentado o naufrágio de que fora vítima, meses antes, fora da ilha das Flores, em metáforas que apelam, com veemência, à emoção. Vieira inicia o sermão com a citação da passagem evangélica das dez virgens: “Quinque autem ex eis erant fatuae, et quinque prudentes”. E depois continua: “Acaso, e bem acaso, aportei às praias desta ilha; acaso e bem acaso entrei pelas portas desta cidade; acaso e bem acaso me vejo hoje neste púlpito, que é verdadeiramente o poço de Sicar, onde se bebem as águas da verdadeira doutrina”.
Logo a seguir refere-se ao naufrágio, explicando-o com uma passagem do Antigo Testamento: “Por certo que não foi tão grande a tempestade de Jonas como aquela em que eu e os companheiros nos vimos. O navio virado no meio do mar, e nós fora dele, pegados ao costado, chamando a gritos pela misericórdia de Deus e de sua Mãe. Não apareceu ali baleia que nos tragasse, mas apareceu — não menos prodigiosamente naquele ponto — um desses monstros marinhos que andam infestando estes mares. Ele nos tragou, e nos vomitou depois em terra”.
Dali o padre António Vieira partiu para Lisboa, a bordo de um navio inglês, onde chegou em Novembro desse ano, curiosamente, após atravessar nova tempestade.
Dados retirados da Internet
Autoria e outros dados (tags, etc)
O NAUFRÁGIO DA MODENA E A PEDRA DE LANG
Nos anos cinquenta, na Fajã Grande, ouvia-se contar, com alguma indefinição e muito vagamente, a história de uns náufragos que tinham sido abandonados na ilha das Flores, mais concretamente na Fajã do Conde, lá para os lados da Caveira e Santa Cruz. Mas muito pouco ou quase nada se sabia acerca do que teria acontecido nesse naufrágio, como e porque tinham sido ali abandonados os náufragos e o que lhes teria acontecido posteriormente.
Mais tarde veio a descobrir-se que, na realidade, naquele aprazível lugar da Fajã do Conde, junto à Ribeira da Cruz, entre uma densa e verdejante vegetação, existia um bloco de pedra, de forma mais ou menos cúbica, que há muitos anos ali havia sido colocado e que continha gravadas algumas informações importantes sobre o suposto naufrágio e os seus intervenientes. Descobertas e investigações posteriores, confirmaram que nessa pedra se podia observar a seguinte inscrição:
“CAPT. W. H. LANG / AND 11 MEN / LANDED MAY 5 73 / FROM BARK MODENA / OF BOSTON MASS. FOUNDERD / APRIL 22”
Hoje, sabe-se que esta enigmática inscrição se ficou a dever ao facto de a tripulação de uma embarcação americana – registada em Boston pelos proprietários J. Rideout e H. O. Roberts, com o nome Modena, de 206 toneladas – que, quando se viu em apuros enquanto navegava nos mares das Bermudas, foi socorrida por uma outra embarcação, cujo nome se desconhece. A Modena tinha saído da Serra Leoa e dirigia-se para Boston, na costa leste dos Estados Unidos da América. No dia 9 de Março de 1873 aportou na Bermuda, onde fez escala, permanecendo aí até ao dia 15 de Abril. Uma semana depois de ter levantado ferro, a 22 de Abril, a referida embarcação defrontou-se com alguns problemas de segurança e o seu comandante, o capitão W. H. Lang, ordenou o seu abandono, tendo-se a afundado, algum tempo depois, nas águas do Atlântico, entre as Bermudas e Boston. Depois de alguns dias à deriva, o capitão Lang e os restantes onze tripulantes foram encontrados e recolhidos, já perto dos Açores, por um navio que navegava entre a América e a Europa. Era necessário colocar os náufragos em sítio seguro e a primeira terra avistada foi a ilhas das Flores, no extremo ocidental do Arquipélago dos Açores, onde no dia 5 de Maio, foram “depositados”, os náufragos, precisamente, no local conhecido por Fajã do Conde.
A barca Modena tinha sido construída em Duxbury, Massachusetts (EUA), no ano de 1851. Mas relativamente à presença dos náufragos na ilha das Flores, o único documento conhecido é, apenas esta interessante inscrição, registada numa pedra, actualmente conhecida como a “Pedra de Lang”, mas só descoberta por Celestino Flores em 1962 e decifrada, anos mais tarde, por Jacob Tomás. Até ao momento não se encontrou qualquer outro registo que permita identificar e conhecer melhor o destino destes homens, nem sequer a sua identidade e que devem ter permanecido na ilha durante algum tempo, aguardando transporte para as suas terras de origem.
A maçonaria tem divulgado este curioso acontecimento, porquanto considera o capitão W. H. Lang um maçon, o que se deduz pelo facto de, aparentemente, existir um esquadro e um compasso gravados na pedra, logo abaixo do nome de Lang. No entanto, cuida-se que estes símbolos não serão fidedignos, por quanto nunca foram reconhecidos nem pelos historiadores nem pelos curiosos que descreveram e opinaram sobre a inscrição registada na chamada “Pedra de Lang”, da Fajã do Conde.
Autoria e outros dados (tags, etc)
TRÊS NAUFRÁGIOS EM TRÊS ANOS
A falta de faróis ou de outros meios de sinalização da ilha das Flores, a grande quantidade de escolhos, baixas e ilhéus da sua costa e a não existência de meios de apoio à navegação, foram os culpados de grande parte de um bom número de naufrágios verificados ao redor das costas florentinas, desde o seu povoamento até à primeira metade do século passado. A Fajã Grande, ponto de referência de toda a navegação proveniente das Américas com destino ao Norte da Europa e ao Mediterrâneo, não foi excepção. Foram inúmeros os acidentes verificados desde o início do povoamento daquele lugar, sendo que de muitos desses naufrágios não há registo ou memória. Alguns, no entanto, marcaram definitivamente a história e a toponímia da freguesia, como foi o caso da “Bidart”, barca francesa naufragada no Canto do Areal, na madrugada de 25 de Maio de 1915, precisamente num local que mais tarde passou a chamar-se, “o lugar da Bidarta”.
Neste longo decurso do tempo, houve, no entanto, um período negro ou de grande ocorrência de naufrágios, nas costas fajãgrandenses. Foi no início da década de setenta do seculo XIX, quando a Fajã Grande como freguesia ainda era uma criança. Nessa altura, num curto espaço de, aproximadamente, três anos, verificaram-se três grandes naufrágios.
No dia de Natal de 1869 deu à costa, nos baixios mais ocidentais da Europa, a barca francesa “Republique”, vinha da Martinica e dirigia.se para França, carregada de açúcar. Rezam as crónicas que foi tal a abundância de açúcar despejado em terra, na altura escasso na ilha, que uma parte foi arrematada, tendo, no entanto, o povo recolhido tanto que, pelos vistos, houve quem chegasse a utilizá-lo como tempero nas couves, em vez do sal, também escasso na freguesia, naqueles recuados tempos. Felizmente salvou-se toda a tripulação.
Ano e meio depois, a 15 de Julho de 1871 verificou-se um outro naufrágio nos mares contíguos à Fajã Grande. Desta feita foi um brigue inglês, de nome “Concórdia” com capacidade de 180 toneladas, que transportava açúcar e aguardente, embora, neste acidente, grande parte da carga se tenha perdido no mar, não sendo recuperada e a que o foi, pelos vistos uma pequena parte, terá sido guardada pelas autoridades e arrematada mais tarde. A embarcação naufragada seguia com destino a Queentown e salvaram-se todos os tripulantes, num total de 8 homens.
Finalmente, a 9 de Janeiro do ano seguinte deu-se mais um grande naufrágio na Fajã Grande, Desta feita foi o lugre francês “Alexis”, capitaneado por Boncherie que faleceu no acidente, juntamento com dez dos onze tripulantes que, com ele, seguiam a bordo. O navio navegava de Rio Grande com destino ao Sul para a Europa, carregando couros, lã, chifres e clina. Uma parte deste carregamento salvou-se e foi arrematada.
A esta série negra de três naufrágios em tão curto espaço de tempo, poder-se-á juntar um quarto, acontecido no dia 26 de Fevereiro de 1866. Trata-se do naufrágio do patacho inglês “Greffin”, capitaneado por Philip de Boutellier. Salvou-se a tripulação e uma boa parte da carga que transportava, neste caso fardos de algodão, dos quais se recuperaram alguns, os quais, como era hábito na altura, foram arrematados na ilha.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O DESASTRE DOS FANAIS (1819)
Um dos maiores desastres marítimos ocorridos com pessoas da Fajã Grande, depois do trágico desastre do Corvo, foi o que aconteceu no dia dezoito de Agosto de 1819, por fora dos Fanais. Assim como no desastre do Corvo, de 1942, o barco naufragado nos Fanais transportava quase exclusivamente passageiros naturais e residentes na Fajã Grande e que também se haviam deslocado ao Corvo, a fim de participarem na festa da Senhora dos Milagres. O acidente deu-se quando regressavam à Fajã. Sendo a festa no dia quinze de Agosto e o regresso tendo-se verificado apenas no dia dezoito, é muito provável que devido ao mau estado do tempo, a viagem de regresso tivesse sido adiada para aquele dia, sendo que, muito provavelmente o mar não estaria ainda nas melhores condições de navegabilidade, nem o tempo favorável à navegação. O barco regressava do Corvo com destino ao porto da Fajã Grande, sob as ordens do seu mestre e proprietário Francisco Coelho Rafael e, para encurtar distâncias, rumou em direcção a Ponta Delgada, ladeando, a partir daí, a costa noroeste da ilha das Flores, até à baía dos Fanais, junto ao ilhéu de Maria Vaz. O acidente deu-se por fora da baixa do Fanal, ainda na freguesia de Ponta Delgada e, muito provavelmente, devido ao mau estado do tempo e do mar. Mestre Francisco Coelho Rafael, de 76 anos, perdeu a vida e com ele mais dez pessoas, sendo uma do Corvo, outra da Fajãzinha e as oito restantes da Fajã Grande.
Da Fajã faleceu, para além do mestre, Leonardo José da Silveira de 26 anos e sua esposa, Maria de Jesus de 20 anos, que haviam casado no ano anterior, na igreja paroquial da Fajãzinha. Faleceram ainda alguns jovens, um de apenas dezassete anos, chamado José filho de João de Freitas, uma rapariga de nome Maria, de vinte anos filha de João António da Silveira. Faleceram ainda José António Galo de quarenta e três anos, Esperança de Freitas de cinquenta e oito e José de Fraga Henriques de quarenta. A jovem natural da Fajazinha que também faleceu neste desastre chamava-se Maria e tinha 20 anos. Não se sabe ao certo quantos passageiros o barco transportava nem, consequentemente, o número de pessoas que se salvaram.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O NAUFRÁGIO DO “STORTIND”
Muitos e variados foram os naufrágios que ao longo dos anos se verificaram nos mares circundantes à Fajã Grande. Situada no ponto mais ocidental da Europa e arpoada a oeste, a ponta do baixio com o seu pequeno e fraco farol era, apesar de tudo, até à segunda metade do século passado, um ponto de referência necessário e obrigatório para todas as embarcações que, oriundas das Américas, pretendiam rumar à Europa do Norte e do Sul, bem como as provenientes do Mediterrâneo e da Costa Ocidental Africana e que tinham como rota principal o Atlântico, na tentativa de aproveitar os ventos e as correntes favoráveis. Assim navios, paquetes, cargueiros, escaleres, escumas, lugres, galeras, bacalhoeiros, patachos. barcas, bergantins, iates, brigues e todo o tipo de embarcações eram como que obrigadas, nas suas rotas marítimas através do Atlântico, a demandar, ao de perto, a costa mais ocidental da ilha das Flores, a Fajã Grande.
Muitos deles, porém, terminaram os seus dias entre os baixios e escolhos da ilha das Flores, acossados por ventos, temporais e neblinas ou atingidos pelas balas e flechas assassinas da pirataria É que nem sempre as condições de navegabilidade, por aquelas paragens, eram as melhores. Umas vezes era o próprio mar altivo, bravo e revolto que dificultava a navegação e provocava naufrágios, outras as intensas neblinas e nevoeiros que com tanta frequência se formavam naquelas orlas marítimas. Num caso e noutro era muito difícil navegar com segurança e serenidade e chegar ao porto pretendido. Mas não eram estes apenas os maiores e mais eminentes perigos. Outros havia, que punham em risco a navegação ao redor da ilha. Por um lado a pirataria, sempre predisposta a atacar, a saquear, a roubar, a atirar e a matar, tanto em terra como no mar e da qual nem sempre as populações se sabiam defender e, por outro, as guerras mundiais que dominaram uma boa parte das primeiras cinco décadas do século XX, durante as quais barcos de guerra e submarinos pertencentes aos países envolvidos nesses conflitos mundiais atacavam sem dó nem piedade tudo o que lhe aparecesse pela frente, mesmo se tratando de vítimas inocentes, quer fossem pessoas quer embarcações. Foi o que aconteceu no dia 2 de Setembro de 1908 quando um cargueiro norueguês de nome “Stortind” navegava ao largo da costa oeste da ilha das Flores, por fora da Fajã Grande, transportando carga diversa, viajando entre Baltimore e La Palice. Este cargueiro, com quinze tripulantes, juntamente com uma pequena embarcação local, com nove pessoas a bordo, foi atacado e torpedeado por um submarino inimigo em plena 1ª Guerra Mundial. Deste ataque resultou a destruição e o naufrágio de uma e outra embarcação. O “Stortind” ficou de tal modo destruído, tornando-se incapaz de continuar viagem. Os náufragos de ambas as embarcações lançaram-se ao mar nos respectivos salva vidas e aportaram ao porto da Fajã Grande, onde aguardaram meios que, mais tarde, lhe proporcionassem o regresso aos seus países. Abandonados na costa. os salva-vidas foram, mais tarde, arrematados em asta pública e adquiridos por José Alexandre da Silveira e António Caetano Serpa, comerciantes de Santa Cruz.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O NAUFRÁGIO DA BIDART – DADOS HISTÓRICOS
A Barca Bidart encalhou, na noite de 24 para 25 de Maio de 1915, nos baixios da Fajã Grande, mais concretamente no Canto do Areal, por fora da Poça das Salemas. Esta barca pertencia à classe de barcas francesas, com 3 mastros, "Amiral Courbet". A "Bidart" é um símbolo do canto do cisne dos últimos veleiros no virar do século XIX. Estes navios, cuja única propulsão era a vela, iriam desaparecer em função dos Clippers e navios de metal, maiores e mais rápidos.
A "Bidart" foi lançada à água em Setembro de 1901,em França. Acabariapor encalhar e consequentemente afundar-se a 24 de Maio de 1915, nas rochas do Baixio, zona perigosa devido aos muitos laredos ali existentes, na Fajã Grande das Flores, Açores.
Durante a noite de 24 para 25 de Maio de 1915, abarca francesa de três mastros Bidart seguia, a meio pano e em pleno Oceano Atlântico, uma rota para norte, em direcção ao arquipélago dos Açores. A bordo, o comandante Jacques Blondel tentava proceder à manobra do navio, uma tarefa que não era em nada facilitada pela escassez de tripulantes válidos - com efeito, em pleno século XX, ainda se morria de escorbuto a bordo dos navios oceânicos. A longa viagem, sem escalas, que a barca Bidart realizava entre o porto de Thio, na Nova Caledónia, e o porto de Glasgow, na Escócia, era propícia ao desenvolvimento desta e de outras doenças, causadas por uma deficiência de vitamina C na dieta diária dos tripulantes. O escorbuto, causador de perturbações ósseas e de dores musculares, provocava também o aparecimento de fadiga e de depressões, o que em muito terá contribuído para o acidente e consequente naufrágio da barca.
Após vários dias de sol encoberto e da presença omnipresente dos nevoeiros, durante os quais não fora possível posicionar o navio pelo sol, o comandante estava praticamente perdido, sem ao menos saber a latitude certa da embarcação. Para piorar ainda mais as coisas, durante o anoitecer do dia 24 de Maio, morreu um dos marinheiros, de nome Letloc. Poucas horas depois, outros oito se lhe seguiriam.
A barca Bidart fora construída em 1901, pelos estaleiros navais Chantier Nantais de Construction Maritime, de Nantes. Este navio tinha 2199 toneladas de arqueação bruta e 1917 toneladas de arqueação liquida. O casco era de aço, tinha 84 metros de comprimento, com 12,30 metros de boca e 6,80 metros de calado. Como todas as barcas, tinha 3 mastros, largava pano redondo no de proa e no grande, e um latino quadrangular e gave-tope no de ré. Os mastros de proa e o grande tinham dois mastaréus enquanto que o de ré - denominado da mezena - tinha um só.
Em Setembro de 1901, abarca fora lançada à água e entregue à Société Bayonnaise de Navigation. A barca, comandada pelo capitão Pinsonnet, iniciou então várias viagens entre a Europa e o continente americano, sem acidentes. O único, digno de menção, ocorreu em 1906 quando, em viagem para Tacoma, Washington, uma tempestade lançou um homem ao mar e arrancou parte do velame e da mastreação da barca.
Em Maio de 1911, a Bidart foi vendida à Societé Anonyme de Voiliers Normands, estabelecida na praça de Rouen. Em 1915, sob o comando do capitão Jacques Blondel, os 23 homens da tripulação carregaram minério de níquel no valor de 500 mil francos e partiram da Nova Caledónia, com destino a Glasgow, na Escócia.
Após quatro meses de viagem, a barca aproximava-se perigosamente do seu último destino. Às 4.30 da madrugada do dia 25 de Maio de 1915, o capitão Blondel apercebe-se, por entre a névoa matinal, de que a barca se aproximava de uma zona de rebentação. Rapidamente, Blondel tentou fazer com que o navio virasse para o mar. No entanto, a bravura crescente do mar e vento não lh'o permitiu vindo o navio a descair encalhando enfim no canto do Areal, junto aos rochedos da Poça das Salemas, na freguesia da Fajã Grande, a cerca de50 metros de terra.
Com o encalhe, o navio parte-se em dois e afunda-se, até ao castelo de popa, a cerca de8 metrosde profundidade. No processo, caiu também o mastro do traquete sobre a ré do navio. Com os salva-vidas inoperacionais, o piloto, o cozinheiro Charles, o imediato Pedron e o contramestre Lhotis atiraram-se à água, no intuito de se dirigirem até à costa e pedirem ajuda. Infelizmente, a agitação do mar apenas permitiu que fosse o piloto o único a lá chegar.
Perante este cenário, o comandante ordenou o abandono do navio. Após se terem munido de coletes de salvação, os elementos da tripulação saltaram, um a um, para o mar revolto. No final, apenas 14 se salvaram, entre eles alguns mais ou menos pisados, tendo-se afogado os marinheiros Legasi, Lecandre, Totbien, Lebreton e Kerne. Logo que foram recolhidos, os náufragos foram logo vestidos e tratados com a maior solicitude, por todo o povo da freguesia. O médico de Santa Cruz procedeu logo aos primeiros socorros, fazendo embarcar os feridos mais graves para o Hospital de Santa Cruz das Flores, logo no dia seguinte, assim que o mar acalmou.
Tanto o cozinheiro como o contramestre se afogaram, tendo os seus corpos dado à costa na freguesia da Fajãzinha, no dia 25 de Maio, juntamente com o de um marinheiro. Imediatamente, o povo os colocou em câmara ardente numa casa do Espirito Santo e ofereceu-lhes 6 coroas de flores naturais, que foram depostas sobre os cadáveres. Os habitantes ofereceram tambem lençoes e almofadas para os caixões dos mortos. Por iniciativa do vice-vigário da freguesia, reverendo Caetano Bernardo de Sousa, fez-se o enterro com toda a solenidade, sendo os três cadáveres acompanhados por todo o povo da freguesia. Os restantes mortos foram sepultados na Fajã Grande.
O que restava do navio - avaliado em cerca de 300 mil francos - e da carga, foi arrematado por José Azevedo da Silveira por 210$000 reis, no dia 29 de Maio. Este comerciante local acabou por tomar posse de alguns salvados tirados do castelo de proa, único ponto do navio que ficou fora d'agua. O resto do navio estava submerso a alguns palmos abaixo da linha d'agua, tendo dentro parte da carga e todos os objectos de bordo, conservas e algum dinheiro. Por vários dias, o mar em volta do naufrágio tomou uma cor avermelhada, devido à fuga do minério de níquel que vinha embarcado a bordo da Bidart. O povo crédulo, cuidou que eram as almas dos marinheiros mortos que ali haviam ficado sem sepultura. Os náufragos sobreviventes embarcaram então para Lisboa, a bordo do paquete Funchal, tendo escalado Angra do Heroísmo a 15 de Junho de 1915.
No meio de todo este azar, o mais azarado acabou por ser o imediato, que acabou também por falecer. Este, que estava para se casar e que iria assumir o comando da Bidart, já tinha naufragado anteriormente nos Açores quando, simples marinheiro a bordo da galera francesa Caroline, encalhou na vila da Madalena, ilha do Pico, a 3 de Setembro de 1901.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O DESASTRE DO CORVO
Quase todos os anos, por altura da Festa da Senhora dos Milagres, partia das Flores uma lancha com pessoal da Fajã Grande para participar na mais importante e maior festa da ilha vizinha. Muitas famílias da mais ocidental freguesia açoriana tinham os seus amigos e “conhecidos” no Corvo, em casa de quem se hospedavam, sempre que ali se deslocavam para a festa, ou simplesmente para efectuar algum negócio ou por outro motivo qualquer. Pela Senhora da Saúde, acontecia o contrário. Eram os corvinos que então se deslocavam à Fajã, hospedando-se nas casas dos que lhes haviam dado guarida pela Senhora dos Milagres. Algumas pessoas da Fajã, até seguiam para Ponta Delgada a pé e daí, da freguesia das Flores mais próxima do Corvo, faziam viagem para aquela minúscula ilha.
Corria o ano de 1942. Muitos peregrinos da Fajã decidiram ir ao Corvo, à Festa da Senhora dos Milagres, uma tradição que se mantinha desde há muitos anos. Organizou-se a excursão, fretou-se o gasolina e, na tarde do dia treze de Agosto, partiu, do cais, com quarenta e cinco passageiros, quase todos da Fajã e da Ponta, com destino ao Corvo, o gasolina “Senhora das Vitórias” também conhecido pela “Francesa”. A partida atrasou-se e a embarcação chegou ao Corvo, já noite escura. Ao aproximar-se da ilha, o mestre viu uma luz em terra e, cuidando que era o pequeno farol que indicava o porto, rumou a terra. Infelizmente a luz não era a do farol, nem o porto era ali e “A Senhora das Vitórias” enfiou-se, precipitadamente e de rompante, sobre as baixas dos Laredos, abrindo um enorme rombo a meio, enchendo-se de água e provocando grande pânico entre os passageiros. A confusão foi geral, a precipitação tremenda e o terror gigantesco. Não havia luz alguma, por ali perto, cada qual procurava salvar-se e salvar os seus familiares que a muito custo encontravam ou nem chegavam a encontrar, acabando por perder a vida neste acidente dezasseis passageiros e ainda um dos proprietários da embarcação de nome António Jorge de André Freias, residente nas Lajes. Da Fajã Grande morreram: António Cardoso de Freitas, Maria Garcia Ramos, Elvira Vitória Ramos, Maria dos Anjos Freitas Henriques, Ercília Garcia Ramos, José Inácio Luís, Glória Barbeiro, João Furtado Sousa, Ana Fagundes e Violante Cândida. Da Ponta faleceram Lídia Freitas Dias, Aurora Inês Freitas, José António Filipe, Manuel Furtado Silveira e Teresa Serpa. Também perdeu a vida neste acidente José Caetano Gangão, natural e residente da Fajazinha.
Diziam as pessoas mais antigas que quando a notícia, no dia seguinte, chegou à Fajã, “parecia um dia de juízo”, pois todos os que tinham familiares embarcados na véspera, para o Corvo, cuidavam que eram eles os falecidos. A freguesia encheu-se de gritos e de prantos, de confusão, de terror, de angústia e desespero, à medida que os nomes dos mortos iam sendo conhecidos.
No entanto, no Corvo, as autoridades e os responsáveis pelos destinos da ilha, com os limitadíssimos recursos e meios de salvamento que dispunham, tentavam recolher os náufragos e prestar auxílio às vítimas. O local, porém, era longe do povoado e de difícil acesso. Os meios de transportes nulos e os náufragos, quer os mortos quer os vivos, foram transportados a ombros. Havia apenas um médico na ilha. Após muito esforço conseguiram levar os mortos para a Casa de Espírito Santo do Outeiro, onde foram estendidos no chão, sem lhe serem prestados os primeiros socorros, não sendo, provavelmente, assistidos da melhor forma.
O desastre do Corvo que assinala o dia mais trágico da história fajagrandense perdurou anos e anos na memória de todos e muito especialmente na dos familiares daqueles e daquelas que tão tragicamente perderam a vida, naquela fatídica noite de 13 para 14 de Agosto de 1942.
Contava-se que a única criança que viajava se salvou. Um dos passageiros, instintivamente, ter-lhe-á pegado, trazendo-a para terra sã e salva. Só que esse salvador terá voltado atrás na tentativa de salvar algum familiar, tendo, infelizmente, perdido a própria vida. A criança salvou-se, mas nunca soube quem foi o seu salvador.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O NAUFRÁGIO DO SLAVÓNIA
Faz hoje, 10 de Junho, cento e quatro anos que o paquete “Slavónia”, popularmente designado, na ilha das Flores por "Salavónia" naufragou junto à Costa do Lajedo, naquela ilha açoriana, acontecimento marcante durante décadas e décadas, na vida e costumes da ilha e, eternamente, presente na memória de toda a sua população.
O naufrágio deste grande e luxuoso paquete inglês aconteceu, segundo alguns relatos da época, por voltada das três horas da madrugada, do dia 10 de Junho de 1909, ou seja, três anos antes de um outro grande naufrágio, o do Titanic. O acidente ocorreu num baixio das Flores, a cerca de 25 metros de terra, em frente ao lugar da Costa, na freguesia do Lajedo, na altura em que se procedia à construção do novo e actual farol das Lajes e provocou um enorme alvoroço em toda ilha, muito especialmente nas povoações e freguesias da costa oeste, sobretudo, por se tratar de um navio que transportava centenas de passageiros. O naufrágio do Slavónia foi, incontestavelmente, o maior e o mais propalado, de dezenas e dezenas de quantos aconteceram naquela ilha, desde os primórdios do seu povoamento, não pelo número de mortes, felizmente que as não houve, mas sim pelo número de pessoas envolvidas e pela excelência e sumptuosidade do navio. Na altura do acidente, viajavam a bordo do Slavónia cerca de 750 pessoas, dos quais 500 eram passageiros e as restantes membros da tripulação. Todas estas pessoas se salvaram, sendo recolhidas e transportadas para terra com ajuda de cabos vaivém e pelos barcos “Botávia” e “Princesa Irene” ancorados na ilha, na altura. Para além dos passageiros, o luxuoso paquete transportava farinha, açúcar, café, algodão, máquinas de escrever e barras de cobre.
O “Slavónia", era um faustoso transatlântico pertencente à Cunard Steamship Company, Lda, construído em 1903. Partira de Nova Iorque no dia 3 de Junho com destino a Trieste, cidade do nordeste da Itália, no Mar Adriático. Tinha 10 606 toneladas brutas, tinha 155,44 m de comprimento, 2 máquinas a vapor alimentadas por 6 caldeiras com 18 fornalhas e era propulsionado por dois hélices que lhe conferiam uma velocidade média de 13 nós.
Segundo rezam as crónicas da altura, alguns dos passageiros ao saberem que o paquete passava perto das Flores, fizeram chegar ao comandante, um pedido escrito para que este alterasse a rota de maneira a que se aproximasse da ilha e pudessem observar, em pormenor, a sua beleza. O comandante acedeu ao pedido e planeou rodear as Flores, pelo Sul, numa rota afastada apenas a 6 milhas de terra, para depois prosseguir no seu curso original. Mas um forte nevoeiro que se abateu na noite de 9 de Junho e uma forte corrente marítima que ali se fazia sentir, terão desviado o paquete da rota prevista, levando-o a encalhar nuns pequenos escolhos e baixas rochosas existentes, entre a Costa e o Lajedo. Sucederam-se sucessivos e angustiantes pedidos de socorro que foram recebidos pelo paquete alemão "Prinzess Irene" e pelo navio "Batavia", que imediatamente se dirigiram para o local, socorrendo o navio naufragado
Entretanto o Slavónia fora abalado em toda a estrutura pelo encalhe violento e a agitação do mar causara-lhe o colapso do compartimento estanque da ré, levando a popa a mergulhar progressivamente no mar, enchendo as caldeiras de água e apagando o fogo das fornalhas. Consta que o comandante, abalado pela perda iminente do navio que comandava, tentou, por várias vezes, suicidar-se, no que foi impedido por elementos da tripulação.
Consta também que todas as operações de salvamento dos passageiros e da tripulação se processaram ordenadamente, quer através dos escaleres dos transatlânticos envolvidos, quer através de um cabo vaivém passado entre a costa e o barco. Todos passageiros e a maior parte da tripulação embarcaram, pouco depois, em outros navios, com destino a Lisboa, ficando apenas alguns quadros superiores da tripulação na ilha. Pelo contrário, apenas um pequena parte da bagagem foi salva e quase nenhuma carga se recuperou e todos os esforços do rebocador "Condor" para retirar o navio, quase totalmente submerso, foram debalde, pelo que, uma semana depois, a seguradora declarou a perda total do navio, que, assim, ali permaneceu afundado para sempre.
Nos dias seguintes, muitas pessoas, não apenas da Costa e do Lajedo mas de outras freguesias da ilha terão demandado aquelas redondezas, apesar de a zona estar sob vigilância da Guarda Fiscal, na tentativa de procurar, recolher do mar objectos valiosos e carga do navio. Era voz corrente de que, para além de parte da carga, estaria perdida, por ali, uma mala do correio com valores declarados. Não consta que tenha sido encontrada, mas muitos populares recolheram louças, talheres, travessas, candeeiros, pratas, mobílias, camas e até portas que usaram, mais tarde, nas suas próprias casas. Lembro-me de em criança ver pratos, travessas e candeeiros, retirados do Slavónia.
Recentemente surgiu a ideia de se recolherem todas as peças que pertenceram ao Slavónia e guardá-las em museu, o que, aparentemente já será um pouco tarde.